NO GOD: But vampires yés escrita por Diego Farias


Capítulo 9
Capítulo 9: O Galhudo


Notas iniciais do capítulo

O melhor capítulo até agora.
Ele expande o worldbuilding, mergulha no misticismo e trás uma dose de Terror gostosa.
Cara! Um capítulo que eu não fazia ideia de como começar e no fim, eu estava urrando de tanto orgulho.



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 “O meu amado é semelhante ao gamo, ou ao filho do veado; eis que está detrás da nossa parede, olhando pelas janelas, espreitando pelas grades”. Cantares 2:9

    Sany foi contando que após a aula de introdução à criaturas da noite, ela seguiu para o segundo andar, onde ficavam a maior parte dos alunos interessados nas Artes Ocultas. Segundo ela, a euforia foi dando lugar a um sentimento de insegurança, ao ver tantos adolescentes esquisitões e de visuais bem pesados.

  Ela segurava os seus livros contra o peito e tentava não fazer contato ocular. E semelhantemente aos alunos da aula de runas antigas, grande parte dos alunos tinha um visual bem punk-rock, com feições amedrontadoras e olhares mortais.

   ― Ué... ― ela exclamou em dúvida, percebendo que a sala onde ocorreria Introdução à Wicca estava completamente vazia. ― Será que eu baixei os horários desatualizados?

  ― Vamos caloura!

   Sany descreveu a voz aguda que havia acabado de se dirigir a ela, como um som de taquara rachada. Ela se virou, receosa, pensando que todos aqueles punks raspariam sua cabeça como trote, mas respirou aliviada ao notar que se tratava apenas de uma garota.

  Sany disse que ela era muito branca, tipo, a lembrança que a nós tínhamos da lua cheia. Era loira e usava os cabelos trançados ao melhor estilo maria-chiquinha. Usava um macacão preto com uma blusa branca de manga por baixo, delineador nos olhos e um batom preto que deixava sua boca carnuda.

   ― Prazer! Me chamo: Nataly Osborn e sou a responsável por levar todos os calouros desavisados para a primeira aula da Srta Kaliman.

  ― Desavisados? ― a futura bruxa levou como ofensa. ― Eu não tenho culpa se mudaram o local em cima da hora.

  ― Você tem acesso ao e-mail da turma? ― a caloura levantou as sobrancelhas e a veterana riu. ― Pois é, foi o que eu imaginei. Vamos! A primeira aula de introdução a Wicca sempre é na estufa.

   Sany decidiu seguir a veterana em silêncio. Se perguntou várias vezes se aquela garota era realmente uma veterana pronta para ajudar ou se estava indo direto para algum ritual para servir de sacrifício. Elas entraram no elevador e subiram alguns andares até saírem na estufa.

  Sany ficou maravilhada com a estrutura a céu aberto. Uma redoma gigantesca de vidro blindado com diversas runas pintadas que brilhavam de tempos em tempos, como se escaneassem os presentes à procura de quem queimar. 

  ― Olá, Nataly! ― disse uma jovem negra, alta, de cabelos alisados. Sany parecia estar olhando para uma deusa africana. Nunca tinha visto uma mulher tão imponente. ― De babá, de novo?

  ― Sabe como é, Dinger! Tenho que ter horas de monitoria, né?

  ― Não vi nenhum calouro promissor. ― ela encarou Sany de cima a baixo e a futura bruxa ficou indignada que a veterana torceu o nariz. ― Nenhum deles tem o dom natural para a magia.

  ― Não perca as esperanças, irmã! Boa aula!

  ― Runas? ― ela revirou os olhos. ― Que tortura.

   Assim que a bruxa veterana entrou no elevador, Sany fez o som que parecia ser o som de um vômito. Nataly riu e deu um tapa de leve nas costas da garota, direcionando-a para dentro da estufa.

  Sany sempre foi uma menina estranha e psicótica. Assim que seus olhos pousaram na senhora gordinha e baixinha, com cabelos pegando fogo, ela sabia que estava de frente para Jean Kaliman, uma famosa herbologista que muito contribuiu para a comunidade bruxa, após o avanço das criaturas da noite.

  Apesar disso, a jovem bruxa estava insatisfeita. Sany tem um fetiche estranho por folhas de papel ou papiros. Ela gosta de quadros cheios de nomes, datas e histórias enfadonhas sobre gente que já morreu a tempos. Ter uma especialista em plantas, lecionando uma matéria histórica para ela, era no mínimo, ultrajante.

  Jean vestia uma espécie de manto vermelho com mangas largas que dava a impressão que ela ia voar, toda vez que abria os braços. A bruxa era ainda mais duvidosa ao vivo do que no seu lattes. Sany me fez rir ao afirmar que ela tinha um cheiro peculiar que lembrava incenso de lavanda e vodka.

  Ela tentou analisar os outros alunos e nenhum deles parecia incomodado ou ofendido com a escolha do mestre da cadeira. Então, ela sentou-se num banco alto, apoiou-se na bancada, abriu o fichário e encarou a professora com todo o seu descrédito.

   ― Srta Kaliman! ― Nataly segurou o riso ao ver a cara de tristeza da professora, ao si ver, interrompida no meio da declamação de um poema aos espíritos das irmãs queimadas nas fogueiras da inquisição. ― Eu estou em dúvida de como a herbologia vai cumprir com os objetivos do curso.

   Jean abriu um sorriso tão esquisito que Sany presumiu que ela estivesse bêbada. Ela se aproximou da caloura e pegou em suas mãos sem permissão, colocando-as sobre seu próprio peito. A garota ficou constrangida, enquanto a maior parte da turma riu.

   ― Qual é o seu nome, irmã?

  ― S-sany... ― ela engoliu a saliva e estava a ponto de mijar nas calças, achando que a bruxa doida iria comê-la. ― Sany Meyers.

  ― Querida, Srta Meyers, sugiro que use essa essência de Yerba Santa para abrir a mente. ― Sany ficou pasma que a professora colocou um frasco de essência dentro de sua mão e a fechou. ― Todo ano, algum aluno questiona a minha capacidade de ministrar essa matéria, por isso, eu marco esse encontro na estufa, porque Wicca não é sobre datas ou pessoas. Não se memoriza, Wicca, se vive.

  ― Parece que alguém ganhou um perfume novo! ― Nataly debochou.

  ― Ah, cale a sua boca! ― Sany ralhou, mas riu.

  ― A Wicca sempre existiu. É conhecida como a religião mais antiga no mundo que celebra o Deus e a Deusa, o macho e a fêmea, A Mãe e o Viril. O útero e o Galhudo. ― ela voltou a recitar, mas com um borrifador nas mãos.― E antes que eu ensine vocês sobre essa história, vocês precisarão ver, não apenas com seus olhos, mas com todo o corpo. Vou transportá-los até lá.

  ― A velha ficou doida.

   Sany e alguns alunos mais céticos abriram sorrisos debochados das borrifadas que a bruxa dava no ar, enquanto entoava um canto numa língua indecifrável.

   ― O quê?

   A garota sentiu seu corpo ressoar. Era como se as batidas do seu coração vibrassem pelo corpo todo. Ela sentiu a pupila de ambos os olhos dilatarem-se e a claridade começou a incomodar bastante, assim como o zumbido no seus ouvidos.

  Ela segurou a sua cabeça e tentou gritar, mas a voz não saía. Ela desequilibrou-se e nem sentiu a cabeça bater contra o chão, apenas abriu os olhos e viu a floresta.

  Sentou-se, completamente, perdida e assustada. Estava no meio de um campo cercado com árvores, no meio de uma noite nebulosa de lua cheia. A luz cândida caía sobre o vale e parecia ser absorvida pela pele. Sany podia sentir... prazer? Tocando a terra e passeando com seus dedos sobre a grama e as raízes.

  Seus pulmões dilataram-se a ponto dela perceber as moléculas de oxigênio. Podia sentir o cheiro de eucalípto e de uma variedade de plantas ao redor. Seu sangue corria rapidamente pelas veias, trazendo junto com a adrenalina, uma vontade ímpar de correr.

   ― Mas que merda é essa? ― foi aí que ela percebeu que estava completamente nua.

   A garota tapava-se, assustada, ainda mais ao perceber que não estava sozinha naquele sonho esquisito. Todos os calouros do primeiro ano estavam espalhados por aquele campo e começavam a recobrar a consciência e se desesperavam, assim como ela.

   ― CONTROLEM-SE! ― se Jean com roupas era tenebrosa, imaginem nua. ― Wicca é uma arte natural. Roupas são condições humanas. Estamos aqui pra celebrar o divino e ele logo vai aparecer para escolher os dignos e abertos para o seu poder. Preparem seus corações e almas. O Galhudo vai aparecer hoje.

   Ela começou a descer o campo até uma clareira com um altar de pedra. Sany ficou imóvel até Nataly surgir de detrás dela e puxá-la pelo braço.

   ― O que é isso? Ela nos drogou?

  ― Sim e não. ― a veterana sorriu. ― Mas isso não importa agora. Você não vai querer perder o grande show.

   Sany e todos os alunos acabaram por descer o campo e se reuniram ao redor da professora que celebrava a lua em silêncio. Em sua mão direita havia um punhal de prata e com ele, ela abriu uma fenda na mão direita e deixou o sangue correr sobre o altar, enquanto dançava ao seu redor. Um vento começou a assobiar e correr pela clareira e logo, todos estavam dançando enebriados.

  Sany parecia ser a única que não havia caido sobre o efeito daquela droga. Ela conseguiu penetrar no círculos de dança e se encaminhou para o altar. Mesmo nua, ela debruçou-se revoltada sobre o altar e vociferou para a professora que parasse com toda aquela loucura, mas a srta Kaliman parecia envolvida por um êxtase ainda mais profundo que todos os seus alunos.

   ― Srta Kaliman! Por favor, acorde! Alguém vai se machucar! ― o vento começou a soprar com mais força, a ponto das tranças de Sany cobrirem o seu rosto. ― ACORDA!

   Bastou que a caloura tocasse a mão da professora sobre o altar, para que Sany percebesse que aquela não era mais a sua professora. Quem estivesse usando o corpo da srta Kaliman, segurou Sany pelo pulso e a encarou com aqueles olhos vermelhos sangue e um sorriso de um predador de frente ao seu lanche.

  A garota tentou gritar, mas da sua boca não saiu som. Ela contemplou todos os alunos desmaiando sobre a relva e se desesperou ao se ver sozinha com aquela entidade.

   ― Faz muito tempo! ― Sany caiu de bunda no chão ao ouvir aquela voz gutural e sinistra. ― Parabéns, criança. Você vai servir.

   A menina tentou correr, mas a entidade sacou a sua mão direita, fazendo o movimento de pegar e a garota se viu paralisada. Ela podia sentir os dedos dele enrolados em seu pescoço, mesmo com ele à metros dela. Ela ouvia o som dos seus passos que mais pareciam o som de cascos batendo contra a pedra.

   ― Você não está pronta ainda criança! Mas um dia, você será a noiva que gerará o meu herdeiro. Você será cercada de adorno e riqueza, de amor e vitalidade, os nossos descendentes contarão a sua história por toda eternidade.

   Ele surgiu no campo de visão da jovem paralisada e abriu um sorriso caridoso. Sany era apenas pavor e apenas fechou os olhos, quando ele esticou o dedo para tocar-lhe. Ao atingir a sua testa, os olhos da caloura se abriram, se arregalaram e perderam toda a melanina, até se tornarem, totalmente brancos.

  E de repente, a sua mente foi transportada para outro lugar.

  Ela se viu com um belo vestido branco de noiva, mais velha e alta. Seus cabelos eram trançados com fios de ouro, alguns galhos silvestres e estavam cheios de flores. Ela segurava um buquê de rosas vermelhas e encarava apaixonada o seu futuro marido.

  A divindade com tronco de homem, cabeça de bode e chifres de galha, bufava apaixonado, enquanto acariciava o rosto da sua amada. Ele vestia um terno branco de linho puro e não usou nada para vestir as pernas de sátiro.

  Sany o beijou e eles foram aplaudidos por vários fiéis. O galhudo segurou nas mãos de sua esposa, afastou-se um pouco dela e alisou a barriga protuberante que ela exibia. A trouxe para perto de si novamente e ambos encararam um carvalho gigante e antigo.

   ― Sany...Sany....

   A garota abriu os olhos, abruptamente. Ela viu um mar de pessoas sobre ela e quando se sentou, mesmo tonta, percebeu que estava de volta à estufa. A srta Kaliman estava ajoelhada aos seus pés e parecia assustada.

   ― Você nos drogou! ― disse.

  ― Não, Sany... Era apenas uma solução de Aipo. Ela abre a mente para a meditação e clarividência. O que você viu?

   Um aluno ajudou a jovem a se levantar e Sany começou a derramar algumas lágrimas só de repassar toda a sua experiência sensitiva. Se ela fechasse os olhos, lembrava completamente da sensação dos olhos da divindade sobre si, o seu hálito e a sensação de ser estrangulada por ele.

   ― O Galhudo! ― a bruxa arregalou os olhos. ― Ele falou comigo.

  ― MENTIRA! ― gritou Nataly atrás de si. ― Isso é mentira! Como ousa profanar o Gamo Rei? ― os alunos abriram caminho para a veterana que veio para cima de Sany com o ódio estampado no rosto. ― Ele não se mostraria para uma não iniciada! Ele não!

  ― Sany! ― a srta Kaliman a puxou para perto de si e lhe entregou algo para beber. ― Tome isso! Vai cortar o enlace sensorial. ― a garota obedientemente bebeu a solução que foi lhe dada. ― Agora, me diga: O que ele disse? 

  Sany olhou a veterana que antes fora tão gentil, agora, encarando-a com tanto desafeto. Sua cabeça doía e seus sentidos pareciam estar uma bagunça. Sentia que ia desmaiar a qualquer momento.

  ― Ele disse que era eu. ― a professora tapou a boca. ― Disse que eu era a sua noiva.

  ― MALDITA! ― gritou Nataly sacando um punhal de prata. ― EU VOU TE MATAR, SANY MEYERS! EU VOU TE MATAR!

   A bruxa veterana foi contida, rapidamente, pelos outros alunos. A srta Kaliman puxou Sany para trás de si e ordenou que levassem a monitora para a sala do senhor Portman. Ela queria mais um tempo e saber mais detalhes da visão, mas a caloura desmaiou logo em seguida.

  Quando acordou novamente. A noiva do galhudo abriu os olhos devagar e tentava reconhecer o local em que estava, mesmo envolvida por uma grande tontura. Demorou para o cômodo entrar completamente em foco, mas quando entrou, ela percebeu que estava na enfermaria.

  Suzy Raymond era o nome da enfermeira de plantão. Era uma mulher negra, alta, corpulenta que usava um hábito. Ela se aproximou de Sany e checou alguns dados de sua saúde com a menina. Fez algumas perguntas sobre o ocorrido, mas a futura bruxa mentiu em todas.

   ― Você vai ficar em observação por mais alguns minutos, se tiver um telefone é melhor ligar para os seus pais virem buscá-la! Eu tenho que dar alguns pontos num rapaz que acabou de chegar todo machucado do laboratório.

   A freira enfermeira saiu e a menina aproveitou a chance de se livrar do aceso pelo qual tomava soro, descer da cama e colocar suas roupas e esperar por uma brecha para fugir de lá.

   ― Ela disse para você descansar! ― disse uma voz grave do outro lado da ala.

  ― Não precisa se preocupar. Estou ótima.

  ― Mas se seu corpo frágil se degenerar, ele ficará muito chateado.

   Sany encarou a cortina branca que separava os leitos com apreensão. Seu corpo ressoava como um sino, de medo. Algo lhe dizia que era da visão que acabara de ter, que aquela jovem estava falando.

  Porém, a curiosidade fora maior que o medo. Ela começou a andar lentamente, mas com os olhos atentos. Por um momento, pensou que fosse Nataly e levantou a sua guarda para lutar contra a bruxa louca.

   ― Você? ― disse incrédula.

  ― Pelo visto, eu me enganei... ― disse Dinger Mcphee deitada na cama com um grande curativo na cabeça. ― Temos uma jovem muito promissora. Seja bem vinda, irmã.

  ― Eu não sou nada sua! E como sabe do que aconteceu? Foi a Nataly?

  ― Ele me contou. ― Sany queria duvidar, mas se Dinger estivesse mentindo, ela era muito boa nisso. ― E para que você se torne a noiva do Galhudo, você precisará de suas três irmãs, Sany Meyers.

  ― Que pena! ― ela exalava deboche. ― Eu sou filha única.

  ― Eu também reagi como você, quando ele me chamou. Mas se ele a escolheu, Sany, é porque ele vê em você a mesma coisa que viu em mim: fome. Não física, mas de poder.

  ― Olha... Eu só quero que fique longe de mim, o.k?

  ― Quinta feira, na Torre Abandonada! ― a garota nada entendeu. ― É onde estudamos os pergaminhos e a magia da cidade natal de todas as bruxas. Assim que estiver pronta.

  ― Dinger, né? ― a veterana confirmou. ― Nem adianta usar os pergaminhos da antiga Salém para me tentar, eu não...

  ― Não, irmã... ― e essa coisa de parentesco estava acabando com a paciência da Meyers. ― Os pergaminhos que vou lhe mostrar, são os manuscritos das bruxas que fundaram Salém. ― O.k. Atenção capturada. ― Se quiser poder, precisa voltar a raiz do poder.

  ― E onde fica a raiz do poder?

  ― Geograficamente, ninguém sabe, mas em algum lugar da Europa. Apenas o nosso sangue é a confirmação de que sempre existiu.

  ― Está me dizendo que nós fazemos parte de uma linhagem de bruxas?

  ― E não de bruxas quaisquer, mas as bruxas primais! As bruxas de Shadowville.


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Notas finais do capítulo

Alguém ta sentindo o mesmo frio na espinha? Mano! O que foi isso? O.O



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