Ochako se abaixa, à espreita como um leão observando silenciosamente sua presa antes de decidir como vai atacar. A Kodai, a Komori e o Deku se alternam em ataques contra o Vlad King-sensei, as meninas criaram uma série de distrações atirando entulho e isolando-os de forma que nenhuma “vítima” se machucasse mais por conta da luta. É improvisado e meio desajeitado, mas eles não tiveram muito tempo de se organizar quando o professor pegou o Deku e a Kodai de surpresa no prédio que eles vasculhavam para achar mais dummies. Assim que Ochako ouviu os barulhos de ataques, puxou a Komori antes que elas pudessem ser vistas e, com uma deselegância tão convincente que poderia ser o próprio Bakugou, segurou-a pelo braço e se abaixou pra sussurrar no ouvido dela.

—  Vai lá e ajuda eles.

—  E você? Não vem?

—  Depois, eu vou deixar vocês cansarem o professor e pegá-lo de surpresa.

—  Eu não te conheço direito, Bakugou-kun, mas não… parece algo que você faria.

Exatamente, porque não é o que ela planeja fazer de verdade.

—  Eu sei, mas você vai ter que confiar em mim. Vocês três. Aqui. —  ela fuça nos bolsos das largas calças do uniforme, sacando três granadas —  Uma pra cada um, só usem como último recurso, esse prédio já tá caindo aos pedaços, uma explosão ia terminar de derrubar tudo! É por isso que a gente precisa levar essa luta pra fora daqui! Você consegue né, Komori-san? —  ela arregala os olhos e cora, e só aí Ochako percebe que tá com o rosto praticamente colado no dela — Aaargh, foi mal! — ela se afasta, corando também — Eu… vou ficar à espreita naquele buraco ali, façam de tudo pra levar o professor pra lá, e… hã… fala pro Deku que… é bom ele não ir achando que vai resolver tudo sozinho, eu vou tá lá pra acabar com tudo. —  Ochako diz no tom mais irritado que consegue e, no fim, dá uma piscadinha, torcendo para que a Komori entenda a mensagem.

—  Certo, eu vou… passar seu recado. —  ela ainda está corando, talvez a piscadinha não tenha sido uma boa ideia…

—  Conto com você! Boa sorte… hã… porra! —  Ochako acena com a cabeça e corre pelo caminho de onde veio, jogando todo o peso sobre as pernas para saltar e se agarrar a uma janela do prédio em ruínas. Balançando o corpo, ela pega mais impulso para alcançar a janela na diagonal. Seria bem mais fácil subir com as explosões, mas o barulho delas alertaria o Vlad King-sensei de sua presença e estragaria o elemento surpresa.

Porque só o fato de ela ser o elemento surpresa já é uma surpresa em si. Quer dizer, não ela, mas o Bakugou, porque é bem incomum vê-lo como a incógnita de uma equipe, Ochako já esteve em times com ele durante algumas aulas e é incrível como o Bakugou sempre parte pra cima e nem pensa em ficar à espreita pra tentar surpreender o adversário, ele ataca de frente, fazendo muito barulho tanto com as explosões quanto com sua gritaria. Não dá pra dizer que não funciona, é só ver a posição dele no ranking da sala pra notar que essa estratégia ultra ofensiva traz resultados quase perfeitos, mas na opinião dela, tem um potencial desperdiçado aí, que é o Bakugou como fator surpresa. Um potencial que Ochako pode tentar explorar já que tem essa chance.

Alcançando o buraco no piso em que sua equipe luta, ela se apoia contra a parede e faz outra coisa raríssima de se ver no Bakugou: espera.

—  É triste como vocês heróis têm a vantagem numérica e ainda não são páreo para mim! —  o Vlad King-sensei dá uma risada maligna, e Ochako se repreende por querer rir, parece o Iida tentando atuar nos exercícios quando ele cai como vilão —  Isso porque vocês ainda estão com um a menos, cadê aquele moleque que tem uma bomba no lugar de um cérebro? — Nossa! Ok, agora ele foi bem convincente no insulto, Ochako tomou as dores pra si mesma.

—  Ele nos abandonou pra pegar o Eraserhead sozinho já faz tempo, não que a gente precise dele pra te impedir! —  o Deku retruca.

—  Ah é? Que pena! Além de ser reprovado, ele ainda perdeu a oportunidade de ser derrotado por mim!

—  Eu não contaria com isso… agora, Kodai-san! —  o Deku berra, e mesmo que a ideia sempre fora tirar o professor de dentro do prédio, Ochako ainda arregala os olhos ao vê-lo ser lançado pra fora do buraco por uma pedra quase do tamanho de uma motocicleta.

Mas o Vlad King-sensei é amplamente conhecido por sua velocidade, reagindo rápido ao lançar seu sangue para cima para que forme uma espécie de gancho que se finca na parede e o impede de cair. Ochako é um pouco menos rápida, mas consegue pular pra dentro do buraco antes de ser vista.

—  Ah, então ele estava mesmo se escondendo. —  a Kodai observa sem um pingo de surpresa.

—  U- Kacchan! Eu recebi seu recado!  — o Deku acena com a cabeça firmemente —  Tá pronto?

—  Quando é que eu não tô pronto, seu nerd maldito? —  ela sorri maniacamente.

O sangue que o professor expeliu lembra tentáculos ao seu redor quando ele emerge, já recuperado do golpe com a pedra.

—  Isso é o melhor que vocês conseguem faz —  ele arregala os olhos ao se deparar com um Deku envolto na estática de seu poder, pernas em posição enquanto vai para cima do professor com tudo. Ochako já consegue ouví-lo anunciando seu “Manchester Smash”, mas, antes que ele possa, um cogumelo enorme surge diante dele, bloqueando seu caminho.

—  Agora, Kacchan!

Essa é a deixa de Ochako para usar a cabeça fofinha do cogumelo como um trampolim para lançá-la por cima do buraco, dando à ela acesso à nuca do Vlad King, onde ela conclui o movimento que estava tentando fazer com o Bakugou hoje de manhã. Ela o puxa pelo pescoço, mas como ele é extremamente pesado, não se dobra inteiro, Ochako acerta uma explosão na altura do ombro dele, o ideal era acertar o peito, mas tudo bem, é o bastante para jogá-lo para frente, rumo a um Deku que usou sua velocidade para chegar ao chão e já se prepara para pegar impulso e chutá-lo.

—  Você… —  ele parece um pouco desnorteado, mais com o barulho da explosão do que com o impacto, e muito surpreso por ver o “Bakugou” aqui.

—  Se quer um conselho, sensei, eu sugiro você se render bem rápido. —  antes de cair, ela dá um sorrisinho e olha na direção de onde o Deku está, a base do cogumelo destruída por ele e o caminho livre para ele acertar o prometido chute.

—--

—  Onde você arrumou essa corda, Kodai-san? —  o Deku pergunta enquanto Ochako termina de atar o nó no Vlad King-sensei, que sabiamente se rendeu antes de ser acertado pelo Manchester Smash. Um chute desses com certeza seria capaz de fazer um estrago considerável, mesmo em alguém tão assustadoramente resistente quanto ele.

—  É só um lacinho de cabelo que eu cortei e deixei crescer. —  o Deku parece admirado com o poder dela, já ela diz isso como se tivesse falando “saúde” pra alguém que acabou de espirrar.

— Kodai, ótimo uso da sua individualidade para ataque. Komori, bom trabalho em criar o cogumelo gigante que serviu tanto como distração quanto como artifício de ataque. Inesperado vocês deixarem o aluno Bakugou como fator surpresa, e louvável como vocês fizeram de tudo para levar a batalha para fora do prédio pensando em possíveis vítimas que ainda estariam ali, acredito que tenha sido ideia sua, Midoriya.

—  Foi ideia do Bakugou-kun, sensei. —  a Komori o corrige, e Ochako se segura pra não sorrir, a última coisa que ela precisa é o Bakugou ganhando uma admiradora agora.

—  Certo. Bom trabalho, Midoriya e Bakugou, o Eraser vai ficar tão orgulhoso quanto eu estou agora. —  o Deku cora violentamente e se curva pra agradecer. Ochako quer fazer o mesmo, mas se contém, o Bakugou é um pouco mais educado com professores, mas também não é pra tanto.

— Aí, Deku, como você… entendeu que eu quis dizer pra me esperar dar o golpe final se nem fui eu que te falei?

—  Ah… quando a Komori-san chegou sozinha, eu fiquei preocupado por um minuto, mas sabia que você tava por perto, você não ia abandonar o grupo, não é seu estilo. —  Ochako acena com a cabeça, é incrível como ele entende o Bakugou em outro nível, mesmo que ela não tenha sido muito clara no recado, é… reconfortante como ela consegue se comunicar com ele numa situação de urgência assim. Deku e Uravity são uma ótima dupla mesmo quando Uravity tá um pouquiiiinho diferente, mesmo que Midoriya e Uraraka não se tornem um casal. —  Bom, faltam uns minutinhos de prova ainda, a gente pode não ter salvado muita gente, mas derrotamos o vilão, então acho que nossa nota vai ser boa e- — por mais que Ochako adore ouví-lo quando ele fica alegrinho assim, outro som chama sua atenção, é um barulho agudo… parece com… miados?

—  Deku, tá ouvindo isso?

—  Isso o quê, Kacchan?

—  Uns miadinhos, acho que- —  ela olha ao redor, procurando a fonte do barulho, e corre até uma construção bem pequena, mas quase que completamente detonada, provavelmente era para parecer uma casa de dois andares quando tava inteira. Usando uma explosão para alcançar o segundo piso, Ochako encontra o que estava procurando: um gatinho, não um dummy de gatinho, mas um gatinho de verdade, encolhido e encurvado numa bola, visivelmente apavorado —  Ah… como você chegou aqui? Vem cá! — ela estica a mão, e o gatinho se recolhe ainda mais — Se o Koda-kun tivesse aqui… vem aqui, chaninho. — Ochako se ajoelha, aproximando-se bem devagar pra não assustá-lo ainda mais, o gatinho cheira o ar, provavelmente notando o odor forte da nitroglicerina.

Ai, ela tomou um soco do Bakugou na costela e não deu nada, não vai morrer com uns arranhões do gato! Eles precisam sair daqui antes que esse prédio caia. Ochako se levanta subitamente e pega o gato antes que ele fuja.

—  Kacchan? O que tá acontecendo aí? —  ele arregala os olhos quando vê o que ela traz em mãos —  Um gato de verdade? O que tá fazendo aí?

—  Não sei, vai ver entrou aqui de noite e não conseguiu fugir quando a prova começou, tadinho, o coração dele tá acelerado! —  ela se lembra da foto que a mãe do Bakugou lhe mostrou, ele criancinha segurando o gato que salvou, e o coração dela acelera tanto quanto o do gato. Que coisa, ela só se lembrou de uma foto, imagina como tava o coração dela quando Ochako achou que o Bakugou fosse beijá-la ou… quando ela quis beijá-lo hoje de manhã quando ele a prendeu no chão… como se um semáforo brilhasse na sua cabeça, ela percebe que apesar de imaginar como seria namorar o Deku, Ochako não consegue se imaginar beijando-o na boca, é só… estranho demais se imaginar fazendo isso, não só com ele, mas com quer que seja… tirando o Bakugou, pode-se afirmar que ela não dormiu bem ontem à noite porque beijá-lo é a única coisa que ela tem na cabeça desde então.

—  Uraraka-san, cuidado!!! —  Ochako sente um empurrão forte atingindo-a no ombro e jogando-a pra longe, o gato sai correndo e choramingando quando ela cai no chão com tudo, tossindo pela nuvem de poeira que se alastra. A construção que parecia prestes a desabar acaba cumprindo seu destino, o que ela não esperava era não ter sequer ouvido os rangidos, absorta em sua bagunça de sentimentos. Outra coisa que ela não esperava era o Deku ter ficado preso entre os destroços ao tê-la empurrado.

—  D-Deku, seu… idiota! O que você…  — mais uma coisa que ela não notou antes: ele não falou “Kacchan” —  Você é maluco?! Por que você fez isso?

—  Porque… —  ele tosse — Nós somos Deku e Uravity, uma dupla infalível salvando as pessoas quando não estão… salvando um ao outro —  o Deku sorri serenamente, deixando-a em choque.

O barulho de sirene ecoa por todo o cenário. 

A prova acabou.

***

Bros da 2-A

[11:37] PegaNasMinhasBolas: e aí??? alguém sabe se o Bacuckgou empurrou o Midoriya de propósito?

[11:37] PegaNasMinhasBolas: vcs colocaram ele de volta no grupo né? QUEREMOS RESPOSTAS, BACUCKGOU!

[11:37] HANTAstico: na boa bro, desiste desse apelido pq nunca vai colar

[11:38] HANTAstico: tenderam a piada? “colar” KKKKKK

[11:38] PegaNasMinhasBolas: nossa mas vc é muito engra kkkk vamos rir com o nick dele e as piadinhas gente

[11:39] HANTAstico: a piada foi uma bosta mesmo, eu assumo

[11:39] HANTAstico: agora meu nick novo foi a Mina que colocou, NÃO OUSE falar mal

[11:40] PegaNasMinhasBolas: mangina ¬¬

[11:40] HANTAstico: num sei o que é isso e nao quero saber

[11:41] Choque_do_trovao: o Bakubro e o Midoriya podem n ser melhores amigos, mas o biriba nunca ia fazer isso

[11:42] Choque_do_trovao: pelo menos nao com aquele monte de câmera filmando a prova hhuahushu

[11:42] HANTAstico: a Mina me falou que tinha um gato preso no entulho e o Bakubro salvou, o negócio desabou e o Midoriya empurrou ele mas n conseguiu escapar

[11:43] PegaNasMinhasBolas: mas n faz sentido

[11:43] PegaNasMinhasBolas: como que o Midoriya ia se quebrar todo com um predinho daqueles qnd ele pode só descer um soco no negócio e quebrar tudo???

[11:44] HANTAstico:  deixa eu derrubar um prédio na sua cabeça sem te dar tempo de reagir pra ver se vc não se quebra inteiro também!

[11:45] Choque_do_trovao: huahuahushua

[11:45] HANTAstico: fora que ele nem se machucou tanto assim

[11:46] PegaNasMinhasBolas: hm, se for comparar o tanto que ele se quebrava no começo do curso, isso daí foi fichinha mesmo ‘-’

[11:47] PegaNasMinhasBolas: poxa e eu achando que o Bacuckgou tinha brigado com o Midoriya por causa da delícia da Uraraka

[11:47] PegaNasMinhasBolas: mas não, é só macho com macho, que nojeira!

Choque_do_trovao removeu PegaNasMinhasBolas do grupo

[11:48] Todoroki_Shouto: já não era sem tempo

[11:49] HANTAstico: EITA nem lembrava que vc tava aqui, Todoroki o.O

[11:49] Choque_do_trovao: o Eiji que pediu pra eu pôr ele

[11:50] Choque_do_trovao: ele tbm me pediu pra tirar o vacilão do Mineta se ele falasse merda

[11:51] HANTAstico: pode crê

[11:52] HANTAstico: falando no Kiri, ele tava na equipe da Uraraka, não tava?

[11:52] HANTAstico: é sério que foram eles que apagaram o incêndio? fiquei sabendo que eles arrancaram uma caixa d’água só pra isso!!! o.O

[11:53] Choque_do_trovao: parece que é isso mesmo, ele n me contou tudo, tava ocupado levando ela na enfermaria

[11:54] HANTAstico: enfermaria???

[11:55] Todoroki_Shouto: ela deslocou o ombro

[11:56] Choque_do_trovao: ah é, imagina que uma menina daquele tamanhinho ia erguer um negócio gigante daqueles e sair inteira! Celoko!

[11:57] HANTAstico: geeeent como vcs falam!!! e depois são as meninas é que só fazem fofoca ¬¬

[11:58] Choque_do_trovao: ???

[11:59] HANTAstico: Mina pegou meu celular, tchau! a gente vai estudar! 3bjs

[12:00] Choque_do_trovao: estudar, sei ¬¬

[12:01] Choque_do_trovao: …

[12:02] Todoroki_Shouto: …

[12:03] Todoroki_Shouto: você sabe o que tem de almoço hoje?

[12:03] Choque_do_trovao: sei nao mano

[12:04] Todoroki_Shouto: ...

[12:04] Todoroki_Shouto: certo… até mais

Ochako vira mais um copo d’água, o terceiro seguido desde que eles vieram para a enfermaria depois que a prova foi finalizada. Ela conseguiu tirar o Deku de debaixo dos escombros sem muita dificuldade, e ele parecia bem, mas foi os professores baterem o olho nele pra exigirem que ele fosse ver a Recovery Girl. O grupo da Mina e do Todoroki também vieram já que parece que o Aizawa-sensei pegou bem pesado com eles, então o tumulto nos corredores próximos à enfermaria é mais por conta de curiosidade do que por gente machucada de verdade. 

Ela não conseguiu ver o Bakugou ainda, mas parece que ele já foi liberado, Ochako sabia que tinha exagerado na luta mais cedo, só não imaginou que aquele ombro ia mesmo dar problema depois. Duas pessoas com quem ela se importa muito se machucaram por culpa dela, ela poderia virar um balde de água goela abaixo e isso não ia mudar. 

O Bakugou se machucou porque ela não se controlou e queria provar pra ele —  ou pra si mesma — que dá conta, que pode lutar de igual para igual com um garoto, lembrando-se do quão patética ela se sente quando o Deku se segura em seus treinos com ela. E o Deku se machucou por que ela tava distraída pensando em beijar o Bakugou. No fim, os dois se machucam porque ela tá com eles na cabeça. No fim, ela não salvou ninguém. Ochako tensiona os lábios, segurando as lágrimas.

—  Ei, não chora! As pessoas vão achar estranho se virem o Kacchan chorando. —  ela escuta um sussurro baixinho em sua orelha, e se vira pra encontrar o Deku olhando-a com um curativo na testa e um sorriso cansado —  Você deve ter um monte de perguntas, eu vou responder todas, mas é melhor a gente sair daqui antes. Vem, Uraraka-san.

Ochako o acompanha em silêncio, observando para ver se ninguém da sala deles vem atrás pra enchê-los de perguntas. Ela não tá com saco pra gente enxerida e com medo de ser desnecessariamente grosseira com quem se preocupa de verdade, tipo o Iida ou a Tsu. Seria aceitável e compreensivo se ela fosse o Bakugou, mas Ochako não é o Bakugou, por mais que ela tente, nunca será. Porque o verdadeiro Bakugou pode ser impetuoso e rude, mas nunca se descuidaria daquele jeito. 

Os dois acabam atrás do prédio dos dormitórios, a tensão podendo ser cortada com um canivete de tão densa.

—  O All Might adiou a divulgação das notas e o feedback pra amanhã. Melhor, né? Aí a gente vem mais calmo e com a cabeça mais fresca pra ver no que a gente errou e acertou. —  ele sorri, coçando a bochecha.

—  Desde quando você sabe, Deku? —  essa obviamente é a pergunta de abertura.

—  Eu… gostaria de falar que desde o começo, mas não é bem assim, eu achei que tinha alguma coisa estranha desde o começo, sim, mas não achei que fosse isso, aí a Eri-chan te chamou de Uraraka aquele dia, depois eu vi o jeito que ele lutou com o Todoroki-kun e tive certeza que aquela pessoa não era a Uraraka-san, eu… achei que era um vilão com uma individualidade de infiltração de mentes ou algo do gênero. É possível, não acha?

—  E assustador. —  ela murmura.

—  E como! Então eu confrontei a pessoa que estava com seu corpo um dia depois daquela luta com o Todoroki-kun e entendi que era o Kacchan, então ele me contou tudo.

—  Ele o quê? —  ela arregala os olhos e quase detona uma explosão em surpresa —  C-como? Por… por que ele faria isso? Ele- todo esse tempo aaargh! E eu me sentindo um lixo por ter contado pro Kirishima-kun!

—  O… o Kirishima-kun sabe? Ahhh, isso… faz sentido, agora eu entendi porque ele disse que ia ficar de olho na Uraraka na prova! —  o Deku parece diante de uma epifania, e Ochako se contorce de raiva e choque — N-não fica brava com o Kacchan, Uraraka-san, ele só me contou porque eu ia acabar lutando com ele achando que era um vilão e ia dar problema pra você! —  ele sacode os braços agitadamente.

—  Mas… mas Deku, se você sabia, por que não me falou nada? Por que…? Por que você… por que você me falou aquelas coisas no seu aniversário sabendo que era eu, por que você…? —  ela sente as lágrimas se acumularem.

—  Eu não queria te perturbar ainda mais com essa loucura toda, por isso concordei com o Kacchan em não te contar, nós dois só queríamos proteger seus sentimentos e… no domingo, Uraraka-san, eu… não devia ter te falado nada daquilo, eu sinto muito, só… queria que você soubesse de alguma forma que… você é importante demais pra mim, e que… eu não acho que você tem que se sentir obrigada a manter uma promessa comigo quando eu sei que não te mereço. Eu… o que você quer de mim, eu nunca vou conseguir te dar, Uraraka-san. Eu tenho que te deixar ir pra que você seja feliz de um jeito que não vai ser comigo.

—  Mas e o que você quer de mim, Deku-kun? Porque o que eu tô entendendo é você me dizendo que tem que me rejeitar “pelo meu próprio bem” mas você não quer me rejeitar, então por que você não fala comigo direito? Por que você não me trata como igual e me fala o que você tá pensando de verdade?

—  Porque não importa o que eu diga, você vai acabar me odiando, Uraraka! —  lágrimas e firmeza inundam os olhos dele, e Ochako se esquece de como respirar por um segundo —  E eu… eu posso não saber o que quero, mas sei o que não quero, e… eu fico te segurando pra dar a minha resposta porque… enquanto você estiver esperando por ela, você não vai me odiar. Eu sou um egoísta maldito, e você merece coisa melhor, você-

Ochako se move mais rápido do que ele se moveu pra salvá-la. Ele pode não ser muito robusto, mas é difícil abraçá-lo por inteiro quando ela está em seu próprio corpo, no corpo do Bakugou, ela consegue envolvê-lo por inteiro, as mãos grandes do Bakugou conseguem segurar a maior parte da cabeça dele, afundando os dedos nos densos cachos verdes. 

Ela o abraça com a mesma vontade e desespero daquela vez que ele perdeu o controle da própria individualidade. O Deku é incrível, forte, poderoso, mas tem esses momentos de fragilidade e medo que a lembram de que no fim, ele nada mais é do que um garoto. Ochako o abraça pra que ele se lembre também.

—  Nunca mais… chame o meu melhor amigo de egoísta maldito, eu vou te descer um socão se você fizer isso de novo na minha frente. —  ela murmura, expirando tremulamente quando ele retribui o abraço com sofreguidão. Eles ficam assim por sabe deus quanto tempo, não que importe, ela ficaria abraçada nele por todo o tempo que precisasse —  Ei, Deku?

—  Sim?

—  Feliz Aniversário… —  ela sussurra, arrepiando-se quando ele bufa uma risada e se solta do abraço, esfregando a manga da camisa nos olhos.

—  Não foi tão feliz porque eu te magoei, mas… obrigado, Uraraka-san. —  e por fim, Deku sorri aquele sorriso mágico que a fez se apaixonar uma vez.

E poderia fazê-la se apaixonar de novo.

Poderia?

***

Alguns minutos antes...

Katsuki gira o ombro beijado pela Recovery Girl, a dor nem tava tão grande, mas assim que o Kirishima e a mina da mãozona viram que ele tava machucado, arrastaram-no pra enfermaria e eles nem ficaram sabendo se foram aprovados ou não, tsk, povo doente que se preocupa mais com um ombrinho machucado do que terem a aprovação do All Might.

—  Hehehe, o Denki tirou o Mineta do grupo dos bros. —  o Kirishima ri sozinho enquanto olha pro celular. Que caralhos esse idiota fica o seguindo e agindo como se fosse amigão da Uraraka? Katsuki já o viu conversando com ela, mas geralmente a Rosinha tá junto, só porque eles ficaram na mesma equipe, agora ele se acha íntimo da Uraraka? Tsk, bobão. —  Ah, você queria saber a nota, parece que o All Might vai falar só amanhã mesmo, o Midoriya se machucou e ele achou melhor adiar. — o Deku se machucou? Tsk, mas é um imbecil mesmo! Mas…

—  E o Bakugou?

—  Hum… parece que ele lutou com o Vlad King-sensei e salvou um gato. Bem másculo, não?

—  Um gato? Que gato?

—  Sei lá, mas aí, se a equipe dele pegou o vilão, então vão ter nota boa! Ah, e o Midoriya tá bem, se você quer saber. —  ele não quer, mas a Uraraka quereria.

Porque o nerd maldito é o melhor amigo dela, ou um dos, já que o Quatro-Olhos e a Menina Sapo também são melhores amigos, só não são melhores amigos pra quem ela sente necessidade de se confessar, tsk, que besteira!

Uma confissão que aconteceu há um mês, nem parece tanto tempo, mas aconteceu coisa pra caralho nessas quatro semanas. Ela trocou de corpo com um cara, esse cara se apaixonou por ela, e de 24 horas em um dia, eles passam mais da metade juntos, treinando, estudando, lutando, flertando… ou será que é só ele flertando? 

Mas ela o chamou de “Katsuki”, ela cuida do corpo dele com carinho e dedicação, ela até o defende, ele a ouviu defendendo-o quando a menina Kinopio perguntou se ela ia abandonar o grupo e tentar fazer tudo sozinha, ela confia nele, já disse isso mais de uma vez, ela o considera um amigo, não o melhor amigo, mas… talvez amigo o suficiente pra ela querer se confessar um dia? Porque ele a vê como uma amiga pra quem quer se confessar

E ele vai se confessar, tomou a decisão assim que saiu da enfermaria e as meninas vieram cumprimentá-lo, impressionadas por saberem que foi ideia dele apagar o incêndio. Ochako merece esse e todo tipo de admiração, é uma maldita de uma deusa, então pode ficar todo mundo de joelhos e adorá-la, porque Katsuki quer que ela saiba o quão fodona ela é, mesmo que ela não acredite, ele vai fazê-la acreditar. Porque ele tá doido por essa menina, completamente de quatro, e se apaixonar é uma merda, mas se é por ela, ele não liga. Ele é tão foda que pode ser o herói número 1 E o namorado que ela merece. Katsuki vai dar a ela essa opção: deixá-la saber que não é só o Deku nessa porra, a escolha é dela, Ochako deveria ao menos saber que é assim que ele se sente.

Então é isso, assim que eles se encontrarem nos dormitórios, ele vai falar. Ela não precisa responder agora, é melhor que responda depois que destrocarem, diferente do Deku, ela merece um tempo pra pensar. Katsuki sente as mãos suarem ao se aproximar dos dormitórios, ele até veio pelo atalho que o Kirishima sugeriu porque quer chegar mais rápido e vê-la, contar o que fez na prova, perguntar que raio de gato é esse que tão falando e deixá-la saber que ele gosta dela.

—  Hã… Uraraka, é melhor a gente dar a volta.

—  Hã? Não foi você que falou pra gente vir por esse atalho porque era mais rápido?

—  É, mas eu… hã, lembrei que dá praticamente na mesma indo pelo outro lado, hahaha! Como eu sou burro! Anda, vamo por ali. —  ele põe a mão no ombro dele e tenta puxá-lo.

—  Que… qual é a sua, Kirishima-kun? Desde quando eu te dei liberdade pra ficar me pegando assim? Eu vou falar pro Pi- pro Kaminari-kun e você vai ver!

—  Ok, ok, você faz o que você quiser depois que a gente sair daqui! —  o idiota parece aflito, olhando pro lado. Katsuki franze o cenho e olha na mesma direção que ele, tem duas pessoas ali atrás dos arbustos, como esse corpo é baixinho, ele não consegue ver direito, então se aproxima, ambas as figuras bem familiares —  Uraraka, não!

Ele vê a si mesmo em uma cena pra lá de esquisita que parece saída de um pesadelo: seu próprio corpo abraçado ao do Deku. Katsuki se lembra de uma vez no primário em que um professor o forçou a abraçar o merdinha e pedir desculpas, o ódio que ele sentiu naquele dia não chega nem à metade do que tá sentindo agora.

Porque não é ele abraçando o nerd maldito, é a Ochako abraçando o Deku. E quando eles se soltam, não dá pra ver a cara do merdinha, mas ele consegue ver sua própria cara, a cara dela: ela tá sorrindo. Katsuki não é burro, ele sabe o que rolou, ela descobriu que o Deku sabe e, diferente do que ele imaginou, não ficou triste. Ochako ficou feliz que pode contar a verdade pro melhor amigo que ela tanto gosta… tanto… ama.

Porque mesmo sem saber que tinha outras opções, ela já fez a escolha dela. E Katsuki é um puta de um idiota por achar que poderia ser diferente.

Não poderia.