Depois do Crepúsculo escrita por FSMatos


Capítulo 6
Capítulo seis




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— Natalie, isso é loucura! - gritei acima do som das vozes das pessoas.

— Não se formos rápidas o suficiente! - gritou ela de volta para mim. - A visita só é depois da missa. Temos muito tempo! - concluiu ela, logo em seguida dando um grito de alerta que afastou ao menos cinco outros turistas. Eles olharam feio para nós, mas seguiram em diante, em direção à Praça do Relógio.

Eram nove horas da manhã quando deixamos a hospedaria em nossas roupas comemorativas. Natalie tirou de sua mala maior dois vestidos vermelhos e capas de igual cor. Eram capas de dupla face: por fora, eram escarlates como sangue fresco, por dentro eram negras como o céu noturno sem estrelas ou luar. Ela me explicou que a cor de dentro era para a noite e simbolizava os guardas noturnos que guarneciam as entradas da cidade mais escondidas; eles usavam preto ou roupas muito escuras para não serem vistos pelos os inimigos que ousassem se infiltrar na calada da noite.

Após estarmos vestidas, descemos para falar com Pedro. O saguão estava lotado de pessoas vestidas como a gente. Na rua em frente a entrada, além das grades do portão, algumas dezenas de pessoas desciam em direção ao centro da cidade. Nós fizemos o mesmo, mas em vez de ficarmos na praça para tirarmos fotos e admirarmos a arquitetura da igreja e do castelo, desceu mais as ruas, em direção à  entrada. Em nossos curtos dias aqui, Natalie aprendeu de alguma forma a andar por aquelas vielas, que agora naquela manhã estavam abarrotadas. À medida que chegávamos mais perto dos limites, mais difícil era nossa caminhada. Chegou ao ponto de termos que dar cotoveladas para que nos deixassem passar.

Uma caminhada que demoraria meia hora, custou o dobro, porém não paramos até alcançarmos o objetivo: os grandes muros de Volterra.

— Pedro disse que podemos ir por ali. - Ela apontou para uma porta pequena de madeira presa às pedras.

Ainda sem soltar a minha mãos (que a esta altura do campeonato já estava dormente de tanto que ela a apertava), fomos até ela. Natalie, sabendo de algum macete para abri-la, girou a maçaneta e a ergueu, ao mesmo tempo em que fazia força para empurrá-la. A porta se abriu com grande estrondo. Sorrindo com satisfação, Natalie sacou o seu celular e ligou a lanterna, iluminando um pequeno corredor empoeirado e uma escada de pedra com diversos lances.

— Isso não seria ilegal? - perguntei, enquanto a seguia e fechava a porta atrás de nós.

— Só se alguém descobrir.

Revirei os olhos no escuro. Natalie sendo Natalie.

Subimos em silêncio as escadas até nos depararmos com outra porta. Usando a mesma técnica, Natalie a abriu. Saímos no que deduzi ser a base de uma torre.

— Pedro me explicou que por causa do grande fluxo de gente lá embaixo - disse Natalie, um pouco ofegante enquanto ia até o parapeito do muro. Ali em cima, tanto o sol quanto o vento castigava. Puxei o capuz da minha capa para me proteger de toda aquela luz. - quase não há guardas nos muros. Podemos ficar aqui por algum tempo, até o meio-dia. Puxa! - Eu a ouvi suspirar. - Venha, Bella. - Sem tirar os olhos da vista além das muralhas, Natalie estendeu a mão para trás, para mim. Eu a peguei, posicionando-me ao seu lado.

— Puxa! - ri, assombrada.

Muitos e muitos metros abaixo de nós, milhares de pessoas em suas roupas vermelhas subiam a íngreme estrada a pé, deixando seus carros estacionados do lado de fora e enfrentando o clima severo da primavera italiana. Vi um lenço vermelho soltar das mãos de uma mulher e sair levitando em direção aos céus. Famílias, casais, grupos turísticos. Dali, eram todos formiguinhas vermelhas. Os guardas as orientavam das direções que deveriam ir e direcionavam os motoristas perdidos. 

Era mais lindo do que pelas fotos.

Eu ouvi Natalie gargalhar. O som me assustou. Quando eu a olhei, ela me encarava de volta, com uma genuína expressão de "eu tinha razão" estampada em suas feições meigas e sagazes.

— Tudo bem, você venceu. Ainda sim, é imprudente.

— Um pouco de vida, minha jovem Isabella, lhe cai muito bem. - cantarolou ela.

Fiz uma careta.

— Sabe que não gosto de ser chamada assim.

— Mas é o seu nome! - bravejou. - E é muito mais bonito que só "Bella". Parece um apelido que se daria a uma criança ou a um animal. Ah, mas Isabella… "Isabella" parece que estou falando com uma mulher de verdade, não um personagem de conto de fadas.

Franzi o cenho.

— "Natie" também parece bem infantil. - rebati, um tanto aborrecida. Natalie não era do tipo que media as palavras e as opiniões. Às vezes era espontâneo, às vezes de propósito. Em ambos os casos, eu sempre queria mandá-la ir à merda.

— Pois combina comigo. - contra-argumentou. - Ainda não tenho idade para beber.

— Verdade. - sorri. - Ainda é um bebezinho.

Natalie deferiu um tapa no meu ombro. Eu ri.

— Não exagere!

— Olha quem está falando.

— Dê uma pausa nessa sua chatice e tire algumas fotos minhas. - Puxando do bolso do próprio vestido, Natalie me deu uma câmera fotográfica digital.

Direi o objeto nas mãos, pouco à vontade.

— Ainda fazem esse tipo de coisa?

— As imagens ficam muito melhores do que tiradas por um celular. Vamos, vamos! - insistiu ela, batendo palmas. - Me faça parecer exuberante.

— Você, Natalie Estrada, é uma megera. - murmurei.

— Sei que você me ama, docinho!

 

 

Perto do meio-dia, Natalie me arrastou novamente pela multidão animada. Não fomos pegas, como previsto, mas agora estávamos atrasadas. Ela disse que a qualquer momento a guia que ela tanto mencionava entraria em contato com o grupo turístico formado para visitar o castelo.

Mais cotoveladas, xingamentos. Atravessamos a praça e fomos para perto da porta da igreja. Um guarda nos parou e disse algo que não entendi. Natalie mostrou a ele credenciais (?). Isso bastou para que ele nos deixasse passar mais a diante.

— Faz parte do pacote de turistas. - explicou ela. - Vamos poder ficar lá dentro. Temos nossos próprios lugares.

— Fascinante.

Estávamos posicionadas aos pés da escadaria que levava a entrada. Atrás de nós, os sacerdotes. À nossa direita e à nossa esquerda, mais turistas que aguardavam a chegada da imagem de São Marcos. Quando a grande imagem chegou ao centro da praça, carregada sobre uma tábua de madeira ornamentada, uma chuva de papéis vermelhos inundou nossas vistas., acompanhada do estrondoso soar do relógio que anunciava o meio-dia. A imagem passou por nós e fomos chamados para seguirmos adiante.

Nunca fui a uma missa católica. Talvez, no máximo, em alguns cultos da igreja presbiteriana (religião da avó Marie Swan) quando era criança. Então eu não sabia o que esperar. Os rituais litúrgicos eram muito bonitos, realmente, e eu assisti a cada um deles em silêncio. Assim que acabou, uma voz feminina, muito suave e delicada nos chamou. Tentei ver seu rosto através da multidão, mas Natalie me garantiu que era ela, a nossa guia. Seguimos os demais turistas até uma porta lateral. Acima das cabeças, pude ouvir sua voz:

— Sejam bem-vindos a Volterra, meus caros. - entoou ela, enquanto todos ficavam silêncio e dirigiam sua atenção a ela. - Sei que os senhores tiveram uma manhã agitada, mas com toda a certeza ela ainda não acabou. Venham comigo.

Saímos por aquela porta, para uma rua lateral. A essa hora, o sol não estava mais pleno daquele lado da cidade. Fomos pela sombra até a entrada principal do castelo. Era uma recepção chique, agora. A arquitetura estava preservada e tinha sido reformada. Assim como a hospedaria, haviam muitos quadros ali. À nossa direita, uma fileira de três elevadores. Para a esquerda, portas duplas de vidro fosco e mogno. Elas foram abertas e nós entramos. Como éramos as últimas, vimos quando dois homens vestindo capas escuras elegantes fecharam as portas assim que passamos. Aquilo provocou um arrepio na minha espinha, pois eu jurava que eles não estavam lá antes.

— Aqui é nosso restaurante. Temos os mais variados pratos da região. Fiquem à vontade para se alimentar. A essa altura até eu estou sedenta por uma boa comida. - disse ela em tom de piada. A maioria riu. Poucos permaneceram sérios, talvez desconfortáveis ou porque não entenderam já que a tal guia falava em inglês.

Natalie nos arrastou para as mesas mais próximas. Nos sentamos juntos a uma família suíça. Eram cinco: uma senhora de sessenta e cinco anos, sua filha caçula de trinta e dois, seu genro de quarenta anos, os netos, um menino oito e outro de dois anos. Era a primeira vez que as crianças viajavam para fora do país. Esta senhora, cujo nome não me recordo, disse que era tradição da família irem ao festival todos os anos, e que estava grata por seu genro ter conseguido o pacote exclusivo para turistas.

— Eles são muito disputados. - disse ela, enquanto cortava um cogumelos refogado em vinho ao meio. - E são só disponibilizados nesta época do ano. Se não fosse pelos contado dele, estaríamos nos acomodando em algum restaurante comum para a celebração da noite. Em vez disso, faremos um tour pelo castelo. - concluiu ela, animada e satisfeita.

Aproveitei a pausa em suas falas e sondei todo o salão. Ali deveríamos ser no mínimo cinquenta visitantes, distribuídos em doze mesas.

— Natie, - sussurrei para ela. - qual dessas é a guia?

Natalie, que conversava alegremente com o menino mais velho, se virou para mim e passou a olhar cada um dos presentes.

— Nenhum deles. - respondeu, depois de dois minutos.

— Assim que deu instruções aos garçons, ela se retirou. - disse o genro, apontando para outra portas laterais, por onde saiam os garçons. A cozinha, talvez. -. Deve ter ido comer em outro lugar. Normalmente, os funcionários têm o próprio refeitório. 

Assenti.

— E qual é o nome dela? - perguntei.

Natalie franziu a testa.

— Eu não me lembro… - disse Natie, de repente muito confusa. - Nem sei se ela ao menos disse para mim.

— Também não lembro. - falou mais uma vez o genro. - Mas eu vi as credenciais dela. Era oficial. - Ele tentou sorrir e passar segurança, mas obviamente se sentia desconfortável ao se dar conta de um fato um tanto perturbador. 

Tentei sorrir também, empurrando o desconforto para a beirada do estômago. Voltei a comer pacientemente.

Depois de quarenta minutos, as portas duplas às nossas costas se abriram de novo. Natalie, que estava virada de perfil, olhou para quem entrava, e seu queixo foi ao chão.

Ela não foi a única que teve reação semelhante.

— Boa tarde. - disse uma voz sedutora e cristalina.

Virei-me para ver quem entrava, e senti o mundo girar. Não porque fosse a criatura mais bela do recinto, em seu lindo vestido de camurça vermelho colado no corpo, seus saltos scarpin igualmente vermelhos ou seu cabelo volumoso e em cascatas onduladas, os olhos incomumente violetas, ou sua pele pálida como giz. - Ela era exuberante, era perfeita. Tal perfeição era humanamente impossível de olhar e não perder o fôlego; eram como todos estavam enquanto a encaravam. Todos, menos eu.

O medo me paralisou de tal maneira que Natalie precisou me arrastar com ela para que acompanhássemos o grupo em nosso tour. Eu a ouvi falar com alguém, pedir um copo d'água, falar comigo, mas meu corpo não conseguia reagir. Eu estava no automático. Mergulhada em um torpor sinistro. Às vezes eu sentia arrepios. Em minha cabeça, um filme muito antigo e borrado rodava.

Era a biblioteca de Carlisle. Edward estava contando a história do Cullen mais velho, o pai e criador na maioria de seus irmãos e irmãs. Ele havia nascido em algum ano do século XVII, em Londres, e tinha sido atacado por outro vampiro. Ele se arrastou e se escondeu para que não fosse descoberto e morto. Um porão cheio de batatas podres. Quando saiu, já era outra pessoa e se odiou por isso. Tentou se matar, renegou o sangue humano. E quando já não tinha mais forças, descobriu uma nova maneira de viver. Estudou, viajou a vários lugares. Viajou até a Itália, onde conheceu vampiros diferentes daqueles que o atacaram anos antes. Eles ficaram fascinados pelo seu estilo de vida e o convidaram para ficar com eles. Havia uma pintura deles quatro na biblioteca; era a maior e mais colorida de todas. E mesmo depois da partida de Carlisle, eles permaneceram ali, em sua residência e fortaleza fixa. Seus nomes eram Aro, Marcus e Caius: os patronos noturnos das artes...

Da mesma forma abrupta em que fui arrastada para o mundo da semi-inconsciência, eu retornei ao mundo real. Minha primeira reação foi agarrar o pulso de Natalie com força. Isso a fez parar. Ela me olhava parecendo estar tão assustada quanto eu, por mais que não estivesse entendo o que estava acontecendo.

Olhei ao redor. Estávamos em um corredor cinza, do chão até o teto, iluminado por luzes brancas fluorescentes. À nossa frente, os visitantes se espremiam para passar pela pequena porta na parede. No final, grandes portas ornamentadas permaneciam fechadas.

Respirei fundo e forcei a minha voz a sair.

— Precisamos sair daqui. - Tentei falar da forma mais clara e baixa possível pois sabia que poderiam nos ouvir. 

Isso deixou Natalie mais apavorada. Não era para menos: meu corpo tremia dos pés a cabeça e eu estava prestes a chorar.

— O que está acontecendo? - sussurrou.

Balancei a cabeça, tanto para tentar me manter sã quanto em negação.

— Não é hora para isso. - respondi, e a arrastei pelo caminho de volta.

Logo atrás de nós, ouvimos mais uma vez a voz da mulher de vestido de camurça:

— Algum problema, senhoritas?

Foi Natalie quem respondeu:

— T-temos que ir ao banheiro.

A mulher nos contornou.  Seus olhos violetas estavam fixos em nossos rostos enquanto bloqueava a passagem.

— Mas a pausa para o banheiro já foi dada. - disse ela em um tom fraternal, como uma mãe advertindo um filho pequeno. - Nós e seus colegas de viagem temos hora, sabia?

Ela estava tentando nos persuadir a prosseguir.

— Não…

Antes que uma única frase fosse formulada, fomos surpreendidas pelo som de dezenas de pessoas gritando em desespero. O som saia pela porta e reverberava pelo corredor. Nós três olhamos para trás ao mesmo tempo. Vi Natalie ficar branca, a cara retorcida em uma expressão de horror. Ouvimos a guia xingar baixinho, mais um rosnado do que um xingamento.

Quando nos demos conta, estávamos sendo arrastadas para dentro em uma velocidade inumana. A guia nos lançou ao chão, mas em vez de aterrissar sobre mármore branco, caímos sobre os corpos de pelo menos umas quinze pessoas, todas elas com suas gargantas cortadas por dentes afiados e brancas após terem tido todo o sangue de seus corpos drenado. Ao meu lado, ouvi Natália gritar e vomitar. O cheiro de sangue era fraco, mas ainda fazia o meu estômago embrulhar e eu vomitei também.

Alguém riu da nossa cena.

— Esses tolos são engraçados. - comentou alguém. Tentei focar a minha visão embaçada em quem falava. Ainda estava um pouco tonta, então mantive a cabeça baixa. Péssimo momento para ser um peso morto. - Elas têm um cheiro ótimo, mas não acho que vou querer me alimentar delas depois disso. - Outra gargalhada.

— B-b-Bella… - ouvi Natalie choramingar. Suas mãos tocaram em mim. Estavam suadas e muito frias. Seus olhos de amêndoas estavam vermelhos e inchados. A boca suja de vômito, estava cortada. Provavelmente batera no chão.

Alguém, um homem de estatura média, veio por trás, agarrando-a pelos cabelos e a suspendeu no ar. Natalie gritou e se debateu. Então foi arremessada contra a parede de pedra branca. Ouvi algo se quebrando, provavelmente um osso. Ela ficou caída no chão, a respiração entrecortada por causa da dor.

— NATALIE! 

Eu me joguei na direção dela, me obrigando a correr apesar da fraqueza. Fui interceptada a meio caminho pelo mesmo homem, o mesmo vampiro. Seus olhos vermelhos e brilhantes transmitiam divertimento. O pequeno showzinho que ele criava parecia estar saindo como o planejado.

Ele se agigantou sobre mim, me fazendo recuar aos tropeços. Mais uma vez, cai sobre os corpos frios.

— Queridinha, - murmurou ele em um tom de veludo. - aguarde a sua vez.

Alguém deu um muxoxo de insatisfação.

— Sabe o quão feio é brincar com a comida, Demetri? - murmurou uma voz infantil. Era uma menina de cabelos curtos e loiros, rosto angelical. Não deveria ter mais do que treze anos quando foi transformada. Ela usava um tom de cinza mais próximo do negro. - Pode acabar "esfriando".

Ouvi Demetri bufar. Ele caminhou até Natalie em velocidade humana e deu um pequeno chute nas costelas de Natie. Outro estalo. Um gemido agudo de dor. Ela estava de bruços, então não pude ver o estado em que o seu rosto estava; ele havia batido na parede também.

— Ela parece bem viva para mim. - resmungou ele. - Apesar de que não estou mais com a sede de antes. Mas pombinhas doces com esta aqui, - Demetri se agachou, tocando o cabelo de Natalie como se acariciasse um cão de estimação. - são únicas.

— Tire as mãos dela. - Eu ainda estava assustada, mas algo dentro de mim precisava falar. - Natalie não tem culpa de nada. Deixe ela ir.

Todos que ainda estavam na sala (metade tinha partido com a maioria dos corpos) riram da minha súplica sem sentindo.

— Qual é o seu nome, linda? - perguntou Demetri.

— Bella.

— Considera-se culpada de alguma coisa, minha querida Bella? - Ele riu, fazendo piada comigo.

Só pude assentir. Meus olhos não saiam de Natalie. Depois do chute, ficou parada. Provavelmente havia desmaiado de dor. Demetri ainda acariciava enquanto esperava que eu falasse. 

— Por não ter uma boa memória. - admiti. 

Seu sorriso se alargou.

— Então veio ao lugar certo, Bella! Temos aqui alguém muito bom com lembranças esquecidas.

— Ora, poupe-nos dos seus teatrinhos, Demetri! - Era a garota novamente. Eu não ouvi quando ela se aproximou. Como um fantasma sorrateiro, ela veio por trás de mim e deu um pontapé em minhas costas, fazendo-me cair sobre o mármore. Ela sinalizou para que outros viessem pegar os corpos restantes. Diferente de Demetri, não foi um empurrão para me machucar, apenas para me tirar do caminho. - O Mestre não merece ser perturbado por tão pouco.

Demetri fez biquinho.

— Então acorde a minha pombinha,  Jane. - choramingou ele falsamente, apontando para Natalie inconsciente. - Ela dormiu bem no início. As coisas perdem totalmente a graça quando elas não estão acordadas.

— Você é patético. - Eu a ouvi resmungar.

Como uma ressurreição do inferno, o corpo de Natalie começou a se retorcer. Meio segundo depois, Natalie gritava a plenos pulmões. Demetri deu alguns passos para trás, a fim de assistir tudo com todos os detalhes.

Eu me levantei e corri para ela. No exato momento que toquei o seu corpo, a tortura parou. Natalie olhou para mim, os olhos loucos, desorientada, castas de lágrimas caindo. Ela cravou as unhas em mim, tentando me puxar para ela. Estava fora de si. - Como eu imaginava, seu rosto estava machucado. Onde havia batido, uma grande mancha vermelha que logo ficaria roxa.

Tentei mantê-la estável, mas ela mais parecia um gato abandonado e assustado, totalmente hostil em seu medo. Ela tomou impulso para se levantar, mas a dor dos ossos quebrados fez ela desfalecer mais uma vez. Demetri riu. Jane ainda nos olhava, com um sorrisinho diabólico nos lábios cheios. 

Talvez por saber que iria morrer ali, tomei um fôlego de coragem (ou insensatez). Segurei firmemente o corpo de Natie e o ergui. Como tive forças para isso? Não sei. Comecei a arrastar até a pequena porta, determinada a dar tudo de mim.

— Jane. - Ouvi Demetri se lamentar. - As pombinhas planejam fugir.

Jane riu em resposta, então ficou silêncio.

Eu esperei pela dor, esperei pelo agarrar de braços gélidos e duros. Mas nada aconteceu. Continuei avançando a passos lentos.

Então aquilo que eu já esperava veio: Natalie foi arrancada de minhas mãos e atirada para longe como uma boneca velha. Meu rosto se chocou contra o chão e meu pescoço foi envolvido em um aperto de ferro. Mudaram minha posição, erguendo-me e me colocando de joelhos no meio da sala. Uma Jane furiosa veio para cima de mim, irritada, fuzilando-me com o olhar, como se pudesse me matar assim.

Depois de alguns segundos, ela deu um passo para trás. Seu rosto era envolto em pura cólera e incredulidade. Demetri ficou em silêncio, esperando. Ele parecia tão incrédulo quanto ela. Era como se algo que deveria ter acontecido comigo, não tivesse ocorrido. Talvez o que foi feito a Natalie poucos minutos atrás. Seria essa a habilidade de Jane? Infligir dor?

— Chame o Mestre. - disse ela a alguém que não pude virar para ver por estar imobilizada.

— Jane. - sussurrou Demetri.

— Agora não é hora. O Mestre precisa ver isso.


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Notas finais do capítulo

Não esqueçam se comentar o capítulo e dar a opinião de vocês. Ela é muito importante para mim.


Obrigada por acompanharem essa projeto audacioso (pelo menos para mim!).