Parceiros não tão Românticos escrita por Onni


Capítulo 1
A Proposta




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— Eu preciso de uma resposta.

 

Foi o que Izuku disse à Katsuki aos arredores da agência Lemillion, uma equipe de cerca de cinco outros heróis em seu entorno aguardando Deku para partir. A expressão intensa não combinava com o rosto gorducho na opinião de Katsuki – por mais que os anos tenham queimado a gordura extra e agora ele tinha um maxilar quadrangular rígido –, mas transmitia a urgência de Izuku.

 

— Não agora, não hoje. Daqui a seis meses. — Interrompeu-o quando Katsuki abriu a boca só para fechá-la imediatamente e apertar o olhar a ele.

 

— Deku, nós temos que ir — chamou Lemillion estendendo a mão em direção ao outro herói.

 

Com a deixa, Izuku respirou fundo junto a um cerrar das pálpebras soltando uma lufada profunda, então aquela expressão sorridente e cheia de brilho nos olhos viridianos iluminou-se para ele. Sim, isso era mais como ele.

 

As palavras faltaram em ambos os lados. Katsuki estava estupefato demais para sequer reagir, e Izuku estava apressado demais para dar alguma despedida piega. A mão enluvada verde foi estendida com algum intuito, Katsuki observou-a, logo caiu desistindo da ideia, então Deku se virou para seguir os outros heróis para a missão, de repente parou e deu uma última olhada para ele atrás com um aceno curto. 

 

Katsuki ficou enraizado no lugar por longos minutos mesmo depois de todos terem ido embora, ainda baqueado demais com as palavras derramadas sobre ele sem escrúpulos, seguido de uma partida fugaz acovardada.

 

Essa foi a última interação deles.

 

O que aconteceu a seguir foi totalmente fruto da memória muscular e rotina de anos.

 

A ficha caiu quando ele escovava os dentes para dormir, a realização piscando em seu rosto no reflexo do espelho.

 

Parceiros.

 

Izuku queria que eles fossem parceiros.

 

— Isso praticamente é um pedido de casamento — comentou Denki distraidamente pegando um pedaço gorduroso de pizza e levando à boca aberta.

 

O clique veio.

 

— Aquele fodido — vociferou estapeando a mesa fazendo tudo tremer e tilintar enquanto elevava-se atraindo a atenção do Bakusquad ao redor que mal se impressionou com a explosão. — Derrama merda em cima de mim e diz "beijo na bunda e até segunda, seu filho da puta" e quer que eu lide sozinho?!

 

— Quem está casando? — Mina perguntou, chegando com um copo de refrigerante e se sentando ao lado de Katsuki no sofá, não prestando atenção à revolta.

 

Denki, mastigando, apontou para Katsuki sem desviar o olhar do vídeo-game que Kirishima e Sero disputavam.

 

— E nem me chama para ser a madrinha?

 

Katsuki desceu de sua ira de volta ao sofá e segurou ambos os lados da cabeça como um homem condenado, Mina ainda insistiu em chacoalhá-lo querendo respostas, mas ele ignorou perdido nos próprios devaneios.

 

Com o barulho de chave no trinco da porta se emitiu, Kirishima gritou:

 

— 'Tá aberta!

 

Kyouka entrou com um sorriso singelo.

 

— Vocês começaram cedo. Do que estão falando?

 

— Algo sobre beijar bundas — disse Sero dando de ombros.

 

O olhar estranho com sobrancelhas arqueadas de Kyouka definiu o contexto todo.

 

Katsuki questionava que tipo de imã para atrair esquisitos ele tinha e por que pairavam ao redor dele como a porra do sol, e principalmente por que ele ainda os mantinha perto.

 

Kaminari era o décimo sétimo no ranking de heróis e estava se engasgando com o queijo, pelo amor!

 

Com todos indo socorrê-lo, seu descontentamento foi esquecido,  por hora. Foi bom porque assim Katsuki conseguiria colocar a cabeça no lugar. Deku não tinha sido muito específico se era secreto para o público ou se era seguro comentar com outros heróis próximos – vulgo seus amigos, vulgo os palermas que ele chamava de amigos. O assunto morreu aí.

 

O celular de Izuku estava desligado quando Katsuki tentou contatá-lo, mais de uma vez, por alguns dias. Se era uma missão secreta, qualquer meio de comunicação externo foi abolido.

 

Isso deixou Katsuki ansioso conforme o tempo foi passando sem contato ou qualquer sinal de Deku. E como sempre, a ansiedade se transformou em raiva, e a raiva ele descontava nos outros ao redor.

 

As explosões que saíam de suas palmas eram duas vezes maiores do que o necessário, não o suficiente para matar alguém, mas o suficiente para ser um perigo se não cauteloso. Kaminari reclamou com ele quando sua jaqueta foi queimada no meio do fogo cruzado entre uma gangue desordeira, ele choramingou tanto que Katsuki enfiou a peça violada na cara do outro loiro empurrando o rosto dele e arrastou-o para a oficina de suporte para fazer uma jaqueta nova que ele iria pagar. Até porque Katsuki não era um mau amigo.

 

Quando Sero veio por trás dele e gritou animado para todos quando eles se reuniram num final de semana, os reflexos afiados de Katsuki agiram por ele empurrando o outro com um tanto a mais de força o suficiente para machucar. Katsuki pagou um jantar para ele como pedido de desculpas, muito sutil, porém, coisa como "Vamos jantar naquele restaurante de yakisoba, eu pago." para o grupo, acontecia que era o restaurante preferido do moreno. Todos notaram sua intenção e sorriram compreensíveis.

 

Até mesmo durante uma missão, eles perderam o foragido e o último a persegui-lo foi Tsuyu. Lotado de estresse, cortisol, raiva e frustração, Katsuki gritou com a heroína sapo pelo deslize atrasando assim a missão. Tsuyu ficou impassível com todos os gritos e ataque de fúria, de certa forma entendeu que a raiva não era direcionada a ela e depois de todo o show, ela passou a mão nas costas dele e se ofereceu para tomar um café com ele, Katsuki aceitou e se desculpou com ela durante o intervalo da missão. Tsuyu sempre foi muito compreensiva.

 

Depois disso, Katsuki aprendeu a se contentar em guardar seus sentimentos para si, porque quanto mais ele demostrava ira, mais todos se preocupavam e se mantinham longe com medo de serem alvos de seus acessos de raiva.

 

Melhor assim porque Katsuki percebeu que teria que lidar com isso sozinho.

 

"Quero que pense com cautela."

 

E pior porque a cabeça de Katsuki não parava de rodar numa espiral de pensamentos, cheio de perguntas… era como se ele estivesse de novo no Ground Beta, só que sem o Deku lá para descontar a frustração sobre.

 

Para começo de conversa, há semanas ele não via Deku fora do trabalho ou dos noticiários. O cara que sempre foi uma constante em sua vida toda parecia tão distante agora e isso causava um tipo de sentimento bizarro de abandono. Desde que concluíram o ensino médio e ingressaram na carreira de heróis tinha sido assim, praticamente quase ninguém da turma tinha tempo sobrando para curtição, ainda mais eles que almejavam o topo. Izuku e Katsuki trocavam de posição tanto quanto o sol e a lua no céu, as festas de confraternização eram os únicos momentos que eles tinham para se encontrarem, mas na maioria das vezes eram engolidos por fãs e repórteres sedentos.

 

Embora a falta de contato, quando raramente escalados em missões juntas, Katsuki ainda podia sentir aquele vínculo arraigado. Quando Deku chamava-o pelo comunicador, Katsuki conhecia exatamente o sentimento transpassado na voz dele e se apressava a chegar onde Deku estivesse. Quando Katsuki preparava para contra-atacar, Deku o impulsionava e combinava seus golpes. Quando Deku tomava à frente com ataque direto, Katsuki ficava na linha de trás com tiros de longo alcance. Quando Deku tomava a retaguarda para proteger alguém, Katsuki o dava cobertura puxando a atenção do(s) vilão(ões) para ele. Ao fim da batalha, um sorriso vencedor surgia no rosto de Deku e ele o direcionava a Katsuki tão brilhante quanto o sol, e Katsuki o devolvia com o próprio sorriso arrogante enquanto um sentimento quente borbulhava em seu âmago e uma corrente elétrica de gratificação percorria-os.

 

Sim. Ali estava o vínculo. Ainda vívido apesar da distância.

 

E pensar que por muito tempo Katsuki queria extingui-lo por pura imaturidade. O eu dele de quinze anos mal iria imaginar o peso que esse vínculo traria.

 

A história deles foi escrita dentre linhas tortas, mas tudo contribuiu para o que eles tinham atualmente. E Deku queria dar um passo adiante nessa relação.

 

"Seja meu parceiro."

 

Não era muito o que Deku estava pedindo? Nem presentes eles estavam na vida do outro direito como costumavam na infância e adolescência, cada um ocupado com suas próprias vidas e escalados em turnos e missões diferentes.

 

"Eu não me vejo fazendo isso sem ser você."

 

E havia algum outro?

 

Isso mudaria drasticamente a rotina que Katsuki tanto prezava. A mídia faria um escândalo e haveria o triplo de repórteres, paparazzis e fãs loucos nos seus calcanhares. O trabalho seria dobrado. A responsabilidade pesaria ainda mais em seus ombros. Por outro lado… eles eram imbatíveis juntos. Os vilões tremiam aos seus pés.

 

Salvar para vencer e vencer para salvar. A dupla mais foda que esse mundo medíocre já viu.

 

Portanto, numa sexta-feira de manhã, uma discussão calorosa envolveu um terço da agência Mirko sobre quem era o infeliz que estava roubando os copos de plástico do segundo andar, começando porque Katsuki veio distrair de enfiar uma explosão na cara de sua chefe por ela socar-lhe relatórios atrás de relatórios impedindo-o de entrar em ativa, assim engolindo alguma coisa que não fosse sua terceira xícara café em plenas sete horas da manhã só para encontrar o repositório vazio.

 

— Ok, QUEM É FILHO DA PUTA…!?

 

Seu descontentamento atraiu atenção do segundo andar inteiro.

 

Katsuki estava sendo imparcial sobre ter que trazer uma garrafa d'água toda santa vez porque não podia beber apropriadamente do bebedouro público que seu trabalho pagava por porque não haviam copos e seu maldito dom dependia da porcaria do seu suor e ele não podia suar sem estar hidratado porque algum palerma do setor dezessete era um maníaco raptor compulsivo de copos…

 

Foi quando Mina irrompeu a discussão:

 

— Bakugou!

 

— Que é?! 

 

Toda a raiva se redirecionou para a pobre heroína rosa que não abalou a expressão urgente que sustentava.

 

— O Midoriya…! Ele voltou! Ele está te procurando!

 

Sua raiva morreu ali mesmo.

 

Livrados foram os funcionários do segundo andar porque Katsuki correu junto com Mina escadaria abaixo. Não seria hoje que o funcionário do setor dezessete sofreria com a ira do herói Dynamight por usar os copos de plástico como esculturas para presentear a telefonista do departamento ao lado do dele.

 

Havia um amontoado de pessoas, heróis principalmente, na sala de descanso no primeiro andar. Dentre todas as cabeças, a cabeleira verde inconfundível se destacou fazendo o coração de Katsuki dar um salto dentro do peito.

 

O barulho de suas explosões salpicando nas palmas foi o suficiente para atordoar a multidão e abrir caminho conforme ele foi se aproximando com obstinação até revelar a figura maltrapilha de Deku. Aos olhos viridianos encontrarem-se com o carmim fogoso brilhando reconhecimento, Deku abriu um sorriso cansado e deu alguns passos até ele antes de tropeçar com Katsuki o segurando sem problemas.

 

Deku agarrou-se nele para se estabilizar, as pernas se rendendo à fadiga, o corpo cedendo ao tremor mal se aguentando em pé. Mas ele tinha que se manter, porque ele precisava…

 

— Kacchan… eu preciso saber… — Deku agarrou as lapelas de seu uniforme para se erguer o suficiente para encará-lo nos olhos com a mesma obstinação que Katsuki veio a seu encontro. — … a minha proposta… eu preciso saber a sua resposta sobre ela.

 

Aquela mesma proposta que vinha atormentando-lhe nos últimos cinco meses e meio, a qual Katsuki pensava dia e noite, que roubava-lhe o sono e a paz porque Izuku tinha implantado aquela semente de dúvida na sua cabeça, que foi criando ramos no seu interior, enraizando em sua mente gerando reflexão, crescendo até chegar em seu coração e florescendo com frutos de certeza como uma árvore na primavera.

 

— Eu digo sim.

 

E como pétalas tomando seu tempo para desabrochar, o sorriso íntegro de Izuku foi surgindo e Katsuki acompanhou cada segundo da mudança de expressão como se visse em câmera lenta, tão habituado com aquele sorriso que puxava as bochechas gordas destacando as sardas estúpidas, mostrava as covinhas no cantos dos lábios, semicerrava os olhos dele, e tornava ele tão radiante capaz de iluminar uma maldita sala escura.

 

Tão rápido quanto veio, desvaneceu quando Izuku desmaiou de exaustão nos braços de Katsuki. E por alguma razão, talvez fosse o longo tempo separados e a saudade crua da presença do outro, Katsuki deixou Izuku descansar em seus braços um tanto demais do que o necessário.

 

— Que lindos — gracejou Mina não muito distante dali apontando o celular para eles a qual gravava o desenrolar todo.





O vídeo caiu na internet na conta oficial da heroína rosa.

 

A internet explodiu.

 

Os eventos a seguir prosseguiram a partir desse estopim.


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