Stella escrita por Vic


Capítulo 28
Desconhecida


Notas iniciais do capítulo

Boa tarde! Demorou um pouquinho, mas saiu... espero que gostem.
Boa leitura!


CAPÍTULO REVISADO



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Stella não se sentia mais a protagonista de sua vida há muito tempo, era como se outra pessoa estivesse usurpando o seu lugar por tempo indeterminado, ela sentia muita vergonha de admitir isso, mas era infelizmente a mais pura verdade. Ela também sentia muita vergonha por estar mentindo para o marido, mas isso não era nada comparado a vergonha que ela sentia por ser uma péssima mãe para a filha que ela tanto sonhou em ter.

— Oi. – O homem fechou a porta ao terminar de colocar o carrinho para dentro enquanto a sua esposa se sentava no sofá e tentava se acostumar com toda aquela claridade invadindo os seus olhos.

A mulher tinha dormido no sofá na noite anterior, e ele achou melhor não a acordar, sabia que ela estava muito cansada do dia agitado que tiveram.

— Oi. – Olhou diretamente para o carrinho, notando que a sua filha estava com a mãozinha direita na boca e que os seus olhinhos estavam quase se fechando. – Como foi a caminhada?

— Eu me sinto outra pessoa. – Colocou a chave de casa em cima do primeiro móvel que viu. – E a Lily está com um pouquinho de sono. – Agachou-se na frente do carrinho e começou a desfivelar o cinto que prendia a menina a ele. – Você está exausta, não está, meu amorzinho?

Ela se espreguiçou e esticou as pernas enquanto o observava brincar com a filha deles.

— Mas isso é bom. – Bocejou. – Está quase na hora da soneca dela.

— Eu sei. – Pegou a menina no colo. – Mas escuta... esse bairro é mesmo perfeito para crianças. Tem muitas ciclovias, parquinhos, flores... aquelas amarelas... nar alguma coisa.

Ela deu uma boa risada.

— Narcisos.

— É, isso mesmo. – Arrumou a pequena, deixando-a deitar a cabeça no seu ombro. – Você quer caminhar com a gente amanhã?

— Claro. – Colocou uma mecha de cabelo atrás da orelha. – Eu acho que é até bom. Estou começando a me sentir melhor... então sei que vou conseguir superar isso.

— Então parece que toda a terapia e os remédios estão começando a funcionar mesmo. – Abriu um sorriso e começou a dar tapinhas nas costas do bebê. – Isso é uma maravilha! – Ambos estavam sorrindo. – Mas eu acho que você precisa se trocar, princesinha. – Afastou a criança do seu corpo para olhar a sua fralda, constatando o óbvio. – Voltamos daqui a pouco. – Seguiu com a menina rumo as escadas. – Vamos nessa, vamos ficar limpinhos.

Ela esperou só o som dos passos dele sumir e voltou a se deitar no sofá, não estava com vontade nenhuma de ir trabalhar e muito menos de ir até o consultório. O que ela queria mesmo era dormir e esquecer que o mundo existia, mas assim que olhou ao seu redor e notou toda aquela bagunça, soube que não podia se dar o luxo de fazer isso. No início, ainda tentou ignorar, mas o desejo de ver a casa em ordem falou mais alto, fazendo-a se levantar e começar a dobrar as roupas da filha que ainda estavam espalhadas pela sala.

— A Kate está lá em cima com a Lily. – Will colocou a maleta em cima do sofá e passou as mãos nas próprias roupas para arrumá-las um pouco mais. – Ela pode dobrar essas roupas para você.

— Eu achei que seria uma boa ideia tentar me conectar com a nossa filha de alguma forma. – Explicou enquanto jogava uma das roupas que não tinha conseguido dobrar em cima da pilha de roupas dobradas. – Mas pelo visto foi uma péssima ideia. – O homem não conseguiu evitar o olhar de preocupação que deu para a mulher, toda aquela distância entre as duas era muito preocupante. – Me desculpa, eu sei que isso foi muito rude.

— Mas eu... não estava te julgando, só fiquei...

— Eu entendo. – Cruzou os braços e saiu de perto das roupas. – Não precisa se explicar.

— Tudo bem... – Eles se aproximaram mais um do outro. – Eu queria...

— Eu só queria que você não fosse a polícia da terapia.

— Mas eu não sou... – Riu. – Eu era, mas não sou mais.

— Então foi mesmo só uma pergunta inocente?

— Foi.

— Ótimo. – Sorriu. – Eu li um artigo... não me lembro exatamente onde, mas falava justamente sobre isso. – Começou a procurar no meio da bagunça. – Eu acho que está por aqui em algum lugar.

— Eu acho que também li. – Começou a ajudar na busca. – Eu acho que foi há um mês mais ou menos, mas agora parece que é praticamente impossível achar alguma coisa nessa casa.

— Eu nem sei o que foi que aconteceu... – Abriu os braços, olhando em volta. – Eu era a pessoa mais organizada do mundo e agora parece que...

— Eu não quero que você se preocupe com nada disso. – Segurou o braço dela, fazendo-a se virar para olhar para ele. Ela sorriu com a atitude do marido, e foi recompensada com um beijo rápido e afetuoso nos lábios. – Um passo de cada vez, lembra? – Ela assentiu. – Eu te vejo no trabalho. – Concluiu dando mais um beijo em seus lábios. – Tchau.

— Eu só queria encontrar aquele bendito artigo. – Acompanhou o marido até a porta. – Mas eu prometo que não vou me atrasar para a terapia.

O homem se apoiou na porta para mantê-la aberta.

— Eu estou muito orgulhoso de você.

— É muito bom ouvir isso.

— Eu sei. – Beijou a mulher mais uma vez. – Tchau.

O sentimento de decepção voltou a pesar em seu peito assim que aquela porta se fechou. Ela ainda tentou arrumar algumas coisas, mas aquela bagunça tomaria muito mais tempo do que ela tinha disponível no momento. Então ela simplesmente entregou os pontos e voltou a se deitar no sofá.

A sua apatia aumentou ainda mais quando a temida hora de ir para a terapia chegou. Foi quase uma missão impossível entrar naquele prédio, mas ela entrou. A testa da mulher estava encostada naquela porta há quase dez minutos, e mesmo assim a coragem para bater ainda não havia chegado.

Ela até chegou a levantar a mão para bater, mas uma voz em sua mente a deteve em cima da hora. A detetive acabou indo embora do consultório sem sequer bater à porta, ela acabaria se arrependendo daquilo mais cedo ou mais tarde.

Ainda faltavam algumas horas para que o seu expediente começasse, mas mesmo assim, ela decidiu ir direto para o laboratório. O seu plano era muito simples, ficaria apenas olhando o lago enquanto torcia para que ninguém muito conhecido aparecesse por lá.

— Oi, Stella. – Uma voz a chamou do alto da escada e ela se virou rapidamente, por sorte era Michelle que vinha descendo as escadas com um saquinho nas mãos.

Ela abriu um sorriso aliviado antes de responder:

— Oi.

— Então é aqui que você se esconde. – Olhou ao redor, admirando toda a simplicidade do lugar. – É muito bom te ver.

— É muito bom te ver também.

Michelle apontou para a bolsa que ocupava o único espaço que deveria estar vazio.

— Você quer companhia?

— Mas é claro. – Retirou a bolsa do lugar e a mulher se sentou.

— É um lindo dia de primavera e tudo o que eu queria era uma pausinha... – Respirou fundo, sentindo o aroma das flores que tinham desabrochado há algumas semanas. – Para respirar. – Completou. – Eu ainda tenho muita coisa para fazer, tenho que arquivar uns casos e desarquivar outros... e ainda tenho que levar uns cupcakes para a festa da Melissa. Ah! Eu já tinha me esquecido disso... – Abriu o saquinho, fazendo a outra cair na risada, ela adorava todo aquele bom humor dos amigos. – Mas de qualquer forma, estou disposta a deixar tudo isso de lado e relaxar um pouco enquanto como esses brownies.

— É... – Tirou uma mecha de cabelo da frente do rosto. – É um dia perfeito para adiar compromissos.

— E o que era para você estar fazendo agora?

— Eu acho que agora não importa mais. – Riu. – É tarde demais.

— Entendi. – Mordeu um dos doces. – Era para eu estar na casa do meu ex agora, temos que conversar sobre a mudança da Maeve. – O orgulho em sua voz não passou despercebido. – Ela vai fazer faculdade fora.

Stella segurou a mão direita dela.

— Isso é maravilhoso.

— É sim, ela é uma garota muito inteligente e eu sei que ele está muito orgulhoso dela, mas eu preciso mesmo ir até lá... – O seu tom ficou mais sério. – Estou sempre preocupada com a possibilidade de alguma coisa dar errado, entende? É como se alguma coisa fosse explodir em cima de mim a qualquer momento.

— Eu sei exatamente como está se sentindo.

— Então vou sentar aqui e tentar não pensar em nada disso... e comer uns brownies. – Stella deu mais uma boa gargalhada. – Você gosta de chocolate? – Indagou, tirando um dos brownies do saquinho e oferecendo para ela.

Ela pegou o doce das mãos da amiga.

— É claro, era exatamente disso que eu estava precisando.

— Então vamos sentar aqui juntas comendo esses brownies e se divertindo um pouquinho. – Sua voz saiu meio esganiçada por conta de toda a sua animação. – Então me conta... como está a sua garotinha?

— Essa coisa... a maternidade, não é como eu imaginava.

— Mas toda mãe se sente assim na maioria das vezes. – Colocou um sorriso compreensivo nos lábios. – Eu também sei como é me sentir assim.

— Sabe?

— Sei.

— Mas você se acostumou com isso, não se acostumou?

— É claro que sim.

— É porque para mim... você é o verdadeiro exemplo de uma mulher bem-sucedida. – Ambas sorriram. – Você é uma mãe solo criando a Melissa e a Maeve, e ainda consegue arrumar tempo para cuidar do seu pai. Isso é incrível.

— Mas é uma troca, sabe? Você tem que abrir mão de algumas coisas. Eu amo dormir e sinto muita falta de conseguir dormir...

— Mas você já quis que as coisas fossem diferentes?

— Para mim? É claro, mas não me arrependo de ter tido as minhas filhas.

— Eu sei que essa é uma pergunta terrível, mas você não sente falta de ser responsável apenas por si mesma? Ou de estar no controle total da sua vida?

— Tem dias que eu sinto muita vontade de gritar... e tem dias que eu realmente grito, mas também tem dias que eu entro na cozinha e fico vendo a Melissa cozinhar, ou... fico vendo a Maeve lendo e é realmente lindo ter o privilégio de observá-las fazendo o que elas gostam de fazer. – Stella deu um longo suspiro, também gostaria de se sentir assim em relação à filha. – Eu não amo tudo, sabe? Ninguém ama... mas eu amo as minhas filhas, então acho que sim... eu amo ser mãe.

— Você tem muita sorte. – Murmurou, colocando o brownie em cima do saquinho para se levantar e se aproximar mais do lago. – E elas também.

— Você só precisa encontrar um equilíbrio entre os crimes e os cupcakes. – Também levantou, indo direto até ela. – E também é preciso entender que na maioria das vezes temos que estar dispostos a fazer alguns malabarismos... e que às vezes tudo o que você precisa é de um pouco de descanso. E quando finalmente estiver pronta, poderá voltar lá e começar tudo de novo. – A outra mulher virou para ela e encolheu os ombros, mas um sorrisinho surgiu em seus lábios. – E se eu fosse você... e tivesse uma bebezinha linda como aquela, eu estaria pegando-a no colo. Eu não consigo mais segurar as minhas filhas no colo, elas estão muito grandes e provavelmente eu acabaria dando um jeito nas minhas costas. – Elas riram. – Meu Deus, o seu marido é um cara tão legal... e ele te ama tanto e também ama tanto a sua filha, não é nada fácil ser mãe solo.

— Eu sei... – Murmurou, estava começando a se sentir culpada. – Eu sei que eu devia ser muito mais grata e eu sou, mas...

— Olha... de uma perfeccionista para outra... você precisa relaxar um pouco. Respira um pouco, porque vai chegar uma época que você vai vir trabalhar com pedacinhos de cenoura no cabelo, mas e daí? Tire um tempo para vir aqui comer uns brownies ou só para respirar um pouquinho.

— Tudo bem. – Sorriu. – Obrigada pelo conselho.

— Você tem que aprender a valorizar o que você tem agora, porque o tempo passa rapidinho. – Estalou os dedos. – Seja a melhor mãe que você puder ser... – Foi até o banco e pegou o saquinho, entregando para ela. – E lembre-se de que ninguém é perfeito.

— Obrigada.

— Eu acho que você precisa mais disso do que eu, pode acreditar. – Sorriram. – Eu te vejo mais tarde.

No consultório, o marido dela estava fazendo uma descoberta que tinha um enorme potencial de abalar a relação deles mais ainda.

— E então onde está a minha mulher? – Will questionou o psiquiatra, a confusão em seu rosto era clara. Era para ela estar saindo da consulta agora.

— Eu tive um probleminha com a minha linha telefônica, e se ela tiver tentado ligar para cancelar... – O semblante do outro homem se fechou. – Mas já está tudo arrumado e ela pode remarcar a consulta.

— Espera. – Respirou fundo. – Então quer dizer que a Stella não veio para a consulta?

— Não, ela não veio.

Naquele momento, Stella tinha acabado de chegar em casa.

— Muito obrigada, Kate. – Girou a chave na fechadura mais uma vez. – Espero que você e a Lily se divirtam muito no parque. Te vejo mais tarde. – Fechou a porta atrás de si. – E diga a Lily que a mamãe a ama muito. Ok. Tchau.

Ela colocou a bolsa e o saquinho em cima do sofá e olhou em volta, sua casa estava uma verdadeira bagunça. Então respirou fundo, aceitando que tinha que começar a arrumar tudo aquilo e começou a faxina. Em poucas horas estava tudo arrumado e limpo.

— Oi. – Abriu um sorriso orgulhoso assim que o marido passou pela porta. – O que você achou?

— Eu acho que você ficou muito ocupada. – Colocou suas coisas perto das dela.

— É. – Afastou o cobertor para longe do corpo, ficando de pé.

— E cadê a Lily?

— Ela foi ao parque com a Kate. – Foi na direção dele. – Eu achei que hoje era um ótimo dia para limpar e organizar tudo. Eu tinha até esquecido de o quanto amo fazer isso, é tão reconfortante.

Ele estava estranhando toda aquela animação, pois não condizia com a personalidade dela, mas mesmo assim sorriu.

— Ótimo.

— Sim, vem cá. – Segurou sua mão, levando-o até a estante de livros. – Aqui estão todos os livros sobre psicopatas. – Apontou para um espaço vazio no canto direito. – E essa parte aqui é dedicada exclusivamente aos artigos médicos. Eu consegui até encontrar aquele artigo que estávamos procurando. – Pegou o artigo e entregou para ele. – E olha só, tem fraldas aqui para um dia inteiro. – Mostrou a pilha de fraldas bem arrumadas para ele.

— E o que exatamente te deixou assim?

— Minha consulta com o doutor. – Respondeu com um sorriso ainda no rosto. – Me deixou muito mais inspirada.

— Então quer dizer que a sua sessão correu bem?

Ela sentou no sofá.

— Sim, muito bem.

— Algum motivo em particular?

— Não, nada de mais. – Explicou com muita simplicidade, ele nem estava acreditando na capacidade que ela tinha de mentir sem sentir nenhum remorso. – Eu acho que estou começando a me acostumar com isso, e também estou reaprendendo a administrar a minha vida e a retomar o controle das coisas.

O homem se sentou ao seu lado, entrelaçando os dedos uns nos outros.

— Sério?

— Mas que cara é essa? – O semblante dela também se fechou. – Eu achei que você fosse ficar feliz.

— E eu ficaria mesmo, Stella. – Soltou uma risada entristecida. – Se eu não soubesse que você está mentindo bem na minha cara. – Encarou a mulher. – Eu sei que você não foi para a terapia hoje.

A mulher deu um longo suspiro e se levantou, não estava nem acreditando que aquilo estava acontecendo outra vez.

— Meus parabéns, você me pegou mentindo...

— Mentindo de novo.

— É... – Cruzou os braços. – Está feliz?

— É óbvio que não, Stella. – Aumentou o tom de voz. – Eu não estou nem um pouco feliz com isso, e você? Está feliz?

— Isso é assustador para caralho. Você fica me seguindo o tempo todo... quando foi que deixou de ser o meu marido para se tornar o meu oficial da condicional?

— Eu fui te buscar. – Explicou enquanto se levantava, indo na sua direção. – Para tentar me redimir por ontem, e o doutor me contou do problema que ele teve na linha telefônica e me disse que você poderia ligar para remarcar a consulta. Eu não estava te seguindo. Eu nem sabia que tinha um problema, porque confiei em você e acreditei que você faria mesmo o que você disse que faria.

— Não, isso é mentira sua. – Fechou o punho. – A verdade é que você não confia em mim para lidar com a minha própria doença...

— Stella... – Fechou os olhos, respirando fundo. – Já conversamos sobre isso. Essa historinha de autocura não funciona! Essa merda não funciona! Agora me responde uma coisa... não foi você quem se sentou bem ali... – Apontou para o outro sofá. – E me disse que precisava de ajuda?

— Sim, mas existe muita diferença entre dizer isso e realmente seguir em frente.

— Muita diferença?

— Eu odeio a terapia, tá? – Levou as mãos ao rosto. – Eu odeio me sentar lá e ficar contando os meus problemas para uma pessoa que eu conheci há exatos dois minutos, que ainda vai ficar me julgando. – Fechou os olhos. – Eu nem sei porque estou te dizendo isso, você nunca entenderia mesmo.

— Mas estou tentando entender. – Rebateu. – Ajudaria se eu fosse com você?

— É muita gentileza sua, mas acho que não mudaria nada.

— Eu quis dizer que participaria da consulta junto com você, Stella.

— Oh! – Exclamou, dessa vez ele tinha mesmo a pegado de surpresa. – Tipo uma terapia de casal? Eu pensei que tinha sido da boca para fora.

— E no começo talvez até tenha sido, mas agora não é mais. – Chegou mais perto dela. – Está começando a ficar muito óbvio que o que estamos fazendo não está dando certo. – Ela continuou calada, estava mais calma e também mais disposta a ouvir. – E indo com você... eu teria a oportunidade de te ouvir num ambiente seguro e livre de censuras. Sem que nenhum de nós entre na defensiva.

— Certo, mas isso tem que ser uma via de mão dupla. Eu também quero saber exatamente o que você tem a dizer. – Saiu quase como um sussurro. – Você exagera um pouco, mas...

— Combinado. – Assentiu. – Eu acho que estamos mesmo precisando de uma sessão de terapia de casal. Eu vou ligar para o doutor e ver se ele pode nos atender.

Stella ainda não estava confortável com aquela ideia e aquilo estava estampado em seu rosto, mas mesmo assim ela foi. O homem caminhava à sua frente o tempo todo, e quando eles finalmente chegaram ao consultório, também foi ele quem colocou a mão naquela maçaneta.

— Viu? – Stella provocou. – Não é tão fácil quanto parece.

— Eu também preferia estar em qualquer outro lugar.

— Ainda não é tarde demais para mudar de ideia.

— Sem chance. – Girou a maçaneta, abrindo a porta.

— Oi. – O homem levantou da cadeira.

— Oi. – Sorriu, abrindo espaço para a mulher entrar. – Obrigado por nos atender. – Fechou a porta.

— Eu achei uma ótima ideia. – A mulher deu de ombros, não se importava nem um pouco com aquilo. – Vai ser ótimo para compensar a sessão que você perdeu.

— A ideia foi toda do meu marido. – Sorriram um para o outro. – Ele quase me prendeu por ter faltado e por ter mentido sobre isso. Eu me sinto péssima fazendo isso, mas espero que isso mude.

— Eu também espero que sim. – Indicou o sofá com um aceno. – Sentem-se. – Assim eles fizeram. – A sua mulher tem resistido muito ao tratamento, como se sente a respeito disso?

Ele suspirou, olhou para a mulher ao seu lado e pensou bem no que dizer.

— Com muita raiva. – O doutor assentiu, pedindo que ele continuasse. – E muito frustrado. Eu não entendo... eu não entendo porque ela não está dando tudo de si para fazer as coisas darem certo. Mas ainda assim tenho que me lembrar que é porque ela está doente, e o que me deixa louco é que eu sei que isso é curável... mas ela não aceita a ajuda de ninguém.

— Então você já teve a sensação de estar perdendo-a?

— Só quando a vi com outro homem. – Olhou para ela. – Ela não considerou que me tinha e que também tinha a nossa filha e... eu me controlei para não a confrontar naquele exato momento.

— Viu? É exatamente disso que eu estou falando... eu não sei porque ele não me disse. – Sustentou o olhar que o marido estava dando a ela. – Ele guardou essa informação como se fosse uma arma secreta e ficou esperando a hora certa para usá-la contra mim. – Explicou com uma expressão de poucos amigos. – Isso não é hostil para você?

— Claramente para você é.

— Eu não fiz nada disso... pode até parecer que fiz, mas...

Ela riu.

— Então você admite?

— Eu só não te confrontei antes porque eu não queria que você se afastasse mais ainda.

— Com certeza. – Um sorriso irônico surgiu em seus lábios. – Então a melhor opção foi gritar comigo na frente do laboratório inteiro?

— É exatamente disso que eu estou falando. – Arrumou sua postura, voltando-se diretamente para o outro homem. – Toda vez que eu digo qualquer coisa sobre o comportamento dela, ela acha que estou a atacando. Mas se eu não fizer nada... se eu ficar inventando desculpas, então estarei permitindo que ela continue fazendo isso. É impossível conversar com ela. – Ela respirou fundo. – Olha... para ser bem sincero... eu era um cara solteiro e feliz, era bem-sucedido, tinha dinheiro e mulheres. Eu tinha tudo o que eu queria e não trocaria isso por nada nesse mundo, mas então a conheci e tudo o que eu ouvia sobre o amor começou a fazer sentido, sabe? Que é incontrolável, que acontece mesmo que você não queira e que te faz querer coisas que você nunca nem tinha imaginado. Eu nunca nem pensei em me casar, ou em ser pai. – A mulher ao seu lado engasgou e começou a chorar. – Mas agora eu quero tudo isso... – Começou a piscar para conter as próprias lágrimas. – E ela não quer mais.

— Mas isso não é verdade. – Começou a limpar as lágrimas com as costas das mãos. – Eu ainda te quero, mas tem uma coisa tomando conta do meu corpo e eu estou só assistindo isso tudo acontecendo.

— Mas é exatamente esse o problema. – Limpou as lágrimas que escorriam por seu rosto. – Você está só assistindo as coisas acontecerem, está vendo tudo que construímos desmoronando, e eu juro que não entendo o porquê disso.

Uma das coisas mais difíceis desse mundo é olhar no espelho e não conseguir mais se reconhecer, era exatamente isso que estava acontecendo com ela no momento.

O relacionamento dos dois melhorou consideravelmente com aquela consulta, não era uma grande melhora, mas já era alguma coisa. Um passo de cada vez, como ele gostava de dizer. Naquela manhã, eles foram trabalhar juntos, nada de brigas e nem de carros separados. O homem estava cheio de coisas para fazer, mas precisava sair um pouco mais cedo para levar a filha ao pediatra, por isso tinha pressa para tentar resolver o máximo de pendências possíveis.

— Eu vou dar uma olhadinha nisso e depois te dou a minha opinião. – Stella dizia enquanto eles iam até onde Jas estava.

— Muito obrigado.

— É um prazer. – Abriu um sorriso, indo procurar algo nas gavetas. – Ei, será que... – Ficou calada. – Não, deixa para lá.

— Não. – Negou com a cabeça. – Você sabe que eu odeio quando você faz isso. Se tem alguma coisa para perguntar, pergunte.

— Eu só estava me perguntando se... – Mordiscou o lábio inferior. – Foi muito bom te ter na terapia comigo ontem. Será que existe alguma chance de você ir comigo outra vez?

— Eu ficaria muito feliz em ir.

— Você não odiou?

— Mas é claro que eu não odiei. – Colocou a mão no rosto dela, tirando uma mecha de cabelo que estava sobre seus olhos. – Aquilo me ajudou muito também, você pode contar comigo.

— Ótimo.

— Cuidado! – Lindsay gritou do alto da escada e eles se viraram com tempo de ver um gabinete de computador rolando escada abaixo.

— Você tem que tomar mais cuidado, ou vai acabar se machucando. – Jas alertou a amiga. – Eu sabia que esses computadores seriam um verdadeiro desastre aqui.

— Eu vou levar isso aqui para a manutenção antes de ir para casa. – Amenizou a situação, voltando sua atenção para o casal. – Eu estava mesmo procurando vocês. – Estendeu a sacola para a amiga. – A Luz ficou tão feliz com aquela boneca que vocês deram para ela que ela mesma escolheu isso aqui para a Lily.

A outra pegou a sacola das mãos dela e abriu.

— Mas não precisava. – Apertou o ursinho contra o rosto, sentindo a maciez da pelúcia. – É tão fofo!

— Eu acho que todos nós deveríamos ter um. – Encarou o gabinete em seus braços, dando um longo suspiro – Um anjo da guarda, não um urso.

— Ela vai amar, obrigada.

— De nada. – Sorriu. – Eu tenho que ir agora.

— Ele é lindo mesmo. – Apontou para o ursinho que estava nas mãos de sua esposa. – Eu não quero te pressionar e nem nada do tipo, mas a nossa filha tem uma consulta hoje, você quer ir?

— Claro. – Assentiu. – Eu quero sim, estou tomando os meus remédios e indo para a terapia, então acho que também consigo fazer isso.

Danny passou por eles com algumas amostras de sangue.

— Vamos precisar de você aqui o dia todo.

— Mas eu não posso, tenho que levar a minha filha para fazer uns exames.

— Eu levo. – Stella disse, chamando a atenção do marido. – O que foi? Eu sou a mãe dela. – Riu. – Eu consigo fazer isso.

— Tem certeza?

— Toda, eu a busco e levo até o consultório.

— Então tá bom. – Sorriu. – Então vocês podem contar comigo aqui. – Olhou novamente para a mulher e sorriu. – Boa sorte, eu te vejo mais tarde.

O pensamento positivo era uma das maiores armas que ela tinha no momento e era exatamente assim que ela tentava pensar enquanto apertava a última parte do cinto na cintura da filha. O hospital não ficava muito longe de casa, e foi por isso que ela decidiu que elas iriam andando até lá, assim aproveitariam para tomar um pouco de ar fresco e também para passar um tempo juntas.

— E aqui vamos nós. – Continuou conversando com a menina enquanto terminava de arrumar o restante das suas coisas. – A tia Lindsay te deu isso aqui. – Mostrou o ursinho para ela. – É o seu anjo da guarda, ela disse que ele vai te manter segura. – Colocou o chapéu na cabeça dela para protegê-la do sol. – Estamos indo ao médico, mas eles vão dizer que você é uma garotinha muito forte e saudável. – Sorriu. – A mamãe está melhorando, eu vou te contar um segredo... não estou mais tomando os remédios, mas acho que consigo ser uma boa mãe. – Pegou a bolsa de cima do sofá, foi até a porta e a abriu toda para conseguir passar com o carrinho. – E eu não quero que você se preocupe, você e eu conseguimos fazer isso.

A visita ao médico correu exatamente como ela esperava, a menina era uma criança muito saudável. Sua mãe ficou tão feliz com isso que decidiu passar no laboratório para compartilhar a notícia com o pai dela.

— E como foi a consulta? – Lindsay perguntou assim que a viu saindo do elevador.

Stella abriu um sorriso orgulhoso.

— Ela é perfeita.

A madrinha dela se agachou na altura do carrinho e começou a brincar com ela.

— Ouviu isso, meu amorzinho? Você é invencível.

— Será que você pode me fazer um favor? Pode dizer para o Will que estamos aqui? A Lily acabou de sair da consulta, e eu acho que ele vai gostar de vê-la um pouquinho.

Lindsay ficou de pé e desceu as escadas.

— Eu não o vi, mas se o vir, direi que vocês estão aqui.

— A mamãe está bem aqui, Lily. – Destravou o carrinho, puxando-o para longe da escada. – Eu preciso que você pegue um arquivo para mim! – Debruçou-se sobre o corrimão e gritou para a amiga.

Jas parou bem ao seu lado e disse:

— Eu pego.

Lindsay agradeceu com um sorriso e respondeu:

— Obrigada, amiga.

As duas foram direto até o bebê.

— E como é que está essa princesinha mais linda?

— Acabamos de fazer alguns exames de rotina. – Abriu um sorriso orgulhoso. – E ela está ótima.

— É isso aí, Lily! Bom trabalho! – Começou a fazer cócegas na menina. – Esse ursinho é muito fofo. – Apontou para o brinquedo nas mãos da amiga.

— A Lindsay deu pra ela. – Sacudiu o ursinho. – Agora ele é o anjo da guarda dela.

— Ótimo, um pouco de proteção nunca é demais.

— Eu queria ver o meu marido, mas acho que ele está muito ocupado.

— Eu ainda não o vi hoje, mas parece que você se saiu muito bem sem ele.

— Sim. – Estufou o peito. – Não que eu precisasse provar alguma coisa para alguém, mas eu consegui.

— Mas é exatamente para isso que os remédios servem.

Stella deixou uma risada escapar.

— Eu não estou mais tomando os remédios.

— Isso é muita irresponsabilidade, Stella. – Repreendeu a amiga, deixando um longo suspiro escapar. – O Will sabe disso?

— Ele não sabe. – Cruzou os braços. – E eu gostaria que você não dissesse nada para ele, deixe isso só entre nós.

— Mas ele precisa saber. – Stella negou com a cabeça. – É para o bem da família de vocês. Isso é muito perigoso, Stella.

— Eu quero que você pare de me tratar como uma criança! – Fechou a cara. – Eu já disse que estou bem!

— Mas não é o que parece...

— Mas está tudo sob controle...

— Me deixa te ajudar, querida. – Segurou o braço dela numa tentativa de apaziguar a situação.

— Não! – Gritou mais alto. – Me deixa em paz! Eu só quero que vocês me deixem em paz! – Puxou o braço, batendo-o direto no carrinho onde sua filha estava. – Lily! Lily!

O desespero que estava sentindo era tão grande que parecia que iria sufocá-la. Os possíveis cenários do que poderia acontecer com a menina não saíam de sua mente enquanto ela corria numa tentativa desesperada de salvar sua vida. Uma pergunta também martelava na sua cabeça sem parar, mas ela não aguentava nem pensar na possibilidade de ter esquecido de travar aquele maldito carrinho.


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Notas finais do capítulo

Eita... problemas...
Até sábado!



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