A Estrangeira, o Executor e o Capuz Vermelho escrita por Afrodeus da dança


Capítulo 10
6.2 - Procure (uma solução)




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Os olhos de Maria Hazenflug se abrem vagarosamente, sentindo seu corpo dormente. Ela vê uma grandiosa lua cheia em um céu enevoado, com nuvens que dançam através do céu azul. É como se a lua decidisse se fazer presente durante uma manhã. Maria vê alguns galhos com poucas folhas. Está deitada. No Sonho do Caçador.

Ela se levanta, devagar, como se tivesse despertado de um longo sonho. Sente seu corpo se mover pesadamente, ainda “acordando”. Leva a mão ao seu rosto, lembrando do golpe que levou. Aquilo a matou. Maria esfrega os olhos, e olha para a Oficina.

Respira fundo, olhando em volta.

— Johannes? — ela pergunta, chorosa.

— Olá, boa caçadora. — Ela ouve, em resposta.

Maria vê a Boneca, sentada ao lado da escada para a Oficina, como de costume. Ela, docemente, acena para Maria, que responde o gesto, começando a andar na direção dela. Sem ferimentos.

Johannes não está ali. E Maria não sabe dizer se isso é um misto alívio.

— O senhor Johannes ainda não chegou até aqui — a Boneca explica. — Ele ainda está lá, na caçada.

Maria morde o lábio. Se sente responsável por essa derrota. Johannes irá inevitavelmente morrer, ferido daquele jeito. E Pyrrha…

“Pobrezinha” Maria pensa, seus punhos se cerrando.

— Está tudo bem, boa caçadora? — A Boneca inclina o rosto, demonstrando, em traços gentis através de seu rosto, preocupação. — Parece aflita.

Maria suspira, tirando seu chapéu e passando a mão pelo cabelo.

— Eu… Nós estávamos indo bem. E então surgiu uma fera. Uma daquelas grandes, um homem besta, usando armas de caçadores. Parecia ter sido um caçador — Maria conta, com a voz triste mas tentando transparecer um pouco de graça. — Johannes estava um pouco mais lento que o habitual, pensativo. Acho. Talvez tentando entender aquilo. Eu fui impulsiva, acho. Só sei que acabei sendo jogada de um lado para o outro, e por causa disso, Johannes tomou uma ferida grande demais na barriga. Ele iria morrer. Não teria jeito para aquilo.

A boneca sorri, curiosa.

— E então?

— E então eu acabei ficando brava. Avancei com tudo e… E, bem, estou aqui. — Maria tenta rir.

A boneca sorri, mais abertamente.

— E estás triste por causa disso, boa caçadora? — ela indaga.

Maria faz que sim.

— E não é para isso que existe o Sonho? Para que possa aprender com o que seriam derrotadas cravadas na pedra? — a Boneca fala, no seu tom calmo de sempre.

Maria pende a cabeça para um lado.

— É, tem razão — ela resmunga.

— Então, não tenha medo — a Boneca fala. — Gostaria que eu canalizasse os ecos de sangue dentro de ti?

Maria abre a boca, pronta para dizer “sim”, mas para. Seu olhar parece se iluminar.

— Na verdade, se alguma hora, Johannes chegar aqui — Maria diz, começando a subir as escadas. — Diga para ele conferir os baús.

A Boneca inclina a cabeça para o lado, curiosa.

— Como desejar — ela diz, com um aceno de cabeça.

Maria retorna sem demora e caminha lentamente pelas lápides que conduzem eles de volta ao Mundo Desperto. Retornaria em que ponto? A lápide brilha, com a aproximação da mão da caçadora e ela é puxada de volta para o Mundo Desperto.

Ela retorna para o momento onde estava avançando sozinha pela caverna, após Johannes e Pyrrha alegarem haver uma fera adiante. Maria se levanta e olha ao redor, um pouco desnorteada, se localizando não só no espaço, mas no tempo. Sempre que chega e volta do Sonho, sozinha, se sente tendo acabado de acordar. Ou dentro de um sonho. A linha entre os dois facilmente pode se tornar tênue. Fina. Translúcida. 

Ela caminha para baixo, querendo conferir se ali era mesmo aquele lugar. Ela dá alguns passos, descendo alguns degraus, quando enfim ouve:

— Maria? — Ela escuta a voz de Pyrrha.

A voz da garota vem com uma espécie de alívio. Parece que não ouvia a voz de Pyrrha há tanto tempo. A caçadora vira para trás, com o coração na mão, chegando a correr por alguns degraus, tamanha é a ânsia para rever seus dois companheiros.

— Pyrrha? — Maria chama.

Ela ouve os passos de sua protegida se aproximando, com os passos pesados de Johannes logo atrás. Eles chegam com tochas apagadas. Pyrrha acena para a caçadora, olhando não só para Maria, mas por vê-la correndo, os olhos da garota mergulham em toda imensidão atrás da caçadora, escada abaixo.

— Ficamos preocupados contigo indo sozinha por tanto tempo — ela explica.

— E a senhorita Pyrrha me convenceu a virmos atrás de você — Johannes complementa.

Ela ergue o olhar para os dois. Seu olhar se enche de brilho vendo Johannes. Maria caminha até os dois abraçando-os, que, logicamente, ficam um pouco preocupados com a amiga, olhando para a escada preocupados. Preocupados que algum ser tivesse atacado Maria e agora viesse atrás deles.

— Está tudo bem? — ele indaga.

— Sim — ela responde, com a palavra tendo um gosto azedo em sua boca. — Só…

Ela faz uma pausa, sem saber como dizer isso perto de Pyrrha. E não querendo mandar ela para longe, apenas para contar que ela está de retorno do Sonho. Johannes viu a lanterna logo ali, Maria acredita nisso fielmente. É uma lanterna em uma escadaria escura dentro de uma caverna.

“É estranho” Maria pensa, conforme as coisas acontecem. “Eu sempre me sinto sendo levada por uma correnteza quando volto sozinha. Os mesmos diálogos acontecem. Meu corpo responde às mesmas coisas. Me sinto entorpecida. É tudo estranho. É quase como se eu não estivesse no real controle do meu corpo.”

— Bem, é, tem uma fera ali mesmo — Maria diz. — Ela não me viu, mas, aviso… É das grandes. E… Jojo?

— Sim? — ele responde.

— Lembra dos casos de caçadores se tornando feras?

Pyrrha ergue uma sobrancelha, curiosa com o ponto de Maria, mas sabendo do que ela fala. Johannes assente.

— Estamos indo enfrentar o que parece ser um caçador que se tornou uma fera — ela conta, ainda sem firmeza nas palavras que escolhe.

— Você parece incerta, aconteceu algo? — Johannes pergunta, inclinando um pouco a cabeça para o lado.

Maria respira fundo, passando a mão pelo cabelo, tirando seu chapéu e trazendo-o para o peito.

— Eu… Só sinto que voltei de um sonho bem longo — ela fala, encarando Johannes profundamente nos olhos, esperando que ele entenda.

E ele entende. Não só pelo uso de palavras, mas por Maria, por medo dele não entender, deu uma ênfase exagerada nas duas palavras. Pyrrha ergue a sobrancelha, afinal a garota não é boba, e percebe o modo com que Maria falou.

— Pyrrha poderia nos esperar aqui, só por um momento? — Johannes, educadamente, pede.

Ela faz que sim, apesar de suas sobrancelhas expressarem não apenas sua curiosidade com o motivo, mas também dúvida.

— Vamos ver essa tal fera que Maria viu — Johannes explica, percebendo o olhar da protegida. — Se precisarmos de você, eu lhe chamarei ou voltaremos aqui. Certo?

Pyrrha assente, um pouco mais aliviada.

— Certo. — Ela suspira.

Os dois caçadores andam pelo corredor, descendo os degraus até que os pés dos dois se enchem de água.

— Então nós morremos para o que está a frente de nós? — ele indaga, quebrando o silêncio.

— Só eu, no caso — Maria o corrige. — Mas você logo teria morrido também.

— É?

— Tomou um tiro de canhão no peito — ela conta.

Johannes para e olha para ela, pasmo.

— Quem vamos enfrentar, de acordo com você, é o tal Euthymos. Ele se tornou uma fera e está ali na frente — ela conta. — Ele usa um canhão de caçador e um soco inglês.

A boca de Johannes fica aberta, em perplexidade e surpresa. Maria consegue sentir a quantidade de informação que está cruzando e sendo processada por ele, apenas de ver o modo como sua boca está levemente aberta.

— Por favor, foque no agora — ela pede. — Ele tentava proteger a Pyrrha.

Mesmo com as bandagens no rosto, Maria conseguiu ver os olhos de Johannes se abrindo ainda mais, arregalando.

— Como assim? — ele tenta erguer a voz, mas ainda sussurrando.

— Ele… Entrou na frente dela, como se fosse para proteger ela da gente. Ele disse algo, confuso. Não sei bem o que foi, mas você ficou com uma cara de imbecil.

Maria faz uma pausa.

— Tipo essa que você tá agora, na verdade. — Ela solta um pequeno riso.

— Maria. — Ele bufa. — Foco no agora.

Ela solta um suspiro, rindo.

— De todo modo, você precisa tomar mais riscos, atacar mais — a caçadora fala, pensativa. — Talvez usar a Pyrrha de isca? Pra abrir brechas?

Johannes assente, em silêncio. Ainda pensando no fato de ser Euthymos, o caçador perdido. O conto preventivo dado aos membros da Igreja, os caçadores principalmente, do porque a Floresta Proibida não deve ser vista como um lugar para se aventurar. E ainda, ele tentou proteger Pyrrha. Queria ter as conclusões (ou pelo menos o caminho iniciado) que a mente de sua contraparte da linha do tempo prévia conseguiu ter. O que será que aquele Johannes conseguiu elaborar ou concluir.

“Queria ter morrido primeiro”, ele pensa, morbidamente.

Os dois saem do corredor, chegando no lugar aberto, onde enfrentariam o oponente. Ao perceber a expressão de maravilhamento no rosto de Johannes, ela decide dar um pouco de tempo a ele.

— Eu vou chamar Pyrrha — Maria fala, dando dois tapinhas no ombro do colega.

Johannes move a cabeça positivamente, dando um passo à frente. O cheiro de fera é nauseante, mas aquele lugar é tão fabuloso. Único. O modo como a água reflete a luz vindo do teto.

“Algum tipo de fungo ou limo fluorescente?" ele se indaga.

E então seus olhos vão para o outro lado daquele lugar, vendo a escadaria. O cheiro vem dali. Euthymos, de acordo com Maria. E isso provavelmente saiu dele. Maria não estava prestando atenção nessas horas.

— Que lugar lindo. — Ele escuta atrás de si.

Pyrrha finalmente chega, com Maria junto.

— Contei para ela nosso plano — a caçadora diz.

— Nosso plano? — Johannes se vira para as duas.

— Vamos usar Pyrrha de isca, vamos operar numa formação de “V”, no começo. Depois disso, vamos atacar sempre juntos, com Pyrrha sempre atrás de nós — Maria explica. — E outra coisa, Johannes, eu diria que ele consegue parar sua roda. Pelo tamanho dele.

Johannes respira fundo e acena com a cabeça, positivamente. Confia em Maria. Eles começam a avançar, os passos trazendo consigo barulho de água se arrastando e de respingos.

A fera ergue a cabeça, olhando para eles do mesmo modo que Maria se lembra. E então, ele vê Pyrrha.

— Você… — o monstro balbuceia, dando um passo à frente, erguendo a mão na direção de Pyrrha.

Maria leva a mão ao machado. Johannes segura com mais firmeza a alça de sua roda. Os caçadores começam a andar mais na diagonal, deixando a vista do lobisomem aberta somente para Pyrrha. A garota, confusa, leva a mão ao peito, em medo. Dá dois passos para trás. Ele dá dois em frente, erguendo a mão.

— Você conseguiu escapar deles, não? — ele fala, a voz se mesclando com os grunhidos bestiais. — Malditos. Bastardos.

— Quem é você? — Pyrrha indaga, assustada.

— Eu? — O que resta de humano no rosto daquela fera se distorce.

E então vem a raiva. E então vem a fera. Pyrrha se pergunta o que, naquela pergunta, causou a quebra da razão daquela fera. Teria sido uma raiva trazida a tona por ele não lembrar quem ele é, e na ausência de uma identidade, só lhe resta a bestialidade; ou teria sido algo como ele lembrando de quem ele foi e se odiando por isso?

O lobisomem leva as mãos à cabeça, se contorcendo e rosnando, até que finalmente avança em direção a Pyrrha. Contudo, seu corpo é interrompido, com a roda de Johannes acertando-o na barriga. O impacto é forte o bastante para jogar a fera para trás. E indo para trás, fez com que ele encontrasse o machado de Maria, que atinge suas costas.

Ele grita, o ar saindo de sua boca junto com sangue. Os dois caçadores saltam para trás, com o lobisomem se debatendo e socando o ar. Seu olhar se foca em Pyrrha e em seguida todos seus sentidos se focam nos caçadores. Maria busca atacá-lo de volta, em um arco vertical. Euthymos salta para trás, para perto de Johannes, que acerta suas costas com a roda, fazendo-o cair no chão. O lobisomem fica de quatro e começa a buscar se afastar dos dois, seus olhos sempre voltando para Pyrrha. Seria aquilo preocupação?

Ele pula e corre, se desvencilhando dos golpes dos caçadores, que atacam sincronizadamente. E ainda assim, ele consegue reagir, com socos e patadas contra os caçadores. Maria avança e desfere um golpe vindo de cima contra o lobisomem, que desvia para o lado e tenta socá-la. A caçadora salta para trás, com o ar acariciando seu rosto devido a força dos golpes. Johannes atira nas costas da fera, atraindo a atenção dele, preparando um golpe com sua roda. O lobisomem morde a isca e avança. E consegue não só parar a roda, mas como também consegue socar o peito do caçador, que cambaleia para trás, quase caindo. Maria avança para golpear o lobisomem, com medo de Johannes novamente se ferir igual da última vez, e Euthymos responde a isso com um soco contra ela. E antes que ele pudesse dar outro golpe, Pyrrha atira contra o braço do lobisomem, fazendo-o abrir uma brecha para Maria se afastar.

A garota pensa no que fez ele ficar assim. Ele… Ele não parece mau ou louco. Talvez perdido na praga da fera e violento além da capacidade de se retornar para a racionalidade. Johannes comentou sobre ele, sobre ele ser um caçador que veio para a Floresta, e não retornou. O Executor falou muito sobre “ele ter encontrado sua perdição", mas ele mesmo disse que era algo vago e que não se sabia exatamente o que houve com ele em termos explícitos.

E ali está o caçador Euthymos. Agora, uma violenta fera.

Pyrrha se foca em atrair o lobisomem e também se manter próxima de algum dos caçadores. Sempre, buscando dar suporte aos seus protetores, com tiros de sua pistola. E não demora para o pensamento finalmente vir até Pyrrha: ela não é a primeira garota de capuz vermelho enviada para a Vila Edda. E certamente as demais vieram com caçadores ou algum tipo de protetor. E se Euthymos tivesse sido um desses?

Maria, por outro lado, busca não pensar muito na situação. Contudo, o nervosismo de morrer novamente a afasta de adentrar na “Zona” — muito ruído dentro de sua cabeça. O lobisomem agarra o cabo de seu machado e a puxa, jogando-a contra Johannes, os dois se trombando, com o Executor tentando segurar a amiga. Tal qual um vento, a fera passa por entre eles, com suas garras cortando por entre a roupa dos caçadores, seu forte corpo os derrubando. O grito de dor de Maria preenche a caverna.

Pyrrha corre na direção deles, pega de surpresa pela velocidade com que tudo aconteceu. O lobisomem se vira para ela e estende a mão, mas sem agressividade ou malícia. “Fique aí, é perigoso”, parece dizer. A garota freia com tudo, dando um passo para trás. Johannes surge atrás da fera, aproveitando que Euthymos tirou seu olhar da luta. Ele ergue sua roda com as duas mãos e despenca-a nos ombros da criatura. O caçador solta sua roda, deixando-a rolar para longe do confronto, e agarra a fera pela cabeça e o puxa para trás, dando uma joelhada na coluna do monstro. Euthymos, o lobisomem, urra em dor. Ele tropeça, tentando se recuperar da pancada e se vira para o caçador que o atacou pronto para atacá-lo, com Pyrrha e Johannes com as armas apontadas na direção dele.

O lobisomem sente seu peito e sua mão esquerda arderem com os disparos, mas a adrenalina e a sede por sangue nublam a dor. Ele tropeça e cai no chão, pelo impacto dos disparos. Maria agarra os pelos desgrenhados que compõem a juba do oponente e seu machado, com o cabo curto, começa a repetidamente se cravar na carne do lobisomem, sangue jorrando para fora a cada golpe, sujando a roupa e rosto de Maria.

“Desista logo” Pyrrha, em sua mente, suplica. 

A fera se debate, pegando o pulso da caçadora e a trazendo para frente de si. Maria cai de costas no chão e sua boca se abre buscando por ar. Pyrrha, notando o que aconteceria, dispara uma vez mais contra a criatura.

Maria, ali no chão, suspira, cansada. Seria bom acabar com isso logo. Está ficando encharcada. Que desagradável. Ela se apoia nos cotovelos e seus pés vão de encontro ao torso de seu oponente, ainda atordoado pelo último disparo de Pyrrha. Ela se levanta, em um pulo, e pega seu machado. O lobisomem igualmente se levantando animalescamente do chão. Maria desvia das garras do lobisomem, que acertam o solo. Ela encurta o cabo do machado e, apesar de mirar no braço da fera, acaba acertando o canhão. O lobisomem ruge para ela, tentando mordê-la e em seguida usa o canhão para jogá-la para longe.

“Caramba, de volta”, Maria pragueja mentalmente.

A caçadora consegue se ajeitar no ar o bastante para cair decentemente. Johannes por sorte a cobriu, indo para cima do lobisomem e impedindo que ele finalizasse a caçadora. Maria se levanta e respira fundo. Ela alonga o cabo do machado. Maria avança, correndo em zigue zague, percebendo que a orelha do lobisomem tremeu, atento ao barulho vindo por trás dele. Ele move o braço com o canhão na direção da caçadora, em um gesto tão casual e limpo. Os olhos de Maria se abrem mais e mais, com seu corpo respondendo sozinho.

Ela coloca todo o peso em um dos pés, tensionando ele. Quando o canhão dispara, em frações de segundos, Maria se impulsiona para a diagonal, avançando e escapando do disparo. Ela sente o calor do disparo. Sente a pressão e o vento sendo empurrado pelo disparo. Ela rola pelo chão, se colocando de pé em um instante, e encurta o cabo do machado. Se impulsiona mais uma vez. Euthymos está tendo que lidar com Johannes, que ergueu sua roda com as duas mãos, e despencou todo aquele peso — somado com a força do Executor — sobre o lobisomem, que consegue pará-la apenas com uma mão. Os pés de Euthymos deslizam para trás, seu corpo sendo empurrado para baixo pelo peso exercido contra ele.

Ele é surpreendido quando sente uma breve dor na parte de trás de seus joelhos. Sua força nas pernas some e ele se vê despencando no chão. Johannes vê o inimigo caído no chão e seu corpo (talvez até sua alma) hesita em dar outro golpe. E se pudesse dialogar com a fera? Entender o que ele faz aqui? Esse caminho deveria levar para a Vila Edda. Existem avisos, muito claros, afugentando feras na entrada. E aqui o caçador de frente para uma fera, dentro de um lugar que as afugenta.

Ele fecha os olhos, e vê diante de si a mesma borboleta que pisou naquele dia. Quando criança.

“Maldita memória” ele pragueja, em sua mente. Tão simples, tão ordinária, e ainda assim, o mastigando e o torturando até hoje.

O Executor leva o olhar para Pyrrha, e vê na penumbra que é sua visão, uma expressão que talvez não fosse muito diferente da sua.

Um som vem de Euthymos, um lamento balbuciante, um gemido de dor. Os dois dão passos para trás, vendo a fera tentando levantar, fracamente. A boca de Johannes se abre, na intenção de dialogar com a fera, e que ninguém da Igreja da Cura jamais saiba disso. Tristemente, o lobisomem salta contra o Executor. Seu canhão fica para trás, repousando no solo úmido. Johannes só tem tempo de erguer a roda à frente de seu corpo. Sente seu corpo indo para trás e precisando lutar para não cair. Seus pés deslizam para trás, lutando para se manterem presos ao chão. Um som de tiro afrouxa a pressão contra o caçador.

— Pare! — A voz de Pyrrha ecoa por aquele lugar.

Johannes empurra a fera para o lado, e como um vento, Maria passa, abrindo um talho pela lateral esquerda do corpo de Euthymos. A caçadora gira em seus tornozelos e seu machado descreve um belo arco pelo ar, encontrando com o lado direito do lobisomem e o jogando para longe. Ele cai, espirrando água, apenas para rolar pelo chão, totalmente zonzo. A água se manchando de vermelho, pelo sangue que verte das feridas do lobisomem.

Euthymos ergue o olhar, ironicamente recuperando um pingo de humanidade, apenas para poder olhar o Executor da Igreja avançando igual uma besta sedenta por sangue, contra ele, que ainda jaz caído. O lobisomem se endireita no chão, ficando de joelhos, apesar da postura torta, devido aos ferimentos. Com dor, ele junta as mãos, em uma última prece. Prece essa que Johannes reconhece, não tendo tempo para parar de avançar, tampouco de voltar atrás no ato de atacar, mas seu coração doendo, em uma pontada.

Vai ter que pisar em outra borboleta caída.

Sangue espirra quando a roda de Johannes violentamente se choca contra a fera.

— Presa abatida — o Executor, amargamente, declara.


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Notas finais do capítulo

Finalmente consegui soltar um "presa abatida" (é algo que aparece após você derrotar um chefão dentro de Bloodborne), e assim termina essa "boss fight".
Espero que tenha sido emocionante e que todas as lutas se mantenham boas e concisas, fáceis de se ler.
Espero que você esteja se divertindo e gostando dessa aventura.



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