Orgulho e Preconceito - Perdida no século XVIII escrita por Aline Lupin


Capítulo 31
Capítulo 31




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Ela olha do retrovisor do carro a propriedade se afastando. Sumindo, como se nada do que ela viveu em dois meses fosse real. Mas, o vestido que ela trajava em um tom amarelo, com mangas curtas, fazia ela se lembrar de que nada do que viveu foi mentira. E o peso do celular dentro do bolso da saia não a fazia se esquecer disso. Ela teve tempo de fazer uma retrospectiva de cada momento que teve com Darcy e com Georgiana. E sentia o quanto eles faziam falta. Fazia apenas poucas horas que não via eles, mas sentia-se agoniada.

Maldito Alexander! Onde ele estava agora?

— Vai me contar o que diabos aconteceu? – a voz de Josh interrompe o fluxo dos seus pensamentos.

Ela olhou para o amigo. Um amigo de longa data. Ele era o único que atendeu ao telefone e veio em seu socorro. Foi gratificante para ela saber que existiam pessoas boas no mundo. Assim que ela correu para propriedade, atordoada ainda por ter voltado no tempo, sentindo o coração partido em pedaços, uma mulher a ajudou. Ela emprestou seu telefone, sem perguntar por que Lizzy precisava. E nem questionou o vestido que ela usava de cintura alta, até os pés. Presumiu que ela veio de um evento que acontecia uma vez no ano, para pessoas que apreciavam o século XIX. Mas, é ai que ela estava errada. O século em que Lizzy estava era o XVIII. E o que ela não daria para estar lá, com Darcy.

— Elizabeth? – Josh diz o nome dela, em tom de pergunta.

Ela afastou a cabeça do vidro e fitou seu amigo. Focou seus olhos nos dele. Ele voltou a olhar para estrada, suspirando.

— Você sabe o susto que levamos Lizzie? Sabe quanto tempo a policia esta procurando por você?

As acusações. A preocupação. Tudo isso doía demais. A cabeça dela estava prestes a explodir.

— Eu não quero falar sobre isso agora, Joshua – ela pede, com a voz fraca. Estava tão enjoada.

Como faria para voltar para Darcy? Ela estava se afastando tão rápido de Pemberley. Saindo de Derbyshire, seguindo pela rodovia, a 120 por hora. Nunca mais veria ele de novo, porque não eram os quilômetros que os separavam, mas eram três séculos. Mais ou menos, duzentos e vinte e um anos. Era muito tempo que se interpunha entre eles. Nesse exato momento, o corpo dele estaria de baixo da terra, já decomposto. Talvez, apenas ossos. Onde será que ele havia sido enterrado?

— Por que não tenta explicar, Elizabeth? Temos algumas horas ainda para chegar a Londres. Adoraria escutar o que diabos você fez todo esse tempo – Sua ironia doía aos ouvidos. Era óbvio que ele estaria assim, tão irritado e irônico com ela. Quem poderia culpa-lo?

— Eu não sei como explicar isso, sem parecer louca – ela tenta se justificar, afinal, quem iria acreditar que ela viajou no tempo?

— Você estar louca não importa – ele diz, sem desviar o olhar da estrada, com as duas mãos sobre o volante, com um olhar cansado – Nos matou de preocupação, sabe? Por isso, preciso de uma justificativa. Ou melhor, você vai precisar dar uma a Meredith. Ela quer comer seu fígado no café da manhã, com waffles.

— Justo – Lizzy assente. Afinal, Meredith deve ter sofrido a sua ausência. Ela teria sofrido igualmente, se um dos seus amigos sumisse. Se Jane sumisse – Como está Jane?

— Arrasada – ele responde, olhando para ela de soslaio, antes de voltar seu olhar para frente – E alias que vestido é esse? Moda vovó?

Lizzy gargalha. Ao menos, ele não havia perdido o senso de humor.

— Não. É uma longa história.

— Já disse que temos tempo. Desembucha.

Lizzy liga o som do carro. Coldplay toca nos alto falantes. The Scientist era uma boa pedida para quem está na fossa. E ela se sentia assim mesmo.

Nobody said it was easy. It's such a shame for us to part. Nobody said it was easy. No one ever said it would be this hard. Oh, take me back to the staaaaart... ahhhh uhhhh uhhhh— Ela canta com tanto sofrimento, mas isso não parece irritar Josh, que acompanha.

As duas vozes se unem, de forma desafinada. Mas, isso não importa. Nada mais importa para Lizzy. Ela somente quer esquecer a dor. Apenas segue a viagem, ainda se lembrando de tudo que passou e viveu com Darcy e nunca vai esquecer.

Pelo retrovisor ela vê apenas a estrada asfaltada. Ela esta cada vez mais longe e mais longe de Darcy. E isso doía profundamente no seu peito.

*

Lizzy olha para o diário a sua frente. Ela fez o registro de tudo que aconteceu com ela. Desde a primeira vez que encontrou Alexander no bar, até o último instante que passou ao lado de Darcy. Quando ela contou para Meredith, Josh e Jane, a única coisa que temia era que eles a internassem. Mas, eles a ouviram de forma compreensiva. Meredith ainda mais, devido ao vestido que Lizzy usava quando chegou em casa. Apesar disso, ela podia sentir os olhares incrédulos de Jane e Josh. Com certeza, nenhum deles acreditava na sua versão dos fatos.

Irmã e a amiga a abraçaram, sem larga-la por bons instantes. Todas choraram. Fora um momento de reencontro importante para cada uma delas. E Josh fez o mesmo depois, dizendo que ela fazia falta no grupo. Mas, de noite, em seu quarto, Lizzy chorou até adormecer, segurando o celular na mão, esperando que Alexander falasse com ela. Que lhe explicasse o que diabos havia acontecido. Infelizmente, ele não mandou uma mensagem sequer.

Um dia havia se passado. Um mísero dia se passou e a dor não diminuía. Ela precisou escrever. Precisou colocar para fora tudo que havia acontecido. Para saber que tudo que viveu era real. Se soubesse antes que aquele celular e que a entrada de Alexander em sua vida iria afetar tanto seu mundo, ela nunca teria acreditado. E se alguém lhe dissesse que havia passado por exatamente o que ela havia passado, suporia que a pessoa estava louca. Por um momento, foi exatamente isso que se passou por sua mente. Que ela não estava bem. Que algo estava errado com sua mente e que tudo não passou apenas de um sonho. Ao menos, colocar toda experiência em seu diário a ajudou a entender os fatos. A entender que nada do que viveu era mentira.

— Lizzy, telefone – Jane chama na porta, olhando para a irmã com preocupação. Está com o celular de Lizzy na mão. Ela não se lembrava mais do próprio aparelho telefônico. Estava tão desacostumada em usa-lo, que o deixou jogado em algum lugar. Como sua irmã havia encontrado, ela não saberia dizer – Precisa falar com seu chefe. Explicar o que houve.

— Eu não sei como vou fazer isso – Lizzy diz, com a voz entrecortada – Quem é no telefone?

— É ele. Brian O’Connor.

— Você disse que eu estava de volta? – Ela não queria parecer irritada, mas estava. Segurou a caneta com força entre os dedos. Não queria falar com ninguém. Não naquele instante. Não quando seu coração doía demais.

— Sim, eu tive que fazer isso, Lizzy. Você desapareceu por dois meses. Ele estava preocupado – ela responde como se fosse algo óbvio e parece chateada. Mas, por que ela está assim? Lizzy se pergunta o que aconteceu para ela estar daquele jeito, na defensiva. Não era como se fosse culpa dela ter desaparecido, não é?

Boris escolheu aquele momento para entrar no quarto e pedir a atenção de Lizzy, mas ela apenas levanta da cadeira e toma o celular da mão da irmã, com um olhar irritado. Jane a encara com seus olhos verdes igualmente irritada.

— Alô? – ela diz, tentando imprimir uma postura calma e pacifica. Mas, por dentro esta mais uma tormenta na praia.

— Elizabeth – a voz de Brian ecoa, parecendo aliviado. Aliviado? Bom, isso era uma surpresa. Ele sempre foi tão pedante e grosseiro – Que alívio que você está bem. Que está...viva.

— É...eu estou – ela diz, tentando não transparecer nada. Nem sabe que desculpa dar a ele sobre seu desaparecimento. Mas, tanto faz para ela, afinal, odeia seu emprego e vai deixa-lo agora que sabe disso.

— Que bom – ele diz, com a voz insegura. Insegura? Aquilo realmente era uma surpresa e tanto. Ela esperou que ele falasse algo, mas ele não disse nada. O que era estranho. Ele não ligou apenas para saber como ela estava? Jane continuava na porta, com olhar expectante. E Boris pulava na perna de Lizzy. Ela se afastou, olhando para a janela. Foi então que ele tornou a falar – Bom, eu não quero tomar muito do seu tempo. Soube por Jane que você havia sumido por esses meses para um retiro espiritual. Mas, eu estou realmente chateado por não ter nos avisado.

Espera o quê? Ela queria gritar com Jane. Mas, logo se acalmou. Que melhor desculpa ela daria as pessoas? De que voltou no tempo? Não, todos achariam que ela tem um parafuso a menos. Ela se virou para a irmã, com um olhar perscrutador.  Jane encolhe os ombros.

— Sim, eu sinto muito. Mas, precisava desse tempo, longe da civilização - ela enfatiza, olhando fixamente para Jane. A mesma da de ombros – Eu sinto muito mesmo. E eu devia ter pedido demissão. Farei isso ainda hoje. Posso enviar por email a carta de demissão?

— Não, não... – A voz dele se tornou aguda, enquanto ele nega. O que é estranho. Brian nunca parece desesperado. O que a faz questionar o que está havendo na editora – Na verdade, eu queria que você voltasse Elizabeth. Apesar da sua falta de comprometimento – Ouvir isso a deixou muito irritada, mas ela continuou escutando ele – Eu acredito no seu potencial – Ela quis gargalhar. Ele não acreditava no potencial de ninguém, só no quanto ele poderia receber no fim do mês – E sei que é uma boa funcionária. E estava na hora de você tirar suas férias atrasadas. Acho que foram três anos sem tirar férias, não é?

— Sim, Brian. Foram três anos – ela responde, de forma irônica.

— Bom, então considere esse tempo como suas férias, sem remuneração, é claro.

— Na verdade, eu acho que mereço a remuneração, Brian. Por tanto tempo que trabalhei para você.

— Bom sim, mas você não avisou a empresa, mas posso dar um jeito nisso – ele diz, dando uma risada forçada – Bom, mas quero ir direto ao assunto. Pode voltar na segunda-feira? Tem muito trabalho a fazer. E você parece à única que tem um cérebro inteiro e que sabe fazer as correções. Tem alguns livros em francês que gostaria da sua atenção. Como sabe, você é a melhor em traduções e eu deveria ter colocado você para fazer isso. Não Margaret. Ela não sabe nada.

— Ok, Brian. Mas, se você quer que eu volte, quero um aumento.

— Aumento? – ele parece incrédulo. Até mesmo ofendido. Mas, se era esse o caso, ele poderia dizer adeus a ela. Pois ela não iria se rebaixar mais. Lizzy se sentia tão cansada dos anos que trabalhou para ele, que achou justo lutar por seus direitos – Muito bem. Um aumento. Posso ver isso com a diretoria. Mas, você volta na segunda-feira, não é?

— Sim, Brian. Eu volto. Agora vou desligar. Tchau.

Ela afasta o telefone da orelha e desliza o dedo indicador na tela do celular e encerra a chamada. Respirando fundo, olhando para nenhum ponto especifico. Não está acreditando que realmente fez isso. Que foi durona com Brian. Então, ela coloca o celular no bolso e Jane diz:

— E ai? Está brava comigo por ter dado essa desculpa ao seu chefe? De que você estava em um retiro espiritual?

— Eu não teria pensado em uma ideia melhor, Jane – ela responde agradecida.

— Você sabe que esta sendo difícil acreditar que você viveu esses dois meses ao lado do Mr. Darcy, não sabe? – Jane diz, de forma brincalhona, mas preocupada. Trança os cabelos escuros, iguais ao de Lizzy.  Jane sempre fazia isso quando estava estressada. E pelo visto, ela está muito.

— Eu sei que você não acredita em mim, Jane. Nem eu mesma acredito, sabe? Que me encontrei com Fiztwilliam Darcy. E com Jane Austin. Não dá pra acreditar. É surreal – ela passa a mão pelo rosto, de repente, sentindo-se cansada demais. Velha demais.

Lizzy segue para a cama dela, sentando-se sobre o colchão, em cima da sua colcha xadrez. Um presente da família, por parte da mãe dela. Boris pula na cama, circulando até deitar a cabeça sobre as patas, suspirando. Lizzy acaricia os pelos dele, com o peito opresso. Olha pela janela. O clima nublado de Londres nunca a deixou, de fato. Já esta chovendo. O que a deixa mais desanimada ainda.

Ela sente a cama afundar ao lado dela, de repente. Jane está ali. Não saiu do quarto. Nem a julgou, ou disse que ela é louca. Apenas foi compreensiva. Sempre foi da natureza dela ser assim. A docilidade e passividade faz parte de Jane. Não que ela não seja uma lutadora, mas ela sempre prefere manter sua opinião para si mesma. O que sempre irritou Lizzy, que nunca foi de ficar calada sobre nada. Mas, naquele momento, ela agradece mentalmente pela sua irmã se calar e não dizer nada. Ela não quer julgamentos. Ela somente quer entender o motivo para estar ali. Mas, se sente culpada, pois sabe que deixou seus amigos e Jane preocupada. Os deixou em uma situação difícil. Todos sofreram pela sua ausência. Não era justo que eles ficassem sem saber para onde ela foi.

— Sabe – Lizzy quebra o silêncio – Eu sei que parece loucura, mas eu o amei, Jane. De todo meu coração. E ainda o amo. Se eu pudesse, estaria com ele agora. Nunca teria voltado para cá. Eu sinto tanto por isso, mas eu nunca voltaria. Mesmo sendo um pesadelo estar em lugar tão atrasado. Era apenas por ele e por Georgiana. Eu sou uma pessoa má por não querer voltar? Por desejar ficar com ele?

— Não – Jane responde, sem a menor sombra de julgamento em sua voz. Ela esta calma, acariciando os pelos cinzentos de Boris com as pontas dos dedos – Você estava com o homem que você ama. Então, não é má por isso. Mas, estou feliz que esteja de volta. Assim, eu sei que você está viva e bem. Mas, se um dia puder voltar, deveria fazer isso. Se um dia desaparecer de novo, eu saberei que você está bem. Apesar disso, quando você desapareceu, eu fiquei desesperada, pois eu achei que você tinha morrido, ou sido sequestrada. E Deus, como isso tudo foi difícil – ela soltou o ar, com os olhos aguados. Lizzy queria consola-la, mas não fez isso. Deixou que sua irmã terminasse de falar – Eu pensei nos nossos pais, sabe? O quanto eles fazem falta. E se eu perdesse você...eu acho que não poderia suportar.

— Jane...eu...sinto muito – Lizzy diz, com a garganta apertada. A respiração opressa – Eu não queria que fosse assim. Juro que não.

— Eu sei – Jane passa o dorso da mão no rosto, forçando um sorriso. O que doía profundamente em Lizzy. É terrível ver que sua irmã está forçando a ficar bem, quando ela não está – E por isso, não culpo você. Eu só fiquei sem rumo, um barco a deriva, pois eu não tinha mais você. Não tinha mais família. Você é tudo que me restou Lizzie, mas eu me sinto egoísta, pois você sempre foi minha ancora. Mas, quem era a sua, afinal? Eu não consegui ser esse apoio. E percebi que não fui mesmo. Eu apenas demandei sua atenção, sem pensar que você também estava sofrendo e que precisava de apoio.

Lizzy balançou a cabeça, tentando encontrar uma forma de argumentar com Jane. Afinal, ela escolheu ser a ancora de Jane e ampara-la sempre. Nunca se arrependeu disso e não seria agora que iria se arrepender.

— Não, Lizzie, deixe-me terminar – Jane pede. Lizzy aquiesce, tentando deixar sua irmã dizer aquilo que ela sente. E então percebe que precisa disso. Precisa ter alguém para se agarrar. Esteve tanto tempo afogando sozinha no mar, tentando se manter firme, puxando sua irmã para cima, mas se esqueceu de se salvar também – Você sempre carregou a nós duas, mesmo não tendo forças. Carregou tudo em suas costas, sem pensar que eu poderia ter ajudado. Eu confesso que fui egoísta também, não pensando em você. Nas suas dores. Eu nunca te vi chorar, sabe? Nunca vi você derramar uma lágrima desde que papai e mamãe morreram. Você começou a trabalhar e estudar tão cedo, apenas para que eu conseguisse ficar na faculdade. E não é justo. Não é justo que você precisasse crescer antes do tempo, para que eu pudesse viver. Não é justo que você não pudesse ser uma adolescente de verdade, saindo para festas, tendo que cuidar de mim. E por isso, vou ficar aqui com você. Estou terminando a faculdade e posso arranjar um emprego. Posso transferir o curso para o modo online e você não vai ficar tão sozinha em casa...eu...

— Não, Jane, não – Lizzy nega com a cabeça. Por que Jane teria que se sacrificar por ela, afinal? Não era necessário. Lizzy sentiu dentro de si que prefere muito mais trabalhar a ficar em casa, pensando em Darcy. E no quanto doí não ter ele por perto – Você vai para universidade. Precisa voltar. Eu vou ficar bem. Graças a você, eu tenho um emprego – ela sorri, de forma forçada, apenas para mostrar a irmã que está bem – E você não pode perder as provas finais. Vá e foque na sua carreira. Eu vou ficar bem. Só venha me visitar final de semana, ok?

Jane sorri para ela e assente.

— Eu ficaria se você quisesse você sabe. Não precisa ser forte o tempo todo. Eu estou aqui para você.

Lizzy anui com a cabeça, controlando as próprias emoções, mas sente a garganta apertada. Tudo dentro de si doí.

— Eu estou bem, Jane. De verdade.

Mas, de fato, não está, porque tudo parece remotamente errado. Fora do lugar. Como um quebra cabeça inacabado. Por isso, Lizzy nunca começou uma relação de verdade. Ela sabia que sofreria se realmente amasse alguém. Porque perder alguém que se ama é a pior coisa do mundo. E dói tanto que o peito de rasga ao meio, deixando a pessoa sem ar. E o mundo simplesmente perde o brilho. Foi assim com seus pais. Ela sentiu toda a dor concentrada no peito, apertando a garganta, mas precisava ser forte por Jane. Mas, naquele instante, ela não tinha motivos para ser forte, afinal, estava sozinha naquela jornada. Havia perdido Darcy e não havia realmente ninguém para se segurar. Não havia uma ancora para se agarrar. Então, ela estava se afogando em lágrimas. Não percebeu que realmente estava chorando, em silêncio, olhando para as mãos abertas em seu colo, sentindo as lambidas de Boris em seu dorso. Sentiu o braço de Jane em cima do seu ombro e ela estava beijando sua bochecha.

— Eu estou aqui. Por favor, me diga o que posso fazer – ela diz em seu ouvido.

— Apenas faça isso parar, Jane. A dor...isso...é insuportável – ela sussurra a resposta.

As duas ficam em silêncio. Não havia como consertar aquilo. Não havia solução. E Lizzy sabia disso. Mas, se houvesse uma maneira de voltar para Darcy, ela voltaria. Ela só precisava encontrar Alexander de novo. Ele só precisava consertar aquela bagunça. Então, tudo ficaria bem.

*

Trabalhar era algo estranho, depois de dois meses cuidando de duas crianças. Estar ali, lendo textos, corrigindo e enviando para seu chefe, além de fazer traduções, era algo que ela não esperava fazer de novo. E havia projetos em atraso, o que tornava tudo mais difícil. Era por isso que Brian estava tão desesperado para que ela voltasse. Apesar do trabalho pesado, era a única maneira que ela encontrou para preencher o vazio das horas e dos minutos sozinha dentro do seu apartamento.

No domingo de tarde, Jane voltou para a universidade, com uma carona. Lizzy descobriu que ela estava paquerando um rapaz que fazia o mesmo curso que ela. Seu nome era Charles. Mas, não Charles Bingley, o que seria ironia do destino. Era Charles Hertford. Ele não era ruivo. Mas, loiro e tinha grandes olhos azuis infantis. Lizzy o avaliou de perto, com olhos afiados, mostrando que se ele magoasse sua irmã, levaria um soco que ele nunca mais esqueceria. Jane ficou horrorizada pela ferocidade que Lizzy demonstrou, ao defendê-la. E pediu gentilmente que ela se afastasse do carro. Charles a encarou entre surpresa e medo, prometendo que jamais pensaria em ferir Jane. É claro que iria, Lizzy, pensara com sarcasmo. Jovens como ele não tinham nada em suas mentes, a não ser festas, bebidas e flertes sem fim. E Jane era sonhadora, muito romântica. Iria se magoar no final. Mas, se Lizzy tentasse protege-la, não deixaria que sua irmã crescesse. Por isso mesmo se afastou do carro, dizendo adeus a ela, pedindo que ela viesse para sua casa, no fim de semana.

Lizzy contava os minutos para o final do expediente, para ver Jane. Ela se sentia sozinha. Apesar de Meredith ir à sua casa com Josh, não era a mesma coisa. Meredith não dormia na sua casa. Ela ia direto para o apartamento de Josh, afinal, eles moravam juntos. O que tornava a noite de Lizzy solitária. Ela tentava dormir, mas sentia-se sozinha naquele apartamento. Nunca sentiu a solidão antes com tal intensidade, mas estava sentindo isso. Perder Darcy fora algo que a tirou dos eixos e a deixou vazia por dentro.

— Vamos sair pra beber hoje, Lizzy – Meredith pegou na mão dela, enquanto seguiam para o elevador.

— Eu não acho que seja uma boa ideia – Lizzy tenta se afastar do aperto, mas não consegue. As duas entram no elevador lotado.

— É sim. Hoje faz uma semana que você voltou do seu retiro espiritual – ela faz aspas com os dedos e Lizzy ri. Ninguém no setor acreditou naquela história absurda, pelos olhares franzidos que foram dirigidos a ela, no entanto ninguém teve a coragem de questiona-la – E quero ver você sorrindo. Saindo com algum gatinho.

— Você sabe que não posso - Lizzy diz, com a voz entrecortada – Você sabe quem eu amo.

— Ah, sim, o Darcy – Meredith diz com um tom irônico – Mas, ele não está aqui, está? Ele é inalcançável. E se toda a história que você teve com ele for verdade, talvez, não volte a acontecer isso. Talvez, não seja possível voltar para ele.

— Para, só para! – Lizzy exige, com os dentes trincados.

As pessoas dentro do elevador olham para as duas de soslaio e Lizzy sentiu as bochechas corarem. Meredith acabava sempre a colocando em apuros, sendo muito efusiva em seus comentários, ou falando alto demais. E aquele era o momento. Era alvo de cochicho dos seus colegas. E tudo que ela era queria era continuar invisível aos olhos dele. Era impossível ser assim, devido ao seu “retiro espiritual”. Todos comentavam o quanto ela teve sorte de continuar na empresa, mesmo sumindo por um mês. Mas, Brian apenas disse que ela precisava de um tempo fora de empresa, o que lhe deu mais trabalho. Todos pediam suas férias atrasadas, o que não estava sendo concedido. E todos lhe dirigiam olhares acusatórios. Todos a odiavam pela sorte que tinha. E ninguém precisava saber mais sobre sua vida pessoal e principalmente, sobre Darcy. Seria dar-lhes mais munição para falar as suas costas.

— Eu não quero mais falar sobre isso, Meredith – Lizzy pede, agradecendo pelas portas do elevador se abrirem.

— Mas, eu sim – Meredith a puxa pela mão, forçando a passar por entre os colegas do trabalho.

Elas passam pelo saguão, indo em direção as portas giratórias.

— Você parece mais um zumbi. Parece que esta apenas sobrevivendo. E isso que só faz uma semana que voltou de lá, seja lá de onde você voltou – ela despejou tudo em cima de Lizzy, de forma sarcástica. Elas passaram pelas portas. Meredith parou de andar e a encarou, de forma preocupada, de repente. Colocou as mãos sobre os ombros de Lizzy, que a fitou com desconfiança e raiva – Eu sei que você está sofrendo, Elizabeth. Acredite, eu sei. Se eu perdesse Joshua, eu ficaria maluca. Mas, nós não queremos perder você. Eu não gosto e não suporto vê-la infeliz desse jeito. Por isso, por favor, por favor, vamos sair e fazer algo que possa alegrar você. Eu sei que está doendo, que está difícil ficar longe de Darcy, mas tente entender, foi muito difícil para nós ficar longe de você. Nós te amamos.

Lizzy entendia a situação, de verdade. Compreendia a dor de Meredith, mas ela estava muito apática para aproveitar qualquer coisa. Não sentia animo para nada. Nem para sair com os amigos. Só queria dormir, depois do trabalho e apenas se forçava a ficar com eles, porque tinha medo de acordar e ver que estava sozinha. E toda vez que acordava, sentia a dor por estar separada de Darcy e já sabia que provavelmente nunca mais iria vê-lo de novo.

— Ok, Meri – Lizzy diz, por fim, vendo o olhar de expectativa da amiga – Vamos sair.

— Finalmente! – Meredith diz de forma animada. Então engancha o braço no de Lizzy – Eu prometo que hoje você vai se divertir. E alias, só pra você saber que eu me importo, pesquisei na internet o que aconteceu com você.

Lizzy anui. Também havia pesquisado. Mas, não encontrou nada. Nada que fosse realmente sério. Apenas conjecturas de pessoas que desejavam voltar no tempo.

As duas caminham lado a lado, na calçada. E Lizzy não faz ideia para onde Meredith está a levando.

— Eu também pesquisei. Mas, não sei como voltar – ela confessa, de forma frustrada.

— Bom, pode não haver uma resposta, mas podemos consultar uma taróloga – Meredith diz, em tom cheio de esperança.

— Não acredito que ela possa responder minhas perguntas, Meredith – Lizzy descarta a hipótese, afinal, não queria mais se machucar. A única coisa que não queria era se enganar, pois deveria ser impossível voltar no tempo. Não sem a ajuda de Alexander.  Ou de uma fada madrinha.

— Não custa tentar, não acha? Eu marquei para amanhã, pra que você possa conversar com ela. Até já paguei...

Lizzy para de andar, fazendo com que Meredith tropece na calçada.

— Você fez o que? – ela exclama, muito irritada.

— Eu marquei para você conversar com uma taróloga, Lizzie. Poxa, precisa ser grossa?

Meredith dá alguns passos para longe de Lizzy, com um olhar magoado.

— Eu não pedi para você fazer isso. Eu não pedi para que se metesse em meus problemas! – ela fala de forma amarga, mesmo sabendo que está magoando sua melhor amiga. Mesmo sabendo que deveria ser mais racional. Mas, de fato, Lizzy não sente mais que consegue ser racional.

— Elizabeth, mas como você é idiota, impossível! – Meredith esbraveja.

Um casal passa ao lado delas, olhando-as de esguelhar, mas as duas ignoraram. De punhos cerrados, as duas parecem que vão realmente entrar em uma briga. Mas, então, Lizzy apenas suspira frustrada.

— Eu não quero que uma charlatã fale sobre minha vida, Meri. Você sabe que gastou dinheiro atoa.

— Eu estou fazendo isso, na esperança de que você encontre as respostas que você precisa – Meredith diz em tom contido, preocupado.

E isso dói no coração de Lizzy. E ela percebe, enfim, que nunca esteve sozinha e que é uma péssima amiga. Que não deveria brigar com as pessoas que a amam. Por isso, toma uma decisão:

— Ok, vamos amanhã. E só por você se mostrar minha melhor amiga e ter cuidado do meu cachorro e do meu apartamento e de Jane, nós vamos beber para comemorar.

Meredith sorri e se aproxima de Lizzy, colocando um braço em volta do ombro dela.

— É assim que se fala.

Apesar da noite mal ter começado e elas terem se dirigido ao mesmo bar que ela encontrou Alexander, Lizzy sente no seu intimo que aquela noite seria melhor do que as anteriores. Afinal, não estava sozinha. Tinha Meredith ao seu lado. E Josh se juntou depois a elas. Ao menos, ela tinha amigos. E era tudo que importava naquele instante.


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