Now I See The Light escrita por shewasevans


Capítulo 1
Capítulo Único: And it's like the fog has lifted.


Notas iniciais do capítulo

Crepúsculo não me pertence e essa história faz parte do Projeto One-shot Oculta 2021.

Agradecimentos especiais à Natasha que me ajudou com o plot e à Luane que se ofereceu bravamente para ler a minha primeira tentativa de Beward, na vida.

Essa história é inteiramente dedicada para a minha amiga oculta, Mari Pattinson.



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“Essas alegrias violentas têm fins violentos

Falecendo no triunfo, como fogo e pólvora

Que num beijo se consomem”

 

Após destacar as palavras que haviam atravessado gerações, Isabella Swan fechou o livro Romeu e Julieta e o depositou com cuidado na escrivaninha, ao lado de uma caneca de café pela metade e já frio. Retirou os óculos de armação quadrada – que utilizava somente para leitura – e deixou um suspiro audível lhe escapar por entre seus lábios. Era quinta-feira à noite em Forks e lá estava ela: preparando as aulas que deveria ministrar na próxima semana, uma calça de moletom à tiracolo e uma pilha de trabalhos parcialmente corrigidos junto do notebook.

A glamurosa vida de uma professora de ensino médio.

O ponto alto da sua semana fora a troca do seu rodinho de pia.

E isso sem levar em conta o cup noodles esfriando no balcão da cozinha, o vinho em caixa que ela comprara na promoção no mercado ou, ainda, a completa falta de perspectiva na sua vida amorosa.

Era quase irônico que – como docente de Literatura – Bella tenha passado boa parte da vida estudando escritores e escolas literárias que tanto tinham a dizer sobre o amor. Pessoas que dedicaram o seu precioso tempo em vida a colocá-lo em palavras. Personagens que travaram guerras e tiveram fins trágicos em nome de tal sentimento. Artistas que quase perderam a cabeça buscando retratá-lo… E, em contrapartida, havia Bella: transmitindo-o aos alunos do ensino médio da Forks High School, consumindo toda sorte de conteúdo romântico, mas podendo contar nos dedos as vezes em que sentira seu batimento cardíaco realmente acelerar ou, ainda, que a adrenalina percorrera a sua corrente sanguínea.

Por um passeio de montanha-russa? Talvez. Mas em nome do amor? Bem...

Não que ela não fosse uma fã assídua do romance. Pelo contrário, era admirável o número de comédias românticas que assistira desde os seus próprios anos de ensino médio. Além do que, as estantes abarrotadas de livros, e que tomavam cada canto do seu pequeno apartamento, quase não exibiam outro gênero. No entanto, Bella se sentia mais confortável daquela forma: vivendo-o através de histórias. Blindando-se da vida real, apreensiva demais para arriscar o próprio coração aos caprichos do incerto. O que, em nada, a assemelhava com Edward Cullen, seu melhor amigo desde a infância e romântico incorrigível.

Edward era o ápice do clichê amoroso: grandes gestos românticos, paixões avassaladoras e, na maioria esmagadora das vezes, fins tão repentinos quanto começos. Afinal, apesar da sua exagerada boa vontade, ele simplesmente parecia não ter sorte alguma em seus relacionamentos. E, ainda assim, tornava a mergulhar de cabeça a cada novo encontro, transitando entre corações partidos e desilusões. Fora assim na adolescência e continuava agora na vida adulta, sempre com Bella ao seu lado para aparar suas quedas com episódios de sitcons e garrafas de tequila.

Era para isso que serviam os amigos, certo?

Ding-dong. Ding-dong.

Ding-dong.

O som estridente de sua campainha a despertou violentamente de seus devaneios românticos e, tornando a empoleirar os óculos sobre o nariz, Bella se inclinou em direção à janela a fim de espiar a rua em frente ao seu prédio. Para a sua surpresa, um familiar volvo prateado se encontrava estacionado próximo à sua velha picape cor-de-tijolo.

O que Edward poderia querer àquela hora?

Puxando pela memória, lembrava-se de que o amigo havia dito que naquela noite se encontraria com a noiva, Tanya Denali. Afinal, de acordo com o que algumas curtas mensagens de texto informaram à Bella, ambos iriam começar a planejar o casamento – após um curto e duvidoso período de noivado – a partir da lista de convidados.

Toc-toc. Toc-toc.

Toc-toc.

Aparentemente, Rosalie Hale, uma de suas melhores amigas e vizinha estonteante do outro lado do corredor, admitira a entrada de Edward no prédio e ele já se encontrava à porta. Mais tarde, precisaria ter uma séria conversa com os amigos sobre limites. Agora, no entanto, estava demasiado curiosa e ligeiramente preocupada.

— Edward, o que… — começou, mas foi abruptamente interrompida com a visão que teve do amigo ao destrancar a porta. Completamente arrasado.

— Acabou — a voz rouca dele parecia realizar um certo esforço para ser ouvida, à medida que os seus olhos, que eram de um bonito tom verde quase dourado, aparentavam estar avermelhados e com o brilho completamente estilhaçado. — A Tanya terminou o noivado — anunciou, abrindo o punho e exibindo um elegante anel entremeado com uma safira em sua palma. O mesmo que ambos passaram cerca de uma semana procurando e que Edward jurara ser para a escolhida.

Oh, céus. Bella já vira aquele filme antes.

 

(...)

 

Apesar de ser incrivelmente cedo e de mal ter dormido na noite anterior, Edward Cullen percorria apressadamente as ruas que ligavam Forks e Seattle a caminho da casa dos pais. O coração recém-partido pedia, como sempre o fazia, que procurasse pela mãe e, devido aos horários incomuns do Dr. Cullen, ele sabia que Esme estaria acordada para recebê-lo.

Então, conforme o previsto, ele foi envolvido no abraço afetuoso da matriarca no instante em que colocou os pés para fora de seu carro. Alice havia espalhado a notícia, concluiu, examinando os traços delicados de Esme envoltos em profunda tristeza. Em seu íntimo, sabia que ela estava triste com o sofrimento do filho, mas que, ao mesmo tempo, respirava aliviada: Esme Cullen não aprovara, nem por um segundo, o seu noivado com Tanya Denali. Todavia, em momento algum, desrespeitara a decisão do filho.

— Edward, querido… eu sinto tanto — ouviu o lamento e, por ele, sabia que ela realmente sentia. Era incrível o quanto ela carregava em seu coração por aqueles que amava e o quanto se ressentia quando esses se abatiam.

Sentindo-se instantaneamente anestesiado pelo carinho contido no tom de voz dela, o filho do meio se deixou guiar para dentro da casa revestida por enormes janelões de vidro – um dos projetos de maior orgulho da mãe – e, sem surpresa, foi recebido pela enorme mesa da sala arrumada para o café-da-manhã. Havia pratos para os três filhos, além de Bella, Rose e Jasper, pois Esme sempre esperava que um – ou mais de um – deles fosse aparecer.

Edward e Emmett, contudo, jamais iriam aparecer ao mesmo tempo. Até porque, ambos gerenciavam juntos um café-bar próximo ao apartamento deles em Seattle, o The Midnight Café. E o local era, também, uma loja de instrumentos musicais. Portanto, revezavam a responsabilidade de abrir o estabelecimento durante os dias da semana, fazendo-o juntos aos sábados. Como aquele era o dia do irmão, o mais novo poderia se dar ao luxo de iniciar a manhã com uma visita aos pais.

— Eu queria falar que não sei o que aconteceu, mas… dessa vez, sei exatamente o que houve — confessou para ela, ocupando o seu lugar à mesa, enquanto o pai ainda não se juntava a eles.

— Quer falar a respeito, querido? — ela perguntou e Edward poderia dar um beijo em sua testa pelo seu cuidado.

— Bem… eu cheguei ao restaurante e Tanya, como sempre, estava atrasada — iniciou, despejando um pouco de café quente em sua xícara enquanto a mãe enchia o seu prato com uma quantia de comida que, certamente, ele não conseguiria consumir nem metade. — Achei que ela iria me dar o bolo mesmo porque a gente já tinha discutido na semana passada, mas, quando eu olhei, lá estava ela… desfilando pelo restaurante com a lista de convidados na mão e, adivinhe: Bella não estava nela — contou e, ainda agora, a indignação borbulhava na boca do seu estômago.

— Como?! — Esme questionou boquiaberta.

— Ela não queria a Bella no casamento, mãe. Aliás, não queria a Bella na minha vida — ele explicou, revirando os olhos muito verdes como se aquela simples cogitação fosse absurdamente ridícula. E, de fato, era. — Disse que jamais poderia confiar completamente em mim com uma amizade tão íntima com outra mulher e mais um monte de besteiras sobre como nós parecemos um casal de namorados. Então, eu me irritei, nós discutimos no restaurante mesmo e ela me pediu para escolher: ou ela ou a Bella… e, bom, eu estou aqui te contando essa história, não estou? — concluiu, dando de ombros, embora estivesse visivelmente incomodado em recapitular a cena com a ex-noiva.

— Mas que mulherzinha… — Esme começou, mas ele sabia que era contra a natureza dela despejar o menor dos insultos que fosse. — Como se fôssemos excluir Bella das nossas vidas! Eu conheço aquela garota desde que ela perambulava o meu jardim com os cabelos presos em tranças, Edward! Bella é da família! Algo que aquela mulherzinha jamais será! — pontuou, expressando a mesma indignação do filho na noite anterior.

— Eu sei, mãe — Edward a tranquilizou, apanhando a mão dela sobre a mesa e fazendo um carinho breve em seu torso com o polegar.

— Querido… desculpe a curiosidade, mas você já contou isso para a Bella?

— Eu fui na casa dela ontem, mas…

— Ontem? Edward! Você foi incomodar a pobre garota? Ela acorda muito cedo para trabalhar, sabia? — e agora a mãe se encontrava completamente indignada.

Então, pela primeira vez naquela manhã, Edward riu.

— Às vezes, sinto que você gosta mais dela do que de mim, sabia? — retrucou, apanhando uma das fatias de pão dispostas na cesta à sua frente. — Mas eu só dei uma passada lá, mãe… e não consegui contar esse detalhe para ela — admitiu, ligeiramente embaraçado.

— Acho que faria bem se vocês conversassem sobre isso… — a matriarca começou a aconselhar, mas foi interrompida pela chegada de Carlisle de mais um plantão no hospital e com o seu jaleco de um branco impecável à tiracolo.

— Bom dia, querida — ele desejou, aproximando-se da cadeira dela e lhe depositando um beijo terno no topo de sua cabeça. — Bom dia, filho — dirigiu-se a Edward, sentando-se em seu lugar ao lado de Esme e tomando uma das mãos dela entre as dele, um gesto de carinho incrivelmente íntimo que o mais novo não pode deixar de notar.

Tudo o que Edward sempre quisera e que, agora, encontrava-se ainda mais distante de sua realidade.

— Sinceramente, como vocês conseguiram isso? — reclamou subitamente, gesticulando para os pais e provocando certa confusão ao recém-chegado ainda alheio às novidades. — Com todo o respeito, o amor tão profundo de vocês chega a ser irritante.

— Ora, Edward, eu casei com a minha melhor amiga — o Dr. Cullen declarou simplesmente, depositando um beijo casto na mão de Esme e passando a se servir como se tal frase não fosse causar impacto nenhum ao filho.

Se ao menos ele soubesse de toda a história…

 

[INÍCIO DO FLASHBACK]

As férias haviam, enfim, começado e, com elas, Rosalie Hale iniciara a sua anual maratona de festas. A família da loira era ridiculamente abastada e isso, somado à disposição de seus pais para investir o patrimônio em viagens, a fazia passar boa parte do verão com a enorme casa vazia. Logo, não era raro que os irmãos Cullen, junto de Isabella Swan e Jasper Whitlock, passassem todo o recesso perambulando por lá.

E, fora em alguma daquelas sociais de Rose, que aconteceu: Edward se declarara para a melhor amiga.

Já era tarde – ou incrivelmente cedo, dependia da perspectiva – e os dois haviam escapado pela janela do quarto da amiga – o mesmo local pelo qual Emmett havia escapulido o verão inteiro, graças aos vizinhos curiosos –, sentado lado-a-lado no telhado  e, agora, aguardavam o nascer do Sol.

Fora ideia de Bella, é claro. Mas ele jamais a deixaria subir aquela altura sozinha, o ímã natural dela para desastres era intenso demais para o seu próprio bem.

Porém, Edward tinha de admitir que daria a sua guitarra preferida, em um piscar de olhos, em troca de um único momento ao lado dela. Conhecia aquela garota como a palma de sua mão, passara a vida inteira a memorizando e, ainda assim, sentia que sempre encontraria novos encantos para admirar nela.

Bella era única e, a cada segundo ao seu lado, sentia-se rejuvenescido. Como se jamais deixasse de ser o garoto que crescera na casa ao lado da dela. Ajudando-a com o medo do escuro e mantendo a luz do próprio abajur acesa, uma vez que as janelas dos dois quartos se localizavam uma de frente para a outra. Deixando-se ser auxiliado com as lições de gramática e literatura, pois ela sempre fora melhor naquilo do que ele. E passando todos os verões ao seu lado, já que os outros pareciam alheios demais em seus próprios mundinhos.

Aquele ano não havia sido diferente: Edward passara o verão ao lado dela, assim como nas demais estações. E, naquele momento com os braços ao redor dela, havia se sentindo irremediavelmente apaixonado por Isabella Swan, a garota dos joelhos constantemente ralados e com um cheiro inconfundível de morango nos cabelos.

E, naquele instante, perguntava-se: como ela se sentiria se ele dissesse que a amava?

O Cullen não soube ao certo o que o fizera tomar o impulso – um bom palpite seriam as garrafas de vinho que ambos haviam consumido mais cedo –, mas, de repente, foi o que fez: aproximara a boca da orelha de Bella e se declarara.

— Eu acho que estou apaixonado.

— Acha? — um riso suave escapara por entre os lábios em formato de coração que tanto adorava.

— Eu diria que tenho certeza — ele havia falado, a expectativa crescente como um balão prestes a explodir em seu peito.

— Bom para você, eu acho.

E Edward quis gritar aos quatro ventos, tamanha era a sua frustração.

— Bella — ele chamara, pousando uma das mãos sobre o queixo dela e, delicadamente, fazendo-a voltar o olhar novamente para ele. — Eu estou apaixonado por você.

Mas a recepção, novamente, havia sido diferente do que antecipara.

— Você é apaixonado por se apaixonar — declarara, um sorriso quase triste lhe enfeitando a expressão muito intensa.

— Mas eu amo você, Bella — insistira, as feições em uma mescla de confusão e algo que beirava ao desespero.

Por que ela não entendia?

— Hoje, Edward — e o olhar marrom-chocolate dela parecia até mesmo magoado.

— Eu sempre amei você — ele teimara, tomando-lhe o rosto a fim de que ela examinasse o próprio a fim de encontrar ali a afeição contida em cada mísero detalhe do seu semblante.

E tudo o que queria era saber se ela se sentia da mesma forma.

Mas, ao invés de uma resposta, Bella simplesmente havia aproximado a sua boca da dele e unira ambas em um beijo pungente, o gosto doce do vinho ainda presente em seus lábios. De início, fora um toque calmo, quase tímido. Porém, aos poucos, uma fúria desenfreada parecera a consumir por completo e a língua passara a travar uma verdadeira batalha com a sua. E, ainda que sem a compreender totalmente, Edward apenas retribuíra, envolvendo-a pela cintura e agradecendo aos céus por estar beijando Isabella Swan.

[FIM DO FLASHBACK]

 

O final da lembrança, contudo, já lhe trazia um gosto amargo à boca, pois, no dia seguinte, Bella alegara a maior ressaca da história e jurava não se recordar nada da noite anterior. Resignado, Edward encerrara os seus sentimentos em uma caixa e a escondera muito bem nas profundezas do próprio coração. Durante anos, então, recusou-se a se aproximar do que julgou ser uma armadilha para aquela amizade. Agora, no entanto, tais sentimentos ameaçavam vir à tona como uma explosão de confete, bem na sua cara.

E, infelizmente, ele não sabia se o laço que tinha com Bella era forte o suficiente para suportar aquilo por uma vez mais. Ou mesmo se ele próprio era resiliente o bastante para enfrentar tamanho amor novamente.

 

(...)

 

— Animada para a Feira da Renascença, senhorita Swan? — a voz de Jasper Whitlock a chamou do outro lado do estacionamento da Forks High School enquanto Bella tentava convencer a sua adorada picape alaranjada a trancar as portas.

Após a visita noturna de Edward, a professora demorara tanto tempo para dormir que, agora, apenas se recordava ser sexta-feira ao avistar o loiro caminhando em sua direção. Jasper também era outro dos seus amigos de infância e a formação em psicologia o fazia visitar a escola, em que ela lecionava, duas vezes por semana a fim de oferecer apoio aos alunos. Nos outros dias da semana, ele se ocupava com os próprios pacientes em seu consultório em Seattle.

— Bom dia… Você me parece chateada — ele saudou, aproximando-se com dois copos de café e lhe oferecendo um. — Algum outro motivo além dessa sua picape velha que me parece se recusar a fechar? — questionou, lançando um olhar crítico para a enormidade cor-de-tijolo e aparentando, mais do que nunca, ser o inimigo público nº 3 do seu amado carro (uma vez que os primeiros sempre seriam Edward e Rose).

— Edward passou lá em casa ontem à noite… — ela começou, capturando a completa atenção dele e sentindo como se pisasse em ovos. Era praticamente impossível guardar qualquer coisa de Jasper. Afinal, ele aparentava “captar as coisas no ar”, o que era particularmente cansativo na opinião dela, mas fazia dele um ótimo psicólogo. — Jazz… A Tanya terminou o noivado e…

— Alice me contou — o loiro interrompeu o seu embaraço, provocando-lhe um revirar de olhos. É claro que a irmã mais nova de Edward já sabia tudo sobre o rompimento e, obviamente, compartilhara com o marido – como as duas perfeitas senhoras fofoqueiras que eram. — Mas, com todo o respeito… Eu acho que foi para melhor. Sempre achei que Edward estava correndo contra o relógio com esse relacionamento — a voz dele era séria, fazendo-o soar como um irritante sabe-tudo.

— Como se Rosalie e Emmett estivessem muito tranquilos em relação ao deles… — ela contra-argumentou, sentindo uma estúpida necessidade de defender o melhor amigo ainda que a sua opinião fosse semelhante à de Jasper.

— Bella… Rosalie e Emmett se conhecem desde a infância e sempre foram apaixonados um pelo outro. Agora que, finalmente, resolveram sossegar… será um alívio para todos dos dramas diários deles, não? — ele declarou e, mentalmente, ela lhe deu toda a razão do mundo.

Esme que o diga.

— Tudo bem, tudo bem… Eu desisto aqui — ela apontou para a picape, porém poderia muito bem estar se referindo também àquele início de discussão, e passou a andar em direção à sala dos professores.

Até porque, Jasper era, além de tudo, uma das metades do que Edward chamava de “casal perfeito nº 2”, formado por ele e Alice Cullen, também uma das melhores amigas de Bella. Assim, ao todo, os dois haviam classificado secretamente três casais como perfeitos: o primeiro deles era constituído por Carlisle e Esme Cullen, os progenitores da família Cullen; o segundo pelos recém-casados Jasper e Alice; e o terceiro pelos noivos Emmett Cullen e Rosalie Hale, o irmão mais velho de Edward e a outra melhor amiga de Bella. Todos perdidamente apaixonados e saídos de contos de fadas infantis. E, por essa razão, era praticamente impossível ter um mísero debate amoroso com qualquer parte dos casais supracitados, pois era isso o que eles eram: praticamente perfeitos – ao melhor estilo Mary Poppins –, uma vez que a vida perfeitamente os ajustara à perfeição.

Carlisle e Esme Cullen haviam se conhecido após a faculdade quando ele, um residente iniciante de Cirurgia Geral, atendera a recém-formada em Arquitetura em um dos seus plantões no pronto-socorro. Esme, de pronto, apaixonara-se pela essência altruísta, cuidadosa e gentil de Carlisle. E ele, embora surpreso de início, deixou-se dominar pelos sentimentos por aquela que, de súbito, tornara-se a sua melhor amiga. O amor e a cumplicidade entre ambos eram tamanhos que, agora, pareciam aumentar exponencialmente com a passagem do tempo - algo que não ocorrera com Charlie Swan e Renée Dwyer, os pais divorciados de Bella.

Havia, também, o típico clichê de amor à primeira vista: Rosalie e Emmett. A loira se mudara para Forks quando todos ainda cursavam o ensino médio e o irmão de Edward não tivera escolha se não cair completamente de amores – tanto por sua beleza estonteante de capa de revista quanto por seu coração de rainha do gelo que, no fundo, era dourado tal qual os seus cabelos. Emmett amava Rosalie além de sua aparência e a vida a ensinara a valorizar tal sentimento. Além disso, sentia-se atraída pela honestidade dele e, de acordo com ela mesma, pureza de espírito. Então, após anos de um jogo de gato e rato no qual o ciúme e a paixão imperavam, os dois, finalmente, estavam noivos e com a data do casamento marcada para maio do próximo ano.

Por fim, o caso mais intenso e peculiar de todos: Jasper Whitlock e Alice Cullen. Se Edward convencera Bella a acreditar em almas-gêmeas, fora única e exclusivamente de suas observações do relacionamento da irmã e do melhor amigo. Os dois se conheciam, praticamente, pela vida toda e possuíam uma conexão rara, como se um fio invisível e inquebrável ligasse ambos. Por vezes, perdiam-se em seu próprio mundo e pareciam não precisar nada além do olhar para se comunicar – quase como se pudessem ler mentes apenas entre eles. Alice conferia leveza a Jasper e acreditava no potencial dele com todas as suas forças, Jasper compreendia a mente singular de Alice e parecia ser capaz de dar sua vida pela dela em um piscar de olhos.

O destino unira os três casais certeira e permanentemente e, tirando as birras ocasionais de Emmett e Rosalie até que eles se acertassem de vez, tudo parecera incrivelmente fácil. Quase natural. O que, na opinião de Edward e Bella, era uma grande injustiça da vida. Ele, em sua eterna busca desenfreada pela “escolhida”. Ela, em sua convicta solidão permeada pelo medo. Logo, era praticamente impossível tentar argumentar ou ser compreendido em meio a tantos “casais que deram certo”. Portanto, a professora de Literatura tratou de abandonar rapidamente a discussão com Jasper.

— Ao menos, ela cancelou o casamento antes que tudo estivesse planejado… Imagine quantos depósitos eles poderão reembolsar! — ela procurou mudar o rumo da conversa, buscando enxergar a situação como “um copo meio cheio”.

— Já notou como Edward sempre corre para você depois de terminar um relacionamento? Como você se sente sobre isso? — Jazz soltou subitamente em um tom de voz que beirava ao analítico, tocando diretamente na ferida recém-aberta responsável por lhe roubar o sono naquela madrugada.

Claro. Era mais do que óbvio que Bella notara. Porém, ouvir aquilo em voz alta e de outra pessoa… não era exatamente agradável. E como ela se sentia com aquilo? Céus, ela sentia uma súbita vontade de socar o rosto preocupado do amigo para que ele guardasse para si as perguntas difíceis.

— Jasper, eu não tenho tempo para a sua psicologia de boteco hoje — ela reclamou, sorrindo amarelo para um aluno ou outro que lhe cumprimentava enquanto seguia a passos duros pelo corredor até a sala dos professores. — Podemos falar sobre outra coisa?

— Prefere me contar sobre os preparativos da feira renascentista? — ele cedeu, como ela sabia que cederia – pois não era do seu feitio aborrecer alguém propositalmente. O loiro apenas era sensitivo demais para o seu próprio bem.

E, de bom grado, ela sorveu o ar aliviada ao aceitar rapidamente a mudança de assunto. Nesse ponto, ele era mais fácil de contornar do que Alice, mas Bella não abusaria da própria sorte.

— Já acertei com Alice a confecção dos figurinos para os alunos que irão participar das peças... O Jake convenceu os outros quileutes a ajudarem na montagem do cenário e das barraquinhas de comida... E eu acho que o diretor até conseguiu os botes de madeira para usarmos no lago — ela contou animada, enumerando nos dedos os últimos preparativos dos quais cuidara.

Até porque, no primeiro domingo da primavera, a Forks High School iria realizar a sua primeira Feira do Renascimento e contava com a professora Isabella Swan como uma das suas principais idealizadoras e organizadoras. Os professores de todos os departamentos iriam participar, oferecendo atividades, adereços, bebidas, jogos e quitutes a fim de transportar a todos que participassem do festival para o período renascentista – e o dinheiro arrecadado com os ingressos seria revertido para a reforma da biblioteca da escola. Como uma das maiores interessadas, Bella se propôs a organizar a apresentação de duas peças do bardo inglês que trabalhara com os alunos em suas aulas: Romeu e Julieta e Sonho de uma Noite de Verão. Para a sua eterna gratidão, Alice e Rosalie – cofundadoras da marca La Belle de Jour com ateliê em Seattle – se ofereceram para doar os figurinos, Edward e Emmett haviam conseguido uma banda que aceitou realizar um show beneficente – com músicas, em sua maioria, próprias do período – e Jacob Black, outro de seus amigos de infância, concordara em confeccionar os cenários dos espetáculos e da ambientação em si.

Como Bella poderia começar a agradecer os seus amigos? Antes que o fizesse, ainda havia um a ser convencido.

— E isso é tudo? — Jasper perguntou quando chegaram à sala dos professores, quase como se conseguisse escutar os seus pensamentos.

— Bem... Falta uma última coisa... — ela começou, já se odiando internamente por ter que lhe pedir um favor. Infelizmente, era orgulhosa demais para aceitar ou solicitar ajuda mesmo quando precisava.

— E o que seria? — o loiro parecia curioso, mas ela poderia jurar que Alice já o havia adiantado parte do pedido.

— Você poderia interpretar Isaac Newton para a demonstração do professor de Física?

E, para a sua surpresa, Jasper riu.

 

(...)

 

'Que tristeza prolonga as horas de Romeu?'

'Não ter isso, o que, tendo, os torna curtos.'

'Apaixonado?'

— Fora ...

— Do amor?

'Fora de seu favor, onde estou apaixonado.'

 

Na primeira aula de Literatura do dia, a professora Swan leu calmamente um dos trechos de Romeu e Julieta, que sublinhara na noite anterior, para a turma que a observava em silêncio. Empurrando os óculos que haviam deslizado até a ponta de seu nariz, ela pausou a leitura a fim de recobrar o fôlego. Tomara o cuidado de não parecer demasiado monótona – a fim de não entediar os discentes – e nem emocionada demais – do contrário, assustaria fácil os jovens corações que, embora não a compreendessem, experimentavam à flor da pele a dramaticidade shakespeariana em seu dia-a-dia.

— Alguma pergunta? — questionou, fechando brevemente o exemplar surrado e se deixando observar cuidadosamente as diversas expressões nos rostos que a encaravam de volta.

— Senhorita Swan? — Serena Stanley, uma de suas mais participativas alunas, chamou ao levantar o braço repleto de braceletes da amizade para o ar.

Bella adorava aquela garota! Nunca a deixava falando às paredes durante as aulas.

— Sim? — ela cedeu, sorrindo em incentivo à aluna.

— Você já se apaixonou? — a pergunta a pegou completamente desprevenida, deixando-a ligeiramente boquiaberta ao passo que a adolescente exibia um brilhante sorriso especulativo.

Correção: Bella odiava aquela garota! Por que não conseguia controlar a maldita língua dentro da boca?

— Se eu já me apaixonei? — repetiu a questão, sorvendo alguns goles de água da garrafa que mantinha sobre a mesa enquanto procurava ganhar tempo a fim de elaborar a sua resposta.

 

[INÍCIO DO FLASHBACK]

— Nós estamos apaixonados? — uma Bella destemidamente bêbada questionava risonha, girando nos braços do melhor amigo ao som de sua música preferida.

A cena deveria ter se passado em uma noite absurdamente quente de verão, a sua memória lhe dizia. A pouca sanidade que restara a todos havia sido levada pela piscina dos Cullen somada às garrafas de bebida alcoólica que agora jaziam vazias espalhadas pelo gramado recém-aparado por Emmett. Eram apenas os seis. Esme e Carlisle haviam viajado a fim de comemorar o aniversário de casamento e os demais adultos os julgavam responsáveis o suficiente para celebrar o verão com um churrasco noturno. Bella não se lembrava muito mais depois disso. Apenas da voz rouca de Edward, de pés descalços na grama e de trechos soltos de uma conversa aos sussurros.

— Apaixonados? — o olhar quase dourado dele era um misto de alegria e confusão enquanto tornavam a rodopiar, o tecido leve do vestido azul-marinho dela esvoaçando ao redor dos seus calcanhares.

— Pela vida, Edward — ela respondeu, incerta se era aquela a razão da felicidade que estourava em seu peito feito as bolhas da garrafa de espumante que entornara mais cedo com Alice e Rose. — Pelas férias de verão e por aquela garrafa de tequila na mão do Emmett.

— Então, nós estamos apaixonados, Bella — garantiu ao seu ouvido, a voz rouca dele lhe provocando calafrios em sua espinha à medida que a dança parecia fazer com que ambos compartilhassem de uma corrente elétrica única.

— Nós estamos apaixonados, então — ela repetira com certeza daquela vez, uma gargalhada lhe escapando por entre os lábios e se desfazendo no vento feito a melodia dos sinos que a mãe dela insistia em dependurar na varanda.

— E você sabe que os corações não se partem por aqui — ele havia contado a ela, as mãos acariciando os fios cor-de-chocolate ao ajeitar delicadamente as margaridas trançadas em coroa que lhe enfeitavam os cabelos.

— Eu devo estar uma bagunça — a Swan lamentara, parando abruptamente a dança a fim de ajeitar o que quer que julgara estar errado com a sua aparência naquele momento.

— Mas, querida Bella, você está perfeita — Edward confidenciara baixo com a certeza de que apenas ela o ouviria, os dedos se entrelaçando aos seus para a impedir de ajeitar o que quer que fosse em sua aparência.

As cores de uma centena de fogos de artifício pareceram explodir aos olhos de Bella, tamanha fora a sua alegria com aquele conjunto de palavras. Assim, quando a música voltara ao seu refrão, ela havia jogado os braços ao redor do pescoço dele e aproximara ambos os corpos em uma ansiedade febril. Nunca soube dizer qual fora a sua intenção inicial com aquele gesto. Mas, antes que pudesse se dar conta, a sua boca fora de encontro com a de Edward e, em questão de segundos, estavam se beijando como se a vida deles dependesse daquilo.

Os lábios dele eram gelados contra os seus e, apesar do gosto de uísque que permeava em sua língua, pareciam suaves. Quase gentis. Como se, apesar da iniciativa dela, ele temesse que ela se afastasse. Mas, à medida que se sentiam seguros, logo passaram a explorar a boca de Bella como se aquele fosse um desejo há muito reprimido que, enfim, era realizado. E ela se deixou ser beijada por Edward, retribuindo-lhe enquanto que ambos iniciavam uma nova dança muito mais interessante do que a anterior.

E nada nunca lhe parecera tão certo na vida. Afinal, eles estavam apaixonados, não estavam?

[FIM DO FLASHBACK]

 

— Senhorita Swan?

A voz da aluna a despertou de seus devaneios, fazendo com que as bochechas de Bella adquirissem uma forte coloração avermelhada devido à lembrança que resgatara de uma das gavetas mais profundas e bem trancadas de sua memória.

Aquele não era um caminho pelo qual deveria percorrer. Não agora. E, certamente, não mais tarde. Aquela era uma porta fechada e ponto final. Engolindo em seco, tratou de se livrar do embaraço aparente para que conseguisse retomar a aula.

— Se já fui apaixonada? Obviamente que sim — começou, apoiando-se na própria mesa e lançando à Serena o olhar de que não lhe daria a resposta que tanto desejava — Como amante da Literatura, eu me apaixono o tempo todo por personagens literários — declarou, por fim, em um tom que deixava claro que aquele tópico não estaria aberto à discussão.

— Sinceramente… — ouviu a jovem murmurar, visivelmente desapontada com a professora.

— Agora… alguma pergunta em relação à matéria? — Bella questionou com uma de suas sobrancelhas arqueada, recuperando o controle da situação e, propositalmente, deixando-se trancar todos aqueles sentimentos confusos novamente às sete chaves.

Assim, o restante do primeiro tempo transcorrera tranquilo, livre de interrupções que não envolvessem o terreno seguro da aula que preparara cuidadosamente.

E Bella quase ficara sem pensar em Edward.

Quase.

 

(...)

 

— Às vezes eu realmente não gosto dessa série — Edward declarou ao apertar o botão de pausar no controle remoto, levando a garrafa de cerveja aos lábios e tragando boa parte do seu conteúdo.

Era sexta-feira à noite e a chuva seguia ininterrupta sobre a cidade de Forks enquanto que Bella e o melhor amigo haviam se reunido no apartamento dela para uma de suas maratonas mensais de sitcons e comida mexicana. A série da vez era Friends e ambos já a haviam assistido tantas vezes que chegaram ao ponto de decorar as falas dos personagens. Contudo, naquela vez, o Cullen parecia especialmente incomodado com Chandler.

Apesar dos sentimentos que o término dele lhe despertara, aquele momento estava transcorrendo tranquilo e a Swan agora ria abertamente dele.

— Muito cedo para jogar sal na ferida? — ela brincou, apertando delicadamente o joelho dele e se referindo à cena que se encontrava congelada na tela de sua televisão.

“I’m hopeless, and awkward, and desperate for love” — ele citou em tom sarcástico. — Tenha um pouco de respeito próprio, amigo — concluiu, voltando a devorar parte dos nachos que trouxera do restaurante preferido da Swan em Seattle.

— Mas você é um grandessíssimo hipócrita, sabia? — ela retrucou, apanhando o copo sobre a mesinha de centro e bebericando o mojito que preparara para si.

— Por favor, Bella, eu não chego ao nível desse cara — defendeu-se, as sobrancelhas se franzindo em indignação.

— Tem razão, tem razão... — ela fingiu concordar, um sorriso divertido surgindo em seus lábios. — Você está mais para o Ted de How I Met Your Mother.

— Você é incrivelmente maldosa, senhorita Swan, e eu estou ofendido — Edward projetou o lábio inferior em uma chateação visivelmente fingida.

— Então, você concorda comigo? — ela insistiu.

— Depende... Você concorda que seria uma ótima Tracy? — ele arqueou uma das sobrancelhas, passando um dos braços ao redor dela e diminuindo a distância entre eles. Com a frase, Bella sentiu um calor repentino lhe queimar as bochechas.

Juntos, os dois já haviam maratonado a série ao menos três vezes e ambos concordavam em odiar o final. De modo que, a pergunta dele não era nada inocente, mas, sim, absurdamente sugestiva.

— Eu... — ela começou, mas foi subitamente interrompida por uma escuridão repentina.

Dez segundos depois, a televisão voltou a ligar, exibindo o menu inicial do Prime Video, mas, agora que prestara atenção, o aguaceiro engrossara lá fora e o brilho ameaçador de um raio foi percebido através das cortinas.

— Forks e seus encantos — Edward ironizou, erguendo-se do sofá e apanhando as garrafas de cerveja vazias que largara sobre o tapete felpudo da sala — Acho que vou andando, Sininho.

Na cabeça dele, o apelido era simplesmente genial, pois como muitos a chamavam pelo diminutivo “Bells”, qual apelido seria melhor do que Sininho? Além do que, a amiga não tinha em nada a personalidade parecida com a irritante fada companheira do Peter Pan e, por isso mesmo, detestava a alcunha com todas as suas forças – o que ele considerava um bônus.

— Andando? Ah, mas não vai mesmo — ela retrucou, também se colocando em pé e levando as mãos à própria cintura. — Você acha que Esme ficaria feliz comigo se soubesse que eu te deixei sair nessa tempestade? — gesticulou, ligeiramente furiosa, em direção à rua.

A despeito de sua irritação, o nervosismo era crescente em seu peito. Afinal, apesar de morar há anos em Forks, a cidade mais estupidamente chuvosa do maldito estado de Washington, Bella odiava o clima local constantemente gélido e chuvoso. Detestava a lama insistente nos pneus de sua picape e o fato de nenhum dos seus sapatos ser apropriado para a garoa contínua. Porém, acima de tudo, a filha única de Charlie Swan possuía um pavor absoluto do escuro. Desde pequena, sempre implorara ao pai para que pudesse deixar o abajur repleto de adesivos de estrelas aceso. Agora, em seu próprio apartamento, instalara luzes de led amarelas em toda a estante que ocupava uma parede inteira do seu quarto. Assim, além dos livros, as lâmpadas também a protegiam do mal que considerava terrível.

Mas Edward não sabia disso.

Aliás, nenhum dos amigos dela sabia que aquele era um temor que a acompanhara para a vida adulta.

— Falei figurativamente, minha cara professora de literatura — ele brincou, abraçando-a por trás a fim de desfazer a zanga de sua expressão corporal. — Se eu sair agora, chego em Seattle antes que o tempo piore.

E, como se para discordar dele, um trovão ressoou ameaçador – aparentando estar furioso com o desafio iminente.

As luzes piscaram mais uma vez e ela sentiu o seu estômago revirar.

Merda. Será que exagerara no mojito?

— Você não vai para lugar nenhum, Edward Cullen — falou irredutível, embora o pânico começasse a borbulhar em seu íntimo com a ideia de que o temporal cortasse a energia elétrica.

Antes que ele pudesse retrucar, mais trovões tornaram a esbravejar lá fora e o tamborilar da chuva contra as vidraças pareceu se tornar mais insistente, mais pesado, quase como se alguém atirasse pesadas bolas de neve contra a sua janela.

As luzes, por fim, apagaram-se de vez e o sangue de Bella pareceu congelar em suas veias.

— Deixe-me adivinhar... você não instalou as luminárias de emergência que eu te dei, Sininho? — a voz rouca de Edward soou muito próxima de sua orelha e, procurando não sucumbir ao medo, ela cobriu as mãos do amigo com as suas, esmagando-as instintivamente.

A noção do corpo maciço dele colado ao seu e do hálito quente esbarrando contra a sua nuca poderia ter feito com que Bella questionasse todos os sentimentos que, naquela semana em especial, estava lutando para enterrar. No entanto, o breu total tomava a sua atenção por completo, deixando-a mais apavorada do que qualquer outra coisa. Assim, fechou os olhos – já que a escuridão seria a mesma – procurou mentalizar todas as coisas boas em que era capaz de pensar: literatura, Edward, vídeos de gatinhos, tequila...

— Bella? — ele a chamou novamente e, agora, a sua preocupação era palpável diante do silêncio dela.

— E-eu… preciso de velas — ouviu-se balbuciando e ele não teria ouvido caso não estivesse tão próximo, tamanho era o barulho da chuva.

— Só me diga onde estão que eu pego para você — o amigo pediu, fazendo menção de se desvencilhar daquela espécie de abraço.

— Não! — a sua voz protestou ao passo que se agarrava ainda mais a ele.

— Sininho, qual é o problema?

Apenas o silêncio.

— Bella… — Edward chamou, girando-a pela cintura para que ficasse de frente para ele. As mãos dele subiram por seus braços, causando-lhe arrepios involuntários, até que chegassem ao seu rosto. Ali, as pontas dos dedos – calejadas da prática dos inúmeros instrumentos que ele tocava – acariciaram seus traços até que ele segurasse seu queixo suavemente. — Você ainda tem medo do escuro? — perguntou baixo, mas o tom não denotava diversão alguma, apenas sincera preocupação.

Bella não respondeu e ele apenas assentiu, guiando-a cuidadosamente pelo apartamento à procura de algo.

— Abra os olhos, Sininho.

E ela obedeceu, deparando-se com a lanterna do celular de Edward acesa, o que lhe causou certo alívio.

— Onde você guarda as velas? — perguntou novamente e, daquela vez, ela sentiu que se encolhia de vergonha.

— No meu quarto tem muitas velas… Aromáticas.

E, apenas então, ele riu.

— Senhorita… — ele tomou a mão delas nas suas, depositando um beijo suave em seu dorso e, só então, guiando-a até a sua fortaleza anti-escuridão.

Lá, Edward acendeu rapidamente meia-dúzia de velas aromáticas com as quais Alice a presenteara, preenchendo o ambiente com uma luz quente e muito bem-vinda. Aos poucos, a Swan sentiu que soltava a respiração que mal percebera ter prendido. E, como ele se tratava de um perfeito idiota, ainda se deu o trabalho de espalhar as pétalas de uma rosa – que ela ganhara de algum aluno e colocara em um copo sobre mesa de cabeceira – entre as suas cobertas bagunçadas.

— Você é um idiota — vocalizou o pensamento, mas logo cedeu e se sentou na beirada da cama.

— Eu sou um cavalheiro — ele se gabou, sentando-se ao seu lado.

Um maldito perfeito cavalheiro — cedeu.

— Você está melhor? — ele questionou, voltando a pousar a mão em seu queixo, a preocupação evidente no olhar esverdeado.

— Sim… obrigada — ela respondeu, baixando o rosto para os próprios pés descalços.

— Quer que eu fique com você, Sininho?

E as batidas do coração de Bella passaram a um ritmo mais acelerado, o vermelho voltando a lhe colorir a face.

Por que Edward tinha de ser tão… Edward?

— Por favor.

— O que acha de eu declamar Shakespeare para você? — ele perguntou subitamente, apanhando o livro que ela largara mais cedo sobre a cama e, já sem os sapatos, encostando-se à cabeceira.

— Não são poemas, Edward.

Mas ela já se encontrava ao seu lado, um dos braços dele circundando seus ombros e a voz rouca de Edward recitando a história que Bella conhecia como a palma de sua mão.

E, pela milésima vez em sua vida, agradeceu aos céus por ele ser um maldito perfeito cavalheiro.

Seu querido e perfeito Edward.

 

(...)

“Meu coração amou até agora? Abandone isso, vista,

Pois eu nunca vi a verdadeira beleza até esta noite”

 

— Caramba, Bells… Como você consegue ler essas coisas melosas sem se sentir enjoada? — Edward reclamou, fechando o livro e o colocando sobre a mesa de cabeceira junto à quantidade impressionante de velas aromáticas que a amiga espalhara acesas por ali.

Alice estava certa, afinal. O termo “exagerado” não era algo que poderia ser aplicado para velas aromáticas – embora Edward ainda guardasse alguns questionamentos em se tratando de sapatos.

— E você está lendo isso para alunos do ensino médio? Cuidado, srta. Swan! Você está a um passo de criar uma geração inteira de novos românticos — provocou, esbarrando levemente o ombro contra o dela.

Mas a brincadeira não foi recebida com nada além do silêncio. Afinal, voltando os olhos quase dourados para ela, notou que Bella já ressonava baixinho, os cabelos se abrindo como um leque sobre o travesseiro. Chocolate profundo em contraste com o branco límpido. O vinco entre suas sobrancelhas se fora e a paz, enfim, instalara-se no rosto em formato de coração.

Ah, Bella… Os anos se passavam e ela continuava a mesma.

Com um sorriso contido, Edward fez menção de se levantar, mas os dedos dela ainda se agarravam firmemente à barra de sua blusa. E, mesmo em sonho, Bella parecia determinada a não o deixar ir.

— Edward... — o som saiu abafado por entre os seus lábios, uma vez que o rosto dela ainda se encontrava muito próximo do seu peito e, em um primeiro momento, ele não teve certeza do que ouvira.

— Bella? — sussurrou, tentando apurar se a amiga ainda estava acordada. Mas as pálpebras da Swan se encontravam firmemente fechadas e, à luz das poucas velas acesas, as sombras de seus longos cílios bruxuleavam na pele pálida de suas bochechas – quase dançando por entre as minúsculas sardas ali escondidas.

Surpreendendo-o, uma certeza se instalou em seu coração: Bella nunca lhe parecera tão bonita quanto naquela noite.

Aguardou alguns instantes e, diante da quietude dela, fez menção de se esticar a fim de alcançar o exemplar que acabara de abandonar na mesa de cabeceira. Contudo, mal se afastara alguns centímetros quando os dedos de Bella voltaram a torcer o tecido de sua blusa.

— Não... Edward! — ela chamou com urgência dessa vez, o cenho se franzindo novamente. — Fique, por favor... — Bella pediu em seus sonhos e, ao som de sua voz suave, algo pareceu se derreter dentro do peito dele.

Edward era incapaz de não atender ao seu pedido, ainda que ela não o fizesse acordada. Se Bella – a sua Bella – não se sentia segura o suficiente para ser deixada sozinha, ele ficaria e vigiaria o seu sono.

Como um maldito perfeito cavalheiro.

— Meu querido Edward... — ela tornou a falar, impelida por uma coragem que apenas o véu dos sonhos era capaz de lhe conferir. — Eu jamais quebraria o seu coração — a confissão foi feita com facilidade. Dentre as brumas da inconsciência, ela parecia quase aliviada em fazê-la, portanto, continuou: — Eu amo você. Então, tornou a afundar o rosto no peito dele e se deixou levar para um estado mais profundo de sono, fazendo com que, agora, o único barulho no quarto fosse o fraco gotejar da chuva na janela.

E o martelar constante do seu coração.

Deixado para trás a observá-la, com aquela quase promessa, Edward sentiu que o que quer que se derretera em seu peito, agora tomava conta dele e o transbordava. Com Bella em seus braços e envolto pelo doce aroma de morango advindo dos fios cor-de-chocolate, sentiu que jamais experimentara tamanha intimidade e vulnerabilidade com qualquer outra pessoa antes. Sabia que a amava. Sempre soube. Mas aquilo era algo novo e, ao mesmo tempo, extremamente familiar.

Era como admirar, de outro ângulo, uma vista que sempre fora a sua favorita e descobrir que, daquele novo ponto, ela era ainda mais bela. Ou, ainda, como ouvir uma nova versão de sua música preferida e se surpreender ao achá-la ainda mais coesa e melódica. Era como se, desde o início, Edward estivesse tentando montar um quebra-cabeças com as peças embaralhadas. Mas, agora que ele aparecera finalizado diante dos seus olhos, a sua completude dourada sequer pudesse ser comparada com o que ousara antecipar.

E o coração continuava a saltitar em seu peito, diversas vezes por segundo, por ela.

Edward Cullen amava Isabella Swan.

Sempre amou.

Ela era a garota que jamais quebraria o seu coração.

E ele faria de tudo para proteger o dela.

Com aquela certeza ressoando em seu âmago, em completa sintonia com os seus batimentos cardíacos alterados, Edward se inclinou e depositou um beijo suave na testa de Bella. Os lábios gelados dele em contraste com a pele aquecida dela, complementando-se. E, ainda sonhando, ela pareceu suspirar satisfeita - quase como se compartilhasse com ele a certeza daquele amor.

 

(...)

 

O forte cheiro de café fresco penetrou a névoa dos sonhos de Bella, acordando-a para uma manhã de sábado livre da chuva torrencial que castigara Forks no dia anterior. Ainda com as roupas da noite prévia, ela se desvencilhou das cobertas e caminhou em direção à cozinha, onde encontrou Edward quebrando alguns ovos em uma tigela e os mexendo com um fuê.

— Bom dia — ela murmurou ainda sonolenta, apanhando uma caneca no armário sobre a pia e a enchendo com o líquido fumegante da cafeteira. Tentava, ao máximo, fingir normalidade.

— Bom dia, Bella — a voz do melhor amigo era suave, embora o escrutínio na sua direção fosse absurdamente intenso. — Você dormiu bem? — ele perguntou, adicionando alguns temperos à mistura amarelo-clara.

— Hm… Sim… Dormi! Inclusive, desculpe por tê-lo feito dormir aqui — e baixou o olhar castanho, sentindo-se completamente embaraçada consigo mesma.

Porém, ele balançou a cabeça, colocando uma frigideira sobre uma das bocas acesas do fogão e dispensado aquele tópico tão rápido quanto surgira. Estava, de fato, focado e era aquilo o que a Swan mais temia.

— Não foi nada, mas… Bella, nós precisamos conversar sobre ontem — o som de sua voz, séria e rouca, trouxe um dilúvio de lembranças da noite, e senti meu rosto e meu pescoço corando.

— Eu prometo instalar as luminárias de emergência logo, Edward — tentou, cruzando mentalmente os dedos e pedindo às estrelas da sorte que ele se contentasse com essa resposta.

— Isso seria bom — o Cullen concordou, embora tenha balançado a cabeça como se aquilo não tivesse a menor importância. — Mas não é exatamente sobre isso que eu quero falar, Bella.

De que serviam as malditas estrelas da sorte, afinal?

— Eu prometo tratar a minha fobia de escuro na terapia? — arriscou novamente, preferindo abordar a própria humilhação pessoal.

Edward, porém, largou a espátula que usava sobre o balcão e se virou para ela, deixando os ovos mexidos perigosamente sem supervisão e a encarando com tamanha intensidade que Bella se obrigou a dar um passo para trás.

— Bella… eu vou tentar novamente… Vou insistir em algo como deveria ter insistido anos atrás — ele declarou, aproximando-se novamente dela e tomando as suas mãos entre as dele.

Por favor, não faça isso comigo. Por favor, não faça isso comigo. De novo, não. 

— Você, definitivamente, leu muito Shakespeare ontem à noite…

— Eu não posso mais fingir, Bella… não posso…

— Edward… 

Não diga. Não diga. Por favor, não diga.

— Eu não posso mais fingir que não sou perdidamente apaixonado por você, Isabella Swan — e a frase fez com que ela quisesse sair correndo. No entanto, o Cullen ainda tinha as mãos nas dela e o olhar esverdeado a fitava com tanta atenção que não havia outra alternativa que não fosse escutá-lo. E, no coração da professora de Literatura, os velhos sentimentos pelo melhor amigo haviam arrombado a fechadura da caixa em que ela os trancafiara, arrastando-a com a força e a impetuosidade que apenas algo que fora sobrepujado por muito tempo seria capaz de conter. — Não posso mais fingir que, além da minha família, você não é uma das únicas constantes na minha vida, que não a decorei como uma de minhas canções preferidas ou que você não esteve por perto em todos os momentos importantes da minha existência — ele declarou, a sinceridade demarcando cada uma de suas palavras. — Eu não posso fingir que Tanya não terminou o nosso noivado por sua causa, Bella. Por nossa causa. E que a única coisa que desejei seria eu mesmo ter feito isso — confessou, por fim, fazendo com que os olhos marrom-chocolate se arregalassem em puro choque. — Eu amo você, Isabella Swan. Por favor, diga que me ama também. Dessa vez — e o significado daquele pedido a atingiu como uma bofetada. Pois ela lembrava muito bem o que ele se referia.

Após o discurso dele, lágrimas quentes escorriam livremente pelas bochechas dela e, tomando aquilo como um sinal de que a emocionara, Edward levou uma das mãos ao seu queixo, aproximando-se como se estivesse prestes a beijá-la. Contudo, Bella não chorava de felicidade. Pelo contrário, estava furiosa. E, espalmando ambas as mãos no torso dele, empurrou-o para longe de si. Não podia se deixar sufocar pelas paixões de Edward Cullen ou, ainda, pelo familiar aroma fresco de pinheiro que invadia suas narinas com toda aquela proximidade.

— Bella?

— Não, Edward. Isso de novo, não — e a dor em sua voz era palpável.

— Mas eu amo você, Bella — ele falou, a mágoa voltando a contorcer as feições antes endurecidas.

E a sensação de déjà vu a atingiu como um soco.

Sim, Olivia Rodrigo, ela tinha um déjà vu.

Toda maldita vez.

— Hoje, Edward, hoje! — ela repetiu a palavra que pronunciara anos atrás, a raiva pontuando cada sílaba. — Você não pode falar que me ama duas semanas depois de terminar o seu maldito noivado, Edward. Assim como você não podia ter dito que me amava e começado outro relacionamento uma semana depois, Edward! Você brinca com os seus sentimentos e com o dos outros como se fossem cordas de uma guitarra! E eu estou tão cansada, Edward! Tão cansada! — gesticulava violentamente, as lágrimas ainda lhe banhando o rosto em um choro furioso. — Toda vez você acaba onde? Na minha porta. E isso apenas é uma prova do fato de que eu jamais estarei no topo da sua lista. Eu sou a segunda opção, Edward. A noiva reserva para o caso de nenhum dos seus relacionamentos darem certo até os quarenta anos — desabafou, sabendo que jogara baixo ao trazer à tona um pacto que ambos haviam feito após assistirem a um episódio de Friends, no qual os personagens prometiam se casar entre eles caso não obtivessem sorte alguma no amor.

Monica e Chandler eram almas-gêmeas. Phoebe encontrara Mike. Rachel acabara com Ross. Mas e Joey?

E Bella? Edward, provavelmente, encontraria alguém e ela teria de se contentar com os seus livros. E todos aqueles sentimentos, agora soltos livremente e perambulando pelo ar ao redor deles.

Todavia, antes que o Cullen pudesse falar alguma coisa, o forte odor de algo queimando penetrou a bolha sentimental na qual se encontrava. E Rose, que possuía uma das chaves reservas da amiga, resolveu usar aquele momento para invadir o seu apartamento.

— Gente? O que é essa gritaria toda aqui? — a loira exclamou alarmada, atravessando a cozinha a passos largos e tirando os ovos mexidos completamente arruinados do fogo. — Vocês estão tentando colocar fogo no prédio? — inquiriu com as mãos na cintura, o olhar azul-celeste os examinando com uma desconfiança assustadora.

— Eu… Preciso ir — Edward anunciou friamente, apanhando as chaves do carro que largara sobre o balcão da cozinha e deixou o local tão rápido quanto a Hale o adentrara. Em poucos minutos, Bella sabia que o volvo prateado estaria percorrendo as ruas de Forks em uma velocidade demasiado perigosa para qualquer um.

— Bella? — Rosalie chamou, estalando os dedos em frente ao rosto da amiga. — Você quer me explicar o que foi que aconteceu aqui?

Mas o que realmente acontecera ali? E, o mais importante, o que aconteceria depois daquilo?

 

(...)

 

Com um solavanco, Edward estacionou o carro em frente ao ateliê da irmã mais nova, em Seattle. Apesar de ser domingo de manhã, sabia que Alice estaria trabalhando nos ajustes finais do figurino que prometera entregar para o festival da renascença – o que o lembrava automaticamente de Bella e fazia com que o rombo em seu peito se tornasse maior. Enviara uma mensagem para a irmã no meio do caminho e, portanto, não foi surpresa quando ela saltou para fora da loja a fim de encontrá-lo – os cabelos curtos e desfiados apontando para todas as direções enquanto que a roupa que usava parecia ter saído direto de alguma passarela.

Familiar e reconfortante, mas que – ainda assim – não parecia ser capaz de acalmá-lo.

— Alice, qual foi a merda que eu fiz para a Bella? — questionou, de imediato, assim que os braços da irmã o acolheram em um abraço afetuoso.

— Agora? Receio que você mesmo terá de me contar — ela devolveu, acompanhando-o para dentro do ateliê e trancando a porta atrás de ambos. Como sempre, o olhar verde-acinzentado dela estava abarrotado de perguntas, mas ela esperou pacientemente até que Edward recapitulasse o que ocorrera na noite anterior e a explosão de Bella minutos atrás que o haviam levado até ali. E, para a sua surpresa, a mão pequena da irmã desferiu um tapa em seu ombro assim que terminou a história.

— Incrível como você consegue ser um belo de um babaca quando se trata da Bella, sabia? — falou completamente indignada, indicando que estava pronta para defender a amiga.

— Ei! Eu não vim aqui para você me atacar, Pequena Polegar — ele reclamou, utilizando-se do apelido justamente para irritá-la.

Mas Alice apenas suspirou profundamente, parecendo terrivelmente cansada com a situação.

— É incrível o fato de você andar por aí, quase se gabando por ser o último dos românticos e é simplesmente cego para o que está bem na sua frente — ela desabafou, torcendo ligeiramente o nariz.

— Você está dizendo que a Bella não me ama e que eu deveria seguir em frente? — questionou, o estômago se revirando apenas com o pronunciar daquelas palavras.

Alice inspirou fundo novamente, parecendo fazer uma força sobre-humana para não desferir outro tapa no irmão.

— A Bella ama você, Edward — garantiu, fazendo com que o seu alívio fosse instantâneo. — Mas você não tem feito absolutamente nada para merecer isso — pontuou e, antes que ele protestasse, logo continuou: — Se declarar duas semanas após o fim do seu noivado? Francamente… E isso não é tudo: quer me falar sobre todas as vezes em que você a procurou depois de um término? Sobre como vocês se magoavam livremente todas as vezes em que enchiam a cara e se beijavam? Sobre aquele pacto ridículo de se casarem caso não encontrassem alguém? E sobre como você desfila com todas essas namoradas na frente dela enquanto sempre soube que a amava? — Alice pontuava, parecendo ter a paciência de Rosalie naquele momento. — Sim, a Bella também tem uma parcela de culpa, mas você está alguns pontos atrás… Lembra da Jessica?

— Jessica? — Edward, de repente, sentiu-se absolutamente confuso.

— Jessica Stanley, a garota com quem você apareceu namorando uma semana após ter se declarado para Isabella Swan. Ou, como você chamou na época, ter o seu coração quebrado por ela — e, aos poucos, a memória de Edward se tornava clara: Jessica fora uma garota que sempre tivera uma queda óbvia por ele. E, quando não foi correspondido pela melhor amiga, fora a primeira com quem resolvera se relacionar. Porém, o romance, obviamente, não dera certo e acabou em uma discussão duas semanas após o seu início. Alice, contudo, não havia acabado: — Na festa na casa do Jazz em que você a apresentou para nós… Bem… Bella havia escolhido aquela noite para se declarar de volta — confidenciou e o mundo de Edward pareceu sofrer um baque.

Afinal, se não fosse a sua maldita estupidez, aparentemente, poderia estar junto de Bella desde aquela época.

— Eu sou realmente um babaca… — murmurou, passando as mãos nervosamente pelos cabelos.

— Achei que iria concordar comigo — a irmã sorriu quase satisfeita com a própria perspicácia. — Mas o que pretende fazer agora?

— Agora?

— Edward, você precisa mostrar para ela que ela não é só mais uma para você — ela explicou impacientemente, tornando-se subitamente inquieta. — Você precisa de um grande gesto.

E Alice, como sempre, estava certa: mais do que qualquer coisa, Edward conhecia Bella. E ela, como a romântica incorrigível que era, também precisaria de um grande gesto.

E ele estava mais do que disposto a dar aquilo para ela.

 

(...)

 

Rapidamente, os dias se tornaram semanas e, quando Bella se dera conta, estava se aprontando para a grande Feira do Renascimento, em um domingo raramente ensolarado para Forks. Ao que parecia, nem o clima prentendia atrapalhar o suntuoso evento. Além disso, o tempo que se passara era igual ao número de dias em que estava sem conversar com Edward, pois, após aquela fatídica discussão matinal na sua cozinha, nenhum deles havia feito qualquer esforço para contatar o outro. Ela não sabia ao certo se ele estava furioso ou apenas magoado com a situação. No entanto, da parte dela, apenas precisava esquecer o ocorrido e, na presença do Cullen, não poderia obter o mesmo sucesso.

Não que estivesse obtendo sucesso algum longe dele, mas…

Fechando o último botão do bonito vestido que Alice confeccionara para ela, a professora calçou as sapatilhas azul-celeste do mesmo tom do tecido fluído de sua roupa e, ao se olhar no espelho, quase sentiu que poderia se passar por uma das fadas- acompanhantes da Rainha Titânia – da peça Sonho de Uma Noite de Verão que também seria representada naquela noite.

Por hábito, checou o celular e o padrão ainda se repetia: sem novas mensagens de Edward. Em seu íntimo, começou a se questionar se ele compareceria ao festival. Afinal, por mais que o The Midnight Café tivesse sido um dos benfeitores do evento, ela passou a achar que Emmett seria o seu único representante.

Ligeiramente decepcionada, trancou o apartamento e, em sua picape alaranjada, percorreu rapidamente o trajeto até a escola. Chegando lá, os carros de Rosalie e Jasper já se encontravam no estacionamento, mas não havia sinal algum do volvo prateado. Será que ele realmente não apareceria?

— Bella! — a voz animada de Alice a chamou, no instante em que ela adentrou a Forks High School.

E, por mais que tivesse passado a tarde ajudando com a montagem dos cenários para as peças, ficou impressionada com a visão que teve do pátio. Afinal, o local havia sido transformado: barracas de madeira, adornadas com tecidos coloridos, exibiam uma grande variedade de comidas e bebidas para os visitantes. Além disso, havia atividades como arco-e-flecha e falcoaria – que a fizeram questionar a possibilidade de um anacronismo –; e personagens históricos do Renascimento brindavam os transeuntes com fatos aleatórios sobre a época – inclusive, lá estava Jasper com a sua caracterização de Isaac Newton! Ademais, dois palcos de tamanho impressionante haviam sido montados para a encenação das duas histórias escolhidas por Bella e o lago próximo a escola estava repleto de pequenos botes de madeira. Havia fitas coloridas, releituras de obras históricas e todos pareciam ter conseguido uma roupa que remetia ao período celebrado. Contudo, na meticulosa inspeção que fizera, o seu olhar castanho não pareceu identificar Edward em lugar algum.

— Oi, gente! Obrigada por terem vindo! — ela procurou parecer animada, ao se aproximar de Alice e Rose, aceitando uma caixa branca com um laço prateado que a menor lhe oferecia.

— Esqueci de entregar antes e faz parte da sua fantasia! — a Cullen explicou quando a professora abriu o embrulho, revelando uma delicada coroa trançada com margaridas frescas. Apesar de lindas, faziam com que ela retornasse perigosamente à lembrança que a perturbara naquele dia na sala de aula. Logo, fez menção de devolver.

— Ah, não! A Alice me perturbou pessoalmente para conseguir esse enfeite, então, pode tratar de colocar — Rosalie interrompeu, apanhando o adereço e o ajeitando sobre os fios chocolate.

— Vamos? — Alice chamou, enganchando em ambas as amigas e as arrastando para perto do palco. A primeira peça, Romeu e Julieta, logo iria começar.

Assim, com uma sensação de orgulho no peito, Isabella Swan assistiu aos alunos – com os quais trabalhara arduamente para orientar – apresentarem uma réplica quase perfeita da história de amor que, por seu final trágico, tornara-se atemporal. Ao final da encenação, ela foi chamada ao palco a fim de receber os entusiasmados aplausos junto com os discentes e, por mais que se sentisse perfeitamente radiante por fora, não conseguia evitar a sensação de coração partido.

Edward não viera.

E Emmett também não, mas aquele não era o caso.

Aquele seria o fim de ambos? Ele passaria a evitá-la?

Sem saber o que fazer com aqueles questionamentos, deixou-se ser arrastada pelas amigas até a beira do lago. Afinal, a segunda peça só seria apresentada em meia hora e, pelo que acabava de reparar, uma espécie de apresentação também se daria naquele local.

E, apenas então, Bella o avistou.

No centro do pequeno deck de madeira, Edward aguardava em um pomposo gibão entremeado com detalhes de tom semelhantes aos do vestido que ela usava. Ao seu redor – e, também, no caminho até ele – estendia-se um verdadeiro tapete de margaridas recém-colhidas idênticas às flores que ela tinha em seus cabelos. Então, para que não restasse dúvidas, ele estendeu a mão a fim de que ela caminhasse até ele.

— Edward, o quê… — tentou perguntar ao se aproximar, mas foi rapidamente interrompida por ele.

— Vamos fazer um passeio, Bella? — ele convidou, indicando um dos botes de madeira, decorado por luzes que lembravam um pisca-pisca natalino, próximo à borda do deck.

E, meio sem saber ao certo o porquê, Bella se viu sentada em um barquinho minúsculo com o joelho tocando o de Edward. Com um remo, ele começou a navegar tranquilamente enquanto que outros casais começavam a avançar pelas águas.

Mas o que, diabos, eu estou fazendo aqui?

Contudo, apesar do nervosismo dela, o Cullen parecia imperturbavelmente tranquilo. E, agora que a noite começara a se estender sobre eles, ela notou que as pessoas nos botes ao redor deles pareciam carregar enormes lanternas de papel, semelhantes àquelas que se apaixonara ao assistir Enrolados, o filme que já considerava ser um clássico da Disney. Logo, eles pararam no que parecia ser o centro do lago e, segurando uma das mãos dela, Edward indicou um par de lanternas que tremulava até eles.

— Vamos fazer um passeio por nossas memórias? — a pergunta fora feita naquele tom sério e rouco, mas impressionantemente gentil, que ele parecia reservar apenas para ela.

Então, as luzes flutuantes se aproximaram e Bella notou desenhos nelas: a primeira exibia duas casas vizinhas e a segunda um menino e uma menina brincando com uma bicicleta; indicando o dia em que haviam se conhecido na antiga vizinhança deles. Um nó se formou em sua garganta e seu coração pareceu se aquecer com as lembranças. Assim, mais e mais lanternas de papel os rodearam e, em cada uma delas, havia símbolos que se referiam aos recortes de cada momento que ambos passaram juntos. Uma delas exibira, inclusive, o desenho de uma margarida e, outra, o de um nascer do Sol. E, ao final daquela apresentação, o lago estava iluminado por uma centena de luzes flutuantes, tornando-o tão mágico quanto o da cena que ela reprisara diversas vezes em sua televisão. Além disso, banhado por aquela intensa luz amarelada, Edward parecia um personagem encantado saído de uma peça do bardo inglês.

— Bella…

— Edward…

Ambos se encararam intensamente, o amor tão óbvio no olhar esverdeado dele e no castanho dela.

— Bella… eu preciso me desculpar com você. Não só pelo nosso último encontro, mas pela série de más impressões que dei a você ao longo da vida. Me desculpe se a tratei como uma segunda opção quando, na verdade, você era a única que existia. Me desculpe pelo desfile de relacionamentos fracassados que você foi obrigada a assistir e me desculpe pela primeira tentativa falha de declaração. Me desculpe, principalmente, por não ter lhe dado o devido tempo para absorvê-la e por ter agido como um idiota depois — ele pedia, os olhos fixos aos dela como se tentasse antecipar qualquer mínima reação da parte dela. — Você jamais seria apenas mais uma para mim, Bella. Na verdade, desde o começo, sinto que foi apenas você. Você e o cheiro de morango dos seus cabelos, o seu coração incrivelmente bondoso, o seu ímã poderoso para desastres, as suas luzes noturnas e os livros que sempre estão na sua bolsa — ele declarava, fazendo com que cada palavra fosse pontuada por um novo acelerar dos batimentos cardíacos dela. Sentia-se completamente absorta por aquela aura ao seu redor, lançada sobre ela graças ao tom de voz rouco de Edward junto do brilho amarelado das lanternas de papel. — Eu sou apaixonado por você, Isabella Swan. E não apenas hoje ou amanhã. Eu acredito que venho amando você desde o instante em que você caiu de bicicleta na minha frente. E o tempo ao seu lado apenas fez com que esse sentimento crescesse dentro de mim. Eu poderia passar horas a escutando falar sobre Shakespeare. Poderia passar noites e mais noites velando o seu sono, caso isso a fizesse sentir segura — e uma lágrima solitária rolou pela bochecha rosada de Bella. — Eu amo você, Isabella Swan. E, para soar como um dos personagens que você tanto adora, estou morrendo para saber se você se sente da mesma forma e se nos daria uma chance.

E o tum-dum, tum-dum, tum-dum no peito dela pareceu aumentar, compondo uma sinfonia única apenas para ele e por ele.

Como sempre fora e sempre seria.

— Eu amo você, Edward Cullen. De fato, tenho amado por muito tempo — declarou, enfim, as palavras que tanto estivera guardando para si. E nada nunca havia lhe parecido tão certo e seguro antes. Era como descansar sobre o agradável Sol da primavera após um longo e rigoroso inverno de decepções.

Daquela vez, sentia-se confortável o suficiente para lhe entregar o seu coração, pois sabia que, em troca, estava recebendo o dele. Agora, não precisaria mais fugir ou esconder os próprios sentimentos e, aquela nova perspectiva, era muito bem-vinda para ela. Afinal, era um amor há tanto tempo cultivado que, àquela altura, sentia-se mais do que pronto para ser vivido.

Então, Edward Cullen e Isabella Swan se beijaram, sob a luz de uma centena de lanternas de papel flutuantes. Eles estavam apaixonados, afinal de contas, e os corações não tornariam a se quebrar por ali.


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