All the love we have escrita por Lily Potter


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Oioi, tudo bem? Sentiram minha falta? Eu como vocês já perceberam, falo muito em notas, e dessa vez não é diferente, mas é mais importante.
Esse plot é muito importante pra mim, e é uma coisa que eu nunca tentei antes, e envolve muitas questões que são importantes e precisam ser discutidas, e eu fiz meu máximo pra deixar a história o mais realista possível.
Muito obrigada à minha beta, Belle, as haters, e a Gab por me ouvirem surtar, pq o surto foi grande dessa vez, vocês são incríveis besties ♥
Obrigada ao NH por existir, vocês arrasam meninas!
Boa leitura à todes! ♥



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 Harry Potter nunca em todos seus vinte e oito anos de vida havia passado tão mal quanto ele estava passando naquele momento, nem mesmo quando ele se embebedou pela primeira vez seu estômago revoltou-se tanto como estava se revoltando no momento.

E o pior de tudo era que ele estava na escola, mais precisamente, atrasado para começar a aula da sua turma do nono ano. 

Com um suspiro resignado levantou-se do chão e conteve ao máximo a onda de náusea que se apossou de seu corpo, apenas para ser obrigado a abaixar-se mais uma vez e despejar o conteúdo que teimosamente ainda residia em seu estômago.

Quando finalmente conseguiu sair do cubículo apertado que usava, Harry já estava mais do que atrasado e sabia que mais tarde ouviria poucas e boas do supervisor, Severus Snape. 

Mais que rapidamente ele jogou uma água no rosto na tentativa de diminuir a tontura que sentia, e lavou sua boca da melhor forma que podia, amaldiçoando-se internamente por ter esquecido de comprar chicletes de menta. Sua mãe havia lhe dito várias vezes que deveria ter sempre uma bala ou chiclete consigo, e naquele momento, mais do que nunca, desejou ter a escutado.

O moreno se apressou pela série de corredores e escadas que o separava da sala de aula enquanto agradecia pela insistência de Ginny em ele entrar na academia com ela há quase dois meses, apenas para quando, finalmente, chegou ao destino, encontrar Snape sentado em sua cadeira e falando com a turma. 

—...e caso a irresponsável da senhorita Potter decida novamente que vocês não estão prontos para os simulados exigidos pela escola, me avisem. — Terminou o mais velho, sem sequer lançar um olhar ao professor que já havia entrado. 

Já irritado e cansado, Harry colocou suas coisas em cima da mesa e olhou para o supervisor. O bastardo sempre fazia questão de chamá-lo pelos pronomes femininos, apenas porque quando eles se conheceram o Potter tinha apenas cinco anos e ainda usava seu dead name e pronomes femininos, uma vez que ele era uma criança e não entendia o que estava acontecendo com ele. 

Felizmente seus pais e padrinhos conseguiram perceber o que estava acontecendo antes mesmo dele, e com muitos anos de acompanhamento médico ele havia conseguido passar pela transição da forma mais suave e saudável possível. Infelizmente ele já conhecia Snape, que era um preconceituoso maldito e não conseguia entender que ele era um homem trans e não uma mulher que usava “roupas masculinas”.

— Professor Snape, classe, me desculpem pelo atraso. — Potter falou com a voz mais neutra possível tentando não soar tão irritado quanto estava, ignorando que o mais velho havia propositalmente errado seus pronomes, pela terceira vez no dia, e olhando para sua sala. 

— Professora Potter, se a senhorita não tem ao menos a capacidade de chegar ao horário, temo que será necessário uma substituição de professores. 

— Muito obrigado pela sugestão, professor Snape, agora se puder se retirar, por favor.

— Claro, professora, tenha um bom dia. — Ele respondeu sarcasticamente e se retirou da sala sem sequer esperar que o moreno o respondesse. 

O transfóbico fazia questão de usar pronomes errados na frente dos alunos mais preconceituosos que ele tinha, mesmo que ele já o houvesse pedido para não tirar a autoridade dele dessa forma. E mesmo que Harry reclamasse, o diretor Dumbledore apenas fazia vista grossa e alegava que o assunto não estava em suas mãos. 

— Professor, o senhor está bem? — Amanda Connor perguntou com visível preocupação ao perceber que ele se apoiava na mesa. Connor era uma de suas melhores alunas e uma das poucas que tinham a mente aberta, talvez isso viesse do fato de que ela tinha pais sensatos. 

— Estou sim, Amanda, só preciso de alguns momentos. — Não era uma mentira total, mas o encontro com Snape certamente havia o deixado mais nauseado que o normal, e para melhorar a situação ele agora sentia o começo de uma dor de cabeça se estabelecer.

— Não basta ser uma desviada, também tem que atrasar a aula. — Resmungou Bethany Howard.

Howard era uma das filhas do pastor que pregava na igreja do bairro. Ao contrário de Amanda, Bethany não gostava muito dele, e sempre usava os pronomes errados, mesmo que ele já houvesse explicado que ela não deveria.

Ele não é um desviado, o professor Potter é o nosso professor e merece respeito. — Alexander Torres um de seus melhores alunos retrucou em voz alta olhando para todos da sala. 

Torres era o filho mais velho de uma família grande, ele tinha quatro irmãs mais novas e sua mãe estava grávida de gêmeos, mais duas meninas ao que tudo indicava, e o pai dele os havia abandonado quando Alex ainda tinha dez anos. Harry amava o menino com todo seu coração e admirava a mãe dele por tudo que ela fazia pelos filhos, e esperava que quando chegasse a hora de ter seus pequenos, ele pudesse ser um pai tão bom quanto ela era mãe. 

    — Você só fala isso porque sua mãe é igual a ela! Uma desviada, e todas as duas vão queimar no inferno. — Lindsay Howard, irmã gêmea de Bethany, gritou com a face vermelha.   

— Minha mãe não é uma desviada! E o professor Potter não é uma menina! Pare de tratar ele no feminino! — Gritou Alexander se levantando da carteira e ficando de frente para as irmãs Howard. — Vocês só ficam falando isso porque o pai de vocês é um preconceituoso que fica usando Deus como desculpa para ser assim!

Com os longos cabelos louros presos em maria-chiquinhas balançando conforme as irmãs agitavam a cabeça em negação, lágrimas de raiva escorriam pelo rosto de Bethany, e uma veia se levantava na  testa de Lindsay. 

Diante dessa visão Harry soube que seria um longo, longo, dia pela frente, logo quando ele achou que conseguiria ir para casa mais cedo e passar o restante do dia deitado em sua cama assistindo comédias românticas com sua esposa e, caso seu estômago permitisse, comendo porcarias apenas para que eles não precisassem cozinhar. 

— Silêncio! —  Ele falou irritado, em voz alta o suficiente para sobressair a dos alunos que agora estavam agitados, mas baixa o suficiente para não ser um grito. — Senhoritas Howard, detenção para as duas, nós já conversamos sobre isso antes e eu avisei que a próxima vez não seria apenas conversa. 

— Você não pode me dar detenção por falar a verdade! — Lindsay gritou irritada, batendo o pé no chão com toda a revolta de uma adolescente que foi mimada a vida toda. Bethany tinha a cabeça levantada e os braços cruzados em frente ao seu peito e qualquer sinal do choro já havia desaparecido. 

— E o Torres ainda por cima vai ficar impune! — A irmã falou com desprezo olhando para Alexander que ainda estava de pé, mas tinha sua cabeça baixa, em forma de respeito. — Meu pai vai ficar sabendo, e ele não vai gostar disso!

— O sr. Torres também está de detenção. — Harry falou calmamente, ignorando a clara ameaça que Howard fazia. E pensar que ele havia cogitado que essa manhã seria calma. Doce ilusão. — Agora sentem-se todos e abram o livro didático na página 236.

XXX

    O sino que anunciava o começo da detenção havia acabado de tocar quando a primeira ânsia de vômito o atingiu. Felizmente o Potter conseguiu controlar a forte onda de enjoo ao se sentar na cadeira do professor e fechar os olhos por alguns segundos. 

    — Professor Potter, o senhor está bem? — Anne Winters, uma aluna do oitavo ano que estava na detenção por ter entrado em uma briga com um dos meninos do time de futebol, perguntou com a voz preocupada. 

    — Estou sim, srta. Winters, obrigado por perguntar. 

    — O senhor tem certeza, professor? — Pressionou Colin Jenkins enquanto caminhava em direção à cadeira mais a frente ao lado da janela e de frente a Harry. O professor apenas assentiu brevemente, pressionando os lábios com mais força que deveria, em forma de mantê-los selados. 

Jenkins era um dos alunos mais encrenqueiros, e surpreendentemente doces, de Meadows Ridge Academy, foram inúmeras as ocasiões onde Harry precisou intervir em uma das brigas em que ele se metia, ou conversar com ele sobre porque ele não podia colocar shampoo na mesa do professor Snape só porque achava que o cabelo dele estava oleoso demais. 

Após dois minutos inteiramente imóvel, Harry abriu os olhos e respirou fundo antes de começar o típico discurso ensaiado que era necessário repetir em todas as detenções, por todos os professores. Durante os minutos que se seguiram, todos estavam em silêncio e Harry conseguiu fingir que estava tudo normal consigo. Ignorando a voz que dizia que sua menstruação ainda não havia descido esse mês, ele sequer podia culpar seus hormônios por isso, já que eles haviam decidido tentar ter um bebê.

    Mas não podia ser isso, certo? Todos os médicos avisaram-nos que poderia demorar anos para que ele conseguisse engravidar, qual seria chance de apenas seis meses após começarem a tentar de verdade, ele já estar com um bebê em sua barriga?

    Balançou a cabeça tentando, e falhando, em não pensar nisso. Não era o momento certo ainda, eles apenas pararam com os hormônios porque levaria anos e aí eles estariam prontos para todas as crianças que quisessem ter e não seria preciso ficar anos esperando para dar certo, mas ainda não era o momento. 

    E claro como se isso não fosse o suficiente, Ginny e Harry sequer podiam assumir seu relacionamento no trabalho, tampouco poderiam mudar de emprego, principalmente por já estarem na metade do primeiro termo, uma vez que eles dependiam dos dois trabalhando para conseguirem sobreviver. 

    Pensar nisso, no entanto, apenas o deixou mais enjoado do que já estava. Era injusto demais eles precisarem se esconder como se estivessem fazendo alguma coisa errada, como se o dinheiro dos pais de mente fechada fossem mais importante que o aprendizado que poderiam oferecer, com a diversidade que não existia alí dentro. 

    Quando decidiu ser professor, havia feito, não só por amar a literatura inglesa e tudo o que poderia tirar de bom dela, mas porque ele desejava mudar vidas e transformar cada criança e adolescente da forma mais profunda que se pode transformar alguém: por meio do conhecimento ilimitado e prazeroso. 

    Não foi o que encontrou.

    O que encontrou foram alunos maravilhosos que tinham seus potenciais mal explorados, julgados e colocados de lado, tudo em prol do interesse de um “bem maior”, bem esse que nunca era retornado para seus alunos. 

    Encontrou alunos que eram tão ricos que achavam que o dinheiro poderia comprar tudo, e que, como sempre teriam alguém para fazer algo por eles, não precisavam aprender nada, e a escola era só um lugar para encontrarem seus amigos.

    — Professor? — Um dos alunos o chamou parecendo preocupado. Não lembrava bem o nome dele, Samuel? Michael? Jhon? Não saberia dizer, só sabia que era um nome religioso, como a maioria dos nomes ali, eram. 

    — Sim, senhor..? Perdão, qual é o seu nome, mesmo?

— Peter Williams, professor. 

— Sim, Peter? 

— Você pode me liberar da detenção um pouco mais cedo? — O menino loiro pediu com o rosto parecendo aflito. Só então que Harry realmente o olhou. 

Peter Williams era um menino magro, e alto, não deveria ter mais de dezesseis anos, havia uma barba que começava a nascer, não muito diferente da que Harry tinha nessa idade, seus cabelos loiros e cacheados caíam no rosto. Em resumo, Peter Williams não se parecia em nada com as pessoas que normalmente frequentavam as detenções, ou aquela escola, em geral. Era provavelmente mais um entre os bolsistas que os professores, como Snape, adoravam colocar em detenção por simplesmente respirar do modo errado. 

Uma vez, um dos bilhetes que explicava a detenção de um dos bolsistas, realmente dizia isso.

— Peter, eu sinto muito, mas as regras são bem claras. — Respondeu com toda sinceridade que conseguiu reunir.

    — Eu sei, professor, mas é que minha irmã mais nova ‘tá grávida e não tem mais ninguém pra levar ela no médico. — explicou o loiro com o rosto sério. — O canalha, desculpa professor, o idiota que a engravidou sumiu assim que ela falou. 

    — Olha, eu não posso te liberar mais cedo. — Respondeu o moreno, sentindo seu coração se apertar ao ver o menino, afinal era isso que ele era, só um menino, abaixar a cabeça e assentir. 

— Tudo bem, professor, eu entendo. — Aquiesceu, já voltando para o seu lugar, de onde ele provavelmente não deveria ter saído, mas dessa vez, Harry iria fazer vista grossa. 

— Mas, eu posso pedir a professora Weasley para acompanhar sua irmã, se você quiser.  — ofereceu cuidadosamente, torcendo para sua esposa não estar ocupada demais. Odiaria dar esperança apenas para arrancar brutalmente logo em seguida. 

    — Seria ótimo, professor. — falou com um sorriso genuíno. — Obrigado, de verdade. 

    — De nada, sr.Williams. 

    O mais discretamente que conseguiu pegou seu celular, uma coisa velha e ultrapassada que já tinha visto dias melhores, e, usando a tática que sempre usou quando estava no colegial, digitar por baixo do livro que segurava, Harry entrou no aplicativo de mensagens. 

 

Harry:

Gin, tá ocupada?

Gin-Gin:

Não, pq?

Acabei de terminar a aula de reforço

Quer que eu te espere?

 Harry:

Não precisa, G.

Mas eu quero um favor

Gin-Gin:

Se for pra pedir comida mexicana

A resposta é não

Se n for isso, pode pedir

Harry:

Compra a indiana ent?

Você pode levar uma aluna ao médico?

Gin-Gin:

Nada de comprar comida, já disse

Levo sim, pq?

Harry:

Em casa te explico melhor

Mas o irmão dela tá na detenção

E ele que ia levar

Gin-Gin:

N tinha mais ngm?

Harry:

Não :(

Você pode?

Gin-Gin:

Posso sim, H

Só me mandar as informações

Harry:

Okay

Obrigado, G

te amo ♥

Gin-Gin:

te amo ♥

XXX

Depois da conversa que teve com Peter Williams a detenção prosseguiu da forma mais calma possível, ao menos, em termos de detenção, o que significava que ele precisou separar duas brigas. Primeiro foram as gêmeas Howard, que não satisfeitas na confusão que arrumaram durante sua aula, quase saíram aos tapas com Anne Winters, e depois os jogadores de futebol e basquete se desentenderam dias antes e decidiram que aquele era o melhor momento para brigar. 

Quando chegou em seu apartamento, por volta das sete da noite, todo seu corpo doía e tudo que ele mais queria era um bom banho e deitar, sequer conseguia pensar em comer, mesmo estando morrendo de fome. 

Ginny estava na sala, corrigindo deveres provavelmente, e sequer desviou os olhos dos papéis em mão quando o ouviu chegar. A televisão estava ligada e passava um episódio da primeira temporada de Parks & Rec, um dos sitcoms favoritos da ruiva, e na mesa de centro uma embalagem , do que ele esperava serem donouts, da padaria que tinha do lado da escola.

— Oi, meu bem. — cumprimentou ele dando um beijo na testa dela e jogando-se ao seu lado no sofá.  — Como foi seu dia?

— Oi, amor. — respondeu o olhando rapidamente. — Foi bom, minhas turmas hoje estavam calmas, e o seu dia?

— Foi péssimo. — respondeu sinceramente, encostando a cabeça no ombro da ruiva. — Teve briga na minha primeira turma depois do almoço, por culpa do meu atraso.

    — Mas você saiu da cafeteria mais cedo que eu, amor. 

— Eu sei. — Suspirou cansado e fechou os olhos, pensando em como responder. 

Não queria falar que tinha passado mal, de novo, porque sabia que ela iria se preocupar e ele odiava preocupá-la, mas se ele não contasse, ela ia acabar descobrindo de outra forma, se o embrulho em seu estômago já fosse uma indicação do que viria a seguir. 

— Tá tudo bem, Harry? 

— Uhum. 

— Tem certeza? — perguntou com a voz cética. — Você ficou pálido do nada. 

— É só um enjoo, amor, nada demais. — Respondeu ainda de olhos fechados, deixando que a voz dos atores o acalmasse. Sentiu o peso dela se movendo no sofá, e soube que agora ela estava totalmente focada nele.

— Hazz, você tá passando mal quase todos os dias. 

— Deve ser só um resfriado, amor. — respondeu calmo, abrindo os olhos e a encarando. Céus como alguém poderia ser tão lindo quanto ela? — Como foi a consulta da srta. Williams?

— Foi bem, o bebê está bem e ela também, mas Olivia só tem catorze anos, eu não consigo nem imaginar como ela deve estar se sentindo, ser mãe tão jovem assim, deve ser terrível.  — Ginny respondeu, colocando a mão sob a dele. — Você não acha que talvez...

— Talvez, o que?

— Não ri, —  pediu a ruiva o olhando séria, e ele assentiu, olhos fixos nela. — mas lá no hospital, vendo tantas pessoas grávidas, eu fiquei pensando, e se você estiver grávido?

— Ginny, isso é impossível.  —  Harry respondeu com uma risada nervosa.

Os dois sabiam que era, na realidade, muito mais que possível, os sintomas de uma gravidez estavam bem ali, diante deles, e não havia como negar que tinham uma vida sexualmente ativa, e eles estavam dispostos a tentar, na realidade estavam tentando, mas ainda assim… Ainda assim parecia absurdo demais pensar que poderia estar grávido principalmente quando ainda sentia que mal conseguia tomar conta de si mesmo. 

— Amor, você sabe que não é. 

— Eu não posso tá com um bebê dentro de mim, Gin. — respondeu sentindo seu pouco auto controle se esvair a cada momento da conversa. — Podemos não falar disso?

— Tudo bem, tudo bem. — concordou ela com o semblante de quem queria muito discordar. — Mas se não melhorar até o final da semana, a gente vai fazer um teste, ok?

— Okay, mas você tá sendo paranóica. 

— Eu só me preocupo com meu marido idiota que não tem senso de preservação. — ela respondeu batendo levemente no braço dele. — Você quer comer o que hoje?

— Achei que a gente não ia pedir comida hoje, vida.

— E não vamos, você vai cozinhar. — Ela respondeu com um sorriso inocente, enchendo o rosto dele de beijos delicados. 

— Eu vou? 

    — Sim, é seu dia de cozinhar. — Respondeu a ruiva com um sorriso, beijando a bochecha dele e o empurrando de leve. 

— Mas eu pedi a comida ontem!

— Porque quis! — retrucou a ruiva. — Eu ofereci pra fazer o jantar, mas você quis comer pizza, em plena segunda à noite, ainda por cima. — Deu de ombros e lançou um sorriso cheio de dentes em sua direção, para logo em seguida voltar para a pilha de papéis que havia abandonado na mesinha. 

— Isso não é justo, amor. — reclamou, já se levantando do sofá. — E se a gente pedir de novo? 

— Nope, não é saudável e sai caro. 

— Estraga prazeres. — resmungou já indo em direção a cozinha. 

— Eu ouvi isso, Potter.

— Era pra ouvir mesmo, Potter!

Entrou na cozinha e foi direto em direção à geladeira, não queria preparar nada elaborado, sequer queria comer alguma coisa saudável como Ginny sugeriu, se dependesse dele eles revezariam entre pizza, hambúrguer, yakisoba, sushi e comida indiana todo dia na hora do jantar. Sabia que se fizessem isso os salários deles nunca iriam render, e eles no mínimo iriam desenvolver uma diabetes, mas um cara pode sonhar.

— Amor, a gente precisa fazer compras. — Gritou após olhar os armários e ver que faltavam muitas coisas essenciais ali, como seu cereal favorito, e o pão integral que a ruiva insistia em comprar e mesmo tendo gosto de papelão de alguma forma sempre acabava antes do final do mês. 

— Eu sei, amor 

— Você colocou no meu planner?

— Coloquei. 

Olhou a geladeira por uns bons três minutos até decidir que iria fazer macarrão e uma salada qualquer, estava sem saco e ainda um pouco enjoado para pensar em qualquer outra coisa. 

Não conseguia imaginar como seria se estivesse de fato grávido, mas ao mesmo tempo não conseguia não pensar na possibilidade, que parecia ser mais verdadeira do que a história do resfriado que inventou pra si mesmo. Sabia que deveria apenas fazer o teste e acabar logo com a dúvida, mas fazer isso faria com que a sua dúvida de hipotética se tornasse algo real. 

Mesmo que ele não estivesse, o fato de comprar um teste fazia a possibilidade de acontecer em um futuro próximo ainda mais real, e claro, sua vida toda ele sabia que era capaz de produzir um ser humano do zero, mas por isso em prática parecia assustador demais. 

Fora que eles só tinham vinte e oito anos e moravam em um apartamento pequeno em um bairro que já tinha visto dias melhores, e apesar do apoio da família dos dois, ainda precisavam enfrentar pessoas preconceituosas todos os dias, e uma gravidez poderia apenas aumentar tudo isso. 

Por maior que fosse seu desejo de por uma criança no mundo, tinha muito medo do que o fato dele ser um cara trans e Ginny uma mulher trans poderia afetar a criança, e claro, esse problema não o preocuparia mais do que se ele fosse um cara cis caso não existisse a transfobia e a lgbtfobia. 

Como as pessoas podiam fazer com que um momento tão mágico quanto a produção de um ser humano fosse corroído pelo medo do que a sociedade era capaz? 

— Hey, amor. — Ginny o chamou colocando a mão em seu ombro. — Tá tudo bem?

Olhou assustado para sua esposa e só então percebeu que o jantar deles estava pronto, havia passado tanto tempo perdido dentro de seus pensamentos que sequer havia percebido o que estava fazendo. 

Encarou os olhos castanhos da mulher que amava e enxergou a menina que o encantou, que amou todas suas partes antes mesmo dele aprender a se amar. Ginny era tão responsável pela pessoa que ele havia se tornado quanto seus próprios pais. 

Não queria estar grávido, mas sabia que se fosse fazer isso, só poderia ser com ela.

— Eu te amo muito, sabia? — Falou ele suavemente envolvendo a cintura dela com seus braços. 

— Eu também te amo muito, Hazz.

 XXX

Sua primeira aula de literatura do último ano do ensino médio começaria em pouco mais de meia hora e Harry não poderia estar mais feliz, o que talvez fosse um tanto estranho para um adolescente de dezessete anos no último ano, o ano em que mudou toda sua vida, ficar feliz com o final do verão. O ano em que conheceu Ginny Weasley.

Harry, como todo londrino que se preze, amava o verão, afinal era durante esses meses em que finalmente conseguia sentir os raios de sol em sua pele e o, sempre cinza e nublado, céu de Londres era tingido de um agradável tom de azul claro. 

No entanto, não era muito estranho que ele gostasse de sua escola, afinal a Northridge Academy era uma escola alternativa que oferecia todo o tipo de suporte que alunos e professores precisavam, e ainda assim não cobrava rios de dinheiro, o que a tornava ainda melhor, ao menos era o que ele pensava na época. 

Estava parado há alguns metros da porta da sala de literatura inglesa avançada conversando com alguns colegas de classe sobre o verão, sua melhor amiga, Hermione Granger, não estava a vista, provavelmente havia parado na biblioteca para devolver os livros que pegou antes das férias, quando Remus fez um gesto para que Harry fosse até a sala.

— Remus, você precisa de alguma coisa? — Perguntou de forma automática, sem sequer olhar em direção de qualquer outra coisa que não fosse seu professor, o Lupin sorriu e inclinou a cabeça para o lado. 

Foi então que Harry a viu. 

E wow, aquela deveria ser a garota mais bonita que ele já havia visto em toda sua vida. Seus cabelos eram de um ruivo intenso, quase com fogo, suas feições eram bem anguladas como de quem pratica esportes com frequência, e a boca dela parecia estar sempre sorrindo, porém o que mais o impressionou foram os olhos, que apesar dele estar longe demais para conseguir ver todos os detalhes, já conseguia dizer que ela tinha os olhos mais lindos do mundo. 

Daquele momento em diante soube que sua vida nunca mais seria a mesma. 

— Harry, essa é Ginny, ela e o irmão, Ron, acabaram de chegar na academia. — explicou brevemente. — Eu já pedi à Hermione para dar um tour ao Ron, e se você puder fazer o mesmo com Ginny,  seria ótimo. 

Obrigado Remus, você é o melhor. Harry agradeceu mentalmente, afinal, não sabia se teria alguma chance de se aproximar dela caso o Lupin não tivesse sugerido isso. 

— Claro, professor, vai ser um prazer. — Respondeu animado lançando seu melhor sorriso aos dois. Ginny sorriu de volta e o coração dele bateu um pouco mais forte em seu peito. 

Eles saíram da sala em um silêncio constrangedor, sentia-se um idiota por não conseguir arrumar um tópico de discussão com ela. Deus, Potter, você não consegue ver uma menina bonita hein? Olhou furtivamente para seu lado e percebeu que ela mexia nervosamente na mochila, como se não soubesse o que falar também. Talvez ele ainda tivesse uma chance de causar uma boa impressão.

— Então, se mudou recentemente? — Perguntou o moreno num tom que esperava ser casual. 

     — Na verdade, não. — ela respondeu com um sorriso tímido. — Sempre morei em Londres. 

— Então por que mudou de escola? — Perguntou encostando-se em seu armário. 

— A gente não deveria estar fazendo uma tour pela escola?

— Er… uh… a gente pode se você quiser, fazer um tour rápido, mas, uh, a escola é meio grande, e, hm, a aula é em meia hora, então eu...er — Começou a falar envergonhado. Seu rosto estava extremamente quente e Harry tinha certeza que estava quase da cor dos cabelos dela. 

Ginny, no entanto, apenas riu e colocou uma mão em seu braço. 

— Relaxa, Harry, posso te chamar assim, né?, só ‘tô implicando com você. — A ruiva respondeu gentilmente, e ele sentiu-se relaxar um pouco. 

— Pode sim, posso te chamar de Gin? 

— Claro, mas eu não tenho um apelido pra você. — Respondeu com um sorriso tímido, colocando o cabelo atrás da orelha.

    — Com o tempo você pode arrumar um. — Falou confiante lançando um sorriso em direção dela. 

    Eles continuaram ali conversando sobre a escola, e sobre o tour que ele daria para a menina depois, mas o Potter era obrigado a admitir que sequer se lembrava do que haviam falado com detalhes, afinal estava ocupado demais olhando para os olhos castanhos dela.

    Eram de um castanho, quase como chocolate, do tipo que parece comum, mas que na verdade é tão lindo e merecedor de poemas declamados em voz alta no meio de uma praça pública quanto os olhos azuis, talvez até mesmo mais interessantes. 

    Ele não era nenhum poeta, nunca poderia se comparar com Emily Dickinson, Shakespeare ou Lord Byron, no entanto sabia que não só os olhos, mas como tudo que compunha Ginny, ao menos o pouco que já conhecia dela, era muito mais do que suficiente para inspirar duas centenas de obras literárias. 

    Apesar de não conseguir, nem se sua vida dependesse disso, escrever um poema que ilustrasse tudo o que via quando olhava nos olhos da menina, o poema ‘O brown eyes’ da escritora Ruby Archer, conseguiu, de alguma forma, descrever algo que chegava muito próximo ao que ele sentia e via ainda em sua primeira estrofe.

 

“O brown eyes, how warm you are

With look I may not meet,

Lest there I read too deep and far

A meaning wild and sweet.”

 

Após aquele dia, Harry e Ginny entraram em uma rotina de amizade fácil e simples, tinham muito mais coisas que esperavam em comum, os dois eram apaixonados por Alan Poe, sorvete de pistache e video games.

Era comum vê-los, junto de Hermione, Ron, e às vezes Luna e Neville, em um fliperama depois da aula, em um dos muitos cinemas ou na biblioteca estudando para as provas, eram um sexteto diferente e muito barulhento, principalmente quando estavam no fliperama e jogavam meninos contra meninas. 

    Havia encantado-se por Ginny quando a viu pela primeira vez, totalmente enamorado pelos cabelos e olhos, mas apaixonou-se de verdade quando o som da risada dela começou a ser o mais alto entre todos, quando suas mãos se esbarravam e eles trocavam sorrisos tímidos. Apaixonou-se por Ginny Weasley não só por sua beleza devastadora, mas também por tudo aquilo que a tornava um ser humano, por todos seus defeitos e qualidades reunidos.

No entanto, mesmo tendo percebido seu crush gigantesco por ela logo no primeiro dia que se conheceram, Harry demorou seis longos meses para chamá-la para sair pela primeira vez, quase chorou quando ela disse sim. Okay, talvez, ele tenha chorado um pouco. 

O primeiro encontro havia sido um completo desastre, o carro dele quebrou quando estavam indo em direção ao cinema, era um antigo que estava tendo uma exibição de clássicos do cinema mudo, no exato momento que havia começado uma chuva torrencial, e seus celulares ficaram sem área. 

Encharcados até os ossos eles precisaram a ir até o lugar mais perto para pedir um reboque, e para Harry ligar para sua mãe vir os buscar, o que só deixava a situação ainda mais humilhante, com lágrimas nos olhos virou em direção de Ginny pronto para pedir milhões de desculpa e quem sabe mudar de nome e começar uma nova vida nas Américas. 

No entanto, apesar de estar com a roupa toda encharcada, o cabelo pingando, maquiagem escorrendo dramaticamente pelo rosto e em pé no meio de uma loja conveniência que o aquecedor não funcionava, a ruiva estava sorrindo como uma criança em uma manhã de natal. 

— Gin, por que você está sorrindo? 

— Por que você não está?

— Eu acabei de estragar o nosso primeiro encontro. — Respondeu com a verdade óbvia, não entendendo onde ela queria chegar.

— Não, você não estragou, H. 

— Ginny, é sábado a noite a gente tá encharcado em uma lojinha esperando minha mãe. — falou frustrado e ela concordou com ele. — Como isso não é estragar tudo?

— Você não teve culpa de nada que aconteceu, H. 

— Mas isso não quer dizer que você precisa tá feliz com isso. 

— Eu sei. — ela deu de ombros. — Mas a gente sai em encontros pra passar o tempo juntos, e é isso que estamos fazendo. 

— Você realmente não está chateada?

— Claro que não, Harry. 

— Que bom. — disse, sentindo-se um pouco menos miserável. — Porque eu realmente gosto de você. 

— Bom, eu gosto de você, também, tipo, pra cacete. 

Ele sorriu e aproximou sua mão da dela. Ginny olhou para suas mãos que estavam quase se encostando e enlaçou seus dedos e o lançou um sorriso. Havia sido o pior encontro em tudo, mas aquele pequeno momento, tornou o pior encontro do mundo no melhor encontro da vida dele. 

Pouco menos de dois meses se passaram até Harry finalmente pedí-la em namoro.


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Notas finais do capítulo

Então é isso, eu espero que vocês tenham gostado da dinâmica desse casal, e do Harry professor de literatura auhauahu
Queria não ter pipocado e entregado como One, mas não rolou né auhauhauha, o capítulo 2 tá pronto, mas eu n sei ainda quando saí, mas minha última fanfic saí dia 25, então a gente vai se ver semana q vem de qlqr jeito heheh
Comentem e favoritem porque isso me faz feliz e eu provavelmente vou me inspirar mais se souber se tô fazendo um trabalho okay.
Boa semana e até maiss♥



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