Um segredo obscuro - Dramione escrita por Aline Lupin


Capítulo 8
Capítulo 9




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/810406/chapter/8

A sensação de coceira na perna, envolvida até o joelho por um gesso, era insuportável. O médico havia pedido que ela evitasse qualquer movimento brusco, até que o osso fosse colocado no lugar. Havia quebrado a perna e não sabia como. Seu rosto estava péssimo, escoriado de hematomas. Estava uma visão horrorosa. Olhou para o espelho de bolso. Por sorte, uma alma boa deixara sua bolsa consigo. Somente não tinha suas roupas ali. E não tinha amigos na cidade, para ajudá-la.  Ficaria no hospital, até que tivesse alta. Então, teria de passar um tempo com a TV, do seu quarto particular, pois não tinha qualquer livro a disposição.

Na TV passava um filme que vira inúmeras vezes. O quarto 1408. Um bom filme de terror psicológico. Baseado em um livro de Stephen King, o mestre do terror. Um tanto subestimado para ela, mas aquele filme tinha algo de perturbador. Conseguia passar uma sensação de falta de controle, colocando o telespectador em uma posição indefesa e ansiosa. A cada lance de cena, alguns clichês, nos momentos em que o quarto parecia adquirir vida e tentar matá-lo ou quando os fantasmas dos antigos hospedes apareciam para assustá-lo ou assassiná-lo, também era um grande clichê. Apesar disso, a cena em que a filha do protagonista aparecia era algo que fazia Hermione se sentir mal. Incomodada. Simplesmente era algo terrível perder alguém. Lembrou-se de Fred. Perdê-lo fora algo que realmente a despertou para a dor da perda. A dor de perder alguém era dilacerante. Lágrimas escorriam de seus olhos, quando terminara o filme.

Depois disso, estava um tanto entediada. E ao mesmo tempo, profundamente melancólica. Observou a janela aberta, com a visão da montanha, encoberta por nuvens. O cenário era sombrio do lado de fora. Não havia mais o sol escaldante, apenas um dia cinzento. Pegou o celular da mesinha de cabeceira, para distrair a mente. Precisava ligar para um guincho. Alguém precisava retirar seu carro da mata. Antes, precisava ligar para a polícia. Ninguém viera falar com ela, depois do acidente. O que era estranho. Iria relatar um boletim de ocorrência. Ligou para o escritório de Thomas, para falar com ele.

— DP Mountain Black – ela escutou a voz de uma mulher.

— Olá, bom dia – Hermione testou a voz, que saiu rouca – O xerife Hardy está?

— Está – a mulher respondeu, com um tom de voz monótono – Quem gostaria?

— Hermione Granger.

— Um instante.

O telefone parecia ter sido deixado de lado. Hermione escutou algumas vozes desconexas. Então, alguém havia pegado o telefone. Era possível escutar a respiração densa da pessoa, denotando irritação.

— Olá senhorita Granger – a voz do xerife era carregada de irritação e cansaço – Em que posso ajudá-la? Soube do seu acidente e seu carro já foi removido, se foi por isso que ligou.

—  É exatamente isso, xerife – ela respondeu, de forma seca – Eu gostaria de gerar uma queixa. Alguém sabotou os freios do meu carro.

— Ah, sim? Com base em que? – ele indagou, de forma desdenhosa – Veja, senhorita, eu não tenho tempo para esse tipo de acusação. Principalmente, quando o condutor está alcoolizado.

— Eu não estava alcoolizada! – Protestou ela, indignada – Estava sóbria. Muito sóbria.

— Claro que estava. Bom, é de conhecimento que a senhorita tem problema com álcool, segundo testemunhas que a viram a noite, andando descalça e de camisola na rua, algumas noites atrás. E fizeram exames taxológicos. Foi constatado uso de álcool – Hermione nesse momento respirava lívida.

— Como se atrevem a fazer exames em mim, seu meu consentimento? Meu advogado vai saber disso!

— Escute, senhorita, não tolero que me tratem com desrespeito. Vou esquecer seu desacato e pedir que ligue em outro momento, quando estiver mais calma. Preciso desligar.

Então, o telefone foi desligado, sem chance de protesto. Hermione fulminou a tela rachada, em formato de teia. Resmungou consigo mesma. O que estava acontecendo? Todos estavam de complô contra ela? Ela passou a mão pelo rosto. Estava cansada de se sentir acusada de tantas coisas. Principalmente, estava cansada de sentir que estava enlouquecendo. Contudo, não poderia ficar ali, sem fazer nada. E precisa de suas roupas. Tentou ligar para a pensão da senhora Thompson, pedindo que ela trouxesse suas roupas, claro, de modo gentil. A senhora, no entanto, alegava estar muito ocupada.

— Sinto muito querida, mas tenho compras a fazer hoje a tarde. Quem sabe amanhã?

Hermione desligou, frustrada. A quem mais poderia recorrer? Uma ideia se formou em sua mente. A imagem de uma pessoa em específico. Mas, seria loucura pedir ajuda a ele. Malfoy não era seu amigo. Não poderia pedir algo assim. Foi quando pensou em George. Talvez, ele estivesse na cidade. Contudo, com tudo que acontecera entre eles, seria errado pedir ajuda. Isso daria ideias a ele, as quais ela não queria alimentar. Depois do que aconteceu na festa de aniversário de Fred, a qual ele passara com ela em Londres, tudo se tornara esquisito entra ela e George. E foi nessa festa que ele tentara beijá-la a força. Sentiu o estomago retorcer. Não gostava de pensar nisso. Teria que ser outra pessoa a ajudá-la, mas quem? Gina não poderia ser. Ela a odiava. Molly, talvez. Mas, isso seria complicado. Não queria abusar da boa vontade daquela senhora.

Sem saber o que fazer, ela passou o dia entre irritação e incerteza. Comeu a comida intragável do hospital e passou os canais de TV, sem encontrar nada interessante para distraí-la. Logo adormeceu, um tanto agitada.

 

**

 

Olhar, era a única coisa que poderia fazer. Ela se movia tranquila, rindo de algo, enquanto segurava a bebida. Eu não a escutava. Não queria escutar ninguém.

— Fred, está me ouvindo?

Eu a fitei, um tanto sem graça. Hermione era uma amiga boa, mas eu não era bom para ninguém.

— O que? Você falou sobre algo...do livro...er...- eu tentei, realmente tentei adivinhar.

— Você não escutou nenhuma palavra – provocou ela, sentando-se ao meu lado, no sofá. Evitei olhá-la. Evitei meu eu interior. Apenas foquei meus olhos na visão incrível do seu loft. Uma parede de vidro ia de ponta a ponta da sala, mostrando London Eye. Eu nunca imaginei que estaria ali, algum dia. Se fosse para estar em algum lugar diferente, no entanto, gostaria de estar com meu dinheiro. Mas, eu não tinha nada. Não tinha uma carreira. E o que me aliviava não era algo que eu deveria me orgulhar.

— Eu estou apenas pensativo. Quero ir para casa, Hermione.

A expressão dela murchou. Ela segurou minha mão, enquanto, com a outra, deixava a taça de vinho sobre a mesinha de centro, com superfície de vidro.

— Você não precisa ir. Pode ficar aqui. Eu tenho contatos. Posso conseguir um emprego para você.

A frase “posso conseguir um emprego para você” saia constantemente da boca dela. O que me irritava muito. Eu disfarçava isso. Mas, não pude fazê-lo, naquele instante. Levantei-me, intempestivamente. Ela notou minha raiva. O rosto dela empalideceu. Mordi os lábios, me sentindo estupido. Um imbecil.

— Sinto muito, Hermione. Eu não posso aceitar – tentei contornar a situação.

Ela se levantou, vindo até mim, me abraçando pela cintura. Eu toquei seus cabelos cacheados. Beijei sua testa. Ela era muito bonita. Tinha a pele em tom de oliva, os olhos grandes e amendoados. Qualquer homem faria tudo por ela. Qualquer um se apaixonaria por ela. No entanto...

— Eu sinto muito – disse, me afastando dela – Preciso ir. Obrigado por me ajudar.

Ela mordiscou os lábios. Os olhos ameaçando enxerem de lágrimas, lágrimas que eu havia causado. Procurei não a olhar.

— Tudo bem. Eu te levo até o aeroporto. Já comprou suas passagens?

— Já – respondi. Com o dinheiro que ela havia me emprestado, claro. Um dia eu a pagaria. O emprego no Lower’s estava no começo. Eu estava juntando, para devolver. Precisava fazer isso. Já era canalha suficiente por aceitar mais dinheiro dela.

Seguimos até o aeroporto em silêncio. Me despedi dela, um tanto afoito de me ver livre dos seus olhos exasperados. Não havia nada que pudesse ser feito por mim. Nada. Segui para o embarque e quando entrei no avião, apenas tomei meu remédio para dormir no voo. Quando cheguei em Mountain Black, não fui recebido por ninguém. Ninguém queria saber como eu estava. Na verdade, minha família me evitava. Mamãe, claro, sempre estava me ligando. Mas, era tarde para ela vir. Contudo, recebi uma mensagem de George. Aquilo enregelou minha espinha.

“Eu sei que você sabe, Fred. Espero que tudo isso fique entre nós. Afinal, somos família”

Engoli a seco. Passei a mão pelo rosto. Ele iria continuar com isso? Eu era mais fodido que todo mundo, mas parecia que George era mais. Fodido em todos os sentidos. Segui para fora da rodoviária e liguei para Roy. Só caia na caixa postal. Eu teria que tomar um táxi. Ninguém me buscaria em Portland, Oregon. Era o aeroporto mais próximo de Mountain Black. Eu esperava apenas voltar para minha vida e esquecer tudo que George fez. Apenas esperava esquecer tudo.

**

Hermione despertou, sentindo o olhar de alguém sobre si. Abriu os olhos, observando o quarto levemente claro. A pouca luz que se infiltrava pela janela, fazia sombras perto da TV. O céu estava clareando, um tanto tímido. Ela observou todo o quarto e ficou congelada. Ali, sentado na poltrona de visita, viu Fred. Ele parecia olhar triste, para frente. Não estava a observando?

— Fred? – ela chamou.

Ele a fitou, dessa vez. Seu olhar demonstrava toda a angústia que carregava. Tinha uma aparência translucida. A garganta continuava com o corte, dessa vez, parecia estar cicatrizando, pois não havia qualquer sinal de sangue.

— Fred, eu sinto muito – ela disse – Eu sinto tanto.

Lágrimas borraram sua visão. “Eu sei”, pensou ter escutado. Fechou os olhos em agonia. “Vá embora”. Dessa vez, a voz dele era nítida. Parecia uma ameaça. Ela abriu os olhos, para não o ver mais ali sentado na cadeira. Devia estar delirando. Mas, na janela, pode ver as mesmas palavras ditas. “Vá embora”. Estava em caixa alta. Era como se alguém tivesse escrito em vidro embaçado, como quando está muito frio e o vidro embaça, devido a sublimação da água. Ela não poderia estar delirando. Ele estivera ali, de alguma forma. Porém, seu aviso deixava claro, que deveria partir.

 

**

 

— Você tem certeza disso? – Malfoy a fitou descrente.

Hesitou muito em ligar para ele. Mas, precisava da sua ajuda. Ele dissera que iria ajudá-la. Se recordava disso. Se havia alguém com poder naquela cidade, seria sua família. Então, precisava provar que houve sabotagem em seu carro.

— Sim, absoluta. Tentei usar os freios, mas não consegui. Você tinha razão, prefeito. Alguém me quer morta.

Ele passou a mão pelo rosto, pensativo. Parecia relutar em acreditar nela. Ela tinha dificuldade já em acreditar naquela situação. Principalmente, no que vira na janela e a visão que teve de Fred.

— Bom...eu vou pedir uma investigação detalhada do seu carro. Não podemos ter certeza de nada, Granger. Sua acusação é muito séria.

— Eu estou dizendo a verdade – ela insistiu, irritada. Não estava ficando louca. Tinha a nítida certeza de tudo que estava acontecendo. E não estava enlouquecendo – Você me disse que iria me ajudar. Ser meu amigo – ela o lembrou – Então, por favor, me ajude.

Ele suspirou, passando a mão pelo rosto, nitidamente cansado.

— Granger...eu não sei. Você parece um tanto instável – ele disse, com certeza delicadeza, mas ela sabia o que estava subtendido. Que ela tinha algum problema psicológico.

— Eu não estou...- ela baixou a voz – Instável. Eu estou bem.

Ele a fitou, descrente.

— Posso ajudá-la, mas desde que fique longe de bebidas – Ela o fitou com olhar mortal – Eu sei que você adora beber. Não minta. Já a vi no bar do Lower’s vezes suficientes.

— Você é um maldito stalker! – ela o acusou. Malfoy deu de ombros – E o que o fato de eu beber invalida meu pedido?

— Você quer ser levada a sério, precisa agir dessa forma. E já vi o quanto o uso de álcool pode destruir uma pessoa – Então, seu olhar se tornou sombrio, o que a fez querer perguntar quem seria essa pessoa na vida dele. Quem era a pessoa que havia sido destruída, mas se conteve. Não se conheciam exatamente. E ele estava sendo muito gentil em atender seu pedido – Enfim, eu pedirei que inicie a investigação. Mas, quando estiver melhor, você deveria partir. Ficar em outra cidade vizinha, até que tudo se resolva.

Ela mordeu os lábios. Talvez, fosse o melhor a se fazer.

— Tudo bem – suspirou.

Então, ele sorriu. Seu sorriso era apenas um curvar dos lábios, mas era óbvio que parecia feliz. O que a deixou confusa.

— Hum...- ela pigarreou, se sentindo constrangida – Eu quero te pagar por sua ajuda. Sabe, por fazer isso por mim. Posso pagar o investigador...

— Não é necessário – ele negou com a cabeça, voltando ao seu olhar sério.

— Mas, sou eu que estou pedindo sua influência para esse caso. É justo que eu pague. Ou lhe faça um favor.

Sabia como funcionava aquilo. Se precisava de um favor de alguém influente, precisava dar algo em troca.

— Sugiro então que saia para jantar comigo – ele disse, em tom provocador.

— O que? Não! – ela protestou, sentindo-se quente por dentro.

— Então, não posso ajudá-la.

Ele parecia estar zombando dela, pela forma como seus dentes estavam a mostra. O sorriso era de orelha a orelha.

— Você disse que iria me ajudar. Por que está se recusando agora?

— Você me lembrou que sou um tanto egoísta. Obrigado por isso.

Ela o fitou, com o desejo de voar em seu pescoço. Ele não parecia ter notado seu olhar assassino, pois a fitava, de braços cruzados, esperando dobrá-la.

— Por que fui abrir minha maldita boca? – soltou um muxoxo, que o fez rir – Está bem. Um jantar. Nada mais que isso. E agora, como vê – ela apontou para a perna engessada – Não posso sair daqui.

— Quando tiver alta, eu venha buscá-la – ele decidiu, sem seu consentimento, se afastando para a porta.

— Como vai saber que estou de alta? – indagou ela.

— Posso pedir ao médico que me avise. Isso é muito fácil. Até mais, Granger.

Ele saiu do quarto, deixando-a pasma. Como ele era estranho. Nada sutil. Riu consigo mesma. Ao menos, era só um jantar, pela ajuda que iria receber.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Um segredo obscuro - Dramione" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.