Queridos Amigos escrita por Mithrandir127


Capítulo 8
Capitulo 8: Deleite Acidental


Notas iniciais do capítulo

Olá! Cá está mais um capítulo da minha história! Espero que gostem!



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Era madrugada, Soluço dormia em sua cama, com o coração jovem apascentado.

Sonhava estar em um grande salão viking de madeira, com o pai, a mãe e o irmão, todos vestindo armaduras, desfrutando de um agradável banquete à uma grande mesa de madeira, iluminados pela luz dourada e agradável do sol que entrava pelas grandes janelas altas na casa de madeira de seu avô, na fria Noruega.

— Ao Soluço! – disse o alto e forte Stoico, erguendo um chifre transbordando de cerveja espumante – Meu filho! Meu orgulho! Ele sim é um verdadeiro viking!

Todos o aplaudiam.

— Mandou bem mano! – disse Nolan erguendo outro chifre.

— Estou orgulhosa de você Soluço!

O caçula sorria para todos enquanto erguia outro chifre cujo conteúdo não poderia ser cerveja dado sua tenra idade.

— Discurso! Discurso! Discurso!

Repetiam todos, batendo o punho sobre a bela mesa entalhada de madeira.

— Tá bem! – disse se levantando, bebeu do chifre e o atirou para o lado.

Estava prestes a abrir a boca, quando de repente ouviu um barulho estranho e desconhecido, baixinho.

— O que foi isso? – perguntou franzindo o cenho.

Olhou para sua família escandinava, que seguiam sorrindo, olhando-o com um sorriso fixo nos rostos luminosos e o olhar preso no mais novo.

O som continuava e ia aumentando gradativamente.

— Estão ouvindo? – perguntou olhando para os lados.

Quando notou o desdém da família para com o barulho desconfortável, unido a uma constante espera ansiosa na face dos três, Soluço franziu o cenho, enquanto o barulho aumentava, se tornando insuportável.

— Pessoal?! – chamou reparando a face estranha no rosto de todos.

O barulho soou uma última vez, bem mais alto.

De repente, Haddock acordou, arregalando os sonolentos olhos verdes, sentindo o trauma de ser abruptamente arrancado de seu sonho agradável.

Passou os dedos sobre as pálpebras, massageando-as em meio ao desgosto.

Aos poucos notou que o barulho que escutava no mundo dos sonhos, também escutava no mundo corpóreo, só que mais abafado e distante, mas ainda assim incomodava.

— O que é isso?! – sussurrou se levantando.

Saiu da cama macia e caminhou pelo chão frio de madeira, seguindo o som maldito.

Passou por cima de Banguela, que dormia serenamente com a cabeça sobre o pelo macio de suas patas felinas. O gato passou a ficar apenas no quarto do dono, para impedir quaisquer problemas, como da última vez que saiu.

O escandinavo saiu pela porta lenta e silenciosamente.

Olhou o corredor escuro. Notou a luz branca do banheiro acesa e com vapor saindo da mesma, dela vinha um som de água caindo e um cantarolar feminino.

Olhou adiante e notou que mais a frente havia um quarto cuja porta de madeira estava entreaberta, parcialmente iluminada pela luz fria que saia das frestas da porta do lavatório, mas sem mostrar nada que havia dentro do quarto.

Mas Soluço, em meio aos sons de canto e do chuveiro de água quente, notou que o barulho desagradável saia do quarto cuja porta estava aberta.

Caminhou em silêncio até o mesmo, sentindo o frio da madeira em seus pés descalços. Olhou o banheiro ao passar lentamente na frente dele.

Chegou até o quarto, empurrou a porta levemente e com cautela. Viu o cômodo escuro, e começou a seguir o som que agora aumentava, dando nos nervos do norueguês.

Notou uma luz vindo do mesmo lugar que vinha o barulho, e se deu conta de que era um telefone. Pegou e viu que enquanto o telefone emanava o toque maldito, vibrava e nela havia uma foto luminosa de uma mulher de cabelos escuros, e bem embaixo da foto estava escrito “mamãe”.

Soluço demorou um pouco para adequar os olhos ao brilho intenso da tela. Quando finalmente ajustou a visão, buscou procurar o dono do telefone, não se lembrava de quem estava hospedado naquele quarto, lembrava apenas que era falta de educação atender a ligação de outra pessoa.

Foi até a porta com o telefone tocando e vibrando em suas mãos. Olhou do quarto desabitado ao banheiro ocupado, e logo fez a conta.

Caminhou até o banheiro esfregando a mão no rosto, caindo de sono.

Chegou até o destino e abriu a porta.

— Seu telefone está tocando... – disse levantando o mesmo com os olhos parcialmente fechados, metade pelo sono, metade pela luz forte do banheiro.

Soluço estava entorpecido pela letargia, e por isso, apenas isso, se esqueceu da privacidade necessária que o usuário de um banheiro precisa ter, mas a informação logo lhe veio à mente, da pior maneira possível.

Era Merida quem tomava banho, estava de pé dentro da banheira, recebendo a ducha quente e agradável. Esfregava os cabelos cacheados e ensaboados quando Haddock entrou.

Se assustou ao ver a porta abrindo, olhou para o mesmo com os olhos azuis arregalados e notando que de uma só vez, Soluço, que ainda pendia de sono notou o que havia acabado de fazer.

Ambos se olharam com os olhos arregalados por um curto instante, a face alva dos dois aos poucos ficando vermelha, até a reação da ruiva emergir.

Um grito alto enquanto cobria as intimidades e pegava algo para atirar no invasor do banheiro.

— Sai daqui seu tarado! – disse atirando as coisas que estavam na estante mais próxima.

A pontaria de Merida era impecável, então todas as coisas que atirou atingiram em cheio a testa de Haddock, que recuou e caiu de joelhos, baixando a cabeça, cobrindo-a e estendendo uma mão, implorando misericórdia.

— Espera! Para! Eu não vi nada! Eu juro!

— Mentiroso!

— Não estou mentindo! – respondeu ainda tentando se proteger das coisas que a ruiva atirava nele.

Ambos continuavam com os rostos vermelhos.

— Como é que você entra assim no banheiro quando outra pessoa está usando?!

— Ah, dá um tempo ruiva! Quem é que toma banho e não tranca a porta?!

— Está de madrugada! Não esperava que alguém viesse aqui no meio da noite! E ainda que não estivesse de madrugada como é que você não notou que não podia entrar? Será que a luz acesa, o som do chuveiro ligado e eu cantando não foram o suficiente pra te avisar?!

— O que está acontecendo aqui? – perguntou Jack saindo do quarto, olhando Soluço de joelhos sobre a madeira fria, de frente para a porta aberta do banheiro, iluminado pela luz branca e fria do mesmo, tentando proteger o rosto com um celular na mão enquanto era atingido por todo tipo de coisa.

Rapunzel também saiu do quarto para ver a confusão.

Ao ouvir outra voz masculina, Merida, com um gritinho, se agachou, entrando na água, escondendo o corpo nu e molhado dentro da banheira cheia, com apenas o rosto de fora e as mãos que seguravam na mesma, levantou um pouco apenas para fechar o registro do chuveiro.

— Que gritaria é essa no meio da noite? – questionou a loira esfregando os olhos verdes carregados de sono.

O platinado chegou até a porta, sendo visto tanto pelo escandinavo quanto pela celta.

— Fala pra esse tarado sair de perto de mim! – gritou a ruiva apontando para Soluço.

— Eu não sou tarado ruiva! – respondeu o norueguês exaltando a voz enquanto se levantava massageando uma parte do rosto atingida por Merida.

— O que aconteceu? – perguntou Jack olhando ambos.

— Não é obvio?! Ele invadiu o banheiro enquanto eu estava tomando banho!

O russo olhou o garoto de cabelos castanhos com um sorriso malicioso no rosto. Rapunzel ruborizou envergonhada.

— Eu estava com sono! – gritou Soluço erguendo a cabeça com os olhos fechados e as mãos balançando com os dedos flexionados nos lados de sua face – Não parei pra pensar que você estaria assim! E tem mais! Eu ainda vou bater na tecla de que você não trancou a porta porque não quis!

— Isso não é desculpa! Sou eu que estou nua! Você está errado aqui!

— Pessoal! – gritou Jack estendendo as mãos para ambos, um sorriso inconveniente jazia em seu rosto agora alegre, deleitando-se com a situação – Parem de gritar! Lembram? Sem gritos! Os vizinhos devem se incomodar com isso, então é melhor evitar gritarias a todo custo.

Os olhos verdes de Soluço se encontraram com os olhos azuis de Merida, ambos franzindo o cenho, ainda vermelhos.

O russo não conseguiu segurar uma risada, mas voltou-se para o norueguês e disse:

— Haddock, resolve isso com ela! E por favor, parem de gritar – voltou-se para a ruiva e continuou – E Merida, da próxima vez tranca a porta e mantenha a calma.

Falou tudo sorrindo.

Deu meia volta, passou por Rapunzel que estava encostada na parede ao lado da porta do quarto e com os braços cruzados, seguia a olhar Haddock com olhar sombrio, mas que rapidamente baixou a cabeça escondendo um sorriso.

— Pode voltar pro quarto Rapunzel – disse Jack enquanto passava por ela, ainda soltando algumas risadas.

Jack entrou no quarto, Rapunzel demorou um pouco, mas entrou no próprio quarto também.

Soluço olhava de lado ambos voltarem aos leitos, no corredor escuro, mas iluminado pela luz branca do banheiro, que seguia com a porta aberta, o vapor quente saindo da mesma.

A escocesa olhava o invasor de sua privacidade a frente da porta, olhando para o lado, a postura ereta e o olhar sério. De repente, o escandinavo pegou o óculos do bolso e colocou sobre a face. Depois notou que na mão dele estava seu telefone.

— Quatro olhos – chamou Merida.

O mesmo se virou bruscamente para ela.

— O que está fazendo com meu celular? – perguntou franzindo o cenho.

Haddock explicou que o mesmo estava tocando. A ruiva praguejou em gaélico, pediu para o norueguês fechar a porta, e o mesmo fez de prontidão, logo depois limpou o sabão de seu corpo, enxugou-se e pegou a toalha.

A celta saiu do banheiro puxando o aparelho hostilmente da mão de Soluço, depois caminhou para a sala, Soluço guardou as coisas que a escocesa havia atirado nele, depois aproximou-se da ruiva em silêncio.

Ainda estava escuro, as nuvens cobriam a luz da lua. Não quiseram ligar a lâmpada forte da sala, então acenderam apenas o abajur de luz dourada perto do sofá.

Merida ficou sentada sobre o sofá, mexendo no telefone, olhando a quantidade de ligações perdidas de Elinor. O garoto de cabelos castanhos estava ao lado dela, falando, enquanto a mesma o ignorava.

— Tá! Vá lá! Eu admito, eu não devia ter aberto a porta daquele jeito! Me desculpa! – a ruiva olhou-o pelo canto dos olhos, dando-lhe agora mais atenção – Mas eu não menti quando disse que não tinha visto nada! Sério! Eu estava sem meus óculos, e ainda que eu estivesse, eles iriam ficar embaçados por causa do vapor.

— Deixa eu ver! – disse a escocesa, estendendo a mão.

Soluço entregou-os sem hesitar.

Merida pegou-o pelas alças, colocou-o diante de seus olhos azuis, notando o grau neles. Aproximou da face como se fosse colocá-lo, e bruscamente recuou o rosto. Olhando o norueguês mantendo ainda certa reprovação.

— Tá bem! Eu acredito em você... – disse devolvendo os óculos.

Haddock o pegou e colocou sobre a face novamente.

De repente, o celular da ruiva voltou a tocar. O escandinavo imediatamente tampou os ouvidos.

— Atende! – disse o rapaz, ainda com as mãos nas orelhas.

A escocesa o olhou com estranheza ao notar o incômodo de Soluço.

Haddock olhou Merida balançar a cabeça com o rosto aflito, olhando o telefone vibrar em suas mãos e lentamente tirou as palmas dos ouvidos.

— De novo – sussurrou a celta.

— Peraí, “de novo” ?! – questionou Soluço.

— O quê?! – perguntou a moça com abrupta incompreensão.

— Ela já tinha te ligado antes?

— Sim!

— Muitas vezes?

— Sim! – respondeu, agora raivosa.

— Se ela já tinha feito isso antes por que não colocou o celular no silencioso?!

— Isso é problema meu!

— Quer saber? Eu retiro meu pedido de desculpas! Foi só por causa do seu telefone barulhento que tudo isso começou! Se ele não tivesse o toque tão alto e tão irritante aquilo não teria acontecido!

— E como é que os outros não reclamaram?

— Eu não sei! Só sei que... – o escandinavo voltou a olhar para o aparelho barulhento enquanto falava – Dá pra colocar esse telefone no silencioso ou pelo menos desliga-lo de uma vez?!

— Ai! Saco! – bravejou Merida atendendo a um dos pedidos de Soluço, rangendo os dentes e fazendo careta, logo depois atirando-o para o lado, apenas vibrando – Feliz?!

Ele não respondeu. Apenas seguiu franzindo o cenho, olhando a celta em silêncio. Aos poucos, a ruiva baixou a cabeça, com o corpo magro de toalha curvado para frente e o rosto jovem triste e abatido.

Olhava o telefone vibrando iluminado, vendo a foto alegre de sua mãe, novamente, esta a intimidava.

Aos poucos os olhos verdes de Haddock se amansaram.

— Por que não atende o telefone? – perguntou em voz baixa, quase sussurrando.

Merida respirou, olhando o mais novo, puxou o ar pelo nariz e o som foi como se estivesse chorando. De repente passou o dedo sobre um dos olhos.

Imediatamente Soluço sentiu o coração abandonar a fúria de alguns segundos atrás.

— É a minha mãe. Eu não quero falar com ela.

— Por que não?

— Por que você quer saber?! Isso não é da sua conta!

— Acabou sendo! – disse com semelhante hostilidade.

— Mas não precisa ser assim! Volta pro seu quarto e me deixa sozinha!

— Escuta ruiva! – a escocesa se calou, mas manifestando seu incômodo – Eu sei que você pensa que eu sou um tarado, ou um mal educado, mas é sério, eu não sou nada disso, e ainda que eu fosse, ainda teria qualidades. Eu estou vendo que você está chateada e só estou querendo ajudar – tentou ser sincero, mas não foi capaz de abater sua postura hostil.

Merida seguiu em silêncio, olhando o norueguês.

— Mas é claro, só se você deixar.

Mais um instante de silêncio se seguiu. Ambos se olhando, Soluço manifestando agora sua gentileza e fazendo um pequeno sorriso para a jovem, Merida ainda franzindo o cenho com hostilidade.

Aos poucos, o sorriso no rosto do escandinavo se desfez, visto que a ruiva não lhe cederia desta forma.

— Tá bem então! – disse o norueguês, afastou-se da mesma, caminhando para o quarto – Boa noite ruiva! – falou reavendo a hostilidade.

A escocesa baixou a cabeça, franzindo o cenho, agora pensativa. Jack mais cedo lhe ofereceu ajuda, mesmo com questionamentos ela aceitou e ganhou algo de bom com isso. Pensou que talvez devesse aceitar ofertas de ajuda com mais frequência.

Ergueu a cabeça, revirando os olhos e gemendo de desdém.

— Tá bem! – respondeu Merida, Soluço parou quando ouviu – Quer saber? Eu conto!

Haddock deu meia volta e caminhou novamente até a mesma, sentou-se no sofá, a certa distância da moça.

A celta o olhou com estranhamento em seus olhos azuis enquanto seguia franzindo o cenho, mas decidiu seguir adiante.

Suspirou.

— Vamos lá! Minha família tem uma empresa, e no futuro eu vou gerencia-la. Minha mãe quer que eu cresça e me torne uma boa empresária, ela me manda em cada dia da minha vida e isso é o inferno, agora estou fugindo e ela está me procurando – contou a história rapidamente e terminou com um sorriso sarcástico no rosto.

— Nossa! – disse Soluço com os olhos verdes arregalados – Sua mãe é bem parecida com meu pai!

— Conta outra! – disse Merida balançando o rosto e voltando o olhar infeliz para baixo.

— Não! É sério! – disse o escandinavo – Minha família também tem uma empresa e meu pai gerencia ela, ele vive me enchendo o saco por causa disso! Eu também estou evitando ele!

A ruiva olhou o mais novo, arqueou as sobrancelhas, surpresa.

— Sério?! Qual o nome da loja do seu pai?

— Berk Winter!

A escocesa arregalou os olhos azuis.

— Berk Winter... Sua família é dona da Berk Winter?! Seu pai é Stoico, o Imenso?!

— Conhece meu pai?! – perguntou franzindo o cenho.

— De cara não! Mas... Já ouvi falar dele. Dizem que ele foi um herói de guerra quando a Noruega convocou alguns civis para servir! E que ele, mesmo sendo rico, se ofereceu para lutar – aos poucos um sorriso se formava no rosto de Merida, nitidamente sentia prazer em falar do veterano pai de Soluço.

— É, pois é eu sei! – disse o mais novo olhando para baixo, não querendo falar da glória eterna de seu pai, então mudou de assunto – E a loja da sua família, como se chama?

— Se chama Modas Dun Broch. Mas me fala... Como é o seu pai? – insistiu a ruiva.

O escandinavo suspirou olhando para o lado com o rosto aflito.

— Assustador! – foi sincero e direto – Eu diria que os momentos que ele esteve zangado comigo foram os piores da minha vida...

A resposta do garoto de cabelos castanhos foi decepcionante. Merida olhou para baixo em silêncio por alguns instantes. Logo depois continuou.

— É tão ruim assim?

— Ele me disse que eu não era filho dele – respondeu olhando a celta diretamente com o rosto sério.

— Nossa... – foi a única coisa que Merida conseguiu responder, a decepção novamente lhe envenenando o coração, após alguns instantes, continuou – Lamento.

— E sua mãe? Como ela é com você? – disse Soluço, tentando desviar a atenção de si.

A ruiva suspirou também olhando para o lado, e respondeu.

— Um monstro! Ela vive me dizendo como devo agir, o que fazer e o que não fazer, querendo me transformar nela! E no fim eu só quero ser eu.

Após um instante de silêncio, Soluço olhou-a fixamente.

— É o inferno não é?! – disse baixinho.

Agora, ambos se olhavam nos olhos tristes e abatidos, para os dois era como olhar para um espelho. Ambos sabiam como era a terrível sensação da constante presença poderosa de seus pais dominadores e implacáveis.

— É... – respondeu a mais velha, agora mais amena.

— Sabe, eu tenho um irmão mais velho, e meu pai sem sombra de dúvidas gosta mais dele do que de mim – olhou tristemente para baixo – Ele olha pro meu irmão e com certeza ele queria que eu fosse igual a ele, mas não importa o quanto eu tente, eu não consigo ser. Acaba que no final nem eu sei quem eu...

Parou na última palavra, olhando Merida com certa empatia transparecida em seus olhos azuis, ao mesmo tempo que manifestava certo desconforto.

— Desculpe... Eu não queria...

— Não! Está tudo bem! – respondeu a mesma interrompendo.

A escocesa havia notado a tamanha sensibilidade do norueguês, coisa que não esperava vinda do invasor noturno de banheiros. Na verdade já não o enxergava de tal maneira.

— Mas e você? Tem irmãos?

— Não! As vezes gostaria de ter, só pra ver se minha mãe pegava menos no meu pé, mas eu duvido muito. Ela vive dizendo que sou a filha mais velha e que devo ficar com tudo... Sabe... Ela até quer que eu namore com o filho de um dos sócios dela...

— Nossa! – Soluço se sobressaltou sobre o sofá – Isso já é sacanagem da parte dela!

— Eu sei! E eu não vou deixar isso acontecer comigo! Não se eu puder evitar...

— Sabe, a sensação é bem frustrante não é? Bem decepcionante.

— É como se nossa casa não fosse um lugar seguro...

— Exato!

Passaram mais um tempo em silêncio. Aos poucos a tristeza no olhar puro de Soluço foi ficando mais forte.

Merida notou a intensidade no olhar do mesmo, sentiu-se no dever de fazer algo a respeito.

Aos poucos estendeu a mão e a levou em direção ao ombro magro de Haddock. Ao invés de manter a mão sobre o mesmo, deu apenas alguns tapinhas, não sabia como consolar alguém direito.

Mas os tapinhas foram o suficiente para chamar a atenção do norueguês, que olhou a ruiva imediatamente, virando o rosto, ficando de lado para ele, tentando fingir que nada aconteceu.

Soluço sorriu, sentiu-se na obrigação de retribuir. Estendeu a mão lentamente até ela, mas de repente Merida recuou. Talvez não fosse uma boa ideia tocar – mesmo que por mínimos instantes – o ombro nu da garota que estava tomando banho quando sem intenção invadiu o banheiro.

A ruiva aguardava com certa ansiedade o toque humano daquele garoto sensível, olhava-o pelo canto dos olhos no meio da escuridão, sendo parcialmente iluminada pela luz quente e dourada do abajur, mas se decepcionou novamente ao notar o recuo de Haddock.

— Posso? – perguntou ele.

— Fique a vontade – respondeu oferecendo o ombro.

A sensação do toque humano durou só alguns instantes, alguns milésimos de segundos, mas foi bom, bom o suficiente para ambos, bem melhor do que toda a carência de afeto que ambos vinham tido nas últimas semanas, nos últimos anos.

Depois disso, ficaram em silêncio, sorridentes, embora tentassem esconder os sorrisos. Lentamente, manifestaram um para o outro um sorriso fraco, não conseguiam manter o olhar fixo um no outro, porém era sincero.

Queriam conversar mais, mas o sono surgiu depressa.

Merida olhou as horas e falou: “Está tarde, acho melhor a gente ir dormir.”.

— Você está certa – disse o escandinavo se levantando ainda com um sorriso pequeno no rosto.

A ruiva se levantou logo depois dele.

Caminharam quase juntos em direção ao quarto, mas já estavam mais confortáveis com a presença um do outro.

Ambos chegaram ao mesmo tempo até a porta do quarto. Abriram-nas juntos.

— Haddock! – chamou Merida, o mesmo a olhou surpreso – Obrigada!

O mais novo sorriu.

— Eu agradeço também.

Sorriram um para o outro de forma tímida mais uma vez, ainda não conseguindo se olhar diretamente.

— Boa noite!

— Boa noite!

O norueguês entrou no quarto. A escocesa passou mais um tempo em silêncio, sorrindo comprazida, de repente o telefone voltou a vibrar em sua mão, era Elinor, mas desta vez, a ruiva desligou e entrou para o quarto com a cara fechada.

Mais tarde, quando a luz do sol brilhava por de trás das nuvens brancas, Soluço acordou. Desta vez mais descansado, mas ainda com sono.

A luz branca do dia entrava pela janela, passando por uma brecha das grossas cortinas fechadas diante da mesma.

A luz atacou a face jovem do escandinavo, que apertou os olhos fechados enquanto gemia e cobria o rosto com as mãos, mas não era o suficiente, então puxou o travesseiro, deitou-se de bruços colocando o mesmo sobre o rosto, sentindo novamente o prazer do sono.

Aos poucos, sua mão esquerda caiu da cama, pendendo próxima ao chão duro e frio.

O norueguês aos poucos sorriu com o conforto.

Contudo, notou algo estranho, sempre que alguma parte de seu corpo estava perto do chão, seu leal parceiro felino estava por perto para cerca-lo enquanto miava, mas desta vez, ele não estava.

— Banguela? – chamou preocupado enquanto franzia o cenho de olhos fechados.

Chamou-o novamente, estalou os dedos, mas sem resposta. Banguela era um gato inteligente que o próprio dono havia treinado, então obedecia aos seus comandos e ordens.

Soluço bruscamente se levantou fazendo o travesseiro voar, olhando o quarto belo parcialmente iluminado, procurando seu bicho de estimação.

— Banguela?! – chamou outra vez, notando que o mesmo não estava dormindo no tapete ou sobre os móveis.

Não demorou a notar que a criatura não estava no quarto, o que poderia se tornar um problema.

O norueguês saiu do quarto lentamente, olhando para os lados, como se escondesse um terrível segredo.

Saiu quando viu que não tinha ninguém. Aparentemente, ninguém mais havia acordado ainda.

Olhou o longo corredor procurando sinais do felino, mas não viu nada.

Fez sons para chamar o gato e chamou pelo nome baixinho para não alertar ninguém do sumiço do animal.

Caminhou pelo longo corredor, agora iluminado, procurando por ele. Olhou dentro do banheiro, considerou olhar nos quartos, mas se lembrou da noite passada e como agora não pendia de sono sabia que não devia fazer tal coisa. Além disso considerou que se algum deles tivesse notado Banguela no próprio quarto o expulsariam.

Constatando isso, saiu do corredor e começou a procurar pelo resto da casa.

— Banguela! – chamou de novo.

Saía do corredor e entrava na sala.

Ouviu um miado familiar.

— Banguela?! – chamou seguindo o barulho.

De repente notou que uma figura de cabelos loiros estava sentada sobre o sofá, o mesmo lugar de onde o miado vinha.

Caminhou em direção ao sofá, franzindo o cenho.

Aos poucos viu Rapunzel, ainda de pijama, calça moletom rosa e uma camisa rosa cheia de bolinhas cor de rosa num tom mais escuro e meias brancas, seus grandes cabelos louros estavam presos em um longo rabo de cavalo. Banguela brincava deitado no colo da mesma, ronronando cheio de conforto, enquanto os dedos finos da moça o seguravam e acariciavam.

Ela sequer notava o rapaz olhando-a com certo incômodo, apenas olhava o felino brincando em seu colo.

— Ahn, com licença – chamou Soluço.

Rapunzel virou o rosto assustada.

— Você pegou o meu gato lá no meu quarto?

— Não! Eu achei ele caminhando por aqui.

Soluço olhou para baixo com seus olhos verdes, pensativo.

— Devo ter deixado ele sair ontem a noite quando... – ia terminando de falar, mas lembrando-se do constrangimento da madrugada decidiu não concluir a frase, a alemã notou a que o mais novo se referia, e logo ruborizou um pouco – Enfim! – interrompeu, e logo depois estalou os dedos – Vem cá Banguela.

O gato prontamente atendeu o dono, saltando do colo da loira, que se assustou no processo, e indo aos pulos até chegar à cabeça de Soluço.

— Ele atende aos seus comandos?! – disse Rapunzel, assustada e maravilhada.

O escandinavo estava prestes a ir embora, mas parou para responder a alemã.

— Sim – respondeu sem grande interesse.

De repente, Haddock se virava novamente para ir embora, mas notou um caderno fino de desenhos, e viu o desenho incompleto de um gato.

Ficou alguns curtos instantes em silêncio

— O que é isso?! – apontou com os olhos claros.

— Ah! Isso?! – disse Rapunzel, imediatamente recolhendo o caderno, abraçando-o contra o peito, escondendo-o constrangida – Não é nada!

— Não! É um desenho! Um desenho do Banguela! – disse maravilhado, costumava gostar de qualquer assunto que envolvesse seu gato de estimação – Posso ver?

Deu mais alguns passos, sentou-se ao lado da loira no sofá e estendeu a mão, pedindo o caderno.

A alemã olhou o mais novo relutante, franzindo o cenho, e o olhando pelo canto dos olhos enquanto abraçava o caderno junto ao peito.

Não queria expor um trabalho casual seu, mas o brilho nos olhos verdes de Soluço, junto do sorriso no rosto do mesmo, a pressionavam a abrir uma exceção.

Tentou resistir até onde sua curta força permitiu, logo depois, gemeu constrangida, baixando o rosto, vermelha e entregando o caderno.

— Nossa! – disse Soluço, Rapunzel escondeu a face com os cabelos quando ouviu – Está ótimo!

A loira revelou um dos olhos verdes, voltando-se em direção ao mais novo.

— Você desenha muito bem! – disse sorrindo para a mesma.

Os olhos verdes se encontraram, e a loira sorriu ao notar o sorriso junto ao sinal de aprovação de Soluço.

— Sério?! Gostou do meu desenho? Não está zangado por eu ter desenhado seu gato sem sua permissão? – perguntou quase sussurrando.

— Zangado?! – disse sorrindo e em voz alta – Não seja boba! O desenho está ficando ótimo! E eu sei do que estou falando, eu também desenho!

— Sério?! – Rapunzel arregalou os olhos verdes, sorridente, aproximando-se de Soluço – E o que você desenha?

— Na maioria das vezes o meu gato também.

— Jura?! Deixa eu ver!

— Meu caderno de desenhos ficou em casa...

— Ahn... – reagiu desgostosa, ficou alguns instantes em silêncio, mas logo depois prosseguiu – Haddock, não é?

— O quê?!

— É o seu nome não é?!

— Sim.

— Você se incomoda de deixar o seu gato comigo mais um pouquinho para terminar de pintar?

— De maneira alguma – respondeu tirando-o de sua cabeça – Eu sei que ele é um ótimo modelo!

— Obrigada! – respondeu pegando o lápis e voltando a desenhar.

De repente, ambos ficaram em silêncio, a loira ficou confortável e alegre por poder concluir o desenho, já o rapaz de cabelos castanhos, embora estivesse de certa forma alegre por conhecer alguém que gostasse de pintar o seu gato, sentiu-se desconfortável com o silencio.

— Então... – disse Soluço sugestivamente, com os olhos verdes voltados para o alto, enquanto se aproximava sobre o sofá de Rapunzel que seguia a pintar, totalmente focada em seu modelo, que seguia deitado confortável na mesinha diante do sofá – Que tipo de pintura você gosta?

— Ah, eu gosto muito daquelas artes pré-rafaelitas – respondeu enquanto focava em seu desenho.

— Ah, essas eu também adoro, a minha favorita é a Vigia da Valquíria.

— Ela é mesmo muito bonita! – respondeu agora focando menos na pintura e mais na conversa – Mas eu gosto mais de Bóreas e Ofélia.

— E de qual pintor você mais gosta?

— Eu tenho um apreço muito grande por Van Gogh!

Rapunzel sorriu, mas aos poucos o sorriso se desfez.

Soluço notou aquilo.

— De fato, Van Gogh merece ser admirado... Ainda mais levando em conta a vida que ele viveu...

— O meu quadro favorito dele é A Noite Estrelada. Eu sei que também é o mais famoso, mas acho que é o que melhor retrata a tormenta que ele sentia.

— De fato.

Nesse momento tanto Soluço quanto Rapunzel que jaziam sentados no sofá confortável, baixaram o olhar, em direções opostas. Sabiam muito bem como a arte era capaz de refletir os sofrimentos eternos do mundo. E como eles viam a si mesmos em diversas obras.

Seguiram mais um momento em silêncio. Rapunzel voltou a focar sua atenção no animal que deitava-se sereno sobre a mesinha. Soluço olhava o gato com certo carinho, e olhava também o belo desenho da loira ganhar cada vez mais vida.

— Rapunzel, não é?

— Sim – respondeu ela agora com o rosto mais sorridente e luminoso.

— Por que começou a desenhar?

Na hora que ouviu a pergunta, Rapunzel quebrou a ponta do lápis. O escandinavo se assustou.

A loira o olhou com os olhos verdes enquanto pegava um apontador e uma borracha.

— “Por que!” ?! Bem... – começou, já apagando a mancha impertinente de seu desenho.

Quando terminou, ficou em silêncio, pegou o apontador e começou a apontar. Evitou olhar o norueguês, chegou a acreditar que não precisaria mais responder a pergunta. Mas quando terminou de apontar o lápis, Soluço voltou a chamar sua atenção.

— Rapunzel?!

— Oi! – respondeu saltando os ombros, assustada voltando-se para o mesmo.

— Por que começou a desenhar? – perguntou, desta vez com ar de cobrança.

— Por que você começou a desenhar? – desconversou.

— Eu?! – arregalou os olhos verdes – Bem... Eu tive um professor que me ensinou a costurar e fazer artesanato...

A loira puxou o ar, surpresa e com um sorriso no rosto.

— Você sabe fazer artesanato?!

—Sei – ele respondeu com um sorriso no rosto – E você sabe, para fazer certas coisas tem que desenhar antes...

— Eu sei! É verdade! – confirmou.

— Ainda mais quando minha família tem uma empresa de roupas... E assim eu descobri que sabia e gostava de desenhar, então fui pesquisando sobre alguns pintores e estilos de pintura, então descobri algumas coisas novas.

Rapunzel sorriu com as bochechas vermelhas enquanto unia as mãos e vibrava de alegria, era o primeiro pintor que conhecia pessoalmente.

— Mas e você? – perguntou Soluço.

O sorriso aos poucos desapareceu do rosto jovem da germânica, e lentamente ela baixou e separou as mãos.

Baixou a cabeça e deu um pigarro.

Olhou o rosto do escandinavo e quando viu seu reflexo nos olhos claros de Soluço, sentiu que estava confortável, e que o mais novo parecia alguém seguro para falar sobre sua introdução no mundo das artes.

Sorriu agora baixando os ombros, mais aliviada.

— Eu passei por uma experiência terrível na infância.

O norueguês esmoreceu o rosto.

— E... Sabe, a arte é capaz de expressar os piores sentimentos da vida, e também conseguem fazer a gente parar de pensar neles. Talvez existam certas sensações que ninguém no mundo consiga expressar com palavras, e para isso existe a arte. Eu tenho alguns desenhos em casa que falam por si só.

— Eu gostaria de vê-los um dia – disse Soluço sorrindo.

— Obrigada – Rapunzel retribuiu o sorriso.

Depois de um momento em silêncio, ambos de cabeça baixa, sentindo certa satisfação na conversa. Soluço perguntou:

— O que seus desenhos expressam?

— Fraqueza – respondeu sombriamente – Impotência, a sensação de que o pior pode acontecer que eu não vou poder fazer nada... A sensação horrível de se sentir fraca.

O escandinavo se surpreendeu, mas não demorou muito para se adequar à resposta.

— Acho que sei um pouco como é isso... – o mais novo sussurrou.

— Sério?! – Rapunzel franziu o cenho no rosto serenamente aflito.

— Não! – respondeu Soluço precipitadamente, imaginava que seja lá o que fizesse a loira sentir tal fraqueza não devia ser nada comparado aos problemas com o pai – Quero dizer, sim! Quero dizer... – gemeu puxando os cabelos, mas ao ver um sorrisinho no rosto de Rapunzel por debaixo da mão delicada se acalmou e ajeitou a postura – Desculpa... É só que... Eu tenho problemas com meu pai, ele me enxerga como um fraco...

A alemã manteve o olhar fixo no rapaz quando esmoreceu o rosto e comentou: “Nossa... Lamento... Deve ser difícil...”.

— É sim... E a verdade é que eu não posso julga-lo, olha pra mim! – disse mostrando os braços finos – Eu não sou um exemplo de virilidade... Não como ele... Ou como qualquer outro homem da minha família... – falou curvando a coluna magra para frente, baixando a cabeça e olhando para o lado com rosto emburrado.

A germânica olhou o escandinavo por alguns instantes, sentindo empatia e um pouco de pena.

— Sabe Haddock – disse Rapunzel – O que faz uma pessoa ser forte de verdade não é a grossura do braço dela... É a vontade dela.

O mais novo a olhou de lado.

— Deus nos fez Sua Imagem e Semelhança, isso porque nos deu Vontade e Livre Arbítrio – disse esticando o braço com dois dedos levantados – E a expressão da Vontade é uma expressão de força, por mais que certas vontades possam ser ruins – disse olhando para baixo e para o lado com os tristes olhos serenos.

Soluço a olhou com os olhos brilhantes e arregalados.

— Se você acha que não é forte, então busque fortalecer sua Vontade, porque Livre Arbítrio você já tem.

O mais novo sorriu para ela, que retribuiu com um sorriso menor.

— Valeu loira – disse baixando a cabeça – Mas e você?

— Eu o quê?

— Você disse que se sente fraca... Por que você não fortalece sua vontade também?

— Ah não Haddock, não seja bobo! Eu não sou capaz de fazer isso!

— Por que não?

— Porque eu não sou! Eu não sou capaz!

— Mas você tem Livre Arbítrio!

A loira se silenciou quando ouviu.

— Você pode fazer sua escolha. Eu não sei que coisa terrível te aconteceu no passado, mas você pode tomar suas decisões agora e não se sentir mais uma pessoa fraca! Sabe... Não é sobre o que somos, é sobre o que podemos ser. Tipo o Batman quando era criança e os pais deles são assassinados e depois adulto vestindo a capa e espancando sozinho um gangster armado com as próprias mãos!

A loira baixou a cabeça, pensativa, balançando-a.

— Droga! – sussurrou com um sorriso no rosto, voltou-se para Soluço e disse – Você é bom!

O mais novo sorriu. Bafejou sobre as unhas e as enxugou na roupa com postura e expressão arrogante.

— Tá! Você está certo! – disse com um sorriso no rosto.

— Vamos fazer um trato! Nós dois temos uma ideia de quão horrível é sentir essa sensação de fraqueza, então vamos deixar o passado para trás e buscar sermos fortes de verdade! – disse o escandinavo.

Soluço ergueu a mão aberta para Rapunzel, esperando que a mesma a apertasse.

A germânica olhou da mão magra para os olhos verdes do mais novo e sorriu.

Apertou a mão do mesmo que firmou o pulso e lançou um olhar obstinado.

Mas Rapunzel sentiu o coração triste ser tocado por uma pequena dose de alegria, provocando-lhe conforto. A sensibilidade de Soluço era notável.

Foi o suficiente para puxar o mesmo e selar um abraço apertado.

Haddock ficou surpreso na hora. Demorou para se dar conta do que estava acontecendo, e mais ainda para responder.

A loira lhe apertava o pescoço com força. Aos poucos o garoto de cabelos castanhos colocou o braço lentamente envolto o corpo magro de Rapunzel, acariciando como faz a uma criança.

— Obrigada! – disse ela com ar de choro.

— De nada! – respondeu ele quase sem compreender tamanha gratidão.

 Aos poucos a luz dourada do sol deixou de ser ofuscada pelas nuvens frias de Filótes, e entrou forte pela janela da sala.

E ficaram assim por um bom tempo. Sentados sobre o sofá, a luz quente a agradável do sol envolvendo-os, Rapunzel lhe abraçando o pescoço e Soluço acariciando seu dorso magro e jovem.

Depois da conversa, Soluço pegou Banguela, voltou para o quarto e voltou a dormir, não sem antes ganhar de presente o desenho de seu amado felino.

Já Rapunzel estava sem sono, mas deitou-se confortavelmente sobre o sofá, deitando a cabeça sobre uma almofada macia.

Ainda vestia seu pijama rosado, os olhos verdes pensativos voltados para cima, enquanto brincava com os cabelos lisos e frequentemente dobrava um pouco uma das pernas. As palavras do escandinavo a deixaram reflexiva.

— Expressão de Vontade é uma expressão de força... – sussurrou ainda olhando para cima.

De repente algumas recordações tortuosas passaram como um vulto violento em sua mente.

A loira saltou e se contorceu, a face começou a exprimir aflição, os dedos femininos e delicados tocaram-lhe a testa alva começando a enrugar.

Após alguns instantes sendo afetada, levantou-se e bateu o punho com força sobre o braço do sofá.

— Força! Força! Força! Força! – repetiu para si mesma enquanto caminhava para o quarto.

Abriu a grande mala rosa cheia de roupas, sacou suas mais belas vestes junto de seu amado estojo de maquiagem.

Trocou de roupa, vestindo um casaco rosado com capuz de pelo branco, este que lhe descia até os joelhos, uma calça jeans e botas também cor de rosa.

Pegou uma escova e um espelho e começou a escovar seus longos e belos cabelos, passou maquiagem no rosto, batom nos lábios e parou para olhar o reflexo.

Não tinha o hábito de se maquiar, já que não costumava sair muito, mas parou para se olhar, e notou que estava bela, a visão lhe confortou o coração. Sorriu para sim mesma.

Logo depois saiu pela porta, carregando uma bolsinha cor de rosa com a alça sobre o ombro.

Caminhou lenta e silenciosamente, com a cabeça baixa, o corpo magro curvado, olhando para os lados, não querendo ser descoberta por ninguém.

Chegou até a porta, direcionou a mão bela e feminina para tocar a maçaneta redonda e metálica da mesma, mas de repente ficou paralisada.

Não tinha o hábito de sair sozinha e estava com medo.

Sentiu os pulmões pesarem e a respiração sair difícil, o rosto ficou sombrio, e as nuvens voltaram a cobrir o sol, tirando a pouca luz que havia no local.

— Vamos lá Rapunzel! – sussurrou para si mesma – Você fez um trato! Não deixa o medo dominar você! Você vai sentir medo pelo resto da vida?!

Baixou a mão, golpeando o ar, enquanto praguejava: “Droga!”.

Começou a andar de um lado para o outro diante da porta enquanto reclamava sobre si consigo mesma.

— Sempre assim não é Rapunzel?! Sempre decepcionando!

Reclamou consigo mesma sobre si por um bom tempo, mas de repente foi interrompida.

—Loira?!

A alemã se assustou voltando-se para a voz, e viu Merida. Seus cabelos bagunçados, o olhar cansando e apertado, mas expressando o estranhamento ao testemunhar aquela cena, e usando um fino pijama branco.

— O que tá fazendo?!

— Eu?! – pensou, logo depois endireitou a postura, respondendo normalmente – Nada!

— Estava falando sozinha!

Rapunzel fez careta e colocando as mãos na cintura respondeu: “Se você já sabia disso por que perguntou?!”.

— Ué, por que você mentiu? – perguntou a escocesa já raivosa, mas logo depois ergueu as mãos abertas em defesa – Quer saber?! Esquece! Fique você com as suas maluquices, seja lá o que estiver fazendo eu não quero me envolver mesmo!

Terminou de falar caminhando para longe da loura, em direção a cozinha.

— Eu só vim aqui procurar alguma coisa pra comer! Já está quase na hora do almoço, e não comi muito bem noite passada! – disse abrindo a porta da geladeira, procurando comida.

A germânica acompanhou a celta com os olhos, olhando-a em silêncio.

— Droga! – disse enquanto olhava a geladeira – Aqui só tem salmão, o Jack não sabe comprar mais nada?! Será que existem tantos pratos assim de salmão na Rússia ou ele só gosta de fazer a gente passar fome?! Estou enjoada de comer peixe.

De repente uma luz se acendeu sobre a cabeça de Rapunzel.

— Escuta... – chamou a loira sugestivamente – Eu vou sair agora, se você quiser pode vir comigo e aí compramos alguma coisa pra comer.

A alemã ainda tinha medo de sair de casa e havia feito o nobre voto de fortalecer sua vontade frágil, uma das formas era saindo na rua sem os pais, mas não precisava ser sem ninguém.

Merida olhou Rapunzel de lado, com desdém, sobre o braço esticado, abrindo a porta da geladeira. Não era capaz de acreditar em tal proposta, nem em tal gentileza inesperada.

— Você faria isso?! – perguntou ainda olhando com desprezo, franzindo o cenho e apertando os olhos ainda sonolentos.

— Sim! – respondeu a loira, de pé sobre o chão de madeira, debaixo do teto alto, vestida com suas belas roupas de sair, com um belo e luminoso sorriso no rosto.

— E por que você faria isso?! – perguntou, mas depois interrompeu a si mesma – Quer saber? Esquece! Cavalo dado não se olha os dentes, e eu estou com fome! Mas ainda assim, eu estou cansada, não tem como você ir sozinha, comprar comida e trazer pra mim?

A loira de repente desfez o sorriso, baixou a cabeça olhando de lado para o chão. Passou a mão no braço agasalhado e respondeu: “É que...”.

— Só pra te avisar! – interrompeu a ruiva – Você mente muito mal, até quando não faz com segundas intenções, então seja sincera.

Rapunzel a olhou sobressaltada, logo depois suspirou com o rosto sério e respondeu.

— Tenho medo de sair na rua sozinha.

— Tipo... Agorafobia?! – questionou Merida.

— É...

Merida a olhou em silêncio. A alemã novamente baixou a cabeça envergonhada, voltando a pousar a mão nua e delicada sobre o braço.

A escocesa fechou os olhos azuis suspirando. Ainda estava cansada e não queria saber de respostas, apenas de sua refeição, e se tal coisa lhe era empecilho, não tinha muito o que fazer para corrigi-lo.

— Tá bem! Aguarda só um pouquinho – disse e logo depois caminhou em direção ao quarto.

Rapunzel novamente a acompanhou com os olhos.

A celta saiu do quarto vestindo um casaco verde com capuz também de pelo branco. Também usava uma calça jeans nova comprada por Jack, a bota que usava era a mesma que calçava quando foi para a casa de Norte onde se hospedava.

Seu olhar jovem estava mais desperto, e terminava de dar os toques finais em seu visual.

— Vamos?! – chamou Rapunzel, tentando agora esconder seu conforto.

A loira desta vez caminhou para a porta e girou a maçaneta sem receios, mas para sua surpresa, a porta estava trancada.

Virou o rosto espantada, olhando para a mesma e tentou abrir novamente, puxando com as duas mãos.

— Espera! – disse Merida se aproximando – O Jack tranca a porta todos os dias, só destranca quando vai sair.

— Então estamos presas aqui?! – perguntou a loira com certa aflição, mas ao mesmo tempo unido a um estranho e novo conforto por causa do empecilho de ter que sair de casa.

— Não exatamente – respondeu a ruiva – Tem algum clipe de papel aí nessa sua bolsa?

— Deixa eu ver! – respondeu abrindo a mesma, demorou pouco tempo para achar o que procurava – Achei!

Merida puxou o pequeno pedaço de metal da mão da mesma, torceu, ajoelhou-se diante da porta e dentro de poucos instante a porta estava aberta.

— Voilà! – disse se levantando, logo depois atirou o pedaço de metal para Rapunzel, que o pegou no ar surpresa.

Logo depois, ambas saíram, desceram as escadas brancas e começaram a caminhar pela calçada cinzenta e fria, a rua também estava repleta de neblina branca e um tanto espessa.

Enquanto caminhavam, aos poucos a germânica começou a sentir vertigem e sua respiração começou a ficar pesada. Puxou para junto de si a bolsa enquanto olhava para os lados com o corpo curvado.

A celta a olhou pelo canto dos olhos enquanto franzia o cenho, desconfortável com a conduta da loira, mas não disse nada.

Após mais alguns instantes caminhando, notou que a loira começava a ficar tremendamente pálida. Não sabia o que estava acontecendo, nem estava disposta a tentar descobrir os problemas dela, focava mais em seu cansaço e sua fome, mas a situação já estava a incomodando então decidiu descontrair.

— Então loira...

— Rapunzel! – respondeu, corrigindo, enquanto seguia caminhando da mesma forma.

— Tá, tanto faz... Você tem dinheiro para pagar por essa comida?

— Tenho um cartão dos meus pais – respondeu distraída olhando para os lados.

— Jura?! Então é você e o Jack! Que sorte a minha! Diz aí, onde é que vamos comer?

— Depois vemos isso, primeiro vamos visitar algumas livrarias no shopping.

— Espera, o quê?! Livrarias?! Achei que a gente fosse comer!

— E nós vamos! Mas depois!

Merida gemeu de desgosto.

— Perfeito... Você mentiu pra mim!

— Eu não menti pra você! – respondeu a loira raivosa.

— Disse que íamos sair pra comer!

— Não! Eu disse que íamos sair e que poderíamos parar para comer alguma coisa!

De repente, a ruiva notou algumas pessoas desconhecidas caminhando do outro lado da rua na direção contrária a dela, e por mais que houvesse uma neblina densa entre elas e aqueles estranhos distantes, ainda era possível enxergar uns aos outros. No mesmo instante a celta voltou a notar o jeito constrangedor com que Rapunzel caminhava.

— Será que dá pra parar de andar desse jeito?! – falou puxando a loira pelo ombro fazendo-a saltar e involuntariamente endireitar a postura – Qual é o seu problema?!

— Eu disse que tinha medo de sair sozinha!

— Segura sua onda! Nada de ruim vai acontecer!

As duas seguiram em um silêncio hostil, caminhando no meio da neblina e do frio debaixo do céu nublado. Rapunzel agora caminhava com a postura normal, embora repetidas vezes algo a impelisse a caminhar da mesma forma que antes.

De repente ao longe, viram uma figura distante surgindo no meio da neblina branca. Aos poucos notaram que era um carro, e depois notaram que se tratava de um táxi, para a alegria de ambas.

Rapunzel acenou, e o taxista parou ao lado delas, ambas entraram.

Merida ficou mais confortável com aquela loira, pelo menos ela pagaria um táxi para ir onde precisa, diferente de seu anfitrião russo.

Quando o motorista perguntou para onde devia leva-las, a alemã respondeu que era ao shopping center, o homem logo começou a se dirigir ao destino indicado.

A viagem foi silenciosa e dentro do carro ainda estava frio, as duas passageiras sequer se olharam no rosto ou conversaram com o motorista, talvez a loira o tivesse feito se não fosse pela presença de uma moça ainda estranha para ela.

Dentro de alguns minutos o homem as deixou em seu destino. Merida prontamente saiu do carro assim que o mesmo estacionou, Rapunzel permaneceu dentro do veículo e pagou o taxista com o cartão, enquanto sua acompanhante a aguardava do lado de fora do carro.

Ambas pararam diante do shopping enquanto o taxista seguia seu caminho. Olhavam o edifício de baixo, cercadas por dezenas de carros e clientes caminhando por todos os lados, para todas as direções usando roupas de frio e cuidando de seus próprios assuntos.

Adentraram o mesmo que estava sempre movimentado e cujas lojas já estavam enfeitadas para o natal, subiram as escadas rolantes, lotadas de usuários, e dentro de pouco tempo encontraram uma livraria.

— Tem algum livro para recomendar? – perguntou Rapunzel enquanto olhava vários livros em uma prateleira pequena.

Merida estava de costas para a mesma, os braços cruzados e o rosto aflito, olhando de um lado a outro procurando qualquer sinal de sua mãe, escondendo-se atrás de uma das prateleiras grandes da livraria, sentia o medo aos poucos lhe dominar o coração jovem.

— Não! Nada além de alguns autores escoceses que eu li! – respondeu com a aflição exposta em sua voz – Por que você decidiu comprar um livro agora?

— Querendo ou não vou ficar um tempinho na casa do Norte, e cansei de desenhar, vou ler alguma coisa até a hora de ir embora.

— Sortuda... – comentou.

A loira ouviu o comentário, mas não respondeu.

— Sério mesmo que você só lê autores escoceses?! – perguntou se apoiando sobre a prateleira com um sorriso pretencioso no rosto belo.

— Claro que não! Não seja ridícula, mas eu sou escocesa! Devo conhecer a cultura do meu país.

— Tá bem...

— Anda logo! Já escolheu? – perguntou, revelando sua pressa.

— Acho que já, vou levar as fábulas dos Irmãos Grimm mesmo – falou caminhando e olhando um livro nas mãos.

— Ótimo! Paga isso e vamos embora logo!

— Calma! Qual é o problema? Você mesma disse que nada vai acontecer de ruim! – respondeu caminhando para o caixa e pegando o cartão.

— Não com você pelo menos – disse Merida, mas Rapunzel novamente não respondeu.

A alemã pagou o livro, e a ambas saíram da loja. A escocesa cheia de pressa empurrando-a para saírem logo daquele edifício. Aquele era o mesmo prédio onde a celta havia encontrado sua mãe antes.

— Para de me empurrar! Qual é o problema! Não quer comer?

A ruiva olhou para o lado e viu a loja onde sua mãe estava no outro dia, aberta e movimentada.

— Comemos fora shopping! – respondeu voltando a empurra-la.

Merida só se tranquilizou após sair do andar onde estava a loja de sua família.

Após saírem do shopping, novamente cercadas de carros e clientes, com Rapunzel carregando a própria compra, a escocesa queria ir correndo para a estrada movimentada, onde via um táxi se aproximando.

— Vamos! Chama logo um táxi! – pediu desesperada enquanto corria e puxava a loira pelo pulso, sequer notando o desconforto da mesma para com isso.

— Espera! – disse Rapunzel puxando o braço com força – Me deu vontade de usar o banheiro!

— O quê?! – exclamou Merida – Não! Você usa o banheiro depois! Em algum outro lugar! Mas não podemos ficar nem mais um segundo aqui!

— Bem, pois saiba que eu queria usar o banheiro desde que saímos da livraria, mas você não deixou, agora fiquei com mais vontade ainda e preciso usar!

— Ai, que droga! Não temos tempo pra isso!

— Dá um tempo ruiva! Tem banheiro aqui do lado de fora, e não leva muito tempo, é só esperar alguns minutos e já vamos, por que está com tanta pressa pra sair daqui?

— Isso não é da sua conta!

— Já que é assim então espera mais um pouco!

A escocesa novamente gemeu, mas agora de raiva, curvando o corpo magro para trás enquanto flexionava os finos dedos de suas belas mãos.

— Vamos! – disse Rapunzel raivosa dando as costas para ela, caminhando em direção ao banheiro.

— “Vamos” aonde?! Vai sozinha! Você que está com vontade! – disse a ruiva gesticulando com a postura desdenhada.

A loira parou, voltando-se para a mesma, os olhos verdes revelando momentaneamente um temor repentino.

No fundo a alemã não queria se afastar de sua companhia, apesar da discussão, mas como estava sendo hostil para com sua consorte, não queria demonstrar isso. Então escondeu o medo e respondeu.

— E se a gente se perder? Eu não sei se ao voltar do banheiro eu vou te encontrar aqui e se eu não te encontrar eu não vou procurar você, aí boa sorte pra voltar andando sozinha pra casa do Norte!

Merida notou que Rapunzel estava mentindo, mas também notou que o que ela realmente não queria era que ambas se afastassem e Rapunzel ficasse sozinha na rua. Também notou uma pequena possibilidade de ambas não se encontrarem e isso tornar a situação pior.

A celta ruiva novamente gemeu de raiva e desgosto, odiava ser forçada a fazer a vontade de outras pessoas, mas nesse momento não tinha muito o que fazer.

— Tá! Vamos! – disse, e logo depois seguiu Rapunzel até o banheiro, colocou o capuz peludo sobre os ruivos cabelos cacheados e volumosos e seguiu adiante, sempre olhando para os lados.

Na frente uma loira caminhando de forma lenta, pacífica e recatada, atrás dela, uma ruiva encapuzada, de postura hostil e impaciente.

As duas chegaram ao banheiro relativamente humilde e pouco movimentado.

A ruiva parou e encostou do lado de fora o lado esquerdo do corpo sobre a parede com cerâmica matizada, bem ao lado da porta do banheiro, voltada para a mesma.

A alemã ia adentrando o lugar, mas ao notar Merida encostada na parede, mexendo no telefone, parou e perguntou:

— Ué, não vai entrar?

— Não! Pode ir! Eu espero aqui fora! – e voltou a mexer no celular distraidamente, no fundo a celta tinha medo de entrar e encontrar sua mãe dentro do banheiro, no momento considerava todas as possibilidades.

— Tá! Você que sabe! – respondeu a alemã, e logo depois entrou.

Merida ficou sozinha encostada na parede do banheiro deserto, seguiu a mexer no telefone por alguns instantes, mas entediada com o aparelho e preocupada com a mãe, dentro de pouco tempo guardou o mesmo.

Olhou ao redor repetidas vezes, procurando por qualquer sinal de Elinor.

Tirou e mexeu no capuz peludo poucas vezes para melhorar a visão periférica ou arrumar os cabelos cacheados, mas até o momento, não captou nenhum terrível sinal de sua mãe.

Seguia com o corpo encostado na parede, voltada para a porta do banheiro. De repente colocou o punho cerrado sobre a cintura magra, coberta pelo casaco, enquanto esperava a loira, e do nada, sentiu um aperto forte no pulso.

Bruscamente olhou para trás, pensando ser algum conhecido, ou talvez até um marginal. Por isso voltou-se já cerrando o punho para usar suas longas habilidades de luta para se livrar de quem fosse.

Mas infelizmente era alguém que conhecia, Elinor. A escocesa mais velha a olhava com o rosto maduro furioso, um olhar cansado e os longos cabelos lisos e castanhos estavam levemente arrepiados.

Merida olhou a mãe de baixo, os olhos azuis arregalados, assustados e amedrontados, a boca de lábios rosados aberta e o rosto jovem ficando rapidamente sombrio.

— Mãe?! – disse a ruiva, assustada e amedrontada, a voz mais alta do que pretendia.

— Vamos pra casa Merida! – disse Elinor raivosa, e começou a puxar a filha jovem pelo pulso magro.

A mais nova nunca viu a mãe com tamanha fúria e tamanho cansaço, jamais a viu com a aparência descuidada.

A mãe de Merida caminhava sobre o chão úmido, frio e escuro, o aperto de sua mão adulta ferindo o pulso feminino de Merida, que a seguiu durante os primeiros passos sem hesitar, enquanto gelava de medo.

— Espera! Não! – disse a ruiva quando notou o que estava acontecendo.

A mais nova firmou os pés no chão, mas começou a ser arrastada, tentou puxar o braço, mas Elinor era mais forte e a fúria lhe aumentava as capacidades físicas.

— Pare com isso Merida! Não aja feito criança! Vamos pra casa! – disse em seu tom maduro e sério.

Enquanto isso acontecia, Rapunzel saia do banheiro enxugando as mãos. Seu rosto inexpressivo esmoreceu mais ainda e sentiu o corpo esfriar quando notou que Merida não a estava aguardando.

— Merida?! – chamou amedrontada, olhando ao redor.

A ruiva seguia sendo arrastada pela mãe enquanto tentava resistir. Foi atirada com violência dentro do carro preto de Elinor, no banco macio de trás. No banco do motorista havia o leal chofer da família Dun Broch.

Elinor entrou no carro batendo a porta enquanto olhava ainda furiosa para a filha amedrontada que tentava se afastar dela.

— Vamos pra casa! Rápido! – ordenou ela ao motorista enquanto tentava conter a filha.

O homem trancou todas as portas do carro enquanto a mãe de Merida lhe prendia as mãos sobre o banco.

O carro começou a andar, entrou em uma pequena fila de veículos que tentavam entrar na rodovia movimentada.

A celta mais nova de repente estava aterrorizada, e os apertos fortes de sua mãe em seu pulso jovem começaram a doer muito, e a expressão de fúria em seu rosto fazia Merida se sentir verdadeiramente ameaçada. Não gostou do terror que a preenchia por dentro.

Isso a fez ter vontade de reagir contra quem jamais tentaria fazer tal coisa, e assim, chutou a mãe para longe, a mais velha gemeu. A ruiva parou um segundo para notar e remoer aquilo que havia feito. Viu sua mãe gemendo enquanto colocava a mão no lugar onde a filha lhe havia acertado.

Abriu com pressa a janela limpa do carro em movimento, que se abriu em pouco tempo, tentou sair pela mesma, mas sentiu o aperto forte da mão de sua mãe em seus tornozelos.

Então decidiu gritar.

— Socorro! Estupradora!

Rapunzel, ainda assustada, ouviu o grito de longe, voltou-se na direção do mesmo, suspeitando reconhecer aquela voz aflita.

— Merida?! – sussurrou consigo mesma.

A germânica sentiu medo ao ouvir o pedido de ajuda, sentiu o coração jovem doer e o rosto enrugar. Involuntariamente começou a correr em direção aos gritos.

Notou um estranho e ameaçador carro preto passando a frente dela, a menos de dez metros, em uma pequena fila de veículos que faziam esforço para adentrar o asfalto por onde corriam automóveis em alta velocidade. Mas diferente de todos os outros, havia uma ruiva desesperada gritando por ajuda emergindo da janela.

De repente, as duas se entreolharam.

— Rapunzel?! – disse Merida com os olhos azuis arregalados.

— Merida?! – disse Rapunzel ao ver aquela cena amedrontadora.

De repente, a escocesa sentiu ser puxada para dentro do carro. E imediatamente se recordou que precisava de ajuda.

— Me ajuda! – gritou implorando.

A alemã se amedrontou, balançando a cabeça recusando e dando um passo para trás.

— Por favor! – gritou a ruiva com enorme desespero, estendendo os braços para a mesma.

Apesar do medo, parte de Rapunzel não pôde resistir às súplicas de Merida, e logo foi correndo até a mesma.

A loira abraçou a ruiva, e começou a caminhar para trás, fazendo força, tentando libertar a celta de um destino cruel. A mãe da ruiva retribuiu puxando com igual intensidade.

Passaram eternos segundos fazendo Merida de cabo de guerra. Ambas sem se conhecer, mas ao mesmo tempo desesperadas. Elinor não queria perder a filha novamente e Rapunzel não se perdoaria se deixasse que levassem a escocesa.

A Dun Broch mais nova sentia com desconforto o corpo ser puxado de um lado para o outro por duas mulheres extremamente violentas e estranhamente motivadas.

Enquanto isso, os outros veículos seguiam e entravam na estrada movimentada, o carro de Elinor era o próximo. Era tudo ou nada.

Os automóveis atrás da mesma começavam a buzinar.

— Solta! – gritou uma suada e furiosa Elinor.

— Não! – respondeu Rapunzel chorosa e raivosa.

No final, a loira venceu. Conseguiu puxar Merida para fora do carro, mas caiu com a mesma no chão frio.

A ruiva estava agora mais aliviada, mas ofegava, aos poucos se ajoelhava e se apoiava em uma das mãos, enquanto voltava-se para sua mãe, colocando uma mecha de seus cabelos atrás da orelha vermelha.

A alemã ficou deitada sobre o chão frio, olhando o ameaçador carro preto ainda próximo, seu coração estava acelerado e seu sangue fervia.

Rapunzel rapidamente agarrou Merida, que se assustou na hora, colocou-a sobre o ombro e rapidamente se levantou, começando a correr para longe.

— Espera! Loira! O que está fazendo?! – perguntou ela enquanto era carregada e seu corpo balançava sobre a mesma.

Elinor, exausta e com dores nos músculos inaptos, olhava novamente a filha escapar-lhe por entre os dedos. Bateu na porta do carro, furiosa.

Alguns automóveis estavam atrás do veículo dela, buzinando para que a mesma saísse da frente e assim fez, adentrando o asfalto e perdendo outra preciosa oportunidade.

A loira corria sem parar, correu tanto que sequer notou quando as nuvens frias se movimentaram no céu vasto permitindo que o sol iluminasse Filótes. Correu até ficar quilômetros longe do shopping. Correu até chegar numa rua antiga e tradicional repleta de belos bancos, sobre uma bela calçada e com belas e antigas arvores altas e cheias de folhas que eram todas iluminadas pela luz dourada de um sol efêmero.

A alemã corria ainda carregando Merida sobre o ombro direito, os olhos verdes arregalados, respirando de forma sufocante pela boca aberta enquanto gemia, os belos lábios rosados separados assustados, revelando os dentes brancos. O suor que encharcava seu belo rosto feminino também atingindo suas roupas.

Mas mesmo assim, não estava disposta a parar tão cedo.

Contudo, sua carga estava cansada de ser carregada. E os balanços que seu corpo fazia de forma involuntária lhe incomodavam a barriga magra.

— Loira! – chamou Merida extremamente incomodada – Eu já falei que pode me colocar no chão! Não precisa me carregar! Também não precisa correr!

— Nem morta! E se ainda estiverem nos seguindo?

— Não estão nos seguindo, se estivessem eu estaria vendo! Olha em volta! Essa rua está deserta! Eu vi eles entrando na rodovia assim que você começou a me carregar!

— Tem certeza? – perguntou Rapunzel enquanto seguia correndo.

— Absoluta! Por que eu mentiria?! Me coloca no chão! – falou começando a se debater.

Rapunzel obedeceu a ruiva, tirando-a de cima de seu corpo e colocando-a sobre um banco da praça, logo depois sentou também.

Curvou a cabeça para frente, os cabelos loiros cobrindo parcialmente o belo rosto branco suado enquanto, de olhos fechados, limpava o suor salgado de sua testa.

Seus joelhos estavam juntos, mas seus pés estavam separados, enquanto isso recuperava o fôlego e sentia as dores terríveis em suas pernas cansadas. Não estava habituada a fazer tanto esforço, nem se imaginaria fazendo.

Merida a olhou com estranheza, mas ainda assim, sentia-se bem, pois apesar do susto de reencontrar Elinor, se livrou dela, e agora já não estava sendo carregada.

Logo depois respirou fundo e suspirou alto. Curvou a cabeça para trás sentindo alívio e comentou: “Puxa...”.

A loira a olhou enquanto a cabeça permanecia baixa e ela recuperava o fôlego com a mão sobre o peito.

— Me lembra de nunca mais ir até aquele shopping! – disse a ruiva, com a cabeça ainda encostada sobre o belo banco, olhando Rapunzel enquanto indicava com o polegar a região do edifício.

Num sobressalto, Rapunzel voltou-se para Merida.

— Você está bem? Ela machucou você? – perguntou preocupada aproximando-se da mesma.

— Um pouquinho – disse a ruiva com tristeza nos olhos, passando as mãos delicadas suavemente sobre os pulsos magros com profundas marcadas de aperto.

A germânica notou aquilo.

— Você viu o rosto dela? – perguntou com avidez.

A escocesa olhou para o lado estranhando a pergunta.

— Sim! Eu conheço ela... – respondeu com ressalvas.

— Você conhece ela?! – disse a loira, surpresa.

— Claro... Por que não conheceria?! – continuou Merida sem compreender.

— Então vamos logo falar com a polícia! – Rapunzel exclamou se levantando.

— Espera! Polícia?! – o estranhamento da celta só aumentou – Ficou doida?!

A alemã também não compreendia a escocesa.

— Como assim?! Ela tentou abusar de você, não foi? Você disse que a conhece então vamos logo fazer uma denúncia!

— Ah! – a ruiva arregalou os olhos azuis, dando-se conta do que estava acontecendo, Rapunzel havia acreditado na acusação desesperada que fez contra sua mãe – Não loira... Aquela era minha mãe!

— Sua mãe tentou abusar de você? – perguntou a loira com os olhos verdes arregalados.

— O que?! Não! Que horrível! Não houve tentativa de abuso! Ela só estava tentando me levar pra casa a força, eu estou fugindo dela.

— Não houve tentativa de abuso?! – perguntou a loira, com os olhos verdes ainda arregalados, indignada.

Ambas passaram um tempo em silêncio. Rapunzel de pé, de frente para Merida, ao lado da mesma, com seu casaco cor de rosa, segurando a bolsa no ombro direito e sua sacola de compras na mão esquerda. Merida permanecia sentada com certo recato, as mãos delicadas pousadas sobre os joelhos, usando seu casaco verde xadrez, olhando a alemã, agora desconfortável. Ambas iluminadas pela luz dourada do sol no meio da rua bonita, alguns passarinhos cantavam ao longe.

De repente, Rapunzel agrediu a escocesa com a bolsa.

— Você mentiu pra mim?! – disse enquanto batia.

— Ai! – respondeu a ruiva, surpresa com o ombro acertado – Ah, qual é?! Você não fez diferente antes, lembra?!

— Não é a mesma coisa... – ia dizendo, mas de repente se interrompeu, colocou as mãos femininas sobre a cabeça com os cabelos loiros enquanto arregalava os olhos e balançava o corpo expressando aquilo que sentia – Meu Deus! ... Você sabe o quanto eu fiquei assustada?! Preocupada?!

— Ué?! Por que ficou? Nem nos conhecemos direito! – respondeu Merida, tentando se defender, inutilmente.

— Você não ficaria se estivesse no meu lugar?! – respondeu Rapunzel, logo depois caiu sentada sobre o banco, deitando a cabeça sobre o banco, respirando fundo.

A ruiva a olhou, baixou os olhos em silêncio, sentiu culpa. Passou um instante em silêncio, logo depois cedeu.

— Tá! Me desculpa... Mas mesmo assim... Obrigada por me salvar da minha mãe.

A loira seguiu em silêncio, com a cabeça ainda deitada, apenas abriu levemente os olhos verdes, em condenação, logo depois os fechou de novo enquanto se acalmava e sentia o coração desacelerar.

— E pode ficar tranquila! Eu sou faixa preta em diversas artes marciais, se algum tarado aparecer eu sei muito bem como me livrar dele. Não seria a primeira vez! – disse agora sorrindo, com memórias nostálgicas.

— Bom pra você – disse Rapunzel com desdém, ainda com a cabeça deitada.

Merida novamente se calou. Ainda envergonhada.

— Você pratica algum esporte? – perguntou a ruiva.

— Se não me engano xadrez conta como esporte – disse a loira.

— Me refiro a um esporte que exija força física.

— Não!

— Sério?! Achei que praticava. Me carregou por todo esse caminho correndo sem parar. Não é qualquer pessoa que consegue fazer isso.

A alemã seguiu calada, com os olhos fechados, sem responder.

Merida seguia a olhando, a testa alva e jovem franzida, os olhos azuis começando a manifestar uma certa raiva. Decidiu ser direta.

— Loira, sem querer parecer interesseira, mas você disse que íamos comer depois que passássemos no shopping.

Na hora Rapunzel ergueu a cabeça e olhou a ruiva diretamente, franzindo o cenho, mas bem menos do que a celta.

Se olharam em silêncio, de forma hostil. As nuvens voltaram a cobrir o sol, tornando a rua sombria e ofuscando a luz que as iluminava, enquanto isso as duas se olhavam descomprazidas.

— Tá bem, só espera um pouquinho... – disse Rapunzel com tom de condenação – deixa eu descansar um pouco.

Novamente se silenciaram, olhando para a rua pouco movimentada. A loira relaxada sobre o banco e Merida com a coluna ereta – como a mãe lhe havia ensinado – com os braços cruzados e rosto inexpressivo, mas ainda assim, impaciente.

De repente, a germânica olhou para o lado, e viu ao longe um pequeno carro vindo. Aos poucos se aproximava e a loira notava que se tratava de outro táxi.

Bruscamente lançou o corpo para frente com os olhos arregalados. Pôs-se de pé e começou a acenar.

Ambas entraram no veículo. Merida queria indicar o lugar, mas Rapunzel a cortou, sob o argumento de que se seria utilizado seu dinheiro, o local onde iriam comer também seria de sua escolha.

A ruiva não gostou, mas não estava em condições de reclamar.

O motorista as levou a uma cervejaria alemã. A placa do lugar era preta, e o nome “Corona” estava escrito em dourado na mesma. Nela haviam bancos e mesas dentro do estabelecimento e mesinhas pretas de madeira ao ar livre, com cadeiras do mesmo material. Haviam poucos homens adultos usufruindo do lugar. Certamente ficaria cheio a noite.

A alemã terminou de pagar o motorista, e logo depois ficou parada ao lado da escocesa, olhando o estabelecimento.

Merida estava surpresa em se encontrar numa cervejaria para almoçar.

— Você está bem? – perguntou a loira.

— Estou – respondeu a ruiva ainda olhando a cervejaria com os olhos azuis surpresos.

— Vamos! – chamou a germânica caminhando.

A celta atendeu seu chamado.

— Desculpe, eu esqueci de perguntar, você tem idade para beber? – perguntou Rapunzel enquanto se sentava a uma mesa próxima a saída da cervejaria.

— Tenho – respondeu a ruiva sentando-se a frente dela, ainda cheia de receios.

Um homem sorridente com avental branco logo foi atende-las, segurando um caderninho branco e uma caneta diante do mesmo.

Perguntou às duas o que gostariam. Depois de conversarem por alguns instantes, decidiram.

— Uma bandeja grande de coxas de frango e duas canecas de cerveja. Pode ir trazendo as cervejas enquanto a coxas cozinham. Põe na conta!

— Sim senhora! – respondeu o homem logo após fazer as anotações em seu caderninho, logo depois deu meia volta e entrou no estabelecimento.

— Hum... Então quer dizer que a loirinha tem uma conta numa cervejaria – disse Merida com ar de zombaria.

— Sim! O que é que tem?

— Seus pais sabem disso? – perguntou mantendo a zombaria na voz.

— Essa conta é da nossa família.

— Sério?! – questionou ela com os olhos arregalados – Vocês bebem muito aqui?

— De vez em quando.

— Vocês vem muito aqui?

— Bem... Essa cervejaria é nossa.

— Sério?! Vocês têm sua própria cervejaria?! Isso deve ser bem legal!

— Na verdade somos donos de uma fábrica de cerveja, de vez em quando abrimos algumas cervejarias por aí.

Merida arregalou os olhos de novo, mas logo depois voltou ao tom de zombaria.

— Sério?! Uma família alemã dona de uma fábrica de cervejas e uma rede de cervejarias?! Que estereotipado!

— Cerveja faz parte da cultura do meu país, não posso fazer nada!

De repente um garçom chegou trazendo duas canecas com a etiqueta da cervejaria, eram altas, gordas e de vidro fino, o funcionário carregava a bebida sobre uma bandeja redonda metálica. As cervejas espumantes eram douradas e as espumas brancas se formavam perto da boca dos copos.

As canecas foram colocadas sobre a mesa. Ambas agradeceram enquanto pegavam as canecas pela alça. Deram um rápido brinde e beberam.

Merida tomou apenas um pequeno gole, apreciou o sabor da cerveja em sua boca por alguns segundos, os olhos azuis voltados para baixo, logo depois engoliu.

Olhou a loira a frente e imediatamente se surpreendeu.

Rapunzel havia virado o chope sobre o rosto levantado. A cerveja balançava dentro da mesma enquanto a alemã engolia a bebida sem separar a caneca da boca e sem parar para respirar. Fazia tudo de olhos fechados.

A escocesa a olhava com os olhos arregalados sem parar, nem piscar. Demorou para colocar sua caneca sobre a mesa.

A loira seguia engolindo a cerveja, até que finalmente sobrou apenas a espuma, que a alemã seguiu engolindo, até finalmente separar a boca da caneca, colocando a mesma sobre a mesa com certa violência, enquanto recuperava o fôlego e gemia de olhos fechados pela queimação na garganta.

Aos poucos abriu os olhos, enquanto ainda segurava a caneca vazia e ofegava. Demorou um pouco para notar o olhar fixo e espantado de Merida.

A sensação de prazer havia imediatamente desaparecido de seu rosto feminino. Agora a loira era alvo de um julgamento.

— Beber faz eu me acalmar. Você me deixou assustada, é por sua culpa que estou bebendo assim.

Passado um tempo em silêncio, a ruiva respondeu:

— De nada! – disse sorrindo e voltando a beber da caneca cheia, voltando os olhos azuis para a mesma.

Rapunzel olhou para ela inexpressiva. Acenou para o garçom repor a bebida.

— Espero que não seja fraca com álcool – comentou Merida sorridente, ainda com ar de deboche.

— Eu sou alemã! Está no meu sangue! – respondeu enquanto o garçom repunha sua bebida – Mas e você? É a primeira vez que você bebe?

— Não! Já bebi whisky algumas poucas vezes escondida com meu pai. Quando fiz idade, claro.

De repente ficaram em silêncio. Passados alguns instantes, a comida chegou.

Uma grande bandeja com um montanha enorme de coxas de frango, douradas, secas e salgadas.

A escocesa sorriu ao ver aquilo. As coxas douradas refletiram no escuro de seus olhos azuis.

A germânica começou a comer de forma recatada, mas a escocesa não se segurou.

Merida agarrou coxa por coxa, comendo todas com rapidez e avidez.

Rapunzel comia a carne macia em mordidas pequenas, frequentemente pegava guardanapos e limpava os lábios rosados e os dedos finos enquanto olhava com seus olhos verdes a glutona ruiva a sua frente. Também começava a dar goles menores de sua caneca de chope.

Depois de um tempo, ambas estavam quase terminando sua refeição. A alemã já satisfeita havia parado de comer, a cerveja também lhe houvera conferido a satisfação que necessitava.

Mas Merida comia sem parar, mordia a carne dourada, salgada, seca e macia de tal modo a sujar o rosto e encher a boca enquanto seus olhos alegres brilhavam e seu paladar sedento seguia a comer. Colocava o sal fino e branco sobre a carne já salgada junto de um molho picante. Certas vezes comia a carne e atirava o molho diretamente na boca.

Demorava muito tempo mastigando, e quando terminava, abanava a boca em chamas com os dedos finos. Usava a cerveja gelada para abafar o fogo.

Por fim, Merida esvaziava mais uma caneca de chope, já tendo comido a última coxa de frango. Seu rosto e seus dedos estavam sujos de gordura e pedaços de frango, sua face alva estava vermelha pois estava embriagada e estava sorridente pois estava satisfeita.

Rapunzel a olhava encabulada, jamais havia conhecido uma moça tão comilona. Desconfiava de que ainda sobraria carne sobre a bandeja.

Ao esvaziar a caneca e coloca-la sobre a mesa gemendo. Os olhos claros sonolentos, a boca suja ainda sorridente e começando a rir.

— Sabe loira... Eu não te conheço bem ainda, mas sei que você tem bom gosto!

— Obrigada... – respondeu a loira ainda de queixo caído – Sabe, não é querendo ser chata, mas acho que consumir esse tanto de sal não é saudável.

— Relaxa! – respondeu Merida pouco antes de limpar a boca com a manga do casaco – Minha dieta está em dia! Pode acreditar em mim!

— Pelo menos usa um guardanapo! – exigiu Rapunzel, empurrando o mesmo para a ruiva.

A escocesa pegou e limpou o rosto e os dedos engordurados.

— Parece que é você que é fraca com álcool!

— Não sou não!

— Eu bebi mais do que você! E olha só como você está!

A celta passou um tempo em silêncio, olhando para o nada, ainda com o rosto vermelho e uma carranca surgindo em ssua face.

— Tá! – respondeu – Pode ser! Mas vai por mim! Eu me recupero rápido!

— Duvido muito! Acho que você nem vai se lembrar dessa conversa amanhã de manhã!

— Aposto que me lembro dela essa noite! – disse Merida com sotaque escocês e voz ébril.

— Apostado!

— Ótimo! O que vamos apostar?

— Um beliscão! Se você se lembrar dessa conversa me belisca assim que acordar! Se você se esquecer, eu te belisco!

— Fechado! – disse a celta estendendo a palma da mão para ser apertada.

Rapunzel o fez, cheia de receios.

— Vamos tomar só mais uma pra fechar! – disse Merida.

— Tá bem – disse a loira com rosto alegre.

Rapunzel chamou novamente um garçom que lhes repôs a bebida. Deram outro drink, agora um mais confortável, o som pequeno de vidro batendo. Logo depois viraram a caneca sobre o rosto.

A loira novamente conseguiu engolir tudo de uma só vez em questão de segundos. A ruiva, sempre competitiva tentou imita-la, mas lhe faltou fôlego e tolerância à garganta. Faltou ainda metade de sua caneca para terminar, e algumas gotas da bebida caíram fora de sua boca.

Baixou a cabeça, quase tossindo, fechou os olhos devido a sensação inusitada enquanto colocava o punho feminino cerrado diante da boca cheia.

A alemã quase riu ao ver que a escocesa tentara lhe imitar.

— Não conseguiu? Se não quiser eu bebo o resto!

— Não! – disse a ruiva, e logo depois engoliu apressadamente e de maneira forçada o resto da bebida espumante.

Enquanto Merida se afogava em cerveja, Rapunzel conversou aos sussurros com o garçom.

— Fez a conta de quanto deu pra colocar na conta da família?

— Sim senhora.

— Me faça um favor, e diga isso aos outros funcionários, Ja? Não fale com os meus pais sobre isso – gesticulou com a face para Merida que segurava a caneca grande diante do rosto com as duas mãos, tentando beber o resto da cerveja.

— Sim senhora – disse o rapaz, e logo depois se retirou.

— Vamos ruiva! – chamou Rapunzel.

A escocesa terminava de beber quando ouviu ser chamada.

Colocou a caneca abruptamente sobre a mesa, com certo susto.

— Não! Espera! Ainda tem muita cerveja que posso aguentar! Eu quero mais cerveja! – disse com voz bêbada.

A loira se levantou e foi até a ruiva, fazendo-a se levantar.

— Eu sei! E você vai tomar, mas não hoje! – disse enquanto tentava levantar a moça ébria com os braços debaixo das axilas da ruiva.

— Me solta! – disse Merida se debatendo – Eu posso andar sozinha! Me deixa!

Era início de tarde, mas como Filótes era cheia de nuvens parecia estar quase chegando a noite, por isso alguns brilhantes postes de luz estavam ligados, como alguns perto da cervejaria.

Merida começou a caminhar pela calçada, entre um muro vermelho de parede com textura rústica à sua esquerda e os postes de luz com suas luzes brancas brilhantes à direita.

Rapunzel a olhava caminhar para confirmar o que ela houvera acabado de dizer.

Parecia estar bem, caminhava em linha reta, apesar dos braços estarem meio erguidos para os lados. Mas de repente, cambaleou para o lado, esbarrando na parede, se apoiando na mesma, quase caindo.

A germânica revirou os olhos e caminhou lentamente até ela.

— Não! Você não consegue andar sozinha! – disse enquanto a ajudava a ficar de pé e colocava o braço esquerdo dela sobre seu pescoço – Vem! Eu te ajudo a caminhar!

— Tá bem! – disse a celta bêbada sem grandes rodeios.

Merida se apoiou em Rapunzel. A loira lhe segurava o pulso esquerdo, mantendo o braço da mesma sobre seus ombros e lhe abraçava o tronco agasalhado com o magro braço direito. A alemã vestindo um casaco rosa e a escocesa com um casaco verde xadrez, ambas com botas e calças. Caminhando debaixo do céu escuro e pálido, iluminadas pelas belas luzes brancas da calçada. A celta bem mais embriagada do que a germânica.

As duas jovens caminhavam agora em linha reta, já andavam bem distantes da cervejaria.

— Devia ter me dito que era fraca com bebida ruiva! Assim não precisaríamos estar nessa situação constrangedora!

— Uh! – disse a escocesa em resposta, em tom de embriagues – Você devia tomar cuidado! Se minha mãe descobrir que você levou a filhinha dela para beber... Você vai estar muito encrencada! – Merida sorria enquanto falava.

Rapunzel revirou os olhos balançando a cabeça. Caminharam por alguns instantes silenciosos pela calçada fria. O clima agradável de antes havia desaparecido totalmente.

Enquanto caminhavam, a loira avistou outro táxi passando pela mesma rua que elas. Acenou para o veículo.

O taxista levou as duas jovens embriagadas para a casa de Norte. Merida chegou a quase dormir no ombro de Rapunzel durante a viagem, para o desgosto da mesma.

Quando chegaram na casa, a alemã acordou a escocesa, precisou ajudá-la a subir a escadaria, mas Jack havia trancado novamente a porta, e a celta ainda teve que abri-la, mesmo que o entorpecimento a atrapalhasse, essa não era uma capacidade de Rapunzel.

Levou alguns minutos, mas finalmente conseguiram entrar na casa.

— Obrigada por me acompanhar! – disse a loira caminhando em direção à cozinha, dando as costas para Merida, buscando afastar-se o quanto antes daquela jovem bêbada, enquanto isso tirava o casco rosado, revelando uma fina blusa rosada de mangas longas.

Mas de repente, ouviu um baque na madeira. Olhou para trás assustada e viu a escocesa caída no chão. Ela havia acertado o sofá e caído.

A ruiva não conseguia se orientar sozinha, Rapunzel se viu forçada a ajudá-la.

Levou a celta para a cozinha, encheu de água potável um copo alto de vidro, entregou para a ruiva de cabelos cacheados que bebeu devagar e em silêncio. Posteriormente a germânica também bebeu.

A alemã levou a escocesa ao quarto da mesma, no meio do caminho pelo corredor, atirou o casaco no próprio quarto.

Ao chegar ao quarto da ruiva, Rapunzel tirou-lhe o casaco, revelando uma blusa fina cinzenta e de mangas longas. Colocou Merida sobre a cama, cobriu-a com o lençol até o pescoço. Fez tudo sentindo ainda uma ponta de embriagues.

De repente, se lembrou brevemente do episódio do shopping com o carro preto que ainda a assustava. Sentiu-se no direito de descobrir.

— Escuta, posso te fazer uma pergunta? – perguntou a loira enquanto ajeitava o lençol, entre elas havia um belo abajur dourado ligado por causa da escuridão do quarto.

— Eu tô bêbada, qualquer pergunta que você fizer provavelmente eu vou responder! – disse a ruiva agora com carranca enquanto passava a feminina mão macia sobre os olhos fechados.

— Qual é o lance com você e sua mãe? – perguntou sentando-se sobre a cama e olhando para a mesma com os olhos verdes atentos e curiosos refletindo a luz forte do abajur.

Ela parou de esfregar o rosto e abriu os olhos, apesar de estar ébria, Merida sentiu a pergunta lhe atingir direto nas emoções jovens e incompreendidas. Sentou-se sobre a cama.

Seu rosto vermelho esmoreceu e seus olhos azuis ficaram tristes. Passou alguns instantes em silêncio, mas logo depois respondeu.

Mesmo estando bêbada, sentiu sua privacidade ser invadida. Mas pensou em seu argumento recente, não tinha nada a perder.

— A gente não se dá bem. Ela vive querendo controlar minha vida. Por isso eu fugi de casa, agora ela quer me encontrar pra me levar de volta – disse de forma esclarecedora, revelando tristeza.

— O que ela fez para que você fugisse de casa?

— Nós sempre conflitamos, ela sempre quis que eu fizesse algumas coisas, quando na verdade eu queria outras.

— Sei como é... – comentou Rapunzel com o rosto ameno.

— Sabe?! – respondeu Merida com certa surpresa – Então deve saber como é frustrante não é? Isso me deixa muito chateada... Sempre deixou... Até que chegou um momento em que eu não aguentei mais... Aí eu fugi...

Um instante de silêncio surgiu. A germânica olhou para baixo por alguns instantes, logo depois prosseguiu com o diálogo.

— E o seu pai? Ele não faz nada?

— Ele é legal! Mas minha mãe é muito dominadora, então por mais que ele me apoie, não consegue fazer muita coisa pra me ajudar, e também ele ama minha mãe, então muitas vezes me sinto sozinha. Às vezes queria ter irmãozinhos para ver se ela me esquece.

A loira de repente se sentiu desconfortável ao notar que estava se intrometendo na vida particular de alguém.

— É melhor você dormir um pouco – disse ela se levantando.

— Espera! – chamou a celta.

A germânica parou e sentou-se novamente.

— O que foi?

— Já que eu respondi sua pergunta eu também queria perguntar. Por que tem medo de sair na rua?

A loira arregalou levemente os olhos verdes e arqueou as sobrancelhas.

— Bem... Por que quer saber? – questionou ela, sorrindo sem graça.

— Foi uma curiosidade que agora me veio à mente. Até porque foi você que me fez sair e dar de cara com minha mãe enquanto eu te fazia um favor, então...

O sorriso forçado da alemã aos poucos se desfez, e as circunstâncias a fizeram se sentir obrigada a responder.

Rapunzel respirou fundo e falou:

— Tive uma experiência traumática na infância – o rosto de Merida ficou sério ao ouvir aquilo – E agora tenho medo de sair de casa sozinha. Eu até tenho um psicólogo!

A ruiva abriu a boca para falar, mas foi interrompida.

— Por favor não me pergunte o que foi essa experiência traumática!

Após ficar um segundo em silêncio, a escocesa respondeu.

— Tudo bem... Não vou perguntar... Mas... Imagino como algo assim deve ser horrível.

A loira demorou para responder, a mera menção ao assunto fez o coração sensível estremecer, seus olhos verdes aos poucos se enchiam da lágrimas.

— Eu não gosto de falar sobre isso... – sua voz agora estava chorosa, enquanto isso ela limpava os olhos – Mas eu sempre me lembro disso! Todos os dias eu me lembro! É uma coisa que me persegue! Dói aqui dentro! Dói muito!

Merida estranhou a vê-la bêbada e chorando. Se sentia na obrigação de consola-la, até porque era por causa dela que aquela alemã estava chorando, mas mesmo com ambas tão próximas uma da outra, ainda assim estava difícil.

E ficaram assim por alguns instantes. Rapunzel chorosa enxugando os olhos e Merida surpresa e desconfortável, com as mãos erguidas tentando consola-la. A escuridão fria as cercando, mas uma forte luz dourada e quente entre elas as iluminando.

De repente, a escocesa não viu outra escolha senão abraça-la sem jeito, sem dar espaço para retribuições.

A escocesa podia ser enérgica e hostil, mas não suportava ver pessoas sofrendo diante dela.

A alemã ficou em silêncio ao sentir o abraço inesperado. Seus olhos verdes e úmidos ficaram arregalados e sua boca entreaberta.

— Escuta... – sussurrou Merida de olhos fechados – Eu não sei o que aconteceu na sua infância que está doendo tanto, mas sabe, todos tem traumas terríveis, alguns piores e outros menos piores, mas... A dor é inevitável, o sofrimento é opcional, concentre suas forças naquilo que realmente irá lhe fazer bem...

Rapunzel aos poucos retribuiu o abraço, e sorriu.

— Obrigada – sussurrou com voz chorosa.

Passaram alguns instantes assim, abraçadas e mudas. Elas mal se conheciam, mas sabiam que ambas estavam abatidas, e o calor do abraço aqueceu o frio interno de ambas.

— Lamento pelo seu trauma de infância – disse Merida.

— Lamento pela sua mãe – disse Rapunzel.

Seguiram abraçadas no meio da escuridão sendo iluminadas pela luz dourada e agradável do abajur.

Dentro de alguns instantes, ambas se separaram, sorrindo uma para a outra, gratas.

— Merida, não é?

— É. Rapunzel, não é?

— É.

— Obrigada.

— Obrigada.

Disseram ao mesmo tempo.

A loira saiu fechando a porta. A ruiva apagou a luz do abajur.

Depois do momento caloroso. Rapunzel entrou no quarto e voltou a dormir.

Horas mais tarde, Jack acordava sobre a branca cama fria. Já era quase noite, e a escuridão da casa havia ficado forte.

Se sentia um pouco mais confortável com seus novos hóspedes, mas não o suficiente para sair do quarto sem antes espionar se havia alguém na sala. Viu novamente a casa escura e silenciosa, então decidiu sair.

Já havia almoçado e tido uma conversa insossa com a mãe. Agora queria relaxar.

Sentou-se sobre o sofá confortável da sala. Ligou a televisão e começou a assistir.

Seu corpo solitário, deitado relaxado sobre o sofá escuro era iluminado pelas cores pálidas da televisão.

Se sentia bem naquele momento, queria que a solidão durasse para sempre.

Assistiu durante um bom tempo. Viu um anúncio na televisão que o alegrou. A trilogia de O Senhor dos Anéis iria passar em sequência na televisão, sem interrupções. Dentro de pouco tempo começaria.

Seu rosto jovem ficou sorridente, mas imediatamente, sua paz e alegria foram interrompidas.

Alguém havia aberto uma porta. O russo revirou os olhos gemendo desconfortável. Olhou para trás e viu Haddock na porta do quarto, bocejando e se espreguiçando.

— Boa noite Jack – disse o norueguês caminhando até a cozinha.

— Ainda não é noite, mas olá Haddock – disse com incômodo na voz.

O escandinavo pegou algumas tigelas e alguns alimentos na geladeira.

O platinado cruzou os braços sobre o sofá revirando os olhos de desconforto.

— Você acordo só agora?! – perguntou Jack.

— Não. Eu só vim aqui pra almoçar, mas estava com tanto sono que decidi voltar a dormir. O que você está assistindo?

— Nada, ainda estou procurando – o platinado não queria que descobrissem sua paixão por filmes de fantasia, suspeitava que ninguém entendesse, como sua família não entendia.

Mas de repente, o comercial passou novamente, e Soluço ouviu. Terminava de colocar leite na tigela quando percebeu.

— Vai passar a trilogia de O Senhor dos Anéis?! – perguntou com espanto.

— Vai. Por quê?! – perguntou o russo, num misto de ar sugestivo e disfarçando sua alegria.

— Eu adoro O Senhor dos Anéis! Li todos os livros do autor! Eu amo os filmes! Pelos menos a trilogia principal... Posso assistir com você?

O eslavo ficou confuso, seu cenho estava franzido e os olhos azuis iam do norueguês à televisão ligada, jamais havia conhecido outro fã da obra. Decidiu se aproveitar da situação.

— Eu não sou muito fã dessa obra, mas se você preparar uma tigela dessas pra mim eu deixo você assistir os três filmes.

Soluço não falou nada, apenas atendeu às condições de Jack. Inocentemente achou que o russo falava a verdade, mas dentro de poucos segundos sua mente afiada percebeu o óbvio.

Quando o escandinavo levou a tigela para o eslavo, comentou: “Então quer dizer que você não gosta, mas vai fazer o nobre sacrifício desnecessário de assistir um trilogia de mais de onze horas que você supostamente não gosta. Me engana...”.

Depois sentou-se do outro lado do sofá enquanto Jack o olhava em silêncio pelo canto dos olhos, um breve sorriso se formando no canto do lábio.

— Quando é que começa?

— Daqui a alguns minutos. Só vai terminar de madrugada.

Haviam acabado de se silenciar e começar a prestar atenção na televisão enquanto comiam de suas tigelas quando novamente outras duas portas foram abertas. Merida e Rapunzel estavam com fome.

Loira e ruiva se encontraram no corredor, a escocesa já estava sóbria, como havia garantido. Se olharam em silêncio com os olhos amenos, deram um breve sorriso uma para a outra, e logo se dirigiram à cozinha.

Jack e Haddock não deram atenção à elas.

As duas entraram na cozinha, se distanciando uma da outra, em silêncio, procurando o que comer. De repente o comercial voltou mais uma vez, anunciando o início da maratona.

— Vai passar O Senhor dos Anéis?! – questionou Merida ao ouvir a televisão.

— Sim! – respondeu Soluço.

— Qual deles vai passar?! – perguntou Rapunzel.

— Todos!

— Ah, então dá licença porque eu também vou querer assistir! – disse caminhando em direção ao sofá.

A ruiva sentou-se entre os dois rapazes.

— Eu também vou, adoro esses filmes.

A loira sentou-se ao lado da celta. Merida de repente a beliscou.

— Ai! – respondeu colocando a mão sobre o local beliscado.

Na mesma hora, Rapunzel se lembrou da aposta.

Depois de alguns segundos, a alemã voltou-se para Soluço e perguntou:

— Tem mais disso na cozinha?

— Tem sim, mas acho melhor você ir pegar logo porque os filmes estão prestes a começar.

— Droga! – praguejou Merida, e junto de Rapunzel, ambas foram pegar outras tigelas para fazer um jantar improvisado.

Rapidamente voltaram. Jack sabia que ia ficar apertado para todos ficarem sentados no móvel da sala, então cedeu seu lugar à uma das meninas e sentou no chão, depois Soluço decidiu fazer o mesmo.

E de repente ficaram assim, na sala escura, iluminados pela luz da televisão, as meninas sentadas no sofá, os meninos sentados no chão, todos sorridentes com uma tigela na mão, comendo enquanto o filme começava.

Enquanto o filme passava e algumas cenas menos empolgantes se seguiam, os quatro conversavam.

— Sabiam que o autor se inspirou quase totalmente na mitologia nórdica para criar esse universo? – disse Soluço, com o rosto alegre.

— Você é norueguês não é? – disse Merida – Para de se exibir!

— Eu adoro a mitologia nórdica – disse Rapunzel – Uma das minhas histórias favoritas é quando Loki engravida de um cavalo.

Jack riu.

— Concordo, essa é a melhor história de todas as mitologias.

— Aí, vocês estão falando da cultura do meu país!

Merida também riu.

— Não temos culpa, essa história foi feita pra ser engraçada! E tecnicamente ela não é exclusivamente do seu país, mas dos países que ficam no norte da Europa.

— Que seja... Mas lembrando, os anões, os elfos, até o anel, vem da mitologia nórdica e nada vai mudar isso.

— Tá, é um ponto para sua amada mitologia nórdica, mas o autor também se utilizou de outras coisas para escrever a história, como por exemplo o Cerco de Viena – disse Merida – O Império Otomano cercou a cidade de Viena, na Áustria, cortaram os suprimentos de comida e os cavaleiros dentro das muralhas estavam em menor número, cerca de dezesseis mil e tinha cento e cinquenta mil turcos atacando com força bruta do lado de fora, com o tempo os cavaleiros começaram a perder a força, mas apareceram os hussardos alados e salvaram Vienna! Que nem acontece no segundo filme – suspirou alto – Deve ter sido épico! Não tem nada melhor que a Idade Média!

— Nisso eu concordo com você – comentou Soluço – eu também conheço essa história.

— Eu também, e eu concordo – disse Jack.

— Eu também – disse Rapunzel – Ei, sabiam que o dessa obra foi amigo íntimo do autor de As Crônicas de Nárnia?

— Claro! Também gosto bastante – disse a ruiva – Mas As Crônicas de Nárnia usa mais a mitologia grega e tem muitas alegorias, mas ainda assim eu gosto muito.

— Eu também adoro – disse Soluço – Gosto muito dos cenários do primeiro filme, me lembra a Noruega no inverno.

— Eu gosto da rainha do gelo – comentou Jack.

Todos voltaram-se em silêncio para o mesmo quando falou.

— Por que será?! – questionou Merida.

Todos riram, e seguiram assim até o final dos filmes.

Assistindo à obra, compartilhando as emoções que a mesma lhes proporcionava e conversando sobre os filmes e os livros, rindo de vez em quando. Eventualmente fizeram pipoca, dividindo-a. Ficaram assim até o final dos filmes.

 

 

 

 


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado de mais um capítulo da minha obra. Muito obrigado aos que leram até aqui! Até a próxima. Muito obrigado!



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