Encontros e Reencontros escrita por Myosotis Fox


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

espero que aproveitem a leitura! ^^



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Apenas o distante pio de uma coruja acompanhava a caminhada da garota de cabelos rosados, que seguia determinada por um vasto campo florido. Como era a primeira noite de lua cheia, a energia estava ideal para colher as prímulas noturnas, mesmo que os feitiços com elas fossem mais efetivos quando realizados em outra regência lunar. Tinha visitado aquele campo na semana anterior, mas dessa vez Gahyeon estava sozinha, pois estava sendo testada. Sua tutora tinha explicado como perceber quais plantas emanavam melhor energia, e a deixara como responsável por coletá-las como maneira de provar que tinha aprendido corretamente.

Quando encheu a cestinha em suas mãos, a garota decidiu que era o bastante e voltou à trilha que a levaria para sua atual morada. Anunciou sua chegada ao que cruzou a porta, mesmo que suspeitasse que não precisaria – Yubin certamente tinha sentido sua energia se aproximando. A mais velha estava na sala de estudos, dois livros flutuando ao seu redor enquanto anotava alguma coisa, e logo ergueu o olhar para a novata.

—Bem-vinda de volta — ela lhe sorriu, depositando os livros na mesa antes de pegar a cesta. — Vamos ver como você se saiu.

Passaram-se alguns minutos com Yubin analisando as pequenas florações amareladas, vez ou outra se demorando mais em alguma, fazendo uma breve tensão respingar nos pensamentos da garota de cabelo rosado.

—Algumas poderiam ter sido melhor escolhidas — declarou por fim, mas abriu um sorriso antes de completar —Mas você fez uma ótima coleta. Já vi bruxas mais experientes que não liam energia tão bem.

Um sorriso tomou os lábios de Gahyeon, um reflexo genuíno do orgulho que a preencheu. A tutora se levantou para levar as flores até o local adequado de armazenamento, e ambas caminharam juntas enquanto a mais nova externava algumas de suas dúvidas. Estavam concluindo a tarefa quando o celular de Yubin tocou – e ela pareceu surpresa ao que seu olhar alcançou a tela. Ainda assim, atendeu com um sorriso de canto.

—Olha só quem finalmente voltou para a cidade — mas sua expressão ficou séria ao que o outro lado da linha explicava o motivo da ligação. — Você trouxe alguma jóia verde com você? Algum medalhão antigo, talvez? – deve ter ganhado um assentimento – Hm, acho que já sei o que é, me dá 20 minutos que chego aí.

—Algum problema? — indagou, mas ela já se movia pela sala

—Um amigo colecionador que se esqueceu de que a primeira regra pra isso é passar por uma revisão mágica.

Gahyeon ainda não tinha se aprofundado nesse estudo, mas lembrava sobre alguns comentários quanto a isso. Várias vezes, jóias antigas e pedras preciosas carregavam energias estranhas ou armadilhas, e até mesmo espíritos — alguns artefatos perturbavam quem quer que se aproximasse , mas algumas precisavam de algum gatilho específico para se mostrarem, o que as faziam ser muito facilmente comercializadas para indivíduos despreparados – e portanto possuidores de magia deveriam sempre realizar feitiços específicos antes de comprar qualquer coisa.

—O que você acha que é?

—Um elemental. – Yubin vasculhava seus livros atrás do certo que lhe indicaria a magia que precisava, mas não deixou de responder – O indicado seria um domador lidar com isso, mas tem alguns anos que não vejo ninguém com essa afinidade... Vou só devolver o elemental pro medalhão e guardá-lo em segurança até o momento certo.

—Seu amigo não tem como fazer isso?

—Ele não faz magia. – explicou a mais velha – Ele tem alguns objetos magicamente carregados, mas nenhum que sirva pro que vamos fazer.

—Ah... – Gahyeon não guardou sua confusão – Por que um humano teria objetos assim?

Yubin deu um sorriso de canto.

—Eu não disse que ele era humano.

 

 

Apesar do dono da casa não ter magia, como tinha sido apontado, ele tinha conhecimento e contatos mágicos o suficiente para que sua residência tivesse proteções mágicas que impedissem que alguém teleportasse diretamente no terreno. Portanto, a dupla de bruxas se teleportou para a localidade mais próxima dele, e caminhavam há alguns minutos.

Gahyeon gostaria de poder alegar que as batidas ecoando em seu peito estavam aceleradas devido ao movimento físico, mas sabia bem que não era esse o motivo. E sua apreensão provavelmente estava escapando por sua expressão, porque sua tutora não resistiu em comentar.

—Sabe, vampiros conseguem sentir o cheiro de medo. Dizem que deixa o sangue mais atrativo.

Ela certamente poderia passar aquela noite sem ser lembrada de algo assim. A mais nova já tinha aprendido que vampiros eram reais – bem, magia existia, então por que não? –, mas a perspectiva de encontrar um tão de repente a tinha deixado um pouquinho assustada.

Talvez mais do que um pouquinho.

—Você não precisava me lembrar disso! – replicou, exasperada, ao que Yubin riu

—E você não precisa se preocupar. Yeosang não é nenhum novato.

—Tem certeza?

—Absoluta. – não houve hesitação em seu tom, mas ela ainda completou – Eu já me machuquei na frente dele e ele nem se alterou.

—Nossa. – não escondeu a surpresa, nem a curiosidade que aquele comentário aflorou – Vocês se conhecem há muito tempo?

—Tem alguns anos. – contou a bruxa de cabelos azuis – Eu precisava de um ingrediente raro para uma poção e um amigo me repassou o contato dele, porque ele provavelmente teria. E tinha. Assim como tinha vários livros interessantes demais para uma bruxa novata e curiosa.

—Uma amizade sincera e desinteressada. – provocou Gahyeon, conseguindo um sorriso de sua tutora

—Exato. Eu acabei voltando várias vezes na casa dele e a gente sempre conversava, muitos dos livros e objetos mágicos que Yeo tem é porque tava sempre viajando... Já viajamos juntos também. Uns dois anos atrás, ele teve que resolver um problema familiar e voltou para sua terra natal. Eu nem sabia que ele tinha voltado...

A mais nova completaria com um “até agora”, mas algo a interrompeu. Sentiu um leve choque na altura das têmporas, e por reflexo levou as mãos até o local, mas a sensação sumiu tão rápido quanto apareceu. Contudo, nem aproveitou o alívio, porque um ruído ficou para trás, entremeado com seus pensamentos.

—O que foi? – indagou Yubin, preocupada

—Eu não sei? – foi sincera – Eu senti como se algo tivesse me dado um choque, e agora to ouvindo um barulho que parece uma tv fora do ar. Tá bem baixinho, mas não consigo ignorar...

A bruxa mais velha ergueu uma sobrancelha, uma expressão pensativa que lhe dizia que ela tinha uma teoria, mas talvez não a externasse.

—Você pode estar captando a energia de algum objeto, ou mesmo do feitiço de proteção. – apontou – Até porque, chegamos.

No meio tempo em que ela bateu na porta até esta ser aberta, a tutora segurou seu pulso e sussurrou algo em linguagem mágica, e a estática parou. Impressionante como Yubin sempre sabia o que precisava fazer. Pensou em agradecê-la, mas não teve tempo de verbalizar sua gratidão, pois logo foram atendidas.

—Nunca pensei que ficaria tão feliz em te ver. – Yeosang comentou, em tom de provocação

—Você sempre fica. – Yubin devolveu a brincadeira com o mesmo sorriso

E então, ela o abraçou, o que Gahyeon sabia ser um sinal de grande estima porque sua tutora não era muito fã de contato físico. E ele também parecia bem aconchegado no gesto, a acolhendo como alguém com mais saudade do que admitiria.

E, hey, ele era bonito. Os mitos sobre vampiros sempre ressaltavam aquela característica, e Yeosang fazia muito jus àquela fama, parecendo ter escapado de alguma obra de arte. Genuinamente esperava que não tivesse corado quando o olhar dele recaiu sobre si.

—Quem é a rosadinha?

Yubin respondeu antes que pudesse protestar.

—Essa é a Gahyeon, minha aprendiz.

—Desde quando você tem uma aprendiz?

—Uns seis meses.

Ele pareceu surpreso pelo tanto de tempo – até porque, deveria corresponder à última vez que conversaram, talvez até mais. E, se por um lado era muito compreensível que alguém imortal perdesse a noção do tempo, por outro ainda era bastante perdido. Talvez o vampiro fosse falar algo, mas, visto que a atenção da bruxa mais velha tinha recaído completamente sobre ele, ela não deixou de notar algo errado.

—Pelas deusas, Yeo! – ela pegou delicadamente a mão dele, virando a palma para cima e deixando visível a marca de queimadura que a cobria – Não me diga que tentou segurar um elemental?

—Eu não to acostumado a pensar na possibilidade de me machucar, lembra? – a segunda parte do resmungo saiu entredentes – E eu não sabia o que aquela coisinha era.

Enquanto ele replicava, Yubin já tinha pescado algumas folhas de babosa da sua bolsa – necessárias na maioria de feitiços de cura envolvendo feridas superficiais, então claro que ela fazia questão de sempre levá-las em qualquer missão que executava, por precaução –, e logo sussurrava as palavras certas da magia de reparo. O vampiro não reteve um suspiro de alívio ao que a ação foi concluída.

—Então... onde você deixou a “coisinha”?

—Deixei no mesmo lugar em que apareceu. – respondeu ele, as conduzindo pela casa – Ela não pareceu muito disposta a me perseguir...

—Elementais geralmente não conseguem se afastar muito de seu amuleto assim que são evocados. – a bruxa de cabelos azuis explicou, e não deixou de avisar – Mas pelo tempo desde que você me ligou, é possível que já consiga se locomover melhor. Então, quando nos ver...

—Deve se sentir ameaçado e tentar fugir. – a mais nova completou, ganhando um assentimento

A conversa se concluiu a tempo de alcançarem a porta do escritório onde Yeosang costumeiramente deixava artefatos recém-adquiridos. As duas bruxas já estavam devidamente protegidas para caso precisassem tocar no elemental – Yubin fez questão de executar o feitiço de proteção antes mesmo de saírem de casa –, então a dupla entrou no cômodo sem hesitar.

E se depararam com uma sala vazia.

Antes que Gahyeon pudesse externar em voz alta sua confusão, seu olhar foi instintivamente guiado até a lâmpada que iluminava o local, e não deixou de perceber uma energia diferente no objeto.

—Ali! – exclamou

E talvez nem precisasse ter apontado visto que, no instante seguinte, o brilho aumentou bem além do que a eletricidade normal possibilitaria, e então a lâmpada estourou. A sala só não ficou em escuridão completa porque a fonte daquele caos irradiava luz de seu pequeno corpo, de pé logo ao lado de um cordão com um pingente de esmeralda. O ser era constituído de uma onda de energia azulada em uma forma que se assimilava a um furão, com pequenas faíscas percorrendo seu corpo vez ou outra. Havia certa beleza hipnótica naquele ser para a bruxa de cabelos rosados, e talvez tenha sido por isso que não reagiu de primeira quando o elemental passou direto por si. Yubin ainda tentou acertá-lo com sua magia, mas ele se transformou em um sutil rastro elétrico, escapando pela porta entreaberta e quicando na parede do corredor antes de alcançar outra lâmpada e seguir a fiação.

—Devo me preocupar? – indagou o vampiro

—Talvez você precise trocar alguns fios depois. – a bruxa mais velha comentou, pegando o amuleto antes de sair do cômodo – Mas vamos, ele não vai conseguir escapar da casa com as proteções que tem aqui.

Como previsto, o encontraram completamente materializado no cômodo mais afastado, arranhando a janela como um animal aprisionado. Ao que percebeu que quem lhe perseguia já tinha o alcançado, o elemental emitiu um chiado que provavelmente era o equivalente a um rosnado, seguido por palavras rodeadas de estática.

Por que vocês não me deixam em paz? Mais um passo e eu queimo a cara de um!

—Hey, tá tudo bem. – Gahyeon respondeu, com as mãos em gesto de rendição – Não estamos aqui pra te machucar.

—Você... tá falando com o Pikachu defeituoso ali? – perguntou Yeosang, nitidamente perdido

—Porque ele falou com a gente? – as expressões continuaram tão questionadoras quanto antes, se não mais – Vocês não ouviram?

Ambos negaram – bem, talvez fosse bom que o vampiro não soubesse o que o elemental replicou depois daquele apelido –, mas, pelo sorriso de canto no rosto de sua tutora, ela já tinha entendido o que estava acontecendo.

—Isso está além das nossas habilidades, domadora. – e ela colocou o amuleto em suas mãos

—Que? – só conseguiu ter essa reação muito articulada, mas Yubin não se interrompeu

—Você estava mais sensível até antes de entrar na casa. E não tem outra maneira de entender mais do que chiados de um elemental sem essa afinidade. – ela falava com tanta certeza que não teria como discordar – Vai, conversa com ele. A você ele vai ouvir.

A mais nova se voltou mais uma vez para o ser elétrico, percebendo que ele observava o desenrolar da conversa com uma postura mais tranquila. Ainda assim, havia um tom de desafio em sua voz quando falou, antes mesmo que a garota pudesse pensar em algo.

Você não vai me trancar dentro dessa coisa de novo, vai?

—Ah... – ela entendeu que ele se referia ao amuleto em sua mão – Bem, vou. Mas você vai ficar comigo, e eu prometo que todo dia te solto! Isso aqui vai ser só uma maneira de sempre te carregar comigo.

Não sabia exatamente como um corpo feito de energia podia ter expressão, mas sentia que a dele estava pensativa pelos poucos segundos antes de concordar. Então, Gahyeon caminhou até ele, estendendo o cordão e murmurando as palavras que Yubin tinha lhe ensinado. O furão se tornou apenas um rastro de energia luminosa ao que voltava para o medalhão.

 

 

Claro, com o problema resolvido, a dupla de amigos concordou que a visita era uma boa oportunidade para colocar a conversa em dia, então as bruxas simplesmente acabaram ficando naquela casa pelas próximas horas. Yubin sempre dizia que é possível aprender coisas novas de qualquer acontecimento, e a mais nova não podia discordar, pois já aprendera muito só de ouvi-los conversando. Também não passou despercebido como sua tutora estava mais risonha, o que demonstrava quão confortável ela se sentia perto de Yeosang – e o contrário parecia ser verdade também.

Contudo, considerando como as duas visitantes não eram seres noturnos, em algum ponto a conversa começou a ser cortada por bocejos. Reconhecendo que o horário era um tanto avançado para uma viagem de volta, o dono da casa as convidou para dormir ali mesmo. Naquele momento, a mais velha já estava na terra dos sonhos, mas Gahyeon, mesmo que cansada, ainda estava muito desperta com o que tinha acontecido naquela noite. E foi assim que viu quando Yeosang parou no batente da porta do quarto onde estavam.

—Só vim checar como vocês estão... – informou ele ao que percebeu seu olhar sobre si – Mas acho que Yubin já tá bem acomodada. – a garota de cabelos rosados riu, concordando, e ele ficou um breve momento apenas a fitando com um olhar terno antes de voltar a falar – Eu não tinha percebido o quanto sentia falta de conversar com ela até agora.

—Ela é incrível, né?

—É sim. E achou uma aprendiz à altura.

—Wow. – sorriu a mais nova – Isso sim é um elogio.

—Foi merecido. – o tom gentil do vampiro sutilmente evaporou ao que ele adicionou – Mas, por favor, da próxima vez que vier aqui, não traga seu amiguinho.

Isso só a fez rir, e sua mão estava no medalhão até antes de responder.

—Sinto muito, mas não vou desgrudar dele tão fácil.

—Domadores. – Yeosang fingiu irritação, mas viu que não havia crítica real ali – Boa noite, rosadinha.

A garota ainda protestou, mas ele já tinha se retirado. E, ao final de alguns segundos, ela não conteve um sorriso, pensando na interessante amizade que tinha ganhado naquela incomum noite.


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Notas finais do capítulo

agradeço que chegaram até aqui! se puderem deixar um comentário me contando o que gostaram mais, o que eu poderia melhorar, ou qualquer coisa que pensaram enquanto liam, eu ficaria ainda mais grata!



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