Crise de fé - Avatrice escrita por KodS


Capítulo 3
Raiva


Notas iniciais do capítulo

Olá!
Então... Era para esse capítulo ter saído na quarta, mas não consegui terminar a tempo e por isso atrasei.
No entanto, eu não sei se consegui o que queria com esse capítulo, não tenho certeza se tô satisfeita.

Enfim...
Boa leitura



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/808554/chapter/3

If you never blinked, then I would’ve

Looked away at the first glance

If you taste poison, you could’ve

Spit me out at the first chance

 

And if I was some paint, did it splatter

On a promising grown (wo)man?

And if I was a child, did it matter

If you got to wash your hands?

No segundo dia, a dor em seu peito começava a apertar cada vez mais, tirando lágrimas grossas de seus olhos, mas seus pensamentos começavam a se pintar de vermelho. Começou como uma pontada, uma raiva voltada a si mesma. 

Ela não estava errada desde o início? Sempre havia estado. 

Foi por isso que entrou para a Igreja em primeiro lugar: se livrar do desejo impuro e pecaminoso por outras mulheres. 

Era claro que a culpa era de Beatrice. Ava tinha um namorado antes dela, não? O que isso significava para ela e para Ava?  

As informações passavam correndo por sua cabeça. Lembrava vagamente de um rapaz com quem Ava havia tentado fugir. 

Em que momento ela havia contagiado Ava? Porque ela poderia ter apenas virado o rosto. Foi aquele momento em que Beatrice lhe ajudou enquanto tentava atravessar seis metros de pedra? No momento em que seus olhos encontraram o dela com uma paixão reprovável?

Ava deveria tê-la afastado na vez, em todas as outras. Deveria ter evitado o contato físico e aquela proximidade perturbadora.  

Mas ela não era a culpada, não podia ser. Pelo menos não a única.

Por que sentia aquela necessidade constante de voltar todas as armas contra si mesma? Como se ela fosse a única que merecesse toda a raiva em seu peito. 

 

All I used to do was pray

Would’ve could’ve should’ve 

If you never looked my way

 

I would’ve stay on my knees

And I danm sure never would’ve dance with the devil

At nineteen

And the god’s honest truth is that the pain was heaven.

 

Não!

A principal culpada era Ava. 

Beatrice estava bem antes de tudo aquilo. Havia achado o seu lugar, onde se sentia parte de algo maior do que ela, um local onde ela apenas uma roda no mecanismo, uma parte importante, mas não pelo seu passado e onde quem ela amava não importava.

Ela amava todas as suas irmãs e esse era o único amor que importava em sua casa, em seu lar. Porque o amor fraternal era o único que importava e quem garantia que estariam sempre uma pela outra. 

Mas então Ava havia olhado em sua direção com aqueles olhos brilhando, com seu jeito intempestivo, levando-a para suas bebedeiras e a envolvendo cada vez mais em uma outra perspectiva de vida, uma perspectiva em que ela poderia ser mais do que uma parte de um maquinário, mais do que uma na multidão.

Só agora percebia que havia acreditado naquela ilusão que Ava havia criado para ela. Uma ilusão em que poderia apenas Beatrice, uma mulher livre e completa, conciliando todas as partes de sua vida que amava, com todas as partes que ela havia deixado adormecidas por tanto tempo. 

A verdade é que ela nunca havia sentido sua vida como realmente era: apática e solitária. Ela não tinha um grande amor que a movesse como Mary, nem a ambição implacável de Lilith, ela estava bem apenas sendo útil e fiel.

E quando Ava chegou, ela sabia que estava balançando sobre o limite. 

Sabia que a forma que o seu corpo reagia não era nada beatificado e Ava não parecia notar, ao menos foi o que pensou por um tempo. E então foram ficando mais constantes, os toques nos braços, os beijos nas bochechas até culminar naquele beijo que ainda fazia seus lábios formigarem. 

Ava sabia, sempre soube. Ela só estava mexendo com a cabeça de Beatrice, com seu coração e seus sentimentos e depois foi embora.

E agora Beatrice estava destruída e sozinha. 

Outro grito cortou o ar do quarto. 

E mais um. 

Beatrice podia sentir seus músculos tensos com toda a dor da perda e a irritação por Ava ter escolhido abandoná-la.

Porque foi uma escolha desde o início. Elas podiam ter achado outro jeito e mesmo que não houvesse, Ava não tinha o direito de cegar Beatrice naquela sala, de impedir que estivesse lá por ela no momento em que mais precisava. 

Ava não tinha o direito de se sacrificar sem dar a opção de Beatrice fazer o mesmo. 

 

And now that I’m grown

I’m scared of ghosts

Memories feel like weapons

And now that I know

I wish you left me wondering

 

Em um êxtase de sua fúria, Beatrice arrancou as roupas de cama. Elas eram as únicas coisas que não tinham nada a ver com a morte de Ava ou com o seu sofrimento, mas precisava descontar em algum lugar, alguma coisa. Qualquer coisa. 

— Bea! — o som da voz de Ava continuava a encontrando como um sussurro, um fantasma em seus calcanhares.

Mas se Ava podia encontrá-la, buscar por ela, por que não voltar? Por que torturá-la daquele jeito tão cruel?

Não importava o quanto as palavras finais de Ava rolassem por sua cabeça, ela não a amava, do contrário não faria nada daquilo, não entraria em sua cabeça, brincando com seus sentimentos, suas esperanças e sua fé. 

Era como uma facada em uma ferida aberta toda a vez que o “eu te amo” voltava como um eco daquele dia.

Ela sabia que não podia mais ficar trancada naquele quarto. Iria enlouquecer se não fizesse. 

Vestiu seu uniforme de treino e desceu para se juntar as outras freiras sob o sol da tarde.

 

If you never touched me, I would’ve

Gone along with the righteous 

If I never blushed, then they could’ve

Never whispered about this

 

And if you never saved me from boredom 

I could’ve gone on as I was

But, Lord, you made me feel important 

And then you tried to erase us.

 

 

O suor escorria por suas roupas, fazendo as roupas grudarem em suas roupas de forma desconfortável, mas isso não a incomodava de forma alguma. Estar entre as outras freiras, focadas em seu dever, sem sequer pensar que poderia haver alguns pecados no lado de fora do convento. 

Eram garotas novas, empolgadas com o novo propósito que encontravam em sua vida, da mesma forma que Camila havia estado poucos meses antes, da mesma forma que ela mesma havia sido há tantos anos atrás, quando fez seus votos. 

Tudo havia permanecido inalterado por muito tempo e então veio Ava com o seu toque reconfortante e afastou sua alma de todo aquele tédio ingênuo. 

Estar com Ava era sempre empolgante, eletrizante…

Intoxicante.

— Tudo bem? 

Beatrice já havia perdido a noção de muitas coisas por conta de Ava. Começou com a noção do tempo e, agora, das próprias ações. Não havia se dado conta do momento em que sentou, perdida em seus pensamentos, e ficou apenas observando para além das jovens que treinavam golpes e esquivas com bastões cobertos de espuma. 

Camila se sentava ao seu lado. Os cabelos cacheados caindo em frente ao rosto e as mãos unidas como em uma oração, apenas esperando pela resposta da amiga.

Eram uma das poucas que ainda restavam da época de Shannon e se preocupavam muito umas com as outras, e Camila mais do que qualquer outra. Beatrice havia sido a sua mentora mais próxima e ela já havia visto o que o luto fez com Mary.

Sua preocupação também era a mais antiga, havia começado no momento em que notou a crescente mudança na relação das duas, quando avisou que se apaixonar pela Irmã Guerreira era mais fácil do que amá-la.

Bea a encarou piscando confusa. Não havia ouvido uma palavra do que a amiga lhe disse.

— Tudo bem? — perguntou, segurando a mão de Beatrice, esperando que isso fosse o suficiente para manter a atenção dela ali. — Eu não vi você direito ontem e nem hoje. Fico feliz que esteja aqui. 

Beatrice sorriu, o sorriso mais triste que Camila já tinha visto em sua mentora. 

— Sim! — respondeu sem convicção. Queria dizer que Camila estava certa desde o princípio.

— Yasmine me contou o que viu. — A freira mais nova baixou o olhar, encarando a mão da amiga entre as suas. — Eu sinto muito, Bea. Eu não imagino o quanto deve estar sendo difícil para você.

Bea sentiu o aperto em sua garganta outra vez e encostou a cabeça no ombro de Camila. Era um tipo de intimidade que só possuía com Ava, mas precisava de consolo e haviam passado por tudo aquilo juntas. 

— Eu to bem. — repetiu mais uma vez. — Eu só… — ela sentia os olhos arderem com as lágrimas que começavam a represar em seus olhos. — Eu sinto tanta raiva dela, Camila, tanta raiva. — Os soluços começavam a balançar o seu peito. — Eu não sei porque ela não me pediu nenhuma ajuda. 

Mas ela havia pedido. Havia pedido que fugissem, que voltassem pros Alpes, que fossem só elas contra o mundo. Talvez Ava ainda estivesse viva.

— Eu me arrependo de tudo sobre ela. 

Beatrice sabia que cada palavra daquela confissão era uma mentira completa.

E então sentiu raiva de si mesma outra vez. 

 

God rest my soul

I miss who I used to be

The tomb won’t close

Stained glass windows in my mind

I regret you all the time

 

I can’t let this go

I fight with you in my sleep

The wound won’t close

I keep waiting for a sign

I regret you all the time.

 

If clarity’s in death, then why won’t this die?

[...]

Give me back my girlhood, it was mine first.

 

Camila também conhecia os verdadeiros sentimentos que Beatrice buscava esconder de si mesma e fez o sinal da cruz, esperando que isso fosse o suficiente para que isso salvasse Bea de suas blasfêmias.

Deus também a conhecia bem e tinha bondade suficiente para relevar. Ao menos o Deus de Camila tinha. 

Não haviam palavras para esse momento. Camila pensou na época em que perderam Shannon e a caçada incansável de Mary para vingá-la, que havia acabado com um mercenário no fundo de um despenhadeiro, mas Beatrice não tinha alguém palpável de quem sentir raiva, de quem se vingar.

Mas também não parecia justo que descontasse em Ava e por isso saiu em sua defesa.

— Ava fez o que… 

Mas Beatrice não estava disposta a ouvir e se levantou do banco. 

— Eu vou pra biblioteca. Com licença.

No entanto, Bea não foi para a biblioteca como havia dito. Se ajoelhou em um dos bancos da capela, escondida da visão de quem pudesse entrar. Quando era mais nova, costumava ir lá procurar por respostas com grande frequência.

Quando era mais jovem, costumava saber que o amor não era para ela, que tudo que deveria lhe trazer felicidade, só traria dor.

Mas já não era aquela jovem. Se conhecia melhor, tinha pessoas que a amavam e protegiam independente de qualquer coisa e havia esquecido as lições de infância. Talvez por isso a raiva de si mesma voltava a crescer em seu peito.

— Por que? — foi tudo o que conseguiu balbuciar. 

Deus a havia feito daquela forma e agora usava isso para puni-la. 

Ela chegou a ergue a mão, armada de uma lâmina de arremesso, pronta para acertar a imagem sacra a sua frente.

Respirou fundo.

Guardou a faca e limpou a lágrima solitária que escorreu. Amanhã era outro dia e, talvez, levasse toda a sua raiva embora.

 

And now that I'm grown

I'm scared of ghosts

Memories feel like weapons

 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Como falei, esse capítulo não tá lá essas coisas, mas se não postasse hoje ia enrolar o esquema todo e poderia até acabar desistindo, então vai assim mesmo.
Beijos e até terça!



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Crise de fé - Avatrice" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.