Constantemente eu penso na minha vida de uma forma negativa, mas depois de ver um filme idiota sobre androids, eu olhei pro lado e encontrei Zoro sentado no sofá em que eu estava sentado.

Desde quando ele estava ali?

— Desde sempre, sobrancelhas.

Desde sempre e ainda me irrita com essa simplicidade nas respostas. Conheci Zoro assim que me mudei de escola, uma que precisava acessar uma ladeira caso quisesse entrar. Tal ladeira era cansativa e eu praguejava tanto, pois já era difícil sair da cama e agora imagina você ter que subir uma só pra chegar num lugar que você não vai gostar nem um pouco.

Eu tinha certeza que minha nova escola seria um lugar que eu não gostaria de passar o tempo, porque constantemente mudava de colégio e as experiências nunca foram boas. Tudo dava a crer que naquela escola seria assim também.

E não foi como eu previ, foi pior. Eu discuti com Zoro na aula de educação física e foi um inferno, ouvi muito do meu pai por ter recebido detenção logo no primeiro dia de aula.

No entanto, um dia acordei e Zoro estava ao meu lado, com o seu peito subindo suavemente e os olhos castanhos fechados. Estava tão perto, que eu senti a pele de seu braço e o ar quente de sua boca.

Amigos são tão próximos?

E ainda começamos brigando...

Ele não se sentia inibido em me tocar, ora colocando o peso de seu braço em meus ombros, ora enlaçando seu pé no meu sob a mesa da cozinha.

Muitas coisas surgiam no meu peito e eu só chegava na conclusão que não vi e nem vivi tanto nesse mundo como aconteceu com Roy Batty. Se eu tivesse que falar bonito antes de morrer, talvez falaria da ladeira e nem sei por quê.

Talvez porque ela me passou a ser importante, principalmente na primavera quando era cercada por cerejeiras. Zoro tinha o costume de pegar na minha mão e me puxar com toda a sua força para chegarmos logo na escola. Eu não entendia por que a pressa, já que ele dormia mais do que estudava, era um péssimo aluno, longe de gostar de estudar. Mas, por mais imbecil que fosse, ele não era de se entregar.

E eu sei que Zoro pensa isso de mim.

Zoro não é otimista, sociável e gentil. Na verdade, ele é meio rabugento, mas que sorri de vez em quando. Seus sorrisos são os mais lindos que já vi, por sinal.

O pior de tudo era que tais sorrisos eram quase sempre rindo de mim.

Como é implicante...

— Ei, marimo, se você estivesse prestes a morrer... o que diria para o seu adversário?

— Daria o meu peito para ele acertar e não as minhas costas.

— Por quê?

— Porque quem dá as costas é um covarde por querer fugir!!

Cristo, Zoro tinha uma resposta pra essa pergunta. Não sei se é criatividade ou sua simplicidade, sabe, a mente dele devia ficar bem vazia para que pensasse em coisas idiotas assim.

Ou talvez seria o seu orgulho.

Um rapaz de família pobre e que já trabalhava, tinha um orgulho de dar medo. De me fazer ficar de joelhos.

— E você?

— Eu?

Eu não entendia por que Zoro tinha interesse em mim, tenho certeza que ele sabia a minha resposta.

— Eu provavelmente imploraria por minha vida...

Pensei que Zoro fosse caçoar de mim, mas ele apenas disse:

— Faz sentido, se viver mais, poderá ter o que dizer na próxima vez...

Ele perdeu uma oportunidade perfeita de rir da minha cara pra transformar em algo poético. Eu não conheço mesmo esse moço e muito menos por que gosta de me tocar.

Mas, eu devo confessar, estou vivendo mais. Já não preciso que ele me puxe para subir a ladeira e chego no topo tampouco cansado.