A Teia escrita por Herock


Capítulo 1
Capítulo 1




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Eis Peter Parker - um jovem sem talentos, mas com um QI avantajado.

Muito humilde. Você deve estar pensando. Falando de si mesmo na terceira pessoa, como se você soubesse que tem um QI avantajado.

Veja bem, caro amigo, eu não tenho provas científicas deste meu QI enorme, até porque tenho uma preguiça da porra de ir fazer esse teste, e aqueles que a gente têm na internet não são lá muito confiáveis. Então é a minha palavra contra a sua.

 

Tenho quinze, primeiro ano do ensino médio, sou o típico nerd, óculos, franzino, pequeno e fraco, meu melhor amigo sou eu mesmo, não confio em ninguém além da conta, as pessoas têm a linda tendência de me desapontar.

Moro com a minha tia May e o seu marido, Ben, para mim eles são como uns pais, até porque eu nunca tive pais de verdade. De boa, não precisa ficar tendo pena de mim por isso, eu já superei isso faz tempo. Na verdade nunca tive muito tempo de lamentar a morte deles, porque se foram tão cedo que eu nem lembro do seu rosto.

Tá bom. Ninguém gosta de introduções longas, então vamos logo para a minha história.

 

A pandemia trouxe diversos problemas para mim, não que o distanciamento social fosse algo que me trouxesse muita tristeza, eu meio que já o praticava antes disso, prefiro bem mais um livro ou um videogame do que companhias chatas a quilômetros da minha cama. 

Mas ao meu amigo Harry sim, nós nos conhecemos há muitos anos, estudamos juntos desde bem jovens, e, apesar de Harry ter tido uma criação totalmente diferente da minha, o fato do pai dele ser um mega-rico totalmente negligente quanto aos problemas do mundo, meio que influenciou isso, o garoto era meio problemático, mas eu sabia que no fundo ele tinha a bondade dentro de si.

Para Harry, assim como para a sua família, nunca houve muito bem essa questão de isolamento social, e devo confessar que para o tio Ben também não, tia May vivia brigando com ele porque ele saia para beber com os amigos, para ir comprar qualquer coisa no mercado, enfim, tio Ben procurava qualquer motivo para não estar em casa, a pandemia o estava sufocando, eu acho.

Mas sim, voltando a questão de Harry, basicamente em uma festa com seus amigos, ele acabou pegando a doença maldita, a qual eu nem tenho muita vontade de dizer o nome, e com ele ocorreu tudo bem, e mesmo o pai dele sendo um homem saudável, ele acabou pegando a doença e partiu.

Harry ficou muito triste, eu não tive coragem de ir vê-lo, veja, tia May e tio Ben já são muito idosos e não os quis expor dessa maneira, mas liguei para meu amigo e expressei a ele as minhas condolências, ainda nos falavamos todos os dias por mensagem e as vezes ligávamos um para o outro, mas eu mal sabia o que falar, apenas falei frases reconfortantes.

Eu nunca fui um homem muito religioso, mas depois disso passei, todas as noites, pedir a não-sei-quem proteção para mim e para os meus, além de ajuda para o meu amigo passar por aquele momento incrivelmente difícil.

Mas a gente não manda nos outros. Harry já estava triste com a morte de Norman, e creio que isso só prejudicou a sua situação, todos os dias, praticamente, ele estava em festas, com pessoas que não conhecia, se expondo e expondo a sua mãe viúva, Martha. Eu me rebelei contra a crença, apesar de que os meses que passei cultuando não-sei-quem, tenham me tornado uma pessoa mais a par de que se há uma certeza é de que não estamos sozinhos nesse universo, e que se o mundo é tão perfeito quanto é, se nós respiramos, é porque uma força maior nos criou. Pense que, se um átomo estivesse fora do lugar, a vida jamais existiria. Veja, eu sou, teoricamente, um cientista, mas para mim, o universo é perfeito demais para ser uma simples obra do acaso, para mim, alguém teve que dar um empurrãozinho para que tudo acontecesse.

E era a esse alguém que eu pedia, todas as noites, proteção aos que eu amava, mas Harry não parecia ser afetado por minhas preces, e sempre estava pior e pior, na sua loucura de expôr a sua mãe, doente e viúva.

Enfim, o pior passou e eu encontrei Harry, e toda a minha raiva por meu amigo se dissipou. Ele não é de ferro, eu pensei. O garoto sofreu, mas ao seu modo, e o seu escape foi aquele. Isso não justifica ele ter exposto tanto a mãe, mas eu não conseguia mais sentir raiva de meu amigo, por lidar com a morte de um ente querido da forma que lidava.

Até que ele marcou uma festa na minha casa.

Harry sabia que eu era contra tudo aquilo, embora já estivesse flexibilizando a minha vida, saindo de vez em quando com alguns poucos amigos, ainda não sentia confiança de ir aos lugares, de estar sem máscara com pessoas que eu mal conhecia. Mas Harry não ligou para nada disso, era pra ser um pequeno encontro de amigos: Eu, Harry, Ned, Thomas, Michelle e Henry. Mas Harry chamou não só a namorada Gwen, como também outras pessoas, como seu amigo Robert, que eu jamais havia encontrado na vida e uma amiga de Gwen, Betty.

Eis o que aconteceu: Eu me sentia deslocado e desconfortável em minha própria casa. Tio Ben e tia May haviam viajado para passar o fim de semana em Jersey com alguns parentes e a casa era toda minha, mas eu não sentia como se estivesse em meu lar.

Um momento foi inevitável e eu tive que sair de casa. Não me importava em deixá-los todos lá, eu não queria estar em um lugar que não queria, com gente que não queria. Já tinha relutado em deixar todos eles entrarem em minha casa, agora sabia que a minha relutância era bem fundada, as pessoas haviam me decepcionado de novo.

Muitas vezes eu já pensei que talvez o problema fosse que eu botava demais expectativas nos outros, e isso acabava fazendo com que as expectativas não atendidas fossem uma força motriz da minha frustração com os outros.

Mas, paranóia ou não, lá estava eu, no quintal de minha casa, deslocado em meu próprio lar, observando uma velha aranha tecendo a sua teia, na qual havia uma pequena mosca, se debatendo, implorando pela sua vida, enquanto, lentamente, o aracnídeo se aproximava e abria a sua boca.

Porém, antes que a aranha abocanhasse a sua presa, eu, como bom herói que sou, dei um tapa, destruíndo a teia e matando tanto a aranha quanto a mosca.

Tudo bem, talvez eu seja um anti-herói.

E agora éramos nós três, eu e dois cadáveres: o de uma mosca e o de uma aranha, deslocados, no quintal de nossa casa.


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