Histórias diversas escrita por Vinicius Aparecido Salatta
Rafael, 7 anos:
— Mamãe, mamãe! Como eu faço pra ir pra Lua?
A mãe riu:
— Para a lua? Você precisa ser um astronauta pra ir pra Lua.
— Mas o que é um astro… astro…
— São pessoas que estudam e treinam pra viajarem no espaço.
Rafael se espantou:
— Uau! Eu quero ir pro espaço! E se eu for pra Lua eu vou achar um dragão lá? - perguntou lembrando das histórias que seu pai contava para ele na hora de dormir.
A mãe riu, claramente adorando toda aquela conversa.
— Sim filho, você vai encontrar um dragão na Lua.
Rafael ficou ainda mais entusiasmado e saiu correndo pela casa. Seus pais no sofá, em frente a TV olhavam ele correndo ao redor deles fingindo ser um viajante do espaço, conversando com seres extraterrestres em uma língua inventada por ele mesmo, ali, naquele instante. Seu pai o ajudava e fingia ser um dragão feroz querendo jogar fogo nele, mas Rafael era valente. Puxava sua espada imaginária com tamanha habilidade que o dragão não foi capaz de se defender e caiu no chão com as cócegas do filho. A mãe ria, a TV não era importante. A verdadeira ação estava ali naquela sala.
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Rafael, 30 anos. Astronauta prestes a fazer a sua primeira viagem a Lua. Seu entusiasmo já parecia subir tão alto quanto o foguete que ainda não havia decolado. Até que decolou.
Ele e mais dois companheiros subiram com ele.
— Mal posso esperar para conhecer os alienígenas!
Os outros dois riram, mas não como sua mãe.
— Alienígenas? Você tá pirado ou algo do tipo?
Rafael tentou argumentar. Falou sobre planetas desconhecidos e o dragão que vivia na Lua… e foi ridicularizado.
— Eu estou certo, vocês vão ver! - disse confiante.
Chegando à Lua, que decepção. Apenas um solo esquisito com algumas rochas e alguns furos. A gravidade até que era bacana, mas… era só. Não fizeram nem uma parada em Marte para conhecer seus vizinhos intergalácticos. Nada disso era real. Nada disso existia.
A viagem acabou. Voltando à Terra a primeira parada foi na casa dos pais, mais envelhecidos, mas ainda sempre felizes ao verem o filho. Bem, ele não estava.
— Como puderam mentir pra mim? Eu cresci acreditando nessas histórias!
— Filho - disse o pai cabisbaixo - Como seria a sua infância se falado essas coisas para você?
— Eu teria sido mais feliz! - e saiu furioso pra fora enquanto fechava a porta, deixando seus pais ali… chorando.
Chegando em casa foi recebido pela esposa. Boas notícias, eles estavam grávidos. A raiva imediatamente se transformou em felicidade. Apesar do encanto perdido pela sua profissão, assim continuou, e nove meses depois, Mariana surgia.
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Mariana, 7 anos:
— Mamãe, mamãe! Eu vi uma história na escola hoje de um menino que viajava pelo espaço com uma raposa. Eu posso viajar também e levar o Neko comigo? - disse puxando o rabo do gato.
A mãe riu:
— Mas é claro, filha!
Mariana se entusiasma:
— E quando eu e o Neko podemos ir!?
— Primeiro vocês precisam treinar bastante igual o papai. Aí eu deixo vocês irem.
— Ebaaa! Vem Neko! Vamos treinar pra virar Astrodálmatas igual o papai!!
Rafael escutava tudo na outra sala, e não ia deixar que a decepção dele se tornasse a mesma da filha. Assim que pudesse diria a verdade para ela. Ele nunca contava histórias pra ela antes de dormir para não piorar o trauma.
E ali estavam todos. Casal no sofá, TV ligada. Mariana desenhando galáxias na folha de sulfite. Rafael olhou e achou que era hora.
— Mari, papai precisa te contar uma coisa…
— Papai, olha o que eu desenhei! É os planetas que o menino e a raposa visitaram no livro que a minha professora leu.
— Mas filha é disso que o papai queria falar com você, tudo isso é…
— Sabe, papai, quando eu crescer eu quero viajar pelo espaço igual você e esse menino! Lá em cima deve ser beeeem grande e deve ter tanta coisa legal pra ver! Quero conhecer amigos de outros planetas, outras cidades, e viajar na minha nave espacial com o Neko, não é Neko?
Neko bocejava, mas Mariana não parava. Falava e gesticulava contando sobre como iria pilotar a sua nave em fuga se seus amigos alienígenas não fossem tão amigos assim, e como tentaria fazer um tratado de paz falando com eles na própria língua alienígena deles, a qual tinha inventado ali, agora mesmo. E se houvessem monstros perigosos em planetas desabitado, ela puxaria a sua espada imaginaria e montaria no Neko, que segundo ela viraria um tigre quando crescesse, e assim enfrentaria a feroz criatura.
Rafael observava, e não conseguiu esconder uma ou duas (talvez três) lágrimas que escorriam pelo rosto. Não conseguia acreditar como havia esquecido de toda essa empolgação e imaginação só pela possibilidade dessas coisas existirem. E como havia decepcionado seus pais, e não o contrário.
— … e aí o Neko vai me salvar e a gente vai voltar pra casa, porque a gente tem escola no outro dia, não é Neko!?
A mãe ria enquanto olhava Mariana e também ria ao ver Rafael emocionado.
— Mas o que você ia me dizer, papai…
Rafael olhou seriamente pra ela.
— Nada disso é… nada disso é o suficiente pra enfrentar um dragão que existe na Lua!!
A criança se entusiasma.
— Eu sou brava, ele vai ver só!
— Ah é!? E se ele tiver 50 metros de altura e cuspir fogo pela boca, nariz e orelhas!?
— Eu e o Neko vamos ganhar dele só com uma espadada!!
— Ah é!? E se ele pegar a mamãe de refém!? Muahahaha! - disse ele imitando um dragão enquanto pulava em cima da esposa no sofá.
— Nããão, dragão! Deixa a mamãe em paz! - disse ela puxando Neko para ajudar no combate.
Todos riam, e talvez até Neko estivesse gostando da bagunça. A TV ainda estava ligada, mas ninguém olhava. A verdadeira ação estava ali, naquela sala.
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