Anos se passaram desde aquele fatídico dia. A pessoa que você amava e confiava foi embora deixando nada mais que remorso preso em seu espírito e feridas marcadas em sua pele.

Em seu cinto, a lembrança eterna daquele dia brilha num tom azulado frio, forçando-te a reviver as memórias e as palavras que lhe machucaram tanto sempre que seus olhos se caem sobre ela.

Mas... você sabe. Você buscou por isso. E mesmo assim, você ainda o ama.  

E apesar de tudo, você o mantém perto. A Visão que ele deixou para trás é a prova concreta de que ele ainda vive, e voltará. Você se agarra à essa esperança como se sua vida dependesse disso.

Num vermelho caloroso e aconchegante – completamente oposta à sua – ela brilha em cima da mesa de centro na sua sala tão bem decorada, mas cheia de vazios por todo canto. Assim como o seu coração frio.

Todos os dias você dedica alguns minutos observando-a, divagando sobre onde ele está, o que está fazendo e sua integridade e bem estar...

Os dias passam sem misericórdia, ignorando sua dor como se ela fosse pó ao vento. A vida rotineira dos Cavaleiros segue seu curso, o Ludi Harpastum e seus aniversários... todos, em algum momento, têm frações de tempo destinados a apenas você e a Visão em brasa. Para você, é como se ele estivesse ali, o calor que emana do objeto aos seus olhos azuis se assemelha aos sorrisos sinceros que brilhavam no rosto dele adornado pelos fios carmesins.

Algumas vezes as memórias são fáceis de se lidar, mas alguns dias a dor e a falta é tamanha que você sente seu rosto úmido e a visão turva antes de se pôr a dormir.

 Mais um dia acaba, cansativo e rotineiro. A sala de sua casa o recepciona com um frio vento que lhe sobe pelas pernas. Estranho.

Você caminha pelo tapete longo da entrada enquanto se livra das peças incômodas de sua vestimenta de trabalho. Apanha uma garrafa de vinho e uma taça em seu mini-bar. Você está pronto para degustar do melhor vinho da Cidade dos Ventos. Para os outros, não há motivos para comemoração. Para você, era o dia em que você fora acolhido naquela cidade.

Sentado no banco, seus olhos, acostumados ao ambiente lusco-fusco logo percebem o incomum.

Aquele brilho febril hoje está fraco, pela primeira vez depois de anos. Seu coração palpita forte avisando-lhe.

Com passos rápidos, você logo alcança a mesa de centro e toma a Visão em uma de suas mãos. A chama cálida é fraca, se extingue aos poucos como uma última brasa numa fogueira, dando seus últimos estalos.

O tempo congela para você. O chão sob seus pés desaparece e o frio que nunca o incomodou, adentra por sua pele, machucando lhe. Não fisicamente.

O carmesim que antes brilhava intenso, em labaredas opulentes enfim se extingue num último suspiro, deixando apenas uma cor morta em seu lugar.

O cinza fúnebre.

O barulho da taça se estilhaçando no chão ecoa no ambiente. Seus joelhos se chocam com o chão e você trás aquele objeto inanimado o contra seu peito. O grito mudo que escapa de seus lábios é ensurdecedor.

As lágrimas descem em cascata e depois de tantos anos, a última esperança de sua vida perde o brilho.

Ele...não vai mais voltar.