Fúria escrita por alegrrdrgs


Capítulo 22
Capítulo 21 - Penélope (2022)




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Before I learned civility

I used to scream ferociously

 

Penélope avisou Franco que eles precisavam dar um fim em Iago e não deixar que nada daquilo caísse sobre Marcos antes de qualquer coisa. Se antes Iago tinha lhe questionado sobre estar ali morando com aquela família, então depois daquilo ele teve certeza que sua presença na família de Marcos não era apenas uma caridade, um estender de mãos entre amigos. 

Mas Franco era Franco, o que significava que ele não se importava realmente com aquilo.  Ele tinha passado a vida inteira à sombra do irmão, sendo o caçula irresponsável e imprudente, que não se importava realmente com o que acontecia ao seu redor. Não se importava nem mesmo em ver Penélope com outros quando estavam juntos, achando tudo divertido e indolor."C'est la vie", ele costumava dizer sobre o que quer que acontecesse com a mesma postura cafajeste que sempre tinha tido, e Penélope sabia que a nova postura determinada dele não duraria muito, por mais que ele clamasse que faria de tudo pela filha que tinha perdido. Ela não se importava, porque não precisava que durasse muito, queria apenas que durasse o suficiente. 

— Quando nós nos casarmos, vamos ter vários filhos. Tantos que Mia não vai fazer falta - disse, acariciando a barriga de Penélope. - Todos tão bonitos quanto nós dois. Ela era bonita? 

Penélope respirou fundo, escondendo a raiva. Sua voz estava plana quando ela respondeu: 

— Sim. Olhos azuis, cabelos pretos. 

— Como nós dois - riu, se levantando - Bem, os próximos também serão. Não tem como variar muito, não é? 

Ela se levantou, caminhando até a varanda. O sol estava forte, e mesmo assim ela sentia frio. Estavam em um hotel, após uma noite intensa tentando resolver tudo, e Penélope não conseguia tirar Marcos da cabeça. Se perguntava e Giovanna estava bem, também, se estava no hospital com ele. Tinha mandado Caim obter notícias, mas ele ainda não tinha voltado.

O corpo de Iago não seria encontrado, os carros que tinham usado já tinha desaparecido, as roupas tinham sido incineradas, não existia nada que pudesse ligar nenhum deles ao incidente, que era como Franco estava se referindo a morte de Iago. Ainda assim, a mente de Penélope ficava voltando sempre ao mesmo tópico. E se alguém falasse alguma coisa? E se a culpa recaísse em Marcos de novo? E se ele e Giovanna nunca mais lhe perdoassem? 

Penélope tinha contratado um advogado muito bom para que ficasse de sobreaviso, só por vier das dúvidas, e Franco pagou uma quantidade exorbitante de dinheiro para os policiais que estavam cuidando do caso. Mesmo quando as pessoas percebessem que Iago tinha sumido, não era possível confirmar sua morte sem um corpo e sem a arma do crime. Só para ter certeza, ela tinha feito denúncias anônimas aos principais jornais da cidade com a breve história de crime do filho do pastor, indicando a sua casa, seu histórico adolescente e os crimes que ela conhecia. Logo todo o drama explodiria nas mídias, e ninguém se importaria em investigar um assalto violento com um escândalo muito mais interessante em mãos.

Ela não sentia muito pela morte dele. Não pensava na sua família, e não acreditava que alguém fosse chorar a sua morte. Mesmo que houvesse alguém, ela tinha feito o que fez para salvar Marcos, e faria de novo quantas vezes fosse preciso. Ela faria qualquer coisa para o bem de Marcos.

— Foi nunca foi muito paternal - disse para Franco. - Por que ficou tão comovido em saber que teve uma filha? 

Ele sorriu, dando de ombros antes de atravessar o apartamento e se servir com uma taça de vinho. 

— Meu pai morreu, toda a situação com Louis, e eu também já não sou um adolescente... Por que não? Deve ser bom ter filhos. E também, Louis não tinha o direito de fazer o que fez. Não com uma filha minha. 

— Se fosse a filha de outro, então tudo bem? - provocou, com um sorriso que sabia que ele gostava.

— Bem, eu não posso me importar com o mundo inteiro, mon coeur. Mas vamos combinar de nos importar um com outro, d'accord?

Penélope observou o homem bonito caminhar até ela, lhe entregando uma taça. Eles dois estavam exaustos da noite em claro, mas mesmo assim ele mantinha a postura intacta. Nada além da sua beleza tinha atraído Penélope, e ela sabia que a recíproca era verdadeira. Talvez a única coisa que tivessem em comum fosse o prazer em saber que estavam fazendo Louis de idiota. Até agora, que tinham algo bem maior em comum.

— D'accord.

*

Eles foram embora do Brasil no final do dia. Penélope estava com pressa para acabar logo com tudo aquilo, e Franco não queria prolongar sua estadia no país.

Marcos ficaria bem, ou pelo menos foi o que Penélope tentou convencer a si mesma para acreditar. Caim tinha lhe dito que a mulher e a filha estavam o acompanhando, e mesmo que não pudesse evitar sentir ciúmes, uma vontade louca de estar lá ela mesma, Penélope ficava feliz que ele não estivesse sozinho. 

Ela devia focar no que estava à sua frente, e o que estava na sua frente era o lugar para onde ela nunca pensou que fosse voltar. 

A ilha de Louis se chamava Ourania, em homenagem ao céu estrelado. Tinha sido um presente do seu avô para a esposa para celebrar o casamento dos dois. Na época eles pouco visitavam a ilha, sempre tão focados nos seus negócios na França, e a primeira vez que Louis tinha ido até Ourania tinha sido com Penélope, para punir a esposa. Talvez ela tivesse gostado da ilha em outras circunstâncias: os cumes com ventos uivantes, as laranjas doces, a casa ensolarada e espaçosa. Mas a sua estadia ali não tinha sido nada além de torturante. 

Penélope reiterou para si mesma, não pela primeira vez, para não pensar em Marcos. Ela queria apenas acabar de uma vez por todas com aquilo.

Era impossível chegar de outra maneira que não fosse de barco, e o mar era muito revolto naquela região. A ilha era dividida em dois pontos: as pequenas casas espalhadas pelo litoral, de famílias que moraram ali por gerações, e o casarão da família, onde moravam as pessoas que trabalhavam ali. Como regra geral, apenas residentes conseguiam navegar por aqueles mares, mas Franco tinha conseguido alguém de fora para levar a eles e aos homens que tinha contratado. Penélope se sentia como em um filme de ação, cercada de homens armados em um barco caro. Ela teria ficado assustada se eles não estivessem ali a mando dela. 

Franco abraçou sua cintura, beijando seu pescoço. Eles estavam na amurada do barco, com o contorno da ilha crescendo na sua frente conforme se aproximavam do cais em frente à mansão.

— Você lembra de todos? - perguntou. Era a quarta vez que ele lhe perguntava isso. 

— Sim - confirmou. - Eu não poderia esquecer. 

Ela não tinha medo que Louis estivesse lá. Ele nunca tinha frequentado Ourania, e devia estar ocupado demais tentando manter seu império de pé apesar das brigas com o irmão e a cisão interna.

Penélope sentiu os arrepios, do vento e das lembranças do passado, assim que o barco atracou. Fazia mesmo apenas alguns meses? Se tinha ficado na casa de Marcos tão pouco tempo assim, então porque parecia como uma vida inteira?

Uma vida que tinha sido muito diferente da que vivia naquele momento, pensou ao observar os homens se organizarem para descer. As armas evidentes, a concentração em seus rostos ao se prepararem para o trabalho. Marcos não se daria bem ali. Não com a sua tranquilidade, o seu jeito pacífico e sempre tão preocupado. 

"Chega", disse a si mesma. "Marcos não pertence aqui, nem mesmo em pensamento."

Antes de desembarcarem, Franco organizou os homens em dois grupo: um menor para seguir com ele e com Penélope até a mansão, e um maior para ir até a vila dos residentes da ilha. Não eram muitas famílias, então Penélope sabia que não seria difícil encontrar os homens que tinham ido até o seu quarto com Louis. Ela tinha dado uma descrição exata deles para os homens para que os encontrassem.

— Por Mia, certo? Pela nossa família. 

Ela assentiu e aceitou o braço de Franco, se apoiando nele durante a longa caminhada até a mansão. Na primeira vez que tinha estado ali, Penélope estava com medo. Temerosa, apavorada, em pânico. Agora, voltando com o seu próprio pequeno exército, ela se sentia segura, forte. Uma vingadora que faria todos pagarem pelo que tinham lhe feito. E assim que terminasse ali, faria com que Louis pagasse também. Acima de tudo ela se sentia furiosa, e finalmente pronta para despejar sua fúria exatamente sobre aqueles que a tinham causado.

A ilha estava silenciosa, um silêncio que ela tinha percebido ser comum naquele lugar. Pelo horário, provavelmente já tinham almoçado e estavam cochilando preguiçosamente enquanto esperavam a hora de preparar o jantar. Penélope pensou que a tranquilidade logo acabaria assim que chegaram ao portão e os homens atiraram para cima, um anúncio do que viria. Eles se moviam rápido, e logo a casa estava com um cada possível saída. Eram profissionais, afinal.

Cinco empregadas trabalhavam na mansão. A governanta era uma mulher mais velha que ela, já na meia-idade. Ela e as outras empregadas estavam encolhidas debaixo da mesa da cozinha, tentando se esconder dos tiros que tinham ouvido. Penélope imaginava o quanto elas estavam confusas com aquilo, e sentiu algum prazer quando viu Agatha arfar ao lhe ver parada na soleira da porta, os olhos arregalados quando entendeu. Os cinco pares de olhos ficaram em pânico e as mais novas correram, mas não chegaram longe. 

Os homens de franco tinham cercado o cômodo, e elas gritaram ao serem agarradas e trancadas na despensa. Agatha ficou para trás, a última a conseguir sair debaixo da mesa. Penélope se aproximou dela, os olhos confusos dela refletindo a imagem da mulher.

— O que, você não lembra de mim? - deu um sorriso, passando a mão na barriga. A mulher tremeu - Você não lembra da minha barriga enorme, das roupas que não cabiam mais em mim? Deve lembrar. 

— Senhora, eu não... 

— Não lembra do meu choro, do choro da minha filha, dos meus pedidos de ajuda? - aumentou o tom, e ela se encolhia cada vez mais na sua frente - Você não lembra? Não lembra?

Penélope segurou o queixo da mulher, apertando para que não desviasse o olhar. Os pedidos de ajuda na despensa aumentavam, e a cada batida na porta a senhora tremia mais, lágrimas escorrendo pelas suas bochechas. Ela devia saber bem o que aconteceria, e Penélope não se deixou abalar. 

— Eu perguntei se você não lembra! 

— Eu lembro, eu lembro - choramingou, se deixando cair na cadeira atrás de si. - Eu queria fazer alguma coisa, todos nós queríamos! Mas tínhamos medo do patrão, ele é tão cruel, ele mataria a gente. 

Penélope riu, se afastando dela e chamando por Caim. Não tinha paciência para prolongar aquilo. Queria que tudo fosse rápido  e certeiro. 

— Que ironia. Você vai morrer do mesmo jeito mas, se tivesse me ajudado, pelo menos a minha filha estaria viva. Como você consegue dormir sabendo o que fez?

— Não, por favor. Por favor, por favor, não! - Ela se jogou no chão, se agarrando aos pés de Penélope. Ela tentou chutar a mulher, mas ela não lhe soltou de jeito nenhum. - Eu não matei a sua filha, eu não fiz nada, eu só queria manter o meu emprego! Isso não é justiça.

— Eu não quero justiça. Eu quero vingança.

Caim afastou a mulher, arrastando-a para a sala dos fundos, junto às outras. Penélope ficou parada na cozinha ao lado de Franco até que os disparos parassem. Ele a olhava de canto do olho, talvez preocupado com a sua reação, mas Penélope estava determinada. Cinco mulheres que ignoraram seus pedidos, que ouviram suas súplicas e não fizeram nada. Observaram sua barriga inchar e inchar, e até lhe ajudaram com a bebê nos primeiros dias. 

— Uma noite eu pedi que ela me levasse um chá - comentou, a voz branda. - Eu não conseguia dormir. Ela disse para Louis que eu estava tentado um aborto. Eu não pude comer nada sem a aprovação dele depois disso. 

Cinco tiros foram ouvidos, conforme Penélope tinha mandado, e os pedidos de ajuda pararam. 

— Os tiros não te incomodaram? - perguntou, depois de um momento.

— Não. 

Franco sorriu, entrelaçando os dedos nos dela, lhe puxando para um abraço. 

— Você só me surpreende mais e mais - o beijo que ele lhe deu foi calmo, quase delicado. Franco se afastou dela ao ouvir o barulho de pessoas chegando.  - Acho que os homens estão aqui. Vou ser justo com você: você cuidou das mulheres como quis, eu cuido deles como eu quiser. 

Penélope assentiu, mesmo desconfiada, e o seguiu para a entrada da casa. A sala estava ensolarada, as janelas enormes deixando entrar o sol forte e a maresia.

Os homens de Franco estavam de pé, atrás dos homens da ilha. Estavam quase todos ali, apenas alguns que deviam ter ido embora com Louis faltavam. Os homens que tinham lhe segurado e tirado Mia dos seus braços, segurado ela enquanto sua filha queimava. Assim como Agatha, eles também tremeram ao lhe ver, a confusão se transformando em pânico.

Franco acompanhou ela até o sofá, indicando para que Penélope se sentasse e então se sentando ao seu lado. Os homens que estavam sendo pagos os olharam com expectativa, aguardando suas ordens enquanto seguravam os outros com força, impedindo que se levantassem. 

— Eles deram muito trabalho? - a voz de Franco soou calma, como se perguntasse do tempo. O mesmo tom de voz que ele usava para perguntar para Penélope se ela queria alguma bebida. 

Um deles se adiantou, aparentemente era o líder. 

— Não muito. Nós estamos em número muito maior. Mas as pessoas da ilha ficaram curiosas, preocupadas. Não acho que virão atrás deles, no entanto. 

Franco fez um gesto de descaso.

— Podem vir também, se quiserem. Nós cuidaremos de todas. - Ele se virou para Penélope - São todos eles?

Um pedacinho de Penélope esperava que houvesse algum inocente ali. Alguém que ela pudesse devolver para a sua família em segurança. Mas olhando com atenção cada um dos rostos na sua frente, ela assentiu para Franco. As mulheres já tinham pago, que os homens pagassem também. Eles estavam amordaçados, e os seus gritos eram abafados.

Ele se levantou, caminhando até o grupo. Eram oito homens da ilha, dois deles trabalhadores da mansão. Eles se remexiam, tentando sair de lá, mas os homens de Franco eram mais fortes e estavam e maior quantidade. 

— Você sabem o que você fizeram. - Não era uma pergunta, mas um lembrete.

Com um sinal dele, os homens começaram a agir. Penélope não podia nem mesmo chamar aquilo de surra, porque estava mais para um linchamento. 

Penélope ficou com raiva. Ela não queria ficar ali ouvindo a violência ou enrolações, não sentia prazer nenhum naquilo. Queria que Franco fizesse logo o que tinha que fazer e então eles poderiam dar as costas para Ourania e ela nunca mais colocaria os pés naquele lugar. Não podia ser rápido como tinha sido com as empregadas? Mas quando ela pediu que ele agilizasse as coisas, Franco a olhou com raiva. A postura dele estava muito diferente do jovem cafajeste e irreponsável que ela conhecia. 

— Eu disse que eu cuidaria disso. Não dei palpites quando quem estava agindo era você, não é?

Então ela esperou que ele se desse por satisfeito, mesmo querendo sair logo daquele lugar. Quando Penélope achou que ele tinha acabado, porque os homens sequer se mexiam mais, ele mandou que pegassem os corpos das empregadas também. Foram enfileirados lado a lado na grande sala, e só então Franco pediu que Penélope saísse de lá com ele. 

Ficaram próximos ao portão, a uma distância segura enquanto os seus homens espalhavam alcool pela mansão. Começaram no andar de cima, e Penélope pode acompanhar o movimento deles passando pelas janelas de vidro no segundo andar e então descendo para o térreo. Eram galões e galões, para que nada sobrasse. Ela ficou contente que não fosse gasolina, porque a lembrança do pânico que tinha sentido na casa de Marcos ainda era muito recente.

Ela não sentia pena de nenhum deles, mas se viu chorando ao sentir o cheiro da carne. Trazia memórias demais, mas é claro que Franco não entendia aquilo. Ficou com raiva quando viu suas lágrimas, mas se limitou a apenas franzir os lábios e desviar o olhar. Ela estava sozinha quando tudo aconteceu, e mesmo que ele gostasse de exibir sua raiva tardia pela perda da suposta filha, só Penélope sabia de fato como tinha sido terrível presenciar o fato. Bem, ela e as pessoas que tinham sido cúmplices, mas estavam todas mortas agora.

Quando voltaram para o barco, ela se sentia um pouco mais leve. 

Apesar da demora, pelo menos tudo estava acabado naquele lugar. Penélope temia que o que viria a seguir talvez não fosse tão fácil. 


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Notas finais do capítulo

Capítulo sem revisão

Então gente, lembra quando eu falei que a Penélope não era uma mocinha mt padrão? Pois então... Eu acho que vale a pena ressaltar que ela tentou fazer as coisas de um jeito mais "limpo", vai. Sem tortura, sem delongas etc. Não é o ideal né, mas pelo menos isso. Acho que a Penélope é uma personagens meio complexa.

Estamos nos aproximando do fim!! Só mais 3 capítulos!! Me digam o que vocês estão achando ♥ ♥



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