Jane Austen disse... escrita por Larissa Vitória


Capítulo 3
3. Me manda um telegrama, uma carta de amor


Notas iniciais do capítulo

Boa noite, pessoal! Depois de alguns meses desaparecida (por motivos de TCC), estou de volta ao Nyah e a "Jane Austen disse..."

Para quem marcou que estava acompanhando, peço mil desculpas pela demora e prometo que - agora que estou oficialmente formada e novamente com tempo livre na agenda - vou atualizar a história com frequência!

Espero que gostem do capítulo de hoje!



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“Belas cores no rosto e olhos brilhantes? Onde eu estava com a cabeça?” Draco se arrependeu das palavras ditas à Hermione assim que elas saíram de sua boca, mas não havia como voltar atrás.

Para evitar ainda mais constrangimento — Hermione olhava para todas as direções exceto a sua com uma expressão de quem não acreditava no que ouvia —, o professor achou melhor interromper a conversa ali mesmo e afastar-se da garota.

— É melhor você voltar logo para a aula, senhorita Granger. Até a próxima! — disse ele já se afastando na direção contrária a das quadras de esporte. O passeio por Hogwarts teria que ficar para depois.

No caminho de volta ao seu escritório e quarto pessoal, Draco perguntava o que havia de errado com si mesmo nos últimos dois dias. Sendo um professor jovem e, modéstia à parte, “bem-apessoado”, os comportamentos inadequados de alunas não o surpreendiam.

Mas, para evitar passar a impressão errada e atrapalhar sua vida profissional (e também porque achava muito estranho o interesse de adultos por garotas em idade escolar), sempre ignorou qualquer comentário, elogio ou “proposta” de alunas mais atrevidas.

Agora, quando sua carreira estava decolando e havia sido aceito em um dos internatos mais renomados do país, colocava tudo em risco. Se Hermione se sentisse incomodada ou ofendida e decidisse procurar a direção, ele teria sérios problemas. Claro que poderiam ignorar um caso isolado, mas sua reputação estaria irremediavelmente manchada.

E tudo por quê? Por uma garota que conhecia a menos de dois dias completos e por quem não nutria qualquer tipo de interesse além de uma curiosidade? Parecia que estava de volta aos tempos do colégio, quando provocar o sexo oposto para chamar atenção era um de seus hobbies preferidos.

Já no escritório, Draco agradeceu por não ter encontrado ninguém no curto trajeto. Não conseguiria disfarçar a expressão preocupada em seu rosto. Uma pergunta surgiu em sua mente e ele foi até a escrivaninha, onde sabia que encontraria a resposta.

Folheando sua grade de aulas para o restante da semana, Draco respirou aliviado ao conferir que o próximo encontro com o terceiro ano seria apenas na sexta-feira. “Quem sabe ela já não esqueceu tudo até lá”, pensou esperançoso.

Mais tranquilo com a garantia temporal, o professor decidiu evitar a aluna fora das aulas. Ignorá-la completamente poderia levantar suspeitas, então ficaria restrito ao “olá, tudo bem?” e “tchau” nos próximos encontros.

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Mas não foi fácil a tarefa de restringir as conversas com Hermione. Encontros aleatórios aconteciam com frequência — a aluna parecia estar em todos os lugares, para seu azar — e, sempre que a via, as frases provocativas vinham à cabeça e lutavam para sair pela boca.

Como quando passava pelo pátio e notou a garota sozinha, sentada em um balanço e perdida em pensamentos. Precisou de todo seu autocontrole para não ir até ela e dizer “Você sabia que balanços não são feitos para ficarem parados?” enquanto empurrava as cordas do brinquedo. Caminhou para longe de lá imaginando qual resposta afiada teria recebido dessa vez.

Teve também a ocasião em que, em uma quinta-feira de sol na qual todos os alunos aproveitavam o clima agradável após o fim das aulas, Draco encontrou Hermione enfurnada na biblioteca, com uma pilha de anotações à sua frente.

“Acho que os seus potenciais Mr. Darcy estavam certos, só uma Mary Bennett trocaria um passeio pelos estudos em um dia como esse”, era o que queria dizer. Contudo, contentou-se em dar um tchauzinho com a mão e partir em busca dos livros para as aulas do dia seguinte.

Por alguma razão ainda fora de sua compreensão ela despertava seu lado brincalhão. Talvez fosse o jeito como a seriedade de Hermione estava sempre acompanhada de um certo ar travesso. Por isso — e também por suas interações anteriores — acreditava que ela sempre teria uma resposta à altura de suas provocações.

E não só para as provocações, aparentemente, mas também para todas as suas perguntas durante a aula. A mão de Hermione era a primeira a erguer-se sempre que ele questionava a classe. Ela fazia jus a fama de sabe-tudo e suas respostas sempre o impressionavam pela precisão.

No jantar da sexta-feira ele observou discretamente como ela interagia com os amigos mais próximos. Da mesa dos professores não era possível distinguir o que diziam, mas ouviu gargalhadas em vários momentos. Pelos gestos do grupo, também supôs que Hermione ralhava com os garotos em alguns momentos.

A hipótese foi confirmada quando passou pela mesa, onde também estavam Neville Longbottom, Gina Weasley e Luna Lovegood, outra aluna do segundo ano com um ar sonhador inconfundível.

— Não importa se ainda estamos na primeira semana, vocês têm que levar isso aqui à sério. Já estão atrasados no cronograma e ainda nem começamos a etapa de exercícios revisórios — esbravejava ela.

Draco segurou a risada, pensando em como ela parecia mais mãe do que amiga dos dois alunos em alguns momentos.

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Após deixar o salão principal, Draco caminhou para o quarto enquanto fazia um balanço mental de sua primeira semana como professor de Hogwarts. Já próximo de seus aposentos, concluiu que o saldo era positivo: começou a construir uma boa relação com os alunos, se deu bem com a maior parte dos colegas e não foi denunciado pelos comentários feitos à Hermione Granger.

Satisfeito consigo mesmo, decidiu mudar a rota do quarto para a biblioteca. Hogwarts era conhecida por ter uma das melhores e mais completas coleções do país e Draco estava ansioso para descobrir tudo o que ela guardava.

Ele já havia ouvido falar da seção reservada, que continha títulos raros de grandes — e, muitas vezes, obscuros — nomes da literatura. E, como presente pelo desempenho no novo emprego, achou que seria adequado permitir-se explorar as maravilhas daquele espaço. 

A área que Draco ansiava por examinar ficava no fundo da biblioteca. Os livros especiais estavam separados do restante por telas e uma porta dupla com uma trava externa, sem cadeado. Os professores eram livres para circular por lá e Madame Pince, que ainda não havia se recolhido, não permitia que nenhum aluno ultrapassasse a barreira sem uma permissão especial assinada.

Ao deslizar a trava e abrir as portas do espaço, o professor sentiu como se estivesse adentrando o próprio paraíso literário. Draco aproximou-se da estante mais próxima, à esquerda da divisória, cuidadosa e solenemente, como se estivesse caminhando na direção de um nobre.

Retirou do bolso um par de luvas, necessárias para o manuseio de exemplares antigos e, muitas vezes, frágeis e já ia começar a ler as lombadas para ver o que as prateleiras reservavam para ele quando notou um brilho amarelado vindo do fundo das estantes. 

Draco logo descobriu de onde vinha aquela luz: as estantes à sua esquerda marcavam a fronteira entre a seção reservada e a área comum da biblioteca. Atrás delas havia estantes de livros regulares separados dos títulos especiais por outra tela. Sem um fundo sólido, era possível enxergar ver as mesas que ficavam nos limites do espaço, próximas às janelas.

E, no vão entre os livros e as prateleiras, o professor avistou os cabelos castanhos que, para ele, já tinham se tornado inconfundíveis. “Até aqui ela me persegue”, suspirou Draco. Mas depois deu de ombros e aceitou que havia arriscado a possibilidade de um novo encontrou quando decidiu ir para a biblioteca, pois aquele era o habitat natural dos sabe-tudo.

Além disso, havia passado quase três dias completos sem interagir com ela e não seria difícil continuar seguindo sua política de distanciamento quando contava com centenas de livros curiosos e inéditos para distraí-lo.

Draco concentrou-se novamente na seção reservada e foi bem-sucedido na tarefa de ignorar a presença de Hermione do outro lado das estantes. Como esperava, ele encontrou ali títulos que só tinha ouvido falar até então e estava ansioso para ler cada um deles.

Seus olhos brilharam quando se deparou com uma prateleira dedicada aos “livros perdidos” de autores clássicos da literatura mundial. E ali, entre fragmentos de textos inéditos de Hemingway, Walter Benjamin, Sylvia Plath, Lord Byron e outros grandes nomes do ofício, ele mal se lembrou da aluna e não viu mais o tempo passar.

Draco foi trazido de volta à realidade pela voz de Madame Pince anunciando que a biblioteca estava prestes a fechar. Ela falava diretamente com Hermione, que parecia ser a única aluna ainda por ali, e pedia que a garota se dirigisse logo ao dormitório.

O professor observou, ainda pelo vão dos livros, a aluna recolher os seus pertences. Draco percebeu que ela havia guardado os cadernos e livros em uma mochila, mas, na pressa de evitar a fúria de Madame Pince, derrubou um deles antes de sair de seu campo de visão.

Antes que a bibliotecária também viesse lhe expulsar, Draco tratou de encontrar seu caminho para fora dali. Antes, porém, foi até a mesa ocupada por Hermione e recolheu o livro que ela deixou cair para lhe devolver na próxima aula de literatura.

Não ficou surpreso ao ver que era uma edição de bolso de Orgulho e Preconceito. Pelas citações e referências na ponta da língua, ele imaginou que ela deveria ler aquele livro pelo menos uma vez por mês.

No caminho, notou a borda de um marcador de páginas colorida saltando para fora da cópia surrada e, quando chegou ao seu quarto, abriu casualmente o livro no local indicado para ver qual parte da história de amor de Mr. Darcy e Elizabeth ela estava relendo.

Para a sua surpresa, era um trecho que ele conhecia muito bem e que havia motivado sua resolução de não se aproximar de Hermione. No oitavo capítulo do livro, Lizzie vai até Netherfield Hall para visitar sua irmã doente que está sendo hospedada por Mr. Bingley.

Fã de longas caminhadas, Lizzie atravessa vários campos enlameados para chegar até lá, fato que a desagradável Miss Bingley usa para criticá-la mais tarde.

— Andar três ou quatro milhas, ou cinco milhas, ou lá o que seja, com os tornozelos metidos na lama, e sozinha, inteiramente sozinha! Que significa isso? Parece-me mostrar um conceito abominável de independência, uma indiferença toda campestre da mais elementar decência.

— Mostra a afeição que ela tem pela irmã - disse Bingley.

— Creio, Mr. Darcy - observou Miss Bingley, quase num sussurro -, que esta aventura deve ter afetado a admiração que o senhor tinha pelos seus belos olhos.

— De modo algum - replicou ele. - Achei que o exercício os tornaram ainda mais brilhantes.

Essa última frase, a mesma que Draco usou para elogiar Hermione no fatídico encontro na horta de Hogwarts, estava sublinhada. O grifo era discreto, feito por um lápis com o grafite suave. O professor não tinha como saber se a marca havia sido feita antes ou depois da última interação entre os dois. Mas, apesar do bom senso lhe ordenar que fizesse o contrário, ele torcia para que fosse a segunda opção, pois isso indicaria que ela também andaria pensando nele.

Depois de alguns minutos encarando a frase e considerando como seria perigoso — e interessante, não poderia deixar de negar — se a aluna de alguma forma lhe retribuísse o interesse, Draco decidiu deixar as conjecturas de lado, fechar o livro e encerrar o dia em sua cama. Hogwarts não poupava para o conforto dos professores e o colchão estava definitivamente entre um dos melhores que já experimentara.

Porém, o foco no descanso foi desviado quando ele pegou o marca-página de Hermione em sua mesa de cabeceira e observou o item com atenção pela primeira vez. Era um cartão postal com a foto das ruínas de uma estrutura que, pelos pilares e o formato, deveria ser um anfiteatro grego ou romano.

A legenda logo abaixo mostrou que ele estava certo: Teatro Romano de Plovdiv, Bulgária. Draco virou o cartão e descobriu que as surpresas da noite ainda não haviam acabado ao ler o postal. 

Querida Hermione,

Senti falta da minha amante de história favorita ao visitar Plovdiv, mas poderemos explorar outras paisagens juntos quando eu voltar. Desembarco no Carnaval e já pedi permissão para visitar Hogwarts! Mas posso esperar para vê-la…

Seu,

Viktor Krum

A mensagem era curta, mas não deixava dúvidas de que, ao contrário do que tinha dito a ele, Hermione tinha pelo menos um admirador. Será que o tal Viktor Krum era o seu Mr. Darcy?


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Notas finais do capítulo

Gostaram do capítulo? Dessa vez a citação é do oitavo capítulo de Orgulho e preconceito, para quem quiser reler.

Volto nos próximos dias para contar a vocês o que Hermione achou da postura de Draco ao longo da primeira semana em Hogwarts e também quais são seus sentimentos em relação ao postal de Viktor Krum! Até logo...



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