De repente no futuro escrita por WinnieCooper, Laura Vieira


Capítulo 1
Prólogo




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Carrapato.

Era isso o que Petruchio era: um car-ra-pa-to.

Com todas as letras que carrapato tinha. E em todos os seus significados e também sinônimos.

Aquele homem não a largava por nada. Até serenata havia lhe feito e além disso havia inventado aquele apelido horroroso: Favo de mel.

Só de lembrar da barba dele lhe roçando o rosto e o beijo dele lhe fazendo ficar com as pernas bambas, lhe causando arrepios. Arrepios que ela nunca havia sentido - muito menos admitido que havia sentido - antes em toda a sua vida. Ela não queria mais sentir essas sensações. Precisava dar um fim nesse carrapato.

Tinha um plano naquela noite e se tudo desse certo ia se livrar daquele carrapato para sempre.

O único problema era a fantasia que ele estava usando. Homem das cavernas, seu peitoral praticamente nu, todas as mulheres da festa olhando para ele. Catarina não se aguentou, quando deu por si já estava questionando:

— Como se atreve a vir pelado?

Ele lhe deu a resposta que só estava fantasiado, ao mesmo tempo em que mulheres passavam ao lado dizendo que ele era um pedaço de mau caminho. Catarina ficou com raiva, mas tinha um sentimento dentro dela que nunca havia sentido, não queria falar que era ciúmes. Pegou Dinorá pelo braço que passava ao lado e falou:

— Dinorá, que bom que veio, diga a esse senhor que isso não é traje para vir numa casa de respeito. - não conseguia nem dizer seu nome.

— Dinorá, Dinorá, que bom que veio, diga a essa moça que fantasia é fantasia e que minha fantasia é tão inocente quanto uma brincadeira de criança.

— Dinorá! Diga a esse senhor… - sua voz já estava completamente raivosa. - Para ele ir embora imediatamente.

Dinorá não conseguiu falar pela terceira vez seguida, Petruchio começou a rir sarcasticamente, o que só aumentava o ódio de Catarina.

— Dinorá! Diga a essa senhorita que embora eu não vou memo, que eu sou convidado, tão convidado quanto os outros.

Catarina ia dizer, mas Dinorá estava exausta.

— Quer saber? Briguem sozinhos! - ela saiu ao mesmo tempo em que uma mulher desconhecida com um vestido branco com rosas vermelhas passava ao lado.

— Eu que queria ser agarrada pelos cabelos.

O monstro dentro de Catarina rugiu e ela não controlou-se mais.

— Ou… ou bota uma roupa decente ou não fale mais comigo!

Catarina saiu de perto dele tremendo de ódio. Só podia estar tremendo de ódio, não de qualquer outro sentimento que o ciúme.

Claro que Petruchio concluiu que ela estava com ciúme e disse isso com todas as letras para Calixto, ria feliz da vida que tinha conseguido toda a atenção da pretendente pelo menos uma vez na vida. Calixto logo cortou seu barato dizendo que ela estava era com raiva. Petruchio não ligou, voltou a dançar feliz da vida atraindo a atenção de todas as outras mulheres da festa.

Catarina não aguentava mais ver aquela cena, abriu a porta do escritório de seu pai com toda força:

— Papai! O senhor deve colocar o Petruchio para fora! A fantasia dele é um atentado ao pudor.

Batista sentiu sua gastrite lhe apertar o estômago na mesma hora, mas ficou curioso quanto a fantasia que tinha tirado a filha dos eixos e tinha feito ela lhe pedir socorro, Catarina nunca lhe pedia socorro pra espantar nenhum pretendente.

Ela parecia prestes a explodir, era nítido sua irritação por causa do pretendente quase nu na sala atraindo a atenção de todas as mulheres da festa. Batista tinha que admitir que Petruchio era esperto. Mas ao mesmo tempo pensou em sua reputação, o porte dele em sua festa não era bem visto. Foi atrás do pretendente a genro.

Chegando na festa, se depararam com a cena de mulheres lhe dando comida na boca. Catarina quis gritar.

— Petruchio, Petruchio, isso são modos de se… de se… comportar numa festa? - Batista começou.

— Ué eu só tô brincando de homem das cavernas. Naquela época as mulheres faziam tudo o que o homem queria, num é? Naquela época que devia ser bom! - falava dançando com as mulheres rindo ao seu redor.

Catarina estava quase explodindo de ódio. Nunca havia sentido aquela sensação estranha dentro de si que lhe tomava por inteira, queria chorar e gritar ao mesmo tempo.

— Viu só? - virou-se para o pai. - Ele ri de mim, ele ri do senhor, eu aqui usando o anel de noivado e ele pisando no nosso nome.

Batista tentando justificar a filha que na idade do Petruchio era pior que ele, mas isso só enfureceu mais Catarina. Batista tentou fazer uma voz mais rude contra o futuro genro o cobrando:

— …Petruchio deve se comportar como meu genro. Não deve…

— Ficar de peito de fora! - Catarina completou.

— É, como um selvagem. Vá botar uma roupa mais decente Petruchio.

— Mas seu Batista colocar que roupa? Eu não tenho outra roupa não, a única roupa que eu tenho é a minha roupinha que ficou na carroça, uma roupinha velha.

Prevendo outro ataque de Catarina, Batista logo o chamou:

— Venha comigo, venha!

Petruchio ria internamente enquanto olhava as opções de roupa que o quase sogro lhe oferecia.

— Pode escolher um terno meu para vestir. - Batista saiu de seu quarto o deixando sozinho.

Petruchio só de olhar para as opções sabia que nada lhe serviria. Mas poderia irritar Catarina um pouco mais. Vestiu um paletó aberto e uma gravata, deixando seu peitoral de fora. Adorava ver a cara brava dela, ficava cada vez mais linda brava, ia se presentear mais um pouco com essa visão.

E lá estava ela, linda com aquele nariz torto, sua feição brava e nada alegre. Ele dançava alegremente fingindo que não tinha reparado nela quando esta lhe questionou sobre a roupa. 

— …Ué, ocê não disse que não queria que eu não ficasse de peito de fora? Eu fui com seu Batista, ele abriu o guarda-roupa e mandou eu escolher. Aí eu escolhi o paletó e a gravata ó. Eu nunca que uso gravata. - ele sorria mexendo os pés enquanto Catarina se enfurecia cada vez mais.

— Pois a emenda ficou pior que o soneto. Tire essa roupa vá! - ela apontou para as escadas para que ele voltasse para o quarto.

— Ué, tá bom. - Ele deu dê ombros fingindo que não tinha entendido os sinais claros dela. Começou a tirar o paletó na sala, na frente de todos.
Catarina surtou. Agarrou o paletó e o colocou de volta em seus ombros.

— Pare o que está fazendo! Vai ficar pelado de novo!? - seus olhos arregalados e surtados eram tão brilhantes que Petruchio só queria se prender neles para sempre.

— Ué, mas eu não tô entendendo mais nada. Ocê quer que eu tire ou que eu ponha?!

— EU QUERO QUE VOCÊ SAIA VOANDO PELA JANELA!

— Ah meu favo de mel, ocê me desculpa. É uma pena eu não ter vindo fantasiado de anjo para sair voando. - Petruchio queria rir. Sorte que uma mulher apareceu.

— Com licença Catarina, mas vou tirar seu noivo para dançar. Vamos dançar?
Petruchio observou a mulher, depois Catarina, a noiva estava impassível, não foi contra, pensou que talvez dançando com outra mulher ela pudesse voltar a ter os olhos brilhantes de raiva dirigidos a ele que até então acreditava serem de ciúme.

Aceitou a dança. Mas conforme dançava sempre procurava Catarina com os olhos, ela parecia estar prestando atenção. Seu plano estava caminhando muitíssimo bem. O que ele não entendeu foi quando a moça começou a insistir demais para que ele fosse para os jardins com ela. Estava tão invasiva e insistindo tanto para ficarem mais à vontade que ele começou a imaginar se aquilo tudo não era… um plano. Sim! Um plano de Catarina. A moça inclusive se recusava a mostrar seu rosto. Foi quando sentiu uma fisgada muito forte em seu coração acompanhada de um calafrio. Como se algo errado estivesse acontecendo e ele tivesse que voltar correndo para a fazenda. Queria ir embora. Mas ela insistiu tanto para irem lá fora.
Estavam nos jardins, Petruchio entortava seu pescoço procurando Catarina, a moça ficava com sua máscara na frente do rosto o tempo todo, quando ela disse para ele tirar o paletó para ficar mais a vontade ele pareceu entender tudo e perdeu a paciência.

— …Não fique tão sério.

— É uma coisa que eu já aprendi, quando a esmola é demais o santo desconfia. - a moça enfim tirou a máscara da frente de seu rosto e Petruchio reconheceu a amiga de Catarina. - Ah! Mas é a amiga de Catarina… safada, safada, mas agora eu tô entendendo tudo. Ela preparou isso tudo para ocê me agarrar…

Bárbara se lançou nele desesperada o beijando ao mesmo tempo em que Catarina aparecia gritando raivosa:

— Safada! Sem vergonha!

— Catarina, mas foi você que… - Bárbara se defendeu.

— Eu que tive a ideia, mas você gostou. Namoradeira, estribo de bonde!

— Catarina me respeite!

— Respeite você o meu noivo! Estava agarrada a ele como um desentupidor de pia.

Petruchio estava era gostando, Catarina não segurava suas emoções, Batista apareceu tentando acalmar as coisas, Petruchio fazia coro dizendo que a culpada era a moça e não ele.

— …Foi ela, foi ela!...

— Não disfarce! Bem que gostou! Te vi agarrado com ela como um cachorro num osso!

Bárbara foi embora se sentindo humilhada, era hora de Catarina finalizar seu plano. Arrancou a aliança do dedo e mostrou a ele enfurecida.

— Olhe bem! Olhe bem! O anel de noivado! - Jogou atrás de si com a maior força que conseguiu reunir. - Nosso noivado acabou!

— Eu tô farto das tuas armadilhas Catarina, Ocê preparou tudo isso, ocê que combinou com ela pra me agarrar aqui, cê pensa que eu não sei? - Ela pensava que ele era o que? Idiota ao ponto de acreditar naquele teatro barato? Petruchio estava farto demais diante de tanta armadilha e tanta humilhação. - Pois agora eu falo pr'ocê de boca cheia. Nosso noivado acabou!
Saiu de perto dela a passos firmes. Catarina olhou inocentemente para o pai, emendando que fôra ele que acabara com o noivado, portanto não podia fazer nada.

Petruchio estava cansado, caminhava até a carroça frustrado, Catarina fez tudo de caso pensado, jogou a aliança pelos jardins, armou contra si, fez de tudo para que ele levasse uma culpa que não tinha e terminou tudo com ele. Era isso! Ele não se importava mais com ela. Não precisava mais dela, poderia muito bem se sustentar sozinho sem precisar de seu dote, não queria mais saber de Catarina Batista, nem se ela se pintasse de ouro em sua frente.

Mas as surpresas daquela noite só estavam começando, assim que chegou na fazenda já com o raiar do dia, percebeu o desastre iminente e o porquê seu peito havia doído em certa altura. Um desastre! Havia acontecido um desastre em sua fazenda.

Todo seu estoque de comidas e rações dos animais havia sido tomado pelo fogo, fora as duas melhores vacas leiteiras que haviam sumido em meio a confusão. Petruchio quis chorar de desespero, seu cérebro fazendo contas e mais contas, as dívidas só aumentando, o problema se multiplicando. Todas as bocas que tinha para alimentar estavam lhe olhando tristemente. Ele não sabia mais o que fazer. Passou o início da manhã toda cabisbaixo e pensativo. Queria chorar, mas homem não chorava, não podia se dar a esse luxo, queria brigar com todo mundo, inclusive com Calixto que havia sumido.

Decidiu que ia ao quarto para pensar. Quem sabe conseguisse descansar meros segundos, colocar a cabeça no lugar e quando acordasse a solução estivesse em sua frente.

Mas o quarto parecia frio, como se as paredes lhe falassem que havia falhado em todos os sentidos diante da herança que os pais haviam lhe dado, olhava o retrato dos pais na sua cabeceira e começou a chorar. Sozinho no quarto ele podia mentir e dizer que chorou de raiva e não de desespero.

— O senhor e a senhora desculpa eu. Desculpa eu por ter falhado. Desculpa eu por não saber o que fazer com a fazenda a não ser vender.

xx

Catarina em seu quarto não estava diferente, estava há pouco feliz e saltitante na sala por ter se livrado de outro pretendente, mas em seu quarto, sozinha, longe de todos ela sentia um nó em sua garganta e não conseguia tirar a imagem de Petruchio de sua mente, será que ele gostava mesmo dela e por isso havia ficado tão chateado terminando o noivado? No fim havia sido ele a acabar com tudo. Não devia estar assim, seu plano havia dado certo, a fúria de ver Petruchio beijando Bárbara havia sido genuína, apesar dela jamais admitir isso a ninguém. Lhe doeu o coração ver ele a traindo e terminar tudo jogando a aliança de sua mãe pelos jardins, não conseguia dormir, pegou o retrato de sua mãe que tinha em seu quarto e o olhou tristemente.

— Desculpa mamãe, eu falhei na minha promessa de cuidar de Bianca. Eu falhei. Desculpa, mas não posso me casar para deixar ela feliz para se casar também.

xx

Petruchio passou os dedos pelo retrato o acariciando lembrando quando os pais haviam partido, ele era tão novo, a responsabilidade bateu em sua porta de um dia para o outro. Teve que virar adulto ainda criança.

— Eu só queria que oceis estivessem aqui, para pedir um conselho sequer do que fazer, não tenho mais noiva, não tenho mais saída, as dívidas tão se multiplicando. Eu simplesmente não sei ser mais a fortaleza que meu povo precisa. Pai, mãe… o que eu faço?

xx

Catarina passou o dedo pelas feições da mãe, parecia tanto sua irmã que aquilo lhe sufocava ainda mais. Parecia que sua promessa de cuidar de Bianca faiscava em sua frente.

— Queria tanto que estivesse aqui, queria tanto lhe abraçar e ser ainda criança em seus braços, queria saber o que fazer. Queria me livrar desse problema de casamento a força que papai insiste, sei que lutaria contra o papai por mim. Eu não tenho mais forças para espantar pretendente nenhum e tenho certeza que amanhã um novo abutre aparece. Mamãe… o que eu faço?

xx

Petruchio deixou o retrato ao lado da cama e resolveu deitar. Precisava por as ideias no lugar, mas nada o que pensava parecia por fim ao seu dilema. Esfregou as mãos em seu rosto e fechou os olhos desejando: "Quero que o tempo passe depressa para não ter que lidar com esse problema amanhã".

xx

Catarina deixou o retrato da mãe em cima da cômoda, foi até sua janela e cerrou as cortinas que insistiam em mostrar que o sol já raiava, foi até sua cama e deitou apertando os olhos cansados e desejando com todo seu coração em pensamento: "Quero que o tempo passe depressa para não ter que lidar com esse problema amanhã".

xx

O tempo é misterioso, às vezes ele aparece como protagonista em histórias inesperadas em que somente o destino devia agir e nessa em questão ele resolveu aparecer de forma literal, mostrando aos dois protagonistas que eles deviam confiar no seu grande amigo destino. Dizem para se tomar cuidado com o que deseja que as coisas podem se tornar realidade. Catarina e Petruchio iam acordar em breve num futuro inesperado e nada previsível.

 


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