Romenian Chronicles: The Degeneration escrita por EvieCristy


Capítulo 6
Capítulo 4




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Após aquele dia, as estações foram passando até o ano atual e já perceptível que o outono estava chegando. As folhas das árvores estavam de cores alaranjadas e prontas para cair na cidade de Targoviste e, por isso, crianças saíam de suas casas para poderem brincar com os esgalhos caídos no chão que eram juntados aos montes pelas pessoas que limpavam os arredores de suas casas.

Helena Arnaud, uma bela otomana encapuzada, pôde sorrir com as atitudes brincalhonas das inocentes crianças e desejou que elas fossem poupadas do que acontecia perto das muralhas do castelo mais ao sul da cidade. Após um momento passando pelas ruas, ela chegou ali e pôde ver um carrasco de roupas simples, espetando uma cabeça de um idoso em uma lança para que, quem passasse por ali, pudesse ver.

— Soube que ele foi morto por tentativa de rebelião, mas que grande tolice — comentou uma senhora idosa com um lenço na cabeça para a sua confidente que estava ao seu lado. — eu mesma digo que foi mais do que merecido, pois quem é o tolo que desafia a Ordem?

— Sem dúvidas, devo concordar. É melhor aceitar esse governo do que aceitar a morte — comentou a outra, de mesma idade, enquanto direcionava o olhar para mais um corpo que aquele carrasco estava carregando. — Alexandrina, olhe! 

Ao ouvi-las, ela direcionou o seu olhar para dois carrascos. Um estava carregando a cabeça careca de uma mulher, que pela aparência, tinha trinta anos de idade, enquanto outro estava trazendo o corpo decapitado daquela vítima, que por sua vez, havia sido partida até o seu busto. O sangue escorria enquanto ambos os levavam até duas lanças e terminaram por espetá-los com o fim de deixá-los ali para exibição.

Aquilo chocou Helena, que por sua vez, perguntou-se o motivo da morte daquela senhora e começou a pensar, mas notou um detalhe que respondeu a sua pergunta. Ela viu um pertence religioso que permanecia no pescoço daquela mulher, que era um rosário da donzela, um pingente talhado no formato de um trevo de quatro folhas de material barato, que denunciava sua posição social.

— Tsc, essa daí foi mais uma que foi pega rezando para a donzela proibida, ouviu? — perguntou um homem gordo de cabelos grisalhos e de roupas camponesas enquanto olhava para um companheiro de trabalho. — mas que tola, pelo visto não teve medo da morte.

— Ouvi sim, ela era uma dona de uma loja de bijuterias bem conhecida — respondeu um sujeito de cabelos castanhos escuros até os ombros, de bigode e sem barba, para o camponês. — mas, ela não foi a única infeliz, ainda há pessoas que insistem em continuar rezando escondido com o risco de serem pegos.

“Donzela sagrada, deusa, ambas são a mesma pessoa em nossa fé de muitos séculos, mas com a Ordem no poder, emitiram uma lei pouco depois de serem coroados: qualquer pessoa, de prestígio ou não, que for pego fazendo adorações proibidas, será morto decapitado e seu corpo, exposto.”

Após tais pensamentos, Helena se pôs a suspirar fechando seus olhos, mas ao abri-los, desejou não o ter feito, porque um dos dois carrascos ali acabou por encará-la com olhares ferozes e mortais como se quisesse matá-la ali mesmo. Ao notar aquilo, a otomana percebeu que foi devido à sua cor de pele exposta de suas mãos e pelo seu rosto descoberto.

Então, enquanto seu companheiro se retirava, aquele ser olhou seriamente para um lacaio que passava ali perto e pediu-lhe uma tocha e ele rapidamente cumpriu aquela ordem. No fim, o carrasco ateou fogo no corpo e na cabeça daquela mulher e sorriu de forma psicótica e de braços como se tivesse prazer em assistir aquilo enquanto ouvia os choros das mulheres que passavam por ali e chocavam-se ao verem a cena.

— Helena Arnaud…não adianta esconder-se entre as pessoas com essas vestes, sei que és tu! — exclamou o carrasco ao olhar para a otomana e rangeu seus dentes de puro ódio. — tens sorte, se não fosse pela Ordem, tu serias a próxima a ser executada pelas minhas mãos!

Após ouvir aquelas palavras, Helena sentiu o cuspe daquele ser e terminou por limpar a sua bochecha enquanto recebia olhares ferozes de outras pessoas ali presentes. Por sua vez, o carrasco retirou-se para seu posto, porém sua sede pela morte daquela estrangeira dificilmente iria passar se não a saciasse em algum momento.

Mas, ela, por sua vez, não podia fazer nada, então partiu dali e caminhou pelas ruas da cidade até chegar em uma praça pequena. Ali, seu coração apertou-se, pois acabou por observar alguns escravos à venda e viu que, pela cor da pele e traços faciais, se tratavam de otomanos vindos do território norte perto do mar mediterrâneo.

“Anos se passam, mas ainda dói…”

Helena terminou por colocar a mão em seu peito, pois para ela, olhar para eles, para suas vestes esfarrapadas e para seus olhares vazios e tristes e dolorosos lhe causava muita dor, ao ponto de sentir seu coração se apertar. Enquanto os olhava, ela sentiu os olhos ficando marejados, mas resistiu em chorar e, ao mesmo tempo, viu-se alí, como se os fantasmas do passado chegando para assombrá-la naquele momento.

— Com eles no poder, o tráfico de escravos está cada vez mais forte — pensou ela, mas alto, controlando sua respiração para não desabar em lágrimas enquanto via-se mais jovem e sendo vendida para um nobre.

Ao retornar a si mesma, ela acabou percebendo os olhares ferozes e hostis que mercador daqueles escravos lhe dava, como se ele quisesse amarra-la e espancá-la até a morte, até porque, lembrava-se dela, por se tratar da pessoa que havia vendido-a há muito tempo atrás e recebeu reclamações fortes do dono que a comprou porque ela havia fugido da sua propriedade em uma noite enquanto ele dormia.

Então, Helena terminou se retirando dali e caminhou até uma área conhecida por ela mesma, que por sua vez era mais afastada do centro que possuía casas mais simples e poucos pontos comerciais. Ao chegar lá, tomando cuidado com as poucas carroças que passavam, ela podia observar alguns soldados fazendo a guarda de uma casa, que a julgar era um ponto de coleta de impostos, viu uma senhora, de aparência humilde e pobre, andando por ali.

— Senhora Evangeline… — murmurou ela em voz baixa. Então, decidida, resolveu seguir aquela idosa a qual se recordou que estava procurando.

Seguindo aquela senhora, a otomana chegou em um conjunto de casas que eram bastante simples. Do lado de fora das habitações, ela podia ver que havia crianças brincando enquanto algumas pessoas olhavam para dentro de uma casa e acabou por observar um homem magro e idoso, de roupas simples e desgastadas e com um buraco no peito de sua camisa, que consertava um sapato usado.

Enquanto o olhava, Helena percebeu um barulho de madeira rangendo e olhou para cima. Alí, ela viu a placa escrito Pantofi Concerta, o que a fez relembrar dos momentos que passara ali há muito tempo e sorriu de leve por estar no lugar certo que estava procurando. Então, a moça seguiu até uma entrada nos fundos e respirou fundo, mas por um instante hesitou chamar aquela senhora, a moradora daquela casa.

— Senhora Evangeline? — perguntou Helena após finalmente tomar coragem, então esperou por uma resposta enquanto olhava para dentro da casa aparentemente vazia. — está em casa?

— Mas quem é… — respondeu uma voz idosa feminina, até que a senhora se manifestou presencialmente na frente da otomana ao vir atender a porta, então arqueou a sobrancelha e reconheceu a aparência estrangeira e vestes nobres da moça. — espere…Helena?

— Sim, sou eu, eu tive que ver a senhora, eu fiquei tão preocupada quando eu soube de outro aumento dos impostos — respondeu ela, que sorriu levemente e aliviada em ver a sua amiga em sua frente enquanto a porta debaixo servia como uma barreira. — eu não me aguentei, tive que vir aqui para vê-la.

— Oh minha querida…as coisas não estão bem desde que a Ordem tomou o poder. Com essa situação eu tive que vender alguns dos meus móveis para pagar o tributo e estão ameaçando até pegarem meus netos!  — exclamou a velha senhora, que não pôde conter suas lágrimas e sentiu seu rosto molhar enquanto a nobre a envolvia em seus braços. — Não há esperanças…

— Eu entendo…mas não se preocupe, essa situação vai passar — falou Helena, mas deu uma pausa pois sentiu como se suas palavras fossem secas e pensou até em oferecer ajuda, porém sabia que a sua amiga iria recusar de alguma forma — e…eu espero que fique bem…

— Helena, a situação apenas tende a piorar. O dinheiro que recebemos mal dá para comprar o que necessitamos e nem podemos rezar para a deusa, pois se formos pegos, a Ordem irá nos condenar à morte — comentou a senhora enquanto balançou a cabeça levemente para os lados. — Mas acho que de qualquer forma…será esse o nosso destino.

Ouvir aquelas palavras fez o coração de Helena se apertar e o peito dela doer, pois como se já não bastasse ter testemunhado a venda de escravos, havia a situação de sua velha amiga que era quase precária, mas ela percebeu que haviam muitas pessoas daquela área da cidade que sofriam quase da mesma situação, pois aquelas pessoas viviam em condições abaixo dos mais abastados e os que vivem bem em meio àquela crise, que ela sabia que era por causa da Ordem.

— Não há esperança, minha cara, apenas aceite isso, que nós morreremos e nossos filhos e netos serão escravos por dívidas — comentou Evangeline, que enxugou suas lágrimas e abraçou a sua confidente pela última vez enquanto Helena tentava conter-se para não chorar. — mas Helena, sabe que é arriscado vir aqui.

— É que… — a otomana tentou protestar, mas calou-se ao ver a mão levantada daquela idosa pedindo para que não falasse mais nada naquele momento.

— Se os soldados descobrirem que a senhorita me visitou, nós duas seremos prejudicadas e eu não quero que isso aconteça — salientou a idosa enquanto colocava as mãos nos ombros da moça e olhava-a de forma séria. — você quer mesmo que isso ocorra?

— Não, mas…senhora, entenda, eu apenas quis aju… — Enquanto falava, Helena viu a mão levantada da idosa interrompendo-a novamente e então, calou-se.

— Helena, eu fico feliz com sua visita, mas fico mais feliz que esteja bem, pois a senhora tem um marido que está cuidando bem de ti e sua situação é melhor que a minha e isso para mim já basta diante do que sofreu — comentou Evangeline, que abraçou a sua amiga e foi retribuída enquanto suas lágrimas molhavam seu rosto novamente. — por favor peço que não arruine isso me visitando.

Então, Helena decidiu não protestar mais, apenas retirou-se daquele lar e tomou cuidado para que não fosse vista pelos soldados por ali. Após caminhar um pouco, ela parou e soltou um suspiro ao esconder-se atrás de um pilar, e, ali, ela abaixou a cabeça e permitiu que pensamentos lhe viessem à cabeça a respeito de sua situação, e, então, pensou sobre a recusa que iria oferecer caso oferecesse ajuda para ela.

“Eu quero tanto ajudá-la…mas se eu oferecer ajuda, ela vai recusar, porque incomoda-lhe receber ajuda de um nobre, por ter que sentir que deve pagar quando puder…”

Contudo, sua mente viajou até o momento que Evangeline falou do marido dela e, por isso, soltou um suspiro. O fato era que Alexandru Arnaud havia lutado com unhas e dentes durante aqueles dois anos para que sua esposa não fosse vendida como escrava por ser otomana isso durou até maio daquele mesmo ano, que foi quando a Ordem aceitou a solicitação dele e com o mandato de que ninguém ousasse tocar nela com apenas uma condição: um imposto mais pesado para pagar.

“Farei de tudo para que não tenha que sofrer novamente, já me basta ter que assistir o povo oprimido se derramando em lágrimas que a Ordem se orgulha e ri banhando-se em deleito por esse sofrimento.”

“Pior seria, Helena, para mim, ter que vê-la sendo vendida como uma escrava, não por dívida mas apenas pelo ódio deles por seu povo.”

“Se eu testemunhasse sua escravidão, minha querida, seria como mil facas de dois gumes atravessando o meu corpo, causando-me tão imensa dor que me faria perder o sentido da minha vida.”

“Eu prefiro morrer para tê-la a salvo, o imposto pode ser pesado para mim, mas leve para o meu próprio coração.”

Helena sentiu suas lágrimas banhando a sua face enquanto repassava aquelas frases que foram ditas a ela, em sua mente, enquanto levava as suas mãos ao peito sentindo uma pontada de dor em seu coração, tanto pelo ato de seu marido, quanto pela escravidão de seu povo em Valáquia pelo ódio que a Ordem nutria a qual ela sabia que era por causas políticas, mas também pelo orgulho, a superioridade e o ódio pela cor da pele e poder do império otomano.

“Tantas invasões desnecessárias…apenas para prejudicar o império otomano e capturar inocentes para serem escravos…”

Dissipando esses pensamentos, Helena olhou para o lado e acabou testemunhando uma criança sendo retirada à força dos braços da mãe. Ela sabia que aquilo estava ocorrendo devido à falta de pagamento dos impostos pela mãe e isso lhe cortava o coração pois por mais que aquela mulher pobre lutasse para salvar seu filho, o viu sendo levado por outro soldado enquanto o outro chutou-lhe a barriga para deixá-la incapaz e se derramando em lágrimas.

Após testemunhar aquilo, Helena fechou os olhos, apertou-os como se tentasse acordar de um pesadelo que queria que estivesse tendo, porém terminou por abriu-los e lamentou-se por essa ser realidade. Então, ela olhou para a frente e assistiu uma jovem mulher em meio aos seus gritos e choros sendo arrastada para fora de casa por soldados que a prendiam e mandavam-na ficar calada, mas o mais notável, era o rosário da donzela que estava em seu pescoço.

“Mais uma dentre outros que possuem coragem para rezarem escondidos em suas casas para a deusa…”

Após ver aquele incidente, ela terminou por se retirar daquele local e foi caminhando em direção a uma estalagem que gostava de frequentar, que também era uma taverna, onde decidiu pernoitar e ir para a sua propriedade no dia seguinte, pois já estava ficando tarde para que o fizesse e sabia que morava a um dia de viagem da cidade.

Ao chegar ali, enfim, a moça observou os frequentadores do local, constituídos por homens trabalhadores que tinham uma condição melhor, além de meretrizes, bonitas, de boa aparência e de vestidos vulgares mostrando os pés enquanto um pouco de seus corpetes, seus cotovelos e braços estavam à mostra com o intuito de atrair freguesia.

Helena respirou fundo, então caminhou até o balcão para falar com a atendente e pediu por um quarto após pagar com vinte moedas de ouro. Após isso, ela virou-se e olhou para o lado da janela da taverna, onde viu um jovem de aparentes vinte anos com vestes creme e calças pretas de um viajante e botas marrons que parecia esconder algo debaixo da mesa.

Ela andou um pouco, mas discreta, para ver melhor a aparência daquele rapaz, que estava parcialmente coberta por um capuz e capa preta com detalhes em pele de coelho, mas ela pôde ver que seus cabelos eram longos até os ombros e seus cabelos eram castanhos acobreados e de olhos azuis com uma cicatriz no olho esquerdo.

“Eu conheço bem esse rapaz…Trevor! Mas o que ele faz aqui? Como ele sobreviveu ao Massacre dos Belmonts? Eu não acredito…ele está vivo…faz tanto tempo que eu não o vi…dois anos…”

Helena hesitou em andar para observar mais o jovem, que estava sentado à mesa e com a caneca pela metade. Contudo, não se aproximou mais por temer pela vida dele caso o descobrissem, então, seguiu em frente com relutância até o quarto que iria dormir naquela noite e começou a pensar no que poderia ter acontecido para aquele rapaz ainda estar vivo.

“Oh minha deusa…eu rezo…por favor…se ainda puder…me ouça, proteja Trevor, o que resta dos Belmonts…e…me junto às pessoas que ainda rezam, para que ainda haja esperança…”

Após isso, ela terminou de vestir-se para dormir e deitou-se em sua cama. Enquanto fechou os olhos, sentiu seus olhos marejarem e em seguida, as lágrimas molhando sua face enquanto abraçava o travesseiro enquanto esvaziava o que estava segurando desde o momento que chegou à cidade, mas sorriu de leve por sua descoberta ao reconhecer o jovem, seu sobrinho fraterno.

“Por favor…que haja esperança…”


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