A Garota que Eu Conheci na Igreja escrita por Binishiusu Sensei


Capítulo 14
Teatro da Praça




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Era sexta-feira de manhã. A primeira semana no novo ritmo de estudos de Sara e Yumi tinha terminado. Sara tinha chegado na sala de aula junto com a professora, então só pode conversar com Yumi na hora do intervalo. Ficaram juntas no corredor onde era sua sala, não foram para a cantina. Sara se sentou, ao lado da porta da sala, apoiando as costas na parede, e Yumi se sentou ao seu lado. Sara se espreguiçou e declarou:

— Tô morta, acaba e destruída - disse com desânimo.

— Tadinha, a sua aula de ontem foi tão difícil assim? - disse Yumi de forma atenciosa, olhando para Sara, com a cabeça virada.

— Foi difícil, mas não é só por causa de ontem que eu estou cansada. Eu estou desenhando quatro horas por dia desde quinta-feira passada. Foram mais de trinta e seis horas desenhando, é quase uma jornada de trabalho semanal - respondeu Sara, olhando pro nada enquanto falava.

— Você ainda está com dor nos olhos? - perguntou Yumi, um tanto apreensiva.

— Não, minhas dores melhoraram ontem. Ainda bem... E você Yumi? Quando eu te vi hoje achei que você tava com uma carinha de cansada - disse Sara, virando a cabeça na direção de Yumi enquanto fazia um olhar atencioso.

— Ah, eu acho que também posso dizer que estou morta acabada e destruída - respondeu Yumi com um sorriso cansado sem mostrar os dentes.

— Entendi... Você ainda não me contou o que a sua professora disse quarta-feira, como foi sua aula?

— Então, eu consegui estudar tudo o que ela pediu. Quer dizer que ela vai me deixar continuar praticando com carga horária dobrada. Mas ela disse que eu posso desistir se quiser - respondeu Yumi, parecendo não se agradar com a possibilidade.

— Você também ficou quase quarenta horas estudando piano essa semana, né? - Perguntou Sara, ainda olhando para Yumi.

— Sim, somando os estudos que a professora me passou, com as músicas da igreja, a apresentação de sábado e o meu repertório pessoal... Deve ter dado quase isso. Mas eu não vou desistir - disse Yumi com ênfase na última frase.

— Eu sei que não. Já disse isso, você é muito determinada, mais do que eu.

— Não mais do que você Sara. Você também se esforça muito - disse Yumi com uma voz fofa.

Sara sorriu, segurou a mão de Yumi e deitou a cabeça no seu ombro.

— Minha vez de pedir para ficarmos assim por um tempinho - disse Sara, que parecia estar relaxada como se fosse dormir.

— Sara, estamos na escola, se alguém ver...

— Vão pensar que é por amizade. Vamos só aproveitar o momento. Ficamos a semana inteira sem poder ficar de namorinho - disse Sara, que estava de olhos fechados, sem aparentar que pretendia sair do lugar.

— Tá bom - respondeu Yumi, deitando a sua cabeça na de Sara.

Elas ficaram naquela posição, sem dizer nada, apenas descansando juntinhas. A sensação de Sara era de que o mundo tinha parado por um momento e que ela estava recarregando suas baterias. Quando o intervalo estava quase acabando, Sara declarou:

— Nós estamos sem tempo para nos encontrarmos durante a semana. Acho que é a hora de pedir autorização aos nossos pais para sairmos no domingo. Acho que eles não vão impedir um passeio de melhores amigas. Perguntamos hoje, aí sábado, na igreja, vemos se poderemos sair no domingo. O que acha, pode ser?

— Claro, achei ótimo. Nunca pedi para os pais me deixarem sair passear, mas eles provavelmente vão deixar - respondeu Yumi, animada.

Quando Sara voltou pra casa, pediu para passear com Yumi no domingo. Rodrigo não gostou da ideia de ter sua filha passeando com a filha de Yuji, que ele definia como um metido interesseiro. Mas Sara conseguiu ser convincente no pedido, então como ele não tinha paciência para argumentar com a própria filha, permitiu.

No sábado de manhã, ao se encontrarem na igreja, Yumi disse que seu pai também tinha permitido o passeio.

— Ele não queria deixar, mas minha mãe insistiu por mim. Disse que eu já tenho idade e responsabilidade o suficiente para poder ir onde eu quiser com você, que também é uma moça responsável. Se não fosse por ela meu pai não iria deixar... Ele é chato - disse Yumi, animada com a notícia.

— Seu pai é chato mesmo, mas sua mãe acabou de ganhar uma fã - disse Sara em tom de comemoração.

No outro dia, como era o combinado, Sara se encontrou com Yumi na frente da casa dela, às oito e meia da manhã. Não era a preferência de Sara sair de manhã, ela ainda estava sonolenta. Esse era um pedido de Yumi, que pretendia sair de casa num horário em que encontrassem menos pessoas na rua. Sara achou justo e acatou o pedido.

— Bom dia - disse Yumi com voz aguda e cantadinha.

— Bom dia, vamos? - respondeu Sara, achando o bom dia de Yumi fofo.

No momento em que elas se viram, Sara correu os olhos pelas roupas de Yumi. Ela estava usando um vestidinho azul e sapatilha. O vestidinho tinha flores com pétalas vermelhas e folhas brancas. Ela está linda - pensou Sara no momento em que a viu. Sara estava usando uma blusinha, com um shorts e uma sapatilha. Elas deram as mãos e saíram andando pela rua.

Depois de cruzarem a primeira esquina, Sara perguntou:

— Aqui perto tem a Praça da Bíblia e o Teatro da Praça. Quer ir aonde?

— Hum... A Praça da Bíblia é mais perto, mas ela não tem nenhum espaço fechado, entende? Prefiro o Teatro da Praça, lá vai ser mais reservado - respondeu Yumi, que parecia um pouco constrangida com o que estava dizendo.

— Tá bom, vamos pra lá - respondeu Sara, com uma voz otimista e sabendo o porquê da Yumi ter escolhido a opção com mais privacidade. - Ela fica fofa quando está com vergonha - pensou enquanto caminhavam.

As duas foram conversando ao longo do caminho. Estavam de mãos dadas e sem preocupações. Riam por qualquer motivo que fosse bobinho e estavam contentes. Demorou vários minutos para chegar ao ponto de destino, mas a caminhada não foi cansativa, o sol não estava ardido e tinha uma briza agradável refrescando o caminho.

Avistaram o Teatro da Praça. Ele era feito de madeira, era pintado de vermelho e tinha o telhado num formato triangular. O teatro em si estava fechado, mas não era um problema, elas estavam ali para ficar na praça. O teatro ficava na parte da frente da praça e ao seu lado tinha um estacionamento. Nos fundos tinha um pequeno bosque, um chafariz, um parquinho e um espaço circular de concreto com escadas, que parecia uma ágora grega.

— Chegamos - disse Sara de forma retórica. - Quer sentar no banquinho?

— Sim, vamos naquele - disse Yumi apontando para que ficava no começo do bosque.

Se sentaram juntas no banquinho. Yumi olhou em volta e disse:

— Ainda bem, não tem ninguém aqui. Não quero ver gente agora - disse aliviada, enquanto se ajeitava no banco, para colocar um dos braços ao redor de Sara.

— Como você é antissocial! - exclamou Sara, fazendo graça.

— Acho que você não tem crédito para me falar isso, Sara Oliveira - respondeu Yumi, enquanto acariciava uma mecha de cabelo de Sara, com a mão que estava livre do abraço.

— Hoje eu quero ficar só com você, sem outras pessoas atrapalhando - continuou Yumi, com um sorriso apaixonado de quem está num momento romântico.

— Também quero ficar só com você - respondeu Sara, antes de beijar Yumi.

Sara não sabia dizer há quanto tempo estavam ali, mas sabia que já tinha se passado bastante desde que tinham chegado. Ali era fresco e pouco iluminado por causa das árvores, perfeito para perder a noção do tempo durante uma boa conversa.

Depois daquele primeiro beijo elas apenas conversaram. De vez em quando passava uma ou duas pessoas na rua, então elas não queriam baixar a guarda. Mesmo assim, ficaram grudadas a maior parte do tempo. Yumi estava com a cabeça deitada no colo de Sara quando disse:

— Sabe aquele lugar perto do chamariz?

— Aquele com as escadas? - Respondeu Sara.

— Sim. Ele é circular e quase fechado... - Disse Yumi devagar.

— Já entendi, também pensei nisso - respondeu Sara, contendo um risinho.

Elas foram de mãos dadas até a "ágora" e, enquanto andavam, Sara ficou observando as expressões de Yumi. - Sempre quando estamos prestes a nos beijar a Yumi fica assim. Ela fica corada, fica ansiosa, a respiração dela muda e ela não olha para um ponto fixo, fica reparando em tudo em volta... É muito bonitinho - pensou Sara enquanto andavam.

Entraram juntas na "ágora" e sentaram onde pareciam melhor escondidas. Dessa vez, quem teve a iniciativa no beijo foi Yumi. Sara apenas se deixou conduzir, aproveitando todas as sensações. As duas se acariciavam, tocavam e ficavam mantendo os corpos em contato. Yumi parecia temer que Sara fugisse enquanto se beijavam, então sempre a mantinha muito próxima. Sara adorava esse jeito da Yumi, fazia com que ela se sentisse conectada com sua namorada.

Já fazia vários dias que elas não se beijavam. Sara estava sentindo uma sensação parecida com abstinência durante esses dias. Enquanto se beijavam, concluiu que fazia mal ficar muito dias sem contato físico com a pessoa que se gosta. - Está decidido, vou trazer a Yumi aqui do domingo, ficar longe dela me entristece - pensou.

O beijo continuou e Sara sentiu Yumi introduzindo a língua em sua boca. - Adoro quando ela me beija desse jeito - pensou, enquanto fazia o mesmo. - Ela beija tão bem quanto toca piano, e isso é muito coisa. Minhas técnicas de língua também são boas, mas perto da Yumi eu pareço uma amadora. Ela tem talento pra isso também. - Esse foi o último pensamento que Sara recordou, depois disso, só lembrava dos beijos, os amassos e a sensação perfeita de estar com a sua namorada.

***

Nas semanas que se passaram, a rotina de Sara e Yumi se manteve assim. Cada uma estudava quase quarenta horas semanais para cumprir seus objetivos artísticos. Somado a isso, tinham que ir para o colégio, e nenhuma delas faltava aula, e ainda precisavam de alguma forma fazer as tarefas para casa. Elas iam para o colégio de manhã, passavam a tarde estudando o piano e o desenho realista, para durante a noite fazer as tarefas do colégio. No sábado de manhã iam para a igreja, no domingo de manhã namoravam na praça.

Na terceira semana Sara começou a sentir o cansaço acumulado. Parecia que não se sentia mais revigorada descansando no final de semana. A partir desse ponto ela só se sentiu mais cansada, mas era capaz de suportar. A partir da sexta semana ela estava um caco, já que não estava mais conseguindo dormir apropriadamente. O bimestre estava chegando ao fim, então o número de atividades aumentou, por isso, ela precisou gastar mais horas da noite para estudar.

Geralmente tanto ela quanto Yumi estudavam as coisas da escola por cerca de duas horas por dia. Isso era o suficiente para realizar todas as tarefas. Entretanto, no final do bimestre o número de demandas escolares aumentava drasticamente. Ela precisava fazer todas as tarefas habituais e ainda entregar trabalhos complicados enquanto estudar para as provas.

Nas duas últimas semanas Sara e Yumi estavam estudando quase quatro horas durante a noite. Assim, a rotina delas era acordar e estudar até a hora de dormir. Foi então que Sara sentiu o maior cansaço acumulado de sua vida. Depois de estudar tantas horas, mesmo estando exausta, não era capaz de dormir. Depois de estudar tanto, para conseguir dormir precisava descansar a mente enquanto assistia anime ou lia um mangá. Com isso, Sara estava indo dormir de madrugada enquanto precisava acordar às seis da manhã.

Estava acabada. Quando começou essa rotina sabia que seria difícil, mas só agora realmente entendia o grau de dificuldade. Ela se sentia horrível, mas continuou estudando. Nesse momento, percebeu o quanto era dependente de Yumi. - Passamos só algumas horas juntas durante o domingo, mas se não fosse por isso eu já teria perdido a cabeça. Só estou conseguindo fazer isso tudo porque eu sei que vai chegar o momento de ficarmos juntas, quando eu poderei compartilhar os momentos que passei durante a semana. Não conseguiria se a Yumi não estivesse me apoiando e cuidando de mim. - pensou, antes de cair no sono, no domingo à noite da oitava semana.

Segunda-feira de manhã, quando foi para o colégio, era o primeiro dia da semana de provas. Agora, no ápice do cansaço, Sara teria que ter o melhor desempenho acadêmico possível. Quando entrou na sala, estava cambaleante e lenta. Tinha dificuldade para se concentrar e estava com dor nos olhos. Não olhou para o rosto de mais ninguém e foi direto ver Yumi.

— Bom dia - disse Sara sonolenta.

— Bom dia - respondeu Yumi devagar, aparentando estar mais cansada do que Sara.

— Boa prova, sei que você vai conseguir ser a melhor aluna de novo, você sempre consegue - respondeu Sara, tentando levantar os ânimos.

Yumi se preparou para falar, mas parou antes de começar. Aparentemente precisou se esforçar para responder.

— Obrigada Sara, boa prova para você também - respondeu Yumi de forma arrastada.

Logo depois disso, o professor de matemática entrou na sala e iniciou os preparativos para a avaliação. - Ok, é só eu me concentrar o máximo possível e fazer o meu melhor. Vai dar tudo certo - disse Sara para si mesma em pensamento. Ela fez a prova, parecia ser a prova de matemática mais difícil da sua vida, era sobre trigonometria. - Uma a menos, agora só faltam treze disciplinas, contando com Ensino Religioso.

Sara fez as provas seguintes com o mesmo nível de dificuldade, mas estava se esforçando ao máximo. Mesmo tendo que revisar os conteúdos para as provas, ela não deixou de praticar desenho realista naquela semana. Foi assim na segunda e na terça-feira. Quarta-feira ela estava ainda mais cansada, se é que isso era possível. - Vai dar certo, vai acabar e eu vou poder ficar com a Yumi domingo. Vou conseguir. - Ficou pensando nisso durante as duas provas que fez naquele dia, antes do intervalo.

Quando começou o intervalo, por costume, ela e a Yumi foram se sentar no corredor, ao lado da porta. Yumi se sentou primeiro, sem dizer nada. Estava de olhos fechados e com a cabeça encostada na parede. Sara se sentou depois e olhou para Yumi. Ela parecia estar fraca, estava mais pálida do que o normal, suas olheiras estavam bem marcadas e a sua expressão facial era a de alguém que estava sentindo dor.

Sara sentiu angústia crescendo dentro de si e perguntou preocupada:

— Yumi, você está bem?


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