Uma armadilha de memórias escrita por AndyWBlackstorn


Capítulo 12
Rota Mundial




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Alguns meses se passaram desde a visita que Elvis recebeu da família na Argentina. Desde então, ele passou a falar com Priscilla pelo telefone, variando nos orelhões que usava para fazer essas conversas. Justamente por andar procurando por telefones públicos, acabou conhecendo e se familiarizando com os arredores do lugar. Ainda assim, mesmo andando muito, ele falava muito pouco e usava roupas discretas.

Outra coisa em que ele concordou relutantemente, mas tendo consciência plena de que era para o bem maior, era deixar de pintar o cabelo no icônico tom de preto. Aos poucos, sua vaidade foi dando lugar a um visual desbotado, passando de um castanho claro ao loiro natural do qual ele fugiu por tanto tempo. Estava bem claro o quanto ele ficava irreconhecível daquele jeito, era exatamente o que precisava. Outra decisão que tomou foi deixar a barba crescer, o que fez se tornar outra pessoa de fato. Era John Burrows, ou Elvis, o Fugitivo, realmente escondido, ainda embasbacado como a farsa tinha funcionado depois de algum tempo.

Priscilla havia lhe enviado uma mensagem que o visitaria de novo. Se encontrando em uma praça aberta, ela mal o reconheceu. Sentou-se em um dos bancos e se sobressaltou quando o homem alto e loiro sentou-se ao lado dela.

—Como vai, Cilla? - ele disse em sua voz grave, inconfundível, mas que soava meio destoante da figura que estava na frente dela, o que a fez pular do assento.

—El? - ela disse incrédula, acostumando-se a chamá-lo pelo pequeno apelido que foi criado sem querer.

—Não foi minha intenção te assustar, mas isso é um bom sinal - ele comentou em seguida.

—Bom sinal de que? - ela quis saber, ainda se sentindo confusa.

—Sinal de que esse disfarce novo é realmente eficaz - ele apontou para o próprio rosto, enfatizando isso - conseguiu até te impressionar.

—Me impressionou o bastante sim, posso garantir que isso é convincente o suficiente - ela opinou sobre o visual - acho que isso até te dá um pouco mais de liberdade pra sair de casa, não?

—É, um pouco, mas tenho tomado todo cuidado - ele garantiu - ninguém nunca me reconheceu e espero que continue assim, falando nisso, sobre o disfarce, já que ele é convincente o suficiente, eu queria ver com você se podemos mesmo pôr os planos das viagens em prática.

—Ah isso, não pode ganhar um pouquinho de liberdade que já quer um pouco mais - Priscilla brincou um pouco com a situação para aliviar a tensão que sempre acompanhava a situação vigente deles.

—Eu sei que pode ser demais, mas tinha sido algo que eu tinha pedido sua consideração sobre isso - ele fez questão de a recordar.

—Sei disso, como poderia esquecer? - ela acabou rindo, sentindo alegria genuína - está tudo arranjado para irmos ao Brasil, ficarmos no máximo uma semana por lá, rápido o suficiente para que ninguém perceba nossa presença e depois disso podemos continuar nosso itinerário.

—Sério, Priscilla? Isso é ótimo! - ele a abraçou de forma empolgada como costumava fazer para comemorar alguma coisa.

—Imaginei que isso ia te empolgar - ela disse com bondade, satisfeita por vê-lo aliviado - vamos nesse fim de semana, então faça suas malas e te encontro no seu hotel.

—É um encontro, então - ele sorriu, grato por tudo que ela estava fazendo.

Conforme planejado, foram até o aeroporto juntos, saindo do pequeno hotel onde Elvis estava há meses, dando o check out final. Havia um certo sentimento de apego, mas também de alívio da parte dele. O pequeno quarto tinha sido sua casa por muito tempo, mas poder sair dali para finalmente ver outro país e estar com sua família era uma grande vitória. Poder experimentar um pouco mais da liberdade que tanto queria.

A família Presley andou por uma multidão de pessoas que desembarcaram com eles, mais tantos outros circulando pelo aeroporto. Priscilla tinha um lenço na cabeça e óculos escuros, também despistando qualquer pessoa que a reconhecesse. O casal andava lado a lado, com os braços entrelaçados e Lisa no colo da mãe, de forma que não se perdessem um do outro.

Pegaram um táxi deixando aquele mar humano para trás e se dirigiram para um hotel discreto e escolhido previamente. Antes que fossem fazer qualquer coisa, algumas horas de sono era justamente o que precisavam. Sem muita cerimônia, Lisa foi a primeira a dormir, se aconchegando na cama desconhecida.

—Pobrezinha - o pai dela comentou, rindo baixinho e tirando os cabelos do rosto dela - é uma rotina muito cansativa pra uma criança... até ela tem sentido os efeitos dessa fuga em massa...

—Eu sei, mas ela estava animada pra vir, e não está errada de querer descansar, você deveria fazer o mesmo - Priscilla recomendou.

—Eu digo o mesmo pra você, imagina, você organizou tudo isso, deve estar exausta - Elvis devolveu o conselho.

—Vamos então os dois descansar, está bem assim? - ela fez uma condição.

—Sim, senhora - ele acabou concordando e os dois se juntaram à filha.

Depois de um tempo, Elvis foi o primeiro a acordar, com algumas ideias em mente. Saiu do hotel, se certificando que suas roupas eram chatas e batidas, completamente camuflado. Deu algumas voltas ao redor do lugar onde estava, tentando explorar a nova cidade onde estava de forma discreta. São Paulo certamente era mais agitada do que o bairro de Buenos Aires onde tinha ficado todo esse tempo. Conseguia ouvir o jeito alto das pessoas conversarem, mais o som dos rádios tocando, fossem pessoas narrando algum tipo de história, fosse música.

Elvis tinha ouvido bossa nova antes, mas não o ritmo que ouvia agora. Era uma voz feminina melódica e doce, seguindo apenas um violão marcado por um puxar de cordas do instrumentista. Era único e contagiante, despertando os músculos um tanto adormecidos dele a querer se mexerem outra vez. Ele acabou se contendo e rindo baixinho, lembrando do quanto seu icônico rebolado havia causado problemas quase 20 anos atrás.

Podia ser coincidência ou não, logo em seguida, seus ouvidos captaram sua própria voz, uma versão de "Suspicious Minds" vinha de um dos restaurantes que havia encontrado por ali. Acabou entrando no local, meio que atraído pelo que estava ouvindo, tentando ver até onde aquilo podia dar e impressionado com, como mesmo estando naquele país pela primeira vez, as pessoas o conheciam muito bem ali.

No local, havia pessoas comendo entre as mesas, garçons trabalhando e servindo, de um lado para o outro, e certamente, músicos se preparando para tocar. Ele não podia conhecer nada de português, mas era mesmo uma língua melodiosa, que soava bonita dentro do ritmo que tinha ouvido antes. Por mais afastado que estivesse dos palcos, música era algo que fazia parte de quem ele era e seria assim para sempre.

 


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