A Guarda Avançada escrita por Giovanna Luiza


Capítulo 2
Capítulo Um: Londres




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20/07/1995

A manhã começou nublada demais em Londres, enchendo Bill de saudades do Sol escaldante do Egito e da claridade que ele trazia. Ainda assim, o clima combinava perfeitamente com o seu humor: mal tinha chegado na cidade e já deveria apresentar-se em Gringotts Bank, sem tempo para descarregar suas bagagens, mudar de roupa ou comer algo, absolutamente nada. Os duendes não se importavam - “afinal, se não está morto, por que não está trabalhando?”, Auguste costumava brincar quando recebia instruções como aquela.

Respirou fundo, tentando afastar aqueles pensamentos e lutando para conter a vontade de vomitar que sempre lhe tomava quando usava chaves de portal. Encarou novamente o céu acinzentado refletido na janela em sua frente, puxou mais ar gelado para dentro de seus pulmões e endireitou-se, tentando recuperar sua compostura. Aquele era um lugar onde não poderia demonstrar nenhuma fraqueza ou traço de humanidade. Deu um sorriso forçado, passando a mão por suas vestes como se estivesse apenas se ajeitando.

— Espero que tenha feito uma viagem agradável, senhor Weasley. — uma voz arrastada e sibilante o saudou e não demorou muito para encontrar um duende careca com uma longa barba negra o encarando com um sorriso malicioso. — Sou Griphook, serei seu Supervisor aqui.

— É um prazer. — Bill o cumprimentou com a expressão fechada, sustentando o olhar do duende. Não fez nenhuma menção de apertar sua mão ou tocá-lo de qualquer modo - afinal, valorizava muito ter todos os seus dedos em seus devidos lugares.

Griphook ficou alguns minutos o analisando atentamente em completo silêncio, provavelmente esperando o deixar desconfortável, mas já estava mais do que acostumado com aquilo. Por mais que fosse funcionário a um tempo relativamente considerável, estava em um novo território, e naturalmente ninguém confiaria nele com tanta facilidade. Também deveriam estar cientes das polêmicas que rondavam o sobrenome Weasley naquelas dias sombrios e seria inocente demais se não presumisse que já haviam calculado os custos e os benefícios de sua presença em Londres naquele momento.

E apesar de não ter muito contato com os seus chefes de outra espécie no Egito, conhecia muito bem as regras implícitas em qualquer diálogo com um duende. Eles não respeitavam Bill e nenhum outro bruxo, e aquela era uma das únicas dinâmicas onde estavam em uma situação de poder. Sendo assim, não falou sem ser requisitado e muito menos ousou elaborar alguma pergunta.

— Muito bem, senhor Weasley, o levarei para conhecer o seu novo… chefe. — Griphook finalmente anunciou com uma risadinha irônica, e dessa vez, não conseguiu evitar esboçar um pequeno sorriso. Embora definitivamente não gostassem de trabalhar com bruxos, os utilizavam para os setores mais convenientes, como qualquer um que envolvesse risco de vida ou o contato com outros bruxos e os postos de chefia que não eram ocupados por duendes em Gringotts Bank eram apenas ilusórios. — Essa semana será sua adaptação, então sua presença será requisitada apenas por meio período. Tenho certeza que o senhor King irá providenciar alguém para lhe levar ao seu novo alojamento. Por aqui.

Bill o acompanhou, enfeitiçando sua mala para que não precisasse carregar e agradecendo silenciosamente por ela ser pequena o bastante para que pudesse fazer aquilo com alguma discrição. Passou sem chamar muita atenção dos clientes habituais e foi sumariamente ignorado pelos demais duendes, como de costume. Sem maiores explicações, foi levado para uma porta baixa escondida atrás dos balcões que dava acesso aos andares superiores do banco.

— O senhor King irá autorizar sua varinha para abrir essa porta e o seu setor fica no quarto andar. — Griphook informou friamente, o conduzindo para um elevador dourado com seis botões sem numeração. — Por mais que você pareça bem mais esperto do que seus colegas, ainda devo lhe informar que sua presença não é permitida em outros andares, a não ser que eu o autorize expressamente.

Bill apenas assentiu, sem fazer maiores comentários. Perguntas demais costumavam irritar seus patrões e dessa vez, deram a sorte que sua grande curiosidade definitivamente não se aplicava àquele contexto: mal tinha interesse em saber o que havia para fazer em seu próprio andar, quem diria nos outros?

Após o que pareceu uma eternidade, finalmente chegaram ao Departamento de Investigações Bancárias e pela primeira vez em muito tempo, Bill sentiu o desconforto de ser o alvo de vários olhares, em sua maioria reprovadores. Conteve a vontade de revirar os olhos e continuou seguindo Griphook com a cabeça erguida, fingindo prestar atenção em sua breve explicação sobre os setores que compunham o departamento, tentando não reparar nos olhos maldosos e nos comentários indiscretos eram sussurrados alto demais.

Não podia dizer que estava surpreso. Para começar, os Weasley haviam permanecido abertamente ao lado de Dumbledore e Harry Potter, enquanto a maioria dos bruxos pareciam concordar quando Fudge dizia que até os gênios enlouqueciam - provavelmente, era mais confortável. Além disso, mesmo antes desses eventos, não podia fingir que se encaixava na parte administrativa do banco.

Os homens e mulheres ao seu redor pareciam imponentes, com os cabelos perfeitamente arrumados em penteados severos e sem graça, com trajes bruxos em cores sóbrias ou vestes formais muggles, todos muito enfeitados por jóias. Bill, por sua vez, continuava o mesmo de sempre: camiseta da banda Weird Sisters , confortável e larga, calças jeans surradas, coturno e jaqueta de couro de dragão, além do longo cabelo ruivo preso por uma tira em um rabo de cavalo e seu brinco de Rabo-Córneo Hungáro balançando em sua orelha. Sua aparência, assim como seus valores, não haviam mudado ao longo dos anos.

— Bill! — uma voz animada demais o chamou e logo localizou a fonte. Era um homem alto, de cabelos castanhos escuros e um conjunto muggle cinza-claro, que aproximou-se quase correndo. Antes que pudesse se dar conta, foi puxado para um abraço apertado demais. — Há quanto tempo!

Bill piscou algumas vezes, obrigando-se a retribuir o abraço enquanto tentava absorver o que estava acontecendo. Sabia que deveria falar algo carinhoso, mas seu cérebro não conseguia pensar em nada no momento. A bem verdade, se fosse um de seus irmãos o abraçando daquele modo na frente de duendes, provavelmente teria afastado com um tapa.

— Vejo que já conhece o senhor Henry King, nosso Chefe do Departamento de Investigações Bancárias. — Griphook interrompeu com a voz claramente reprovadora, salvando o ruivo da situação constrangedora. — Deixo o senhor Weasley em suas mãos, já que maiores apresentações não se fazem necessárias. Espero que ele esteja pronto para nossa reunião na próxima segunda-feira.

— Se depender de Bill, vamos poder até mesmo adiantar! — Henry brincou com uma gargalhada forte, dando um tapa forte em seu ombro. Era um movimento tão obviamente errado que se perguntou como alguém tão inteligente conseguia agir como um completo trasgo.

— Mas não depende. — Griphook retrucou com irritação, se retirando sem acrescentar nenhuma palavra.

— Não ligue para ele, está sempre de mau humor. — Henry revirou os olhos antes de envolver o ombro do ruivo, conduzindo-o pelo departamento e fazendo com que os seus novos colegas precisassem disfarçar um pouco de sua hostilidade. — Prometo que te coloquei com um chefe mais… oh, você vai ver, vai amar tudo isso!

Tinha certeza que não iria amar absolutamente nada de seu novo emprego, mas sabia que não era hora de ser tão sincero assim. Afinal, por algum motivo que nunca entendeu completamente, Henry King sempre gostou muito dele, mesmo que nunca tivessem sido, de fato, próximos. Henry era três anos mais velho e também foi monitor-chefe e seus conselhos foram muito úteis para que o próprio Bill conquistasse o cargo aos seus dezessete anos. Após formados, continuaram mantendo contato esporádico através de cartas, mas não era como se fossem melhores amigos.

Mas era um ótimo aliado e não podia estragar isso. No meio de todo aquele escândalo, Henry interviu junto aos duendes para trazê-lo de volta à Inglaterra. Uma carta sem quase nenhuma explicação, foi tudo o que precisou para fazer com que aquele homem arriscasse sua reputação.

— Muito obrigado por tudo, Henry. — Bill deu um sorriso educado, permitindo-se relaxar um pouco os ombros. — É bom estar de volta em casa.

— Confesso que você me surpreendeu, nunca pensei que fosse cansar de suas aventuras no Egito. Quero dizer, as histórias que você me contava em cartas pareciam maravilhosas, vou providenciar um almoço para que possa me dar mais detalhes pessoalmente! — Henry estava definitivamente animado, parecia prestes a dar pulinhos a qualquer momento. Viraram para um longo corredor dourado repleto de portas brancas com pequenas placas de ouro sem nada escrito. — Nós também temos nossa cota de emoções aqui, você vai ver! Nada tão emocionante como uma múmia mau-humorada ou maldições de faraós, mas nos divertimos de nosso próprio modo.

“Mau-humorada” não era exatamente o adjetivo que usaria para descrever nenhuma múmia que enfrentou e preferia nem comentar sobre a parte de maldição do faraó. Forçou uma risada, fingindo concordância. Em algum universo paralelo, alguém realmente deveria encontrar muita emoção em estar preso atrás de uma mesa, tentando descobrir se as pessoas estavam pagando corretamente o imposto ou enganando umas às outras.

— Bom, até aqui, parece mais agitado do que no Egito. — Bill confessou, um pouco incomodado. Ali, as pessoas andavam de um lado para o outro muito rápido e carregando pilhas de pergaminhos, ninguém parava. É claro, em campo as coisas eram bem dinâmicas e perigosas, mas naquele horário, ele e Auguste provavelmente estariam bebendo um chá e fumando cigarros, conversando sobre algum assunto aleatório.

— Você vai se acostumar rápido. Este é o seu setor. — Henry comentou, apontando para uma das portas e fazendo uma escrita inclinada e elegante surgir na placa: “Seção de Fiscalização do Comércio de Artefatos Orientais”. Franziu o cenho, tentando imaginar onde exatamente aquele setor se encaixava em um departamento investigativo. — Infelizmente não poderei ficar muito tempo com você hoje. Tenho alguns relatórios urgentes para entregar, mas conversarei com minha secretária sobre aquele almoço. De qualquer forma, tenho certeza que irá amar seu Gerente, ele será o responsável por sua adaptação.

Henry abriu a porta, revelando uma sala muito grande, com portas que levavam a outros ambientes. Havia três mesas ocupadas por mulheres que pareciam entulhadas em pergaminhos e uma placa que identificava o local como “Triagem”. Do outro lado, uma longa mesa com algumas comidas e café, muito café - tinha certeza que iria precisar daquilo com mais frequência do que estava acostumado.

Foi conduzido até uma porta maior, bem no centro da parede oposta, onde podia-se ler “Gerência da Seção de Fiscalização do Comércio de Artefatos Orientais”, e Henry a abriu sem maiores cerimônias. Bill certamente não estava preparado para o que aguardava. O cheiro de chá o atingiu primeiro, aromas tão específicos e tão conhecidos que jamais esperaria encontrar ali. Em seguida, percebeu que “Do The Hippogriff”, das Weird Sisters, tocando ao fundo. O rosto sentado à mesa também lhe era familiar, assim como a regata preta apertada demais que destacava os músculos dos braços muito pálidos e a jeans negra surrada.

— É bom saber que agora vão ter mais alguém para os almofadinhas da Seção de Fiscalização de Artefatos Europeus encher o saco sobre a aparência, Weasley. — Ivor comentou em tom de brincadeira, um sorriso de escárnio em seus lábios finos.

— Não sabia que continuava ouvindo Weird Sisters, Montague. — Bill devolveu no mesmo tom, permitindo que o mais velho se aproximasse e o puxasse para um abraço rápido. — Pensei que achava Gideon Crumb um grande babaca.

Ivor Montague era uma figura polêmica em qualquer lugar que estivesse. Vinha de uma orgulhosa e tradicional família puro sangue, filho de Comensais da Morte inocentados após a Primeira Guerra Bruxa e foi o Capitão do time de quadribol da Sonserina, onde jogava como batedor. Tinha tudo para ser um grande babaca, mas conseguiu ser odiado por seus próprios colegas de Casa. Bill estava no seu primeiro ano em Hogwarts quando ouviu falar sobre o sonserino que era amigo de nascidos muggles da Grifinória e da Lufa-Lufa, o infame namorado de Gideon Crumb, que tocava gaita de fole na Weird Sisters.

Mas somente conheceu Ivor de vontade no Egito, onde era Chefe dos Desfazedores de Feitiços até 1992, antes de receber uma promoção e mudar-se novamente para a Inglaterra. Bill ficou bem triste quando isso aconteceu, já que aquele homem havia se tornado um de seus melhores amigos. Nunca entendeu muito bem o motivo dele ter aceitado um trabalho administrativo, e não comprou a história de que tentaria ajudar seu irmão mais novo, Graham Montague.

— Eu tenho certeza que eles irão me incomodar profundamente, motivo pelo qual deixei meus relatórios para última hora. — Henry deu uma risadinha. — Senhores, é aqui que me despeço.

Realmente, talvez tivessem mais motivo para reclamarem da aparência de Ivor do que a de Bill. Para além de suas roupas, o mais velho tinha uma série de tatuagens que ele mesmo fez em seus braços e mãos, um cabelo relativamente comprido castanho-escuro já com alguns sinais grisalhos e, como todo bom Desfazedor de Feitiços, não era conhecido por sua boa-educação e gentileza.

— Devo dizer que estou surpreso. Quando disse a King que precisava de você e Dubois, não esperava que ele realmente conseguisse. Vocês são dois cabeças-duras. — Ivor retomou a conversa como se não tivesse sido interrompido, o servindo um pouco de chá com um gesto da varinha antes de franzir o cenho para a expressão de confusão no rosto do mais novo. — Mas imagino que ele não tenha te falado nada.

— Não, só comentou que precisava de ajuda. — Bill suspirou, não gostando muito do rumo daquela conversa. Não sabia que sua presença havia sido especificamente requisitada e nem que o assunto era tão sério. — Eu só precisava voltar para casa e a proposta foi boa, mas não vejo como posso ser útil em fraudes bancárias.

— É um pouco mais complicado do que isso, na verdade. Deveria imaginar que King não lhe passaria o quadro completo. — Ivor parecia aborrecido agora, o que o deixou um pouco mais nervoso. — Não me leve a mal, ele é um ótimo Chefe, mas não faz a mínima ideia do que estamos fazendo aqui. A única vez que pisou no Oriente, foi em uma convenção de vassouras que o pai o levou.

Precisou conter o riso, porque aquilo realmente parecia a cara de Henry.

— Imagino que irá me colocar a par de tudo. — Bill deu de ombros, acostumado com o jeito de seu superior.

— Não, eu não. Pedi a sua estagiária para preparar um dossiê com as informações mais importantes, ela o colocará a par de tudo. — Ivor respondeu, dando uma risada sarcástica para o olhar atônito do ruivo. — Não me olhe assim. Ela queria muito treinar o inglês e é muito insistente. Além disso, King não é o único que tem compromissos importantes hoje.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado do capítulo, assim como dos personagens originais como Ivor Montague!



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