Era Uma Vez... Uma Ilusão escrita por Landgraf Hulse


Capítulo 17
16. Todos temos que fazer sacrifícios na vida, sejam eles fáceis ou difíceis.




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Maio|1799 Buckingham House, Londres

Em frente a uma grande janela, a rainha massageava silenciosamente a testa, ela estava com dor de cabeça, uma dor muito forte e com um motivo mais forte ainda. Atrás dela, a princesa Augusta tocava piano, embora já mostrasse algum sinal de cansaço, enquanto Elizabeth e Augustus ocupavam-se em outras coisas.

Havia, porém, uma pessoa na sala que olhava com muita preocupação a rainha, essa pessoa era o rei, que sabia muito bem a causa da dor de cabeça dela. Suspirando consigo mesmo, George retornou ao livro que tinha consigo... até que ele se cansou e fitou novamente a esposa.

— Mary não virá tomar chá conosco? — A rainha permaneceu de costas, sendo que apenas Elizabeth voltou-se ao pai. Nada satisfeito por ser ignorado, o rei acrescentou negando: — Assim ela acabará perdendo a hora.

— Mary está fazendo companhia a Amélia, papai. — Sorrindo calmamente, Elizabeth respondeu ao pai, que assentiu concordante ao lembrar desse fato.

Elizabeth voltou então ao caderno de desenho, e com isso o silêncio retornou, para o desprazer do soberano. George encarou fixamente a esposa, que por sua vez encarava fixamente alguma coisa do lado de fora. O que seria? O rei franziu o cenho, porém, quando estava prestes a perguntar, ele percebeu algo.

— E Sophia, onde está? — George não percebeu, mas essa pergunta fez Augusta errar no piano e Elizabeth quebrar o grafite. Sem respostas, o rei acrescentou: — Espero que não esteja doente também.

As duas princesas se entreolharam alarmadas, principalmente quando a rainha finalmente voltou-se para trás, fitando-as da forma mais questionadora possível. Augusta e Elizabeth retornaram então às distrações anteriores, sem dar resposta alguma. Isso o rei percebeu, porém...

— Acho que a anjinha foi ver Edward... ou melhor, nosso mais novo duque de Kent. — Antes do rei falar qualquer coisa, Augustus respondeu levemente irônico ao mencionar o irmão. — Pelo menos acho que foi Edward, ou seria William? Bem, não importa muito. Deseja que eu cante para você, mamãe?

— Não desejo cantoria alguma, Augustus! Será que já não basta o barulho de Augusta? — Definitivamente, a rainha estava irritada. Apesar disso, Augustus continuou sorrindo. Charlotte novamente massageou a testa. — Augusta, traga meu rapé.

A princesa nem mesmo assentiu, apenas saiu do piano, no maior desânimo possível, e foi pegar o rapé guardado em um armário. Observando tudo isso, o rei encarou a esposa e negou lentamente.

— Será que não existe um remédio melhor para sua dor, Charlotte? Sabe que não gosto do cheiro de rapé. — E nem dos efeitos, tudo lembrava George das coisas que ele já teve que beber. A rainha, porém, apenas suspirou e deu novamente as costas, então ele simplesmente mudou de assunto: — Grenville já terá falado?

Agora esse assunto trouxe a atenção da rainha, que voltou-se imediatamente para trás, nem mesmo dando atenção a Augusta com caixinha de rapé. Exatamente como ele imaginou, George negou e levantou-se da poltrona onde estava. Um assunto como esse nunca seria fácil.

— Você queria me ouvir, não era, George, pois agora me ouvirá. — Era tudo que ele mais queria. Charlotte, cuja expressão era das mais preocupadas, deu um passo para frente. — Tem certeza disso?... Disso que acabamos de fazer?

— Todos temos que fazer sacrifícios na vida, sejam eles fáceis ou difíceis. — Aproximando-se mais ainda da esposa, o rei respondeu sério. Ela não mostrou reação, então George sorriu de lado. — Será difícil no início, sei disso, mas depois...

— Sei muito bem disso, George. É verdade que tive muita sorte, mas sei como é difícil. — George tinha conhecimento disso, ele observou toda a dificuldade dela, mas... o rei permaneceu calado. A rainha cruzou os braços e suspirou. — Estou falando da escolha, de ambas as escolhas. Não acho que Grenville tenha a sensibilidade necessária para...

— Grenville saberá falar, ele é um parlamentar, afinal de contas. — Não foi o suficiente para acalmar a rainha, que negou. O rei sorriu e estendeu uma mão. — Quais problemas podem surgir? Estaremos na verdade apenas afastando eles.

— Você está sendo muito otimista. Nunca ouvimos coisas boas daquele lugar. — Agora foi o rei que ficou sem resposta. Suspirando, a rainha novamente deu as costas e voltou a janela. — Me dói tanto ter que submetê-los a tamanha tortura! São crianças, George, podem tentar parecer gente grande, mas não passam de crianças!

O rei permaneceu calado, observando a esposa, que pegou a caixinha de rapé com Augusta. Todas essas preocupações eram válidas, mas... George engoliu em seco e aproximou-se dela. Ambos ficaram lado a lado na janela, observando o pátio.

— Sei disso, Charlotte, mas eu jamais poderia deixar uma de nossas filhas naquela triste posição. — Em resumo: tudo não passava de egoísmo. Atrás deles, Augustus começou a tocar, fazendo a rainha franzir o cenho. — Minhas irmãs... elas sofreram tanto, não posso condenar nossas filhas também!

— Então condenaremos os filhos alheios.

— Está no sangue deles, lembre-se disso. — Todo Habsburg nasceu para sofrer, ou era isso que parecia, pelo menos. Charlotte negou, então George acalmou a voz. — É mais seguro assim, não podemos usar nossas moedas mais preciosas. Além do mais, foram eles que decidiram assim.

Nada então poderia ser feito, senão aceitar. E a julgar pelo silêncio de Charlotte, foi exatamente isso que ela fez. O silêncio retornou à sala, mas agora George não fez questão alguma de quebrá-lo. O rei, a rainha e a princesa Augusta continuaram a olhar pela janela, até que...

A rainha semicerrou os olhos ao ver Sophia cruzar o pátio, parecendo vir exatamente da ala dos criados. Sophia parecia desnorteada, alegre e... segundos depois passou um homem, estava de cabeça baixa e foi muito rápido, mas parecia tanto com o major... a rainha imediatamente voltou-se questionadora a Augusta, que deu os ombros e afastou-se.

Algo não estava certo, não estava nada certo. Entretanto, tudo ainda iria ficar visivelmente pior, muito pior.

*****

Palácio de Hampton Court, Londres

Logo no dia seguinte aos acontecimentos de Cottington House, o arrependimento nasceu em Cathrine, um arrependimento tão grande e forte que ela foi falar com Richard. Porém, surpreendendo-a profundamente, ele a cortou e disse que o ocorrido deveria ser esquecido, eles jamais voltariam a mencioná-lo. Cathrine prontamente obedeceu essa ordem.

Nada, porém, mudou entre os Bristol, nem mesmo o fato de agora Cathrine saber claramente que Anne a odiava, mudou o status de poder da família, e muito menos a frequência deles na sociedade. Entretanto, apesar de nada ter mudado, Cathrine sentia que... isso não iria durar.

Na sala de visitas, a marquesa sentou lentamente num sofá e dispensou as damas de companhia, que rapidamente saíram da sala. Richard estava sentado ao lado dela, em completo silêncio, e à frente deles estava Lord Grenville, também em silêncio. Era tão desconcertante, muito desagradável, Cathrine praticamente agarrava as mãos no colo a fim de mantê-las quietas.

— Fico muito agradecido pela rapidez com que me receberam, Suas Altezas Sereníssimas. — Foi uma surpresa, isso sim. Cathrine viu pânico nos olhos de Richard quando o secretário do estrangeiro chegou. Por que dessa visita? O casal apenas assentiu, então Grenville continuou: — É de extrema importância o assunto do qual vim tratar.

— Envolve a guerra? — Richard imediatamente sugeriu, ganhando rapidamente uma negativa do barão. Isso, porém, não pareceu acalmar o marquês.

— Seria a Dinamarca? — O tom de Cathrine foi visivelmente preocupado, mas Lord Grenville novamente negou, agora levemente irônico. Cathrine franziu o cenho, principalmente por ofensa, mas acabou dizendo: — Mas se não envolve nem a guerra e muito menos a Dinamarca, o que o milorde deseja aqui?

— Deixemos Lord Grenville falar, Cathrine, por favor. — Cobrindo o rosto com a mão, Richard interrompeu, parecendo mais cansado que irritado.

Pois bem. Não tendo outra escolha, Cathrine encarou Lord Grenville e forçou um sorrisinho. Que ele desse a mensagem dele, e não voltando a ofendê-lo, de preferência. O barão, porém, não falou imediatamente, primeiro ele analisou Richard, depois Cathrine e, por fim, retornou ao marquês. Lord Grenville parecia estar escolhendo as palavras que usaria.

— Devo confessar que, em parte, o assunto que vim tratar envolve a guerra, bem como nações estrangeiras, em parte. — Talvez fosse pela gravidez, mas Cathrine sentiu-se ofendida com essa última parte. Após uma pausa, Grenville suspirou e, muito sério, logo disse: — A Rússia, é sobre a Rússia que vim falar.

A Rússia? Cathrine imediatamente franziu o cenho e voltou-se para o marido... as dúvidas dela aumentam mais ainda ao fazer isso. Richard não parecia nada surpreso com as palavras de Grenville, a única ação dele foi bufar. Por acaso ele sabia de...? A marquesa retornou ao secretário do estrangeiro.

— A Grã-Bretanha está tendo problemas com a aliança russa?

— Não. — Foi a única resposta dele. Cathrine franziu ainda mais o cenho, pois então era o quê? Grenville, friamente sério, engoliu em seco. — Serei curto e direto, sem enrolação. O rei e Pitt decidiram que haverá um casamento anglo-russo.

Casamento anglo-russo... mas, Cathrine encarou fixamente Grenville e negou, o que eles tinham haver com isso!? Se o rei deseja um casamento com a Rússia, era só casar um dos filhos dele com algum grão-duque ou grã-duquesa, haviam cinco príncipes e cinco princesas para casar. Muito simples, por que de...?

Porém, no mesmo momento que falaria algo, Cathrine percebeu o olhar de Lord Grenville muito sério em Richard, bem como a serena calma do marido. O que estava acontecendo, Deus? Parecia até que... Cathrine arregalou os olhos e negou. Não poderia ser isso... poderia?

— Bem, creio que o milorde esteja se referindo a nós. — Nós? Cathrine voltou-se a Richard, um casamento com um Tudor-Habsburg!? A marquesa não conseguia evitar uma negativa, porém o marquês não deu atenção. — Irei... falarei com Robert sobre isso e...

— Creio que o senhor não entendeu, meu príncipe. — Agora não foi apenas Cathrine que fitou confusa Lord Grenville, mas também Richard. Nenhum deles dois estava entendendo realmente. — Precisamos de um casamento, um que mantenha a aliança anglo-russa, um casamento que influencie a Rússia e o imperador.

Precisavam de um espião, isso sim, pelo modo como falavam era isso que davam a entender. Cathrine fitou Richard, buscando claramente uma explicação, isso tudo parecia caminhar para um caminho muito ruim, mas nem mesmo ele sabia o que dizer. Richard encarou a esposa e negou. Não aguentando mais ficar sentada, a marquesa levantou e afastou-se dos cavalheiros.

Toda essa situação... oh Deus! Atrás de Cathrine, Richard encarava fixamente o barão Grenville, cuja expressão era praticamente de pena. Até que...

— Lord Grenville, qual tipo de casamento que o milorde está se referindo? — Não aguentando mais a dúvida, Richard perguntou lentamente.

Houve apenas silêncio, o que não ajudou em nada. Cathrine parou de andar, a fim de escutar melhor. Lord Grenville então começou:

— Meu marquês, minha marquesa, não iremos tirar uma grã-duquesa da Rússia, — Oh Deus! A marquesa imediatamente voltou-se para trás, enquanto o marquês arregalou os olhos. — na verdade, daremos uma para eles.

Levando ambas as mãos à boca, Cathrine encarou então Richard, cujo pavor era imenso nos olhos. Um casamento... um casamento com um grão-duque russo...

*****

Entre alegres risadas e altos suspiros, Anne entrou correndo num novo corredor do labirinto de Hampton Court, logo ela percebeu que não havia saída, porém... fortes mãos agarraram a cintura de Anne, puxando-a para trás e beijando-a no pescoço. A princesa inicialmente tentou se soltar, debatendo-se, mas logo ela desistiu e voltou-se para trás.

— Assim não vale! Sabe que não gosto de perder... Fritz! — Mesmo tentando parecer chateada, Anne acabou gemendo o nome de Fritz, que beijava lascivo o pescoço dela. Após certo custo, ela afastou-se dele. — Alguém pode nos ver.

— Quem iria nos ver? Outro casal se pegando? — Fritz agarrou a mão de Anne, beijando-a apaixonadamente. A única ação dela foi tomar a própria mão e, encostando-se na parede de carpa, rir cética. — E se eu te pedisse em casamento, pedisse aqui e agora? Você aceitaria, Anne?

Casamento? Anne negou sorrindo, não parecia algo que ele faria. Fritz, porém, fingindo decepção, aproximou-se para novamente beijá-la, mas dessa vez a princesa conseguiu desviar e correu para um novo corredor, ele foi atrás, claro. Ambos riam altamente nessa caçada, tanto que logo ficou difícil saber se estavam longe ou perto um do outro.

Diminuindo o passo, assim como a risada, Anne negou para si mesma. Quem diria que as coisas ficariam assim? Desde o baile em Cottington House... a princesa suspirou apaixonada, tudo estava tão perfeito. Um olhar, um abraço e um beijo poderiam fazer milagres.

— Não sei o que responder, Fritz. Tudo dependerá do seu pedido, ele terá que ser perfeito. — Sentindo a presença dele, Anne respondeu desafiadora. Estava silencioso... até que Fritz apareceu e, pressionando-a contra a parede, voltou a beijá-la. — Sim, Fritz, beije-me! Beije-me com toda a sua paixão! Ainda não acredito que estamos realmente fazendo isso!

— Pois estamos, e estamos gostando muito. Mas... tudo ficará mais sério agora. Entende? — Parando um momento de beijá-la, Fritz falou encarando-a fixamente. Oh Deus! Anne sorriu largamente ao entender.

Afastando-se levemente dela, o príncipe hereditário ajoelhou-se e pegou a mão da princesa. Oh Deus, então era real!? Anne conseguiu apenas sorrir e negar, mais para ela mesma que para ele.

— Seja perfeito. — Fritz respondeu esse sussurro com um sorriso encantador.

— Eu não posso ser perfeito, Anne, está além da minha condição, mas posso ter comigo a perfeição. Case comigo, Anne, torne-me perfeito! — Olhando-a fixamente nos olhos, Fritz proferiu essas palavras apaixonadas. A ação de Anne foi assentir sorrindo. — Quero tê-la ao meu lado. Quero amar-te, Anne... necessito do seu amor!

Dito isso, o príncipe hereditário beijou a mão dele, ficando com a cabeça baixa logo em seguida. O sorriso e a emoção de Anne eram tremendas, não parecia haver amanhã ou consequências ruins, ela apenas disse.

— Oh Fritz, sinto que não posso viver sem você! — Foi um assentimento, um bastante emocionado, por sinal.

Sorrindo muito emocionado, Fritz voltou a encarar Anne, os dois ficaram apenas nesse olhar por um momento, até que... eles se beijaram novamente. Estavam cheios de paixão, tomados pelo sentimento e a ilusão. Havia apenas Anne e Fritz, apenas a paixão deles.

— Irei avisar imediatamente o meu pai. Casaremos assim que ele consentir. — Perfeito, embora... também pudesse demorar. Anne, porém, não conseguia parar de sorrir. Ele percebeu isso, tanto que começou a acariciar a bochecha dela, isso antes de perguntar: — E seu irmão, o que ele dirá?

— Richard aceitará sem questionar. Devemos, porém, esperar o consentimento do Conselho Regencial de Niedersieg e do rei também, claro. — Não que fosse obrigatório, mas era uma questão de gratidão. Fritz assentiu para Anne, que logo teve uma ideia. — Venha aqui hoje, Fritz. Jante conosco e peça oficialmente a minha mão.

Tudo foi combinado, o apaixonado casal planejou tudo até o casamento, embora Anne tivesse planejado até o nome dos filhos deles. Após isso Fritz foi embora e ela foi procurar pelos irmãos. Oh Deus, tudo seria tão belo e perfeito! A Europa ficaria encantada por Anne e Fritz! Eles seriam belos!

Anne, porém, não encontrou Richard no escritório, nem na biblioteca e muito menos na galeria, o que foi surpreendente. Anne até mesmo passou por uma pintura de Anne Boleyn, o que não foi tão agradável assim, afinal... não era preciso dizer muito. A princesa não encontrou ninguém, isso até Lady Spencer avisar que estavam na sala azul.

Ao entrar na sala, ela tentou manter-se calma e sério, mas foi impossível, a alegria de Anne era tão grande que tornava-se impossível. Todos na sala, desde os irmãos até Cathrine, fitaram confusos a princesa.

— O que aconteceu, Anne? Alguém morreu, por acaso? —Deitado de qualquer jeito num sofá, Robert comentou com humor, um bastante seco, por sinal. — Faltava apenas você para Richard começar.

— Ele deseja nos falar algo importante. — Mary reiterou. Algo importante? Anne franziu o cenho e aproximou-se. A princesa caçula ainda falou preocupada: — Espero que não seja algo ruim, uma boa notícia é mais do que necessária.

— Sendo assim, eu tenho uma boa notícia. Uma que não envolve a guerra. — A atenção, que já estava nela mesmo, permaneceu em Anne, sorrindo amplamente. A princesa suspirou emocionada. — Estou noiva.

Talvez fosse a emoção, pois era algo inédito, mas nenhum deles teve reação, ou melhor, uma diferente de perplexidade. O olhar de Anne recaiu logo em Richard, boquiaberto e... preocupado?

— Casar!? Você vai casar!? — O espanto na voz de Cathrine era grande. Anne assentiu orgulhosamente. — Quando foi isso? Com quem!?

— O príncipe hereditário de Württemberg me propôs hoje mesmo, naturalmente eu aceitei. — Novamente eles ficaram perplexos, novamente Anne encarou o irmão mais velho, buscando algum apoio. Richard, porém, parecia preso num abismo de pensamentos. — Surpreendente, não? Eu também achei, mas percebi que o amo muito. Com esforço e paciência seremos felizes.

Claro que seria assim... pensando melhor, Anne sentia-se quase uma tola apaixonada com tais pensamentos, mas... era Fritz! Porém logo a atenção dela saiu do noivado. Richard comentou a andar ansiosamente pela sala, como sempre fazia quando estava ansioso ou perturbado. Anne, Robert e Mary fitavam confusos o irmão, até que ele parou e olhou para ela.

— Meus parabéns, Anne. Seja muito feliz. — Richard sorria, porém não plenamente... perturbado. — Mas eu também tenho notícias. O imperador Pavel... ele também deseja um casamento... ele deseja casar um dos filhos dele com... uma de vocês.

Nada poderia ter preparado os Tudor-Habsburg para essa notícia. Anne e Mary se encararam, perplexas... casar com um grão-duque russo?

*****

Estava tudo acabado, não havia mais esperança... como tudo desandou dessa maneira, Deus!? O horror no olhar de Anne e Mary, encarando uma à outra, era uma terrível visão. Mordendo os lábios, Richard deu as costas e afastou-se, porém não o suficiente para calar Robert.

— Você só pode estar brincando. Diga que está brincando, Richard! — Levantando-se rapidamente do sofá, Robert exclamou furioso. Richard apenas fechou os olhos, agora realmente pensando que havia cometido um pecado. — O que um grão-duque russo iria querer com uma princesa Tudor-Habsburg!? Explique!

— Abaixe o tom quando estiver falando com seu soberano, irmãozinho! — Sendo tomado momentaneamente pela emoção, Richard gritou ao irmão, que permaneceu desafiador. — Somos realeza, não estamos num nível tão inferior assim. A questão é que o rei deseja fortalecer a aliança anglo-russa, e o que é mais forte que um casamento?

— Mas o rei tem cinco filhas solteiras, por que ele não usa uma delas!? — Por que ninguém em sã consciência enviaria uma filha ao inferno! Richard apenas negou ao furioso irmão. Robert, fechando os olhos, apontou ao irmão. — Recuse o pedido.

Era uma ordem? Pois parecia uma. De qualquer forma, o marquês negou lentamente, as coisas não funcionavam assim. O jovem duque de Kendal, vendo a negativa do irmão, apertou fortemente os punhos e afastou-se. Parecia até estar segurando-se para não bater nele.

— Não é tão simples assim, Robert. — Atrás deles, foi Cathrine que respondeu, muito calmamente, graças a Deus. Isso, porém, não acalmou em nada Robert. A marquesa continuou: — Essa é, acima de tudo, uma questão diplomática, uma que pode ser muito benéfica no futuro.

— Eu sei, Cathrine, tenho muito conhecimento disso! — As palavras de Robert não passaram de uma desistência, tanto que ele afastou-se mais ainda. — Mas que merda!

Uma merda, realmente, mas eles nada poderiam fazer em relação a isso. Havia o dever e vontades pessoais, duas coisas diferentes numa constante luta, e nessa luta o vencedor sempre seria o dever. O silêncio tomou de conta da sala, e um silêncio bastante próprio para o momento: muito desagradável.

Nesse momento, enquanto Richard mantinha-se de pé, Robert praticamente caiu num sofá, Mary parecia perdida nos próprios pensamentos, já Anne... ela estava mais afastada de todos eles, na frente de uma janela. A expectativa não era boa, nada boa.

— Qual será? — A voz de uma das princesas finalmente foi ouvida, a voz de Anne, mais especificamente. Não houve resposta, então ela repetiu: — Qual dos grãos-duques?

Isso... com certeza elas iriam querer saber. Richard olhou para baixo e mordeu os lábios, muito receoso em responder. Elas já estavam tão fragilizadas, poderia ser ainda pior revelar, mas... deveria ser assim.

— O segundo filho mais velho do imperador... — Todos voltaram-se para Richard, menos Cathrine, claro, completamente horrorizados. O marquês disse então: — Konstantin.

Aumentando ainda mais o horror, eles arregalaram os olhos. Por isso mesmo Richard tinha tanto medo de falar, era terrível! Seria um casamento com o grão-duque Konstantin, o... focinho de porco.

— Não! Konstantin não, Richard! — E Robert comentou novamente. O duque de Kendal levantou e apontou em direção ao irmão mais velho. — Nenhuma de nossas irmãs casará com esse grão-duque!

— Estamos tão horrorizados quanto você, Robert, mas não tivemos escolha. — Com a falta de resposta de Richard, foi Cathrine que respondeu, tentando ao máximo mostrar-se calma. — O tsesarevich Alexandre já é casado, enquanto o grão-duque Nicholas é muito jovem, sobrou apenas Konstantin.

— O grão-duque Konstantin é um bruto, um homem conhecido pelo temperamento violento e... rude... — Voltando-se na direção deles, bem como chamando atenção, Anne falou praticamente para si mesma. — Mary... se alguém deve sofrer nessa história, essa pessoa sou eu. Eu casarei com o grão-duque, enquanto você... você será feliz com Fritz.

Os olhos de Mary arregalaram, tanto que ela levantou e aproximou-se da irmã, negando veemente.

— Mas e você, Anne? Você não será feliz! — A princesa mais velha sorriu debilmente e assentiu. Mary novamente negou. — Eu jamais poderia ser feliz ao lado do seu amor, nunca!

— E eu jamais poderia ser feliz sabendo que fiz minha irmãzinha casar com um monstro! — Nenhum deles poderia, na verdade. Respirando fundo, Anne pegou as mãos de Mary e a olhou bem fundo nos olhos. — Sejamos racionais, Mary.

— Estou sendo racional, muito racional. — Soltando-se da irmã, Mary respondeu com toda a determinação. — Se você casar com Konstantin, não será apenas você a infeliz, mas também eu e o príncipe Friedrich, pois eu nunca poderia amá-lo! Mas não será assim caso eu fique com Konstantin.

— Não... não quero sua tristeza...!

— Somos ensinados desde cedo que devemos fazer sacrifícios. Felicidade, bem-estar e satisfação pessoal são coisas supérfluas, devemos deixá-las de lado pelo bem maior. Eu casarei com Konstantin. — Mary estava decidida, mas não eles. Era perceptível que ela queria chorar. — Serei uma Andrômeda dada como sacrifício ao Ceto, porém... não haverá Perseu dessa vez.

Oh Deus! O coração de Richard apertava com tudo isso, ele abriu a boca e tentou falar algo, mas Mary levantou a mão, sorrindo docemente.

— Está decidido, não tentem me convencer do contrário. — Ela realmente sorria, embora não um sorriso belo. — Irei para meus aposentos, então não me perturbem.

Dito isso, a princesa caçula saiu correndo da sala, sendo quase imediatamente seguida por Anne, que foi para os próprios aposentos. O silêncio instaurou-se, até que o olhar de Richard recaiu em Robert, cuja expressão... se houvesse uma pistola nessa casa, com certeza daqui a dez dias ele estaria descansando no mausoléu da família.

— Tudo que acontecer com Mary será culpa sua, Richard. APENAS SUA! — Após gritar furiosamente, Robert deu as costas e saiu da sala.

Em seu lugar, Richard apertou fortemente os punhos, sentindo uma imensa raiva e vergonha dele mesmo. Robert... Robert não estava errado, a culpa seria dele, unicamente dele! O marquês fechou os olhos, tentou manter a calma, mas... ele derrubou fortemente uma mesa, fazendo Cathrine recuar, e afastou-se.

Passando o susto, Cathrine negou e foi para perto do marido. Ambos ficaram em silêncio, até que a marquesa pegou amorosamente a mão dele.

— Sinto como se eu fosse o monstro da história, Cathrine. — Não tendo força alguma para olhá-la nos olhos, Richard falou ferido. — Eu sacrifiquei a minha irmãzinha.

— Todos temos que fazer sacrifícios na vida, sejam eles fáceis ou difíceis. Mary está fazendo o dela. — Mas que tipo de sacrifício era esse? Mary não tinha nem 14 anos! Cathrine apertou novamente a mão dele. — Tenho certeza que Mary conquistará o coração do grão-duque, senão isso, conquistará o da família imperial.

Pode ser que sim, pode ser que não, quem poderia garantir? Suspirando, Richard assentiu. Ambos ficaram novamente em silêncio, até que Cathrine pegou o rosto dele e o beijou levemente.

— Por que do beijo?

— Para alegrá-lo. — Foi o suficiente para fazer Richard sorrir. Logo em seguida, o marquês fitou a barriga da esposa e a tocou carinhosamente.

— Nossos filhos não passarão pelo mesmo, Cathrine. — Richard se recusava a pensar numa coisa dessas novamente, ele encarou a esposa. — Eu prometo.

Cathrine sorriu e assentiu, Richard estava determinado nessa ideia. Ele não pode impedir o sofrimento dos irmãos, fosse grande ou pequeno, ruim ou apenas desagradável, mas ele faria o possível e o impossível para evitar o sofrimento das crianças deles... nem que fosse necessário morrer.


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Notas finais do capítulo

* Esse é o fim de uma fase, com certeza. Estamos no capítulo 16, então no próximo já teremos uma passagem de tempo. Devo dizer que a partir daqui as coisas ficam mais emocionantes ainda, e tristes também... parece até novela mexicana, só tem desgraça. De qualquer forma, espero que vocês, leitores, estejam gostando da história até aqui.

* Curiosidade: quando estava editando esse capítulo, eu achei muito estranho essa reação tão ansiosa de Cathrine durante a conversa com Lord Grenville, não era pra ela ser tímida, afinal de contas? Sim, mas então eu lembrei que as mulheres produzem mais hormônios durante a gravidez, então elas ficam mais sensíveis, são fáceis de irritar. Eis o motivo.

* E quanto ao relacionamento de Anne e Fritz, gostaram? Ainda não acabou, está longe, mas devo dizer que minha opinião pessoal sobre o que fiz, mesmo que eu não possa no momento declará-la bem, está no texto mesmo. Busquem a acharão.

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