Desarmonia: Os 4 deuses da Harmonia Livro 1 escrita por Alice P Shadow


Capítulo 13
Capítulo 12


Notas iniciais do capítulo

Estou sem img, mas o capítulo é dela:
Amita~



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Ela quase cortou a mão quando deslizou a ponta da flecha pela pedra de amolar.

— Vai se cortar se continuar desse jeito. – A voz masculina fez com que Amita sorrisse. – Faz tempo que não te vejo aqui. Lembrou que tem amigos, hm?

— Oi. – Respondeu de forma suave e continuou a afiar a ponta da flecha. Clari e Tedros estavam um pouco mais afastados na campina, ambos encostados no muro de pedras enquanto Amita ficava sentada embaixo de uma árvore. – Você também não foi me ver.

— Não acho que eu tenha permissão pra entrar no castelo quando eu bem entender. – Se sentou ao lado dela e pegou outra das flechas, verificando o trabalho da garota – Você ainda leva jeito pra isso.

— Aprendi com o melhor. Orion, no caso, não você.

— Me ofendeu. – O homem riu – Como você está?

— Como sempre.

— Não teria vindo aqui se estivesse como sempre. Vai, pode falar, eu sei que não sou sua primeira opção, mas ainda sou a melhor. – Ele piscou pra ela, o que a fez rir. 

— Estou apenas… com a cabeça cheia. Às vezes estar no trono me sufoca. Quis vir pra cá respirar. E confesso que estou feliz que te encontrei aqui, Callan. 

Callan sorriu. Não o sorriso convencido que sempre estampava seu rosto. Mas um doce, quase que aconchegante. Seu cabelo dourado caía de forma charmosa sobre seus olhos. Ele o assoprou para afastar os fios, sem sucesso. Amita levou a mão delicadamente até seu rosto, e afastou o cabelo com delicadeza. 

— Quando você faz isso, é realmente difícil superar, sabia? – Não era uma repreensão. Sua voz soava fraca, como se doesse respirar perto dela. – Meu coração ainda é seu. 

— Me desculpe. – Foi tudo que ela conseguiu dizer. 

— Não peça desculpas por algo assim. Quem se iludiu sozinho fui eu. 

Seu tom era bem humorado, mas Amita sabia o quanto destroçou seu coração. Ela havia tentado, afinal, gostar dele. Quando era adolescente e o conheceu, pensou que Callan era o homem mais lindo que já havia pisado no Mundo Acima. E ele ainda era, em sua visão. 

Por meses, tentou sair com ele para encontros depois de seus treinos. Conversavam, riam e se divertiam muito. Ela valorizava a amizade que tinha construído.  Mas era só isso que sentia por ele. Ele era lindo. Um ótimo amigo. E só. Não sentia vontade de o beijar. Não queria viver pra sempre ao seu lado. 

Nem dele, nem de mais ninguém.

E isso a corroía por dentro. Ela queria viver um romance. Ela queria amar e ser amada. Mas não conseguia. Era como se algo a impedisse, mesmo sem saber. Era algum medo? Trauma? Em todas as suas sessões de autoconhecimento e meditação, nunca tinha detectado nada sobre o tema. Chegou num momento, que apenas deixou pra lá. 

Mas sabia que havia causado dor nele. E, por mais que não devesse, se sentia culpada. Mesmo ele reforçando todas as vezes que ela não tinha culpa alguma e que não se mandava no coração.

— Eu realmente senti falta de estar com você. – Repetiu, o coração apertado. – Mas eu não sabia como te encarar. Eu fui uma idiota.

— Juro que se pedir desculpas mais uma vez por algo que não tem culpa, eu paro de te ajudar com essas flechas. – Callan advertiu em um tom mais sério. Combinava com ele na visão de Amita.

Callan com o semblante sério tinha um costume de deixar o maxilar tenso e marcado. Era sexy. E ela podia não o amar, mas não era cega. Definitivamente os olhos enxergavam muito bem.

— Tudo bem, sem tocar nesse assunto hoje. O que anda fazendo? 

— Agora que não sou mais seu professor particular de arquearia? Ainda dou aulas pra alguns nobres. E só. Minha vida não é tão movimentada quanto parece.

— Me parece formidável, na verdade.

— É entediante. – Ele colocou outra flecha na aljava de couro. Amita olhou para Tedros e Clari pelo canto olho e sorriu. – O que está planejando?

— Nada. 

Mas, tão rapido quanto o piscar de um olho, Callan a viu conjurar uma ilusão dos dois ainda em baixo da árvore para que os guardas pessoais não desconfiassem de nada. Então, o chão se abriu em um buraco infinito e os dois caíram. E ele sorriu ao sentir o vento o envolver e o abraçar. Seus olhos foram para Amita, que abriu os braços para sentir mais da liberdade no próprio rosto. Seu cabelo balançava conforme a corrente de ar deslizava pela face e ele sentiu o coração bater forte quando os olhos dela brilharam de alívio.

Poucos segundos depois, um círculo luminoso se abriu e os dois surgiram no meio de uma floresta exuberante, os pés tocando suavemente o chão. O círculo se fechou como se nunca tivesse existido e Amita deu passos silenciosos pra dentro da mata, com Callan logo atrás. Ela estava com o arco em mãos, atenta. Iriam caçar.

O homem levou a mão até a orelha e tirou um dos brincos que se transformou num arco grande, cinza escuro e opaco. Quando removeu a outra joia, uma aljava com flechas surgiu e a acomodou nas costas. Ele não sabia o que sua Rainha buscava, mas manteve os ouvidos e olhos atentos para qualquer sinal.

As árvores eram de um tom verde escuro. Musgo crescia próximo de suas raízes e começava a subir pelos troncos largos e sinuosos. Ouviram animais, mas, nada que despertasse a atenção da regente. Conforme se amaranhavam mais adentro na floresta, a luz começava a sumir devido as copas cheias das árvores que impediam a passagem e os afundava na escuridão. 

— Não deveríamos ir tão fundo na mata, Majestade. – Callan advertiu em um sussurro. Seus passos permaneciam agéis e quietos. – Há monstros aqui que fariam o Encontro parecer um mar de rosas. 

— Nem você acredita nessas histórias. 

De toda maneira, ela sabia que realmente poderia ter algo ali. Mas ela lidaria com isso. Sempre lidou. E queria que tivesse algo.

Chegou num momento, à medida que avançavam, que ficou realmente difícil de enxergar. Nem parecia que o céu acima deles era de um azul brilhante. Ali, tudo era cinza, verde e marrom escuro. Aos poucos, os olhos dela se adequaram a escuridão imposta e seus ouvidos ficaram mais alertas. Ela continuava consciente da presença de Callan logo atrás de si. E imaginava o que ele já saberia de suas intenções.

Claro que não havia ido até ali sem motivos. Trazer aquele homem consigo era um imprevisto, mas um acidente adorável para o que precisava fazer. 

Alguns minutos de caminhada silenciosa foram o suficiente para que ela finalmente sentisse a existência pútrida do que buscava. Em um sinal simples, levando o dedo indicador até os lábios, pediu que o colega permanecesse quieto. Se escondeu com ele atrás de uma árvore e pegou uma flecha, já a encaixando na corda firme e resistente do arco que empunhava. Callan repetiu o movimento, mesmo que não pudesse ver o que ela enxergava.

Ele não conseguiria, de fato. O que Amita rastreava ali não poderia ser visto pelos olhos de quem nunca teve contato prévio com algo assim. Não quando aquele ser queria continuar escondido. Num movimento rápido, ela disparou a flecha que reluziu a mínima faixa de luz que uma das folhas do topo da árvore mais alta deixou passar. A arma atingiu onde ela desejava e um rugido grotesco ecoou. O corpo dos dois reverberou e Callan finalmente pôde enxergar o monstro que não se preocupava mais em se esconder.

Sua forma era similar a de um urso, mas muito, muito, muito, maior que um. A pelagem parecia luz e sombra ao mesmo tempo. Era como se aqueles dois elementos brigassem entre si, mas, se complementassem com perfeição, moldando o monstro do Encontro para ser ainda mais aterrorizante. A flecha de Amita estava fincada em um de seus olhos, que jorrava um tipo de sangue branco e bizarro. E agora a atenção daquilo estava toda nela. 

Em um movimento rápido, Callan atirou outra flecha que acertou o dorso do animal e desviou a atenção dele para si. As patas ganharam garras afiadas e o urso urrou, disparando em sua direção, os dentes famintos bem evidentes. 

Amita fez um sinal ágil com as duas mãos e a magia irrompeu pelo ar. Uma rajada de vento pegou impulso entre as árvores, os troncos servindo de ampliadores devido ao formato que eram dispostos. A pancada acertou o bicho com força, e a flecha que ainda permanecia em seu olho, adentrava mais ainda na carne. 

Amita saltou sobre o monstro e subiu em suas costas com agilidade. Fincou uma flecha com a mão em seu outro olho e deslizou o arco pelo pescoço dele, o enforcando. Ela segurava o arco e o puxava com força descomunal. Mais sangue branco jorrava no chão. "Volte para o esgoto que você saiu". 

O urso se debatia e tentava a tirar de cima de si com aquelas garras pontiagudas. Callun acertou uma das patas com outra flecha antes que o monstro machucasse a Rainha. Ele não conseguia entender como ela o segurava apenas pela força. Nem como o arco não se partiu.

Aquela coisa era servo do Encontro. Uma anormalidade que não deveria andar pelo Mundo Acima. Incontáveis guerreiros eram necessários para derrotar apenas um. E Amita Dízon acabava com ele como se fosse brincadeira de criança. 

Quando o corpo sem vida do animal caiu no chão, com a mulher ainda montada em cima dele, Callun soltou o próprio arco e se curvou em admiração e lealdade. A venerava. Céus, sempre venerou Amita e o ar que ela respirava. Mas aquilo? Era a mais pura demonstração de poder.

— Não se ajoelhe. – Ele se levantou no mesmo segundo, transformando o arco e a aljava novamente em brincos e os colocou na orelha. – Deve ter mais desses por aí. Mas acho que um só conseguiu me deixar mais calma. 

Ela limpou um pouco do sangue branco que manchou seu braço. O contraste com sua pele era encantador. Amita desceu do bicho e tirou as próprias flechas do corpo que ainda era uma mistura de luz e sombra. Mas agora os elementos se moviam devagar. Se entrelaçavam com lentidão. 

A Rainha tirou uma adaga da cintura e cortou um dos dentes do bicho. Ela colocou num bolso do casaco branco que usava. Em seguida, desceu a lâmina direto no peito dele, e, onde deveria existir um coração, havia uma pedra reluzente, do tamanho de uma maçã. Branca, pálida e com uma aura fantasmagórica. 

Com magia, Amita a diminuiu de tamanho e guardou no bolso junto do dente. Proferiu algumas palavras no idioma antigo, que saíram por sussurros. A terra estremeceu. E o bicho começou a ser sugado pelo solo, sumindo e indo para o inferno. 

Ao menos, ela esperava que fosse. 

Quando ergueu a cabeça, Callun ainda a encarava admirado. Ela não pôde evitar sorrir ao ex-professor. Ele a ensinou bem, afinal.

— Me diga, Amita, por que raios você passa o dia inteiro no castelo quando claramente seu desejo é estar em batalha? 

Ela não respondeu. Porque era o que se perguntava todos os dias. 


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Quando voltaram para a árvore, invisíveis, e se posicionaram de forma a se mesclar com a ilusão, a Rainha finalmente desfez o feitiço. O sol começava a se pôr, e os raios dourados refletiam em seus olhos amendoados. A visão era linda e de perder o fôlego. Clari e Tedros ainda permaneciam no muro, mas aparentavam cansaço. Amita precisava voltar logo para o castelo.

— Obrigado. – O homem à sua frente se levantou. Sua pele bronzeada o deixando ainda mais atraente com o sol poente em suas costas. – Por me permitir ver alguém tão incrível em ação. 

— O prazer foi meu. Acredite. 

Ela se levantou e os dois deram um abraço apertado. Callun inspirou o cheiro do perfume dela que ainda pairava mesmo depois de tanta ação. Então se afastou e desceu colina abaixo para a cidade de Dízon-Regnum sem olhar para trás. 

Amita o observou ir em silêncio. Um dia ele superaria. E poderiam voltar a ser como eram antes. 

O olhar dela se encontrou com o de seus guardas pessoais, que prontamente foram até ela e a escoltaram até o palácio. O céu agora estava escuro e as luzes da construção gigantesca iluminavam bem o caminho deles. A Rainha parou em frente a porta e se virou para trás, os olhos no horizonte além. A colina. A floresta. Ainda podia sentir a adrenalina em suas veias. Aquela sensação majestosa de estar viva e poder respirar. 

Ela inspirou profundamente e fechou os olhos. Uma brisa suave acariciou sua bochecha e seu coração bateu de forma mais tranquila. Mas algo esquentou no seu bolso e ela correu castelo adentro.

— Preciso ir ao banheiro. – Disse para Clari e Tedros que a seguiam preocupados. Eles relaxaram os ombros e fizeram a guarda na porta do quarto dela.

Amita entrou como se fosse um furacão e fechou a porta. Correu até o banheiro, que era consideravelmente grande, e tirou o tapete que ficava de frente para a pia. Se agachou ali e deslizou o dedo indicador pelo mármore branco num símbolo que já havia memorizado. Quando terminou, tomou fôlego e deixou que o sopro fluísse de seus lábios. Uma fina névoa se formou e tomou o formato da marca. Click. Um mecanismo foi acionado e a pedra se moveu para baixo. Em seguida, uma sucessão de pedras se moveram e uma escada em espiral se formou. 

A Rainha se levantou e começou a descer pela longa escada. Quando sua cabeça já estava completamente abaixo do piso, os degraus começaram a subir e tudo ficou escuro. 

Ela permaneceu descendo no breu, seus pés pisando com graciosidade em cada desnível. Tudo que podia escutar era o som dos seus passos. Amita Dízon respirou fundo e moveu os três dedos do meio para cima e para baixo, e então, uma chama branca contornou sua mão, até que se formasse em sua totalidade, iluminando o ambiente.

Quando chegou no último degrau, ela caminhou por um corredor longo e estreito, feito do mesmo mármore branco do banheiro. Não demorou muito para que ela chegasse onde planejava. 

Ao final do corredor, uma porta de pedra a esperava. Sem tempo para paradas, pegou uma das flechas que ainda carregava e fez um corte minúsculo na ponta do seu dedo. Uma gota de sangue vermelho-vivo se formou e caiu contra um símbolo praticamente invisível. Quando o líquido entrou em contato com a pedra, ele se moveu de maneira rápida e formou o contorno da marca. A tranca se mexeu, e a porta se abriu sozinha sem nenhum rangido. Amita praticamente voou pra dentro e jogou a pedra-coração que fumegava em cima de uma bancada. Ela não estava mais pequena como antes, quando o feitiço foi feito. Estava grande como quando foi retirada do monstro. 

— Merda. – Resmungou, a mão ardendo por entrar em contato com algo tão quente.

Ela tateou a parede, ainda no escuro, e encontrou o interruptor que ligava todas as tochas do ambiente com fogo. Quando tudo ficou claro, ela observou seu pequeno laboratório com alívio. Estava exatamente igual dias atrás, então, ninguém ainda sabia o que ela havia feito ali em baixo com o cômodo que deveria ser apenas um refúgio em caso de invasões no castelo.

Ao descer o olhar para sua mão, ela percebeu algumas bolhas brancas estranhas se formando. Mais que depressa, ela abriu uma torneira e deixou que a água corrente descesse fria pelo ferimento, o que suavizou o machucado. As bolhas diminuíram quase que no mesmo segundo, mas, quando ela tirou a mão da água, voltaram mais fortes do que antes. A Rainha praguejou. “O que é isso?”. 

Ela ousou tocar uma das bolhas com uma pinça que estava jogada em uma das bancadas de mármore puro, mas a ponta de aço do objeto se desintegrou assim que tocou na superfície branca da ferida. Ela disse palavras de xingamento que uma rainha não deveria pronunciar quando viu aquilo. 

Seus pensamentos estavam acelerados e precisou controlar a respiração. Não deveria ter ficado em contato direto com aquela coisa sem uma maldita luva, e sabia que foi uma burrice não ter conjurado uma quando matou o bicho, mas naquela hora ela sequer pensou nessa possibilidade. Estava inebriada com a adrenalina e com a sensação maravilhosa do sangue correndo em suas veias enquanto acabava com aquela coisa.

Com cautela, encostou a palma da mão na mesa e a afastou com rapidez. O local onde as bolhas tinham tocado, havia começado a se decompor e pequenas marcas de queimadura se destacavam na pedra. Aquilo era um mau sinal. Ela voltou sua atenção para o coração em cima da outra bancada e ele permanecia intacto. Fumegante, mas intacto. Nada a volta dele havia derretido. 

Lágrimas se formaram em seus olhos. Já tinha muita coisa para lidar. Precisava cuidar do seu reino, de Bragi também; do seu primo amaldiçoado que se afundava cada dia mais num limbo, e, mesmo querendo o ajudar, não havia achado nada em suas pesquisas nesses anos todos; precisava se preocupar com Orion querendo travar uma guerra, e com a ganância de seus conselheiros; não aguentava mais, além de tudo isso, abdicar de si mesma. Não aguentava ouvir que precisava cuidar de si, que tinha que ter responsabilidade sobre sua saúde mental e física, que precisava socializar, conhecer pessoas e ter mais romances; Não suportava mais viver a vida que punham para ela. Sempre o que queriam. Sempre se preocupando com cada movimento e como cada ação sua refletiria nos outros. Ela não aguentava mais. Ela queria poder querer. Fazer algo porque gostava. Porque acreditava naquilo.

Não ser mais a Amita bondosa. A Rainha que todos viam como a perfeita em tudo. Ela odiava ser perfeita. Porque não era.

Mas, além de tudo isso, agora ter que se preocupar com malditas bolhas brancas horripilantes que desintegraram tudo que tocava? Isso quando ela finalmente havia feito algo que queria? Era injusto.

Brava, ela pegou a maldita pedra branca direto em contato com a pele, que a queimou. E ela queria que queimasse. Que deixasse uma marca irreversível pra fazer valer a pena o caminho que sua vida tomaria. Para que ficasse registrado em seu corpo e na sua alma que ainda estava viva e que podia tomar suas próprias decisões, mesmo que erradas. E ela queria poder errar.

Sufocou um grito e apertou com mais força, sangue vermelho começando a escorrer da palma da mão, contornando seu pulso e braço. Um sangue quente como brasa que a queimava sem deixar nenhum rastro além do vermelho vivo.

Ela não sabia de onde tirou forças para continuar segurando aquilo, mas todas as células em seu corpo gritavam para continuar. Para que sentisse aquele fogo queimar e a acordar de algum estupor. Então… aconteceu.

Amita gritou tão alto que uma ventania mágica se espalhou pro toda a sala, saindo de seu corpo e empurrando tudo que via pela frente. As chamas que iluminavam o laboratório se apagaram e todos os objetos jogados pela mesa de experimentos caíram no chão. O vidro de alguns armários se quebrou, cadeiras foram lançadas contra as paredes de pedra. O local estremeceu quando a Rainha caiu de joelhos no chão, com lágrimas da cor branca como tinta escorrendo por seu rosto.

Um soluço irrompeu de seus lábios e Amita percebeu que sua mão não possuía mais bolhas e a pedra agora era completamente vermelho-sangue. O seu sangue. Ela se levantou com dificuldade, cega pela escuridão e conjurou magia para iluminar o ambiente. O fogo voltou. Seu coração batia rápido demais conforme se apoiava na bancada e colocou o coração em cima da superfície. 

— Quem diria. – Uma voz rouca a fez virar com rapidez, assustada, e a sacar uma das adagas que guardava. – Sem violência, Majestade.

O homem caminhou com uma elegância sem fim até a bancada. Quando Amita fez menção de se mover para pegar a pedra, ele riu e olhou no fundo do seus olhos. Um brilho percorreu o olhar dele. 

— Saia da frente. – A ordem ressoou pelos ossos dela. Seu cérebro implorava para obedecer, mas ela não deu um passo sequer. – Interessante essa sua muralha. Não sabia que tinha uma mente tão forte. – O corpo dele estava próximo do seu. Sua presença exalava um tipo de poder que preenchia o ambiente, como se o laboratório fosse pequeno demais para sua presença. Lentamente, ele levou o polegar até a bochecha da rainha e o deslizou por sua pele em um toque carinhoso e ameaçador. Ainda mais devagar, calculado, seu rosto se aproximou da orelha dela, os lábios quase encostando na curvatura. – Eu disse para sair da frente. Poderia me fazer esse pequeno favor, não acha?

Contra sua própria vontade, seu corpo se moveu para o lado e o homem pegou a pedra. O vermelho contrastava com a luva preta de couro que ele usava, e, com uma facilidade que ela não poderia descrever, ele a esmagou. Quando abriu a mão novamente, um pingente havia se formado e ele o colocou junto de outros em um colar dourado que adornava seu pescoço. Amita engoliu em seco.

— Você nem imagina o presente que acabou de me dar, Dízon. – Um sorriso percorreu os lábios dele, repleto de uma maliciosidade que a deixava aterrorizada. – Será uma honra ter você em minha coleção. Quando chegar a hora, irei reivindicar meu prêmio. Até lá, tente não chamar muita atenção com… as mudanças que vão acontecer com você. 

Com um silêncio felino, ele se afastou e abriu um portal. Antes de atravessar, fez uma reverência exagerada.

— Uma honra te conhecer, Majestade. Vou esperar ansioso pelo nosso próximo encontro. 

Um clarão se fez quando ele atravessou o portal e Amita jogou a adaga por ele, torcendo para que acertasse quem quer que fosse aquele homem. Havia mirado bem onde estaria sua cabeça. Quando o portal sumiu, ela não sabia se havia acertado. Imaginava que não. Mas não importava. Não quando sabia que havia se metido onde não devia e que algo muito grave aconteceria. 

Ela respirou fundo e tentou se controlar, o que não durou muito quando viu o sangue branco fantasmagórico que escorria do machucado da sua mão. “O que isso fez comigo?”.


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Notas finais do capítulo

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