A fada que o escreva escrita por Creeper


Capítulo 10
O fim dos caixões de Redrock


Notas iniciais do capítulo

Hey!
Como foi a primeira semana de 2022 para vocês? Espero que tenha ocorrido tudo bem e aqui vai nosso primeiro capítulo do ano ♥

Tenham uma boa leitura!



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Em um único e majestoso golpe, Aurora partiu as correntes que aprisionavam Lissa, espalhando faíscas alaranjadas pela sala juntamente a um tinido enferrujado. A loira caiu de joelhos, suspirou pesadamente e avaliou os braceletes de ferro em seus pulsos com o que sobrou das correntes.

— Sabia que viria me salvar. – Lissa deu um sorriso franco.

Aurora emitiu um muxoxo, girou o machado nas mãos e estufou o peito.

— Vão. – Dante ordenou estalando sua corrente no piso.

Balancei a cabeça em afirmação, corri ao encontro de Lissa e a ajudei a se levantar, tratando de dar apoio ao seu corpo quando ele pendeu fracamente.

— Aurora... Boa sorte! – Lissa gritou quando a empurrei para dentro do túnel.

Nos arrastamos pela passagem apertada e úmida, deixando que os rosnados dos demônios e os barulhos das armas ficassem para trás. A mulher encarregou-se de deitar as costas no túnel e chutar com uma força absurda a tampa do caixão que o fechava, jogando-a para o centro da loja e partindo-a em um estrondo ao atingir o chão.

Saltamos para fora da passagem e prestes a sair pela porta esburacada, notamos algo crucial: ela estava aberta. Meu maxilar ficou tenso e meu corpo paralisou por um instante sob a presença de outra pessoa na loja.

Estava parado em um canto com os braços atrás das costas e um manto preto caindo sobre seu tronco e arrastando a barra no chão. Possuía entradas no cabelo cobre, cavanhaque escuro e sobrancelhas finas.

— Então temos intrusos. – sua voz soou grave. – E um ajudou você a se soltar. – semicerrou os olhos negros que esboçavam desgosto.

Lissa jogou a franja para longe do rosto, franziu as sobrancelhas e cerrou os punhos cheia de determinação. Eu havia percebido que Aurora era alta, porém, Lissa era do tipo que facilmente atingia os 2 metros de altura.

— O que você achou? Que eu morreria e viraria mais um de seus experimentos? – ela sorriu desafiadora.

O homem andou lentamente pela loja, olhando-nos como se fosse um lobo faminto e nós suas presas.

— Eu já te prendi mais cedo. Não será difícil fazer isso outra vez. – tocou o pequeno machado acomodado em seu cinto.

Senti um estalo na cabeça e ao ver Lissa ranger os dentes e a maneira como as gotículas de suor escorriam por sua pele pálida, notei algo que não conseguiria ver nunca no escuro: uma mancha de sangue em sua cintura por debaixo do rasgo no corpete de couro.

— Acha que isso é o suficiente para uma gigante, Redrock? – a exploradora riu do fundo da garganta.

— Você quem escolhe. Se não aceitar voltar para onde nunca devia ter saído, terei que colocar alguém no seu lugar. E será alguém menor e mais fraco. – seu semblante maligno focou-se em mim.

Cerrei os dentes, segurei o bastão em frente ao corpo e pressionei o botão, permitindo que suas extremidades crescessem. Não que aquilo fosse dar conta de um machado, mas já era alguma coisa.

— Você pode tentar. – franzi as sobrancelhas.

A expressão de Redrock endureceu-se mais do que eu achei possível e em questão de meio segundo, seu corpo veio a toda velocidade em minha direção, movendo-se feito um vulto preto entre os destroços de madeira. A lâmina de seu machado brilhou ao ser levantada e pela posição de seus braços, ela seria cravada em meu ombro.

Mantendo os dentes rangidos a ponto de quase quebrá-los, abaixei-me e inclinei-me contra seu torso, usando o bastão para atingir seu estômago com toda minha força. Seu corpo cambaleou para trás e ele cuspiu no chão sem tirar os olhos de mim um momento sequer.

Soprei a mecha de cabelo que caía em meus olhos e corri para cima do homem, planejando acertar o topo de sua cabeça, contudo, seu antebraço surgiu a tempo para protegê-la e sua outra mão agarrou minha arma, puxando-a e levando-me junto. Meus pés tropeçaram em algumas tábuas e eu fui ao chão, caindo sentado.

Redrock ganhou um ar de imponência ao ter a posse de meu bastão e parti-lo em seu joelho, além de jogar seus pedaços para longe com toda a superioridade do mundo. Contive um grunhido de raiva, aquele foi o melhor bastão que Gaspar já me deu.

Sem tempo para lamentações, observei o homem puxar seu machado e caminhar a passos lentos até mim como se quisesse me torturar com a ideia de que eu não tinha mais como me defender.

Conseguia escutar o sangue bombeando em meus ouvidos e o coração batendo de maneira insana. Tudo girava a minha volta e o suor borrava minha visão.

Arfei e algo luminoso e trêmulo chamou minha atenção. Na bancada ao meu lado, três velas derramavam sua cera em pratinhos amassados de alumínio enferrujado.

Redrock fez menção de agarrar minha perna, todavia, a encolhi e devolvi-a no balcão com um chute violento, fazendo todas as coisas em sua superfície tremerem, principalmente as velas que tombaram sobre o móvel.

Lissa arregalou os olhos e fez o mesmo com outra bancada que estava ao seu alcance, derrubando todas as velas que conseguiu. Logo a madeira começou a ser consumida por pequenos pontos alaranjados e o cheiro de queimado preencheu o local.

— Acha que isso vai te salvar? – o homem gargalhou. – Você já está morto por ter nascido no mesmo mundo que eu. – encarou-me com ódio.

— Posso até estar, mas não é você quem vai me matar. – rosnei.

Puxei uma das tábuas jogadas no chão e acertei-a nas pernas magrelas do dono da loja, arrancando-lhe um grito entredentes e obrigando-o a se curvar de dor. Ergui-me em um pulo e tateei o interior de meu sobretudo apressadamente.

Não havia mais bombas de Pó das Mil Noites, entretanto, eu não precisava daquilo quando tinha outra coisinha. Ao recuperar-se do golpe e endireitar sua postura, as mãos de Redrock pararam em meu pescoço, apertando-o com suas unhas compridas e sujas.

Antes que o ar me deixasse e eu ficasse roxo, atirei em seus olhos um punhado do que havia pegado em meu sobretudo. Ele os fechou instantaneamente e largou-me para esfregar suas pálpebras de modo raivoso.

Obrigado, Gaspar, por nunca temperar a comida e me fazer levar pimenta moída para todo lugar.

Sem tempo a perder, corri para perto de Lissa e a puxei pela mão, conduzindo-a até a porta. Seu corpo começava a ficar lento e pesado e sua respiração estava ofegante.

— Espera, e os exorcistas? – ela vislumbrou as chamas que cresciam à medida que devoravam a madeira.

— Seu maldito! – Redrock berrou e abriu os olhos avermelhados.

Havia um círculo de fogo em volta de seus pés e as labaredas eram tão altas que eu não ousaria pulá-las. Tendo a confiança de que ele não nos seguiria, passei um dos braços de Lissa por meus ombros e segui a passos largos, apenas o suficiente para nos afastarmos da loja.

— Eles vão escapar pela porta que há na sala circular. – olhei-a no fundo de seus olhos castanhos claros. – Agora, precisamos cuidar disso... – baixei o olhar para seu machucado, assustando-me ao ver mais sangue.

— Aurora mandou irmos para a pousada. Lá estaremos seguros. – sua voz vacilou.

— Não, precisamos ir a um médico. – puxei de dentro do bolso um pedaço de tecido branco e o pressionei em seu ferimento, manchando-o totalmente de vermelho.

— Isso seria óbvio para o Redrock. Ele vai atrás de nós cedo ou tarde. – Lissa respirou fundo e colocou a mão no tecido. – É só um corte, podemos cuidar disso sozinhos. Você é um explorador como eu, não é?

Assenti rapidamente.

— Então se lembra do terceiro ano na guilda, certo? Sobre como tratar ferimentos...

Meu coração falhou uma batida e meus membros perderam a força.

— Eu pulei o terceiro ano. – respondi desesperado.

— Não me diga que você é o Whitlock. – ela fez uma careta, igualmente desesperada.

Mordi o lábio inferior e olhei ao redor buscando por qualquer coisa que pudesse nos ajudar. Estávamos escondidos atrás de uma árvore na praça da cidade, apoiados em seu grosso tronco e pisando em suas monstruosas raízes que saíam do chão, se olhasse para além das folhas, veria a fumaça saindo da loja de caixões.

— Tem uma parteira na pousada, talvez ela possa dar um jeito. – Lissa assentiu cansada.

A pousada não era tão longe, todavia, a mulher pesava e seu corpo caindo sobre o meu me fazia temer que iríamos ao chão a qualquer segundo. Nós dois arfávamos e suávamos ao chegar na porta da singela construção onde fomos recebidos por uma senhora assustada.

— Não conhecem o toque de recolher?! – ela trajava uma longa camisola azul. – Ai, meus deuses! – ficou sem ar ao ver o estado de Lissa.

— A parteira ainda está hospedada aqui? – Lissa retirou seu braço de meus ombros e encostou-se na parede.

— E-Ela está dormindo... Eu vou chamá-la! F-Fique aí! – e disparou escada acima.

Lissa quis fechar os olhos durante os poucos segundos que se passaram até a parteira chegar, então me encarreguei de dar-lhe tapinhas no rosto para mantê-la consciente.

A parteira desceu as escadas correndo e segurando a barra de sua camisola. Diferente da dona da pousada, não se mostrou surpresa, apenas adquiriu uma feição séria e ordenou que levássemos a exploradora para um dos quartos vagos do primeiro andar.

Lissa foi deitada na minúscula cama de solteiro que deixou suas botas de cano alto para fora. A parteira segurava uma pequena caixa de ferro e mandava a senhora sair do quarto diversas vezes para pegar uma coisa ou outra.

— E você, nos dê licença. – lançou-me um olhar de repreensão.

Fiquei receoso em deixar Lissa, contudo, respeitei a ordem e fiquei do lado de fora, permitindo que minhas costas escorregassem pela parede e meu corpo caísse sentado no chão.

Suspirei exausto e torci para que Dante, Sybelle e Aurora voltassem logo. Enquanto mantinha a cabeça entre os joelhos e remexia meus pensamentos, a porta se abriu e a parteira saiu acompanhada da dona da pousada.

— E então? – levantei-me desajeitado.

— Ela vai ficar bem. É uma mulher surpreendentemente forte. – olhou para o vão que deixou na porta. – Pode entrar agora e me chame se precisar, boa noite.

Adentrei o quarto e avistei a mulher que eu pensava estar dormindo, mas pelo contrário, encontrava-se lendo um mapa sob a luz de uma vela solitária colocada na cabeceira.

— O que está fazendo? – fechei a porta atrás de mim e aproximei-me horrorizado. – Devia estar descansando.

Sua camisa que algum dia foi branca estava levantada até abaixo do busto e uma faixa percorria toda a sua barriga. Ela fez um gesto para que eu chegasse mais perto, ainda que não tirasse os olhos do papel gasto.

Acomodei-me ao seu lado no colchão e as palavras sumiram quando vi que o mapa era idêntico ao que vimos no subsolo do consultório.

— Roubei isso em um restaurante em Barradas onde achamos um círculo com símbolos estranhos. – Lissa contou e pousou o indicador na cidade circulada. – Também achamos esse círculo em Gengibra. – mudou o dedo para a próxima cidade.

— Eu e Dante descobrimos um desses em Pomar. – toquei o desenho no papel. – E agora aqui em Solene.

Lissa franziu levemente as sobrancelhas e segurou seu queixo de maneira pensativa.

— Um casal de exorcistas que conhecemos estiveram em Mansa e Lunes recentemente. – cutucou as duas cidades circuladas restantes. – E encontraram a mesma coisa que nós, o que significa que essas seis cidades estão ligadas por isso.

— Estranho. – torci a boca e cruzei os braços. – Eu gosto de números pares, mas é esquisito que tenham escolhido justo seis cidades. Por que não sete que é o número da perfeição ou treze que é o número do azar? Para esse tipo de caso, mais negatividade seria melhor, não?

A exploradora ponderou um pouco, dobrou o mapa e colocou as mãos delicadamente sobre o abdômen.

— O que temos que fazer agora é avisar a guilda sobre nossas descobertas. – a luz da vela refletiu em suas írises perdidas.


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Notas finais do capítulo

Dante tem unicamente uma fala nesse capítulo, já que hoje o foco foi o Suichiro e a Lissa, aliás, viram a diferença de altura desses dois? Me contem o que acharam ♥

Um bom final de semana a todos e até semana que vem.
Beijos.
—Creeper.



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