Cada Música Uma História, Cada História Uma Música escrita por Maria Vicente Carvalho


Capítulo 2
Capítulo 2 - De Volta Pra Casa


Notas iniciais do capítulo

A minha intenção ao publicar um capítulo é que cada um seria um conto diferente do outro, pois cada um tem uma música como inspiração, porém quando eu fui escrever esse segundo acabei usando os personagens do primeiro e meio que escrevi uma sequencia e agora tô cogitando a ideia de manter esses dois personagens e escrever mais sobre eles (vou precisar mudar a sinopse), mas ainda assim penso escrever de uma maneira onde mesmo que seja tipo sequencia, cada capítulo possa ser lido ou visto como um conto, uma nova historia.

A música de inspiração para este capítulo é a De Volta Pra Casa do Junior Lima (sim, o irmão da Sandy, final de 2023 ele lançou um album solo e eu tô curtindo bastante esse trabalho solo dele)



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/811333/chapter/2

 

 — E isso dá dinheiro?

 — Vai ter a versão física e digital do livro e...

 — Mas isso não dá dinheiro... Porque você não faz um concurso? Se passar ganha um salário dos bons e... – o som da voz estridente de Elena foi se abafando, pois Marina deixou de prestar atenção no que ela tagarelava, encolhendo-se em sua cadeira, Marina deu um longo gole em sua cerveja.

 Quando a bebida acabou decidiu chamar o garçom para pedir a conta.

 — Já vai? Você nem me contou nada... E o Paulo, tem notícias dele? Já superou?

 — Eu não tenho mais nada pra contar...

 — Achei que gostasse de contar histórias, você não é escritora? – aquele deboche fez com que Marina quisesse ir embora dali o mais rápido possível.

 Pagou sua parte, despediu-se de Elena e saiu do bar, estava tão irritada que nem percebeu que caminhou em passos largos e quando se deu conta já estava próximo à estação Paulista.

 Enquanto passava as catracas tentou recordar a razão de ter acordado tão feliz pela manhã, logo lembrou que o motivo era a mensagem de sua melhor amiga dizendo que havia voltado de viagem e que ansiava em vê-la, Marina estava feliz, se sentia realizada por finalmente ter concluído a revisão final da escrita do seu livro, a capa estava sendo editada por um colega de trabalho, como ela sonhava com aquilo: publicar um livro.

 Havia deixado o sonho de lado quando se excedeu em seus sentimentos por Paulo, deixou de fazer muita coisa por causa daquele relacionamento, mas não por culpa dele, pelo contrário, Paulo ao saber que a namorada escrevia, incentivou ao máximo para que ela publicasse algum dos seus escritos, mas por causa dos excessos emocionais de Marina em relação aquele namoro fez com que ela deixasse o sonho de lado. Após o fim do relacionamento, Marina precisou cuidar de si, do seu psicológico e aprendeu a ser a sonhadora de antes e também a conviver com a ausência de Paulo, aceitando o fim daquele relacionamento. Voltar a escrever fazia Marina se sentir em casa, escrever era o seu prazer, sua paixão, sua razão de viver; quando concluiu a escrita de sua primeira obra ambicionava publicar e divulgar a mesma aos quatro cantos, mas desde que anunciou aos seus familiares e amigos não teve incentivos, sempre que ela falava: vou publicar um livro, alguém sempre fazia uma pergunta seguido de algum comentário apático por isso quando havia recebido aquela mensagem de sua melhor amiga anunciando que voltara de viagem ela se animou, pensou que fosse ver um enorme sorriso, pensou que o semblante de sua amiga fosse alegre, que ela fosse abraçá-la e dar os parabéns, mas não: ela também foi outra a desaprovar tal feito.

 Marina não era e nem seria a última pessoa a vivenciar aquilo referente a escrita, grande maioria dos escritores, inclusive dos independentes passavam por aquilo e naquele momento Marina se deixou levar por todos os questionamentos e comentários desprezíveis sobre um dos seus maiores sonhos da vida e se deixou levar tanto que ao chegar em casa desistiu de publicar a obra e os arquivos de todo o seu trabalho ficaram salvos em uma pasta qualquer de seu computador.

 Frustrada com sua vida profissional passou a pesquisar mais sobres concursos públicos, se apegou aos valores de salário ofertados dessas vagas e se dedicou aos estudos, deixou o lazer de lado, pois além de ter que estudar muito precisava poupar dinheiro porque a cada prova que prestava ela pagava uma taxa. Depois de umas sete tentativas, tenciona desistir, mas quando prestou por mais uma prova foi finalmente aprovada e assim ocupou uma dessas vagas de emprego.

 Marina usufruiu dos benefícios, a escala e carga horária de trabalho eram excelentes, além do salário tinha bonificações e diversas vantagens, aproveitou para fazer uma faculdade e optou em cursar administração em uma universidade privada da cidade de São Paulo, mas ela ainda não se sentia feliz. Saiu do aluguel, comprou uma casa própria, viajou para diversos lugares quando tirava férias ou quando tinha emendas de feriados, passou a trajar etiquetas de grife, todo mês comprava algum item novo para o seu lar, mas ainda assim ela continuava a sentir um vazio dentro de si, era um desconforto que ela não sabia explicar e também evitava, Marina julgava que estava sendo ingrata por se sentir daquele jeito porque a sua vida estava “perfeita”.

 Em um desses feriados emendados decidiu não viajar, preferindo ficar em casa e a partir dali foi abandonando o hábito das viagens, agora a sua rotina era: casa, trabalho, faculdade e casa. Passou a dedicar suas folgas para a culinária, se viciou em vídeos de TikTok dedicados a receitas, reproduziu maioria delas, ela procurava por algo que preenchesse aquele vazio, porém de nada adiantava.

 Em uma noite de domingo, quando retirava do forno uma bandeja com uma fornalha de biscoitos doces ouviu o interfone tocar.

 — Oi dona Marina, boa noite. – era a voz rouca do porteiro.

 — Olá senhor Benedito, tudo bem?

 — Tudo sim... Escuta... Tem um homem aqui querendo te visitar.

 — Quem?

 — Diz que se chama Paulo.

 Sentiu suas pernas tremerem enquanto um arrepio passava vagarosamente entre suas costas, o coração acelerou os batimentos. A última vez que Marina havia visto Paulo foi quando terminaram a relação, após isso teve notícias dele somente pelas redes sociais, não, ela não era mais apaixonada loucamente por ele, entretanto Marina jamais esqueceu o que vivera daquela relação e achava que Paulo jamais a quisesse vê-la novamente.

 — Ei dona Marina, mando subir ou dispenso? – o porteiro a despertou de seus devaneios.

 — Pode mandar subir, por favor.

 Não demorou muito para ouvir batidas na porta, antes de atender tirou o excesso de farinha de trigo de sua blusa vermelha de moletom.

 — Boa noite. – dissera Paulo com as mãos dentro do bolso da calça jeans.

 — Boa noite... Entre, por favor.

 Paulo já foi se explicando, pois seria nítido que Marina o questionaria para descobrir como foi que ele obteve o endereço, ele havia conseguido com um dos amigos dela.

 — Fiz uns biscoitos... Aceita com café?

 — O cheiro está ótimo. – elogiou ele ao balançar a cabeça positivamente.

 Enquanto Paulo se acomodava em dos cantos do sofá da sala, Marina foi à cozinha preparar o café, daquela vez não haveria xícaras espatifadas e discussões. Paulo estava ali como um amigo e seria ele que faria Marina preencher aquele vazio que ela sentia dentro de si.

 Saborearam os biscoitos, beberam café e conversaram sobre a vida, Paulo narrou com detalhes as novidades sobre si, ele estava muito feliz e realizado, pois seu trabalho musical estava tendo frutos.

 — ... E mês que vem o meu álbum estará disponível para ouvir pelo Spotify.

 — Uau Paulo, você conseguiu, parabéns e muito sucesso! – ambos se levantam para um abraço.

 Paulo percebeu que tinha algo de errado com a ex-namorada, quando voltaram a se sentar ele a toca gentilmente no ombro e firmando seu olhar para ela faz a seguinte pergunta:

 — Tudo bem com você?

 Um sorriso falso foi a resposta, arqueando a sobrancelha Paulo insistiu na pergunta, mas Marina insistia em demonstrar que estava bem.

 — E o seu livro? Fiquei sabendo que ia publicar sua primeira obra.

 — Quem disse isso? – admirada ela arregala o olhar.

 — Elena.

 — Não sei pra que ela te falou... Ela nem liga pra essas coisas!

 — Ela é sem noção, comentou sobre isso e disse que era a maior perda de tempo.

 — Pois é, mas eu não perdi tempo – Marina se levantou e passou a recolher as coisas do café da mesinha de centro da sala – fiz concurso, tô cursando adm, tô pensando em estudar outro idioma e...

 — Marina! – Paulo exclamou de uma maneira que a fez deixar as coisas de volta à mesinha, em seguida ela começou a caminhar pela sala. — Você não publicou o livro? Por que?

 Um choro foi a resposta, porém entre as lágrimas Marina tentou se justificar alegando que deixará de lado a ideia de ser escritora afirmando que aquilo não lhe traria futuro e passou a repetir os comentários desprezíveis que ouvira de diversas pessoas na época em que anunciou sobre a publicação de sua obra.

 Paulo se levantou e a envolveu em outro abraço, fez com que ela se acalmasse, quando o pranto foi cessado que ele começou a falar:

 — Você antes não se importava com que os outros falavam, por que agora se importa?

 — Antes eu era mais nova e sem juízo.

 — Não, antes você era determinada.

 — As pessoas não são as mesmas pra sempre.

 — Concordo, mas temos que mudar pra melhor e seguir nossos sonhos. Eu vi seus posts da Argentina, soube que voltou a ser alegre, voltou a ser aquela maluca de antes...

 — Mas o negócio do livro é bobagem e...

 — Vou precisar te interromper... Quando nos conhecemos, eu recordo muito bem algo que você sempre dizia: a escrita é o meu lar, a minha vida. Lembra disso?

 — Lembro sim. – ela volta a chorar.

 — Eu percebi que tinha algo estranho contigo desde que cheguei... Você parou de escrever mesmo?

 — Parei e... – soluços – Eu sinto um vazio tão grande dentro de mim e eu fico tentando preencher, parece idiotice minha, mas desde que abandonei meu sonho eu acho a vida sem sentido e eu fico procurando sentido de outras maneiras e... – Marina se senta de volta ao sofá.

 — Não é idiotice, sabe o que é estupido? Permitir que outros ditem sua vida. Bacana você ter feito concurso e conseguido um excelente emprego, não vamos negar isso, porém você só fez isso porque os outros falaram, não foi? Elena se gabou por isso.

 — Aquela vaca disse o que?

 — Disse que é uma ótima amiga, que você seguiu o conselho dela... Mencionou sobre você publicar o livro, mas disse que se você fez isso provavelmente não deu certo porque não ficou sabendo de nada.

 — Que infeliz!

 — Marina, você ainda quer publicar o livro?

 — Quero, ele está pronto e eu tenho diversas ideias para os próximos.

 — Se é o que você quer então faça. Você dizia que a escrita era o seu lar então trate de voltar para casa!

 — Tem razão, eu vou, eu vou... Eu sou uma escritora!

 — Eu não ouvi direito... – Paulo emitiu um sorriso.

 — Eu sou uma escritora! – dando mais entonação na voz, Marina se levantou e passou a repetir aquela frase diversas vezes.

 Agradeceu a Paulo pelo conselho e em seguida ele se despediu dizendo que precisava voltar para casa pelo horário, despediram-se com um abraço. Aquela visita inesperada do ex-namorado despertou Marina para seus sonhos, ela acessou o computador e abriu a pasta onde estava todo o arquivo de sua obra editada e prometeu a si que daquela vez iria acontecer. Na manhã seguinte entrou em contato com uma editora independente de obras literárias e assim publicou seu livro.

 Marina não se tornou aquela escritora famosa pelo país e afora, entretanto ela deu o máximo de si para divulgar suas obras pelas redes sociais e algumas livrarias da cidade de São Paulo, não pediu exoneração do seu cargo público porque gostava do trabalho e o salário a ajudava com os custos de divulgação e impressão de sua obra, voltou a se dedicar a escrita, tinha tantas ideias a explorar, muitas histórias para contar. Aos poucos as vendas de suas obras foram aumentando e Marina ficou eufórica ao descobrir que fizeram resenha de seu livro em um canal do YouTube.

 Passados alguns meses, Marina começou a escrever aquele que seria o próximo livro a ser publicado, o mesmo era uma sequência da primeira obra.

 Em uma noite estava diante de seu computador escrevendo, estava ali há bastante horas e percebeu que era momento de uma pausa. Pegou seu celular para acessar suas redes e se deparou com o anúncio de um cantor brasileiro que ela admirava muito, o artista estava um tempo afastado da música, todavia naquele instante ele havia publicado um vídeo para divulgar seu retorno através de um álbum que ele havia gravado e o mesmo estava disponível para ouvir em diversas plataformas digitais. Entusiasmada com a nova, Marina se conectou em sua conta do Spotify para ouvir o álbum.

 A primeira faixa era intitulada como De Volta Pra Casa, uma sensação se apossou de Marina, era um misto de emoções ao ouvir aquela música, riu e chorou, porque a letra da canção a fez refletir sobre o que vivenciava sobre a sua escrita; escrever era a sua paixão, a escrita era o seu lar. Após alguns dias Marina assistiu uma entrevista do artista em que ele menciona sobre aquela canção alegando que a mesma expressa a sua vivência ao regressar ao universo da música e dessarte Marina se viu naquela manifestação, porém em seu caso era através da escrita.

 A escrita era o seu lar e retornar a escrever fazia Marina sentir-se daquela maneira: de volta pra casa.

 

 

  

 

 

 

 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Eu tentei pensar em outro título pra esse capítulo porque queria evitar colocar o nome da música, mas não consegui pensar mais nada.

O artista mencionado no capítulo é o próprio Junior mesmo e sim ele deu uma entrevista para o Fantástico falando do album e ele fala algo semelhante sobre essa faixa do album dele e sobre ele voltar pra música dessa maneira, na entrevista ele falou algo que me marcou muito... Ele disse que um dia mexia nas redes sociais e se deparou com um vídeo da Clarice Lispector em que ela diz que quando ela não tá criando ela tá morta, ou seja, quando ela não tá escrevendo e tal, isso me marcou muito porque desde que meu cunhado faleceu eu pra escrever tô meio que negação e fora que tô passando por outras coisas que tem dias que eu quero desistir, mas quando eu paro e me faço escrever eu me sinto bem me sinto em casa então desde que ouvi essa música dele eu tenho pensado escrever algo relacionado e o desafio só me incentivou.



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Cada Música Uma História, Cada História Uma Música" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.