POV MITCH

Eu passei o dia todo evitando o Drake.

Não queria isso, mas essa era a única maneira de poder focar meus pensamentos em outros assuntos que não fossem… ele, aquele baixinho lindo e talentoso, mas que nunca retribuiria meus sentimentos.

Tentei me distrair, nos últimos dias foquei nas aulas e nos treinos, no tempo livre assisti vídeo-aulas sobre equação do segundo grau e voltei ao meu antigo hobbie, que era pintar quadros. 

Era difícil, por mais que eu tentasse, não conseguia deixar de pensar, até mesmo as figuras avulsas que rascunhava pareciam ser semelhantes a Drake.

Apertei o lápis durante a aula do Sr. Yamada, ouvi um estalo.

Estava ignorando a vontade de olhar para o outro lado da sala, onde Drake e Butch conversavam alegremente. Aquilo era insuportável! A maneira como seus olhos brilhavam quando conversava com o Maverick. 

Sei que não deveria reparar, muito menos ficar persistindo em algo que sabia que iria me machucar e me dar gatilhos de ansiedade… simplesmente não dava.

Fitei eles.

Drake estava sentado na cadeira de trás, como era de costume. Seus cabelos estavam soltos e formavam cachinhos lindos.

— Você é muito sem noção Butch, sério! — disse com a cabeça encostada na palma da mão.

— O que eu disse demais?

— O que você disse demais? Ora, quem em sã consciência mistura manga com açaí? Isso é…

— Delicioso. 

— Nojento! — Mostrou a língua para fora.

— Diz isso porque não sabe que está perdendo.

— Até parece! Eu sei exatamente o que estou perdendo — Deram outra risada. — Uma forte dor de barriga. Agora eu sei porque você sempre vai direto ao banheiro quando volta do refeitório à noite.

— O quê? — Seus olhos se arregalaram. — Não acredito que você repara nisso.

— Meu bem, eu tenho olhos.

— Stalker! — Acusou sério, logo desatou a rir.

Drake, por uns instantes, me pareceu distante. Ele olhou para Butch com atenção, e pude notar aquele brilho único no olhar presente novamente. E aquilo me doeu. 

Ele estava apaixonado por Butch Jojo, mesmo que ele mesmo ainda não tivesse se dado conta disso.

Até mesmo chegou a ameaçar esticar a mão para abaixar alguns dos fios rebeldes dele, mas se impediu antes. Com certeza se tivesse concretizado o ato a reação do babaca não seria das melhores, ainda bem que ele tinha consciência disso.

Sei que ninguém manda no coração, mas poxa, por que justo ele e não eu?

O deixaria tocar meu cabelo quando quisesse, na frente de todos, sem me importar com o que poderiam dizer.

Voltei a fitar a lousa.

Ele nunca foi seu para perdê-lo, Mitch, aceite isso…

xxx

A última aula do dia tinha acabado.

Recolhi meus materiais e rapidamente fui guardá-los no meu armário. Tinha que treinar. Antes de entrar no campo, Drake veio conversar comigo, ignorei sua fala. Durante a partida, ele pedia incansavelmente para eu tocar a bola para ele, ignorei de novo.

Queria fingir que ele não existia. Que toda a nossa convivência não se passasse de um surto coletivo. Talvez assim fosse mais fácil recolher os cacos que se transformaram meu coração.

Nem sei porque isso ainda me magoava. Nunca fui escolhido pelas garotas, aparentemente isso também se aplica para os garotos.

Coloquei minha toalha no pescoço quando o técnico apitou o final da partida. Cumprimentei meus colegas, os parabenizei pelo jogo e saí da quadra. Quando estava para entrar no prédio, alguém puxou me puxou para o cantor.

Era… o inominável.

— Pode me explicar o que tá havendo com você? Tá esquisito desde a feira. — Exclamou ele. O boné verde deslizando aos poucos em sua cabeça.

Não queria ter que encará-lo agora…

— Eu tô normal.

— Tá nada, me ignorou durante o treino inteiro.

— Não te ignorei, deve ser impressão sua.

— Claro que é — Sorriu, ironico. — Anda, desembucha. O que há? Não me diga que tá com ciúmes da minha amizade com o Butch?

— Nunca. — Revirei os olhos.

— Então, tá com inveja porque sou melhor que você!

— Qual é o seu problema, hein? — Me desvencilhei de sua mão e andei no sentido contrário. — Olha, você não entenderia.

— Realmente, não dá pra te entender, não diz coisa com coisa.

— Drake — Fiz uma pausa. — Eu sei o seu segredo.

— Quê? — Sua expressão era de pura confusão. — Qual segredo? Do que tá falando?

— Eu percebi que você gosta do Butch.

— Sua loucura tá pior do que eu pensava — Riu, na falha tentativa de disfarçar o rubor que surgiu em suas bochechas.

— Não precisa se preocupar, o seu segredo tá a salvo comigo, mas… por que ele… e não eu?

— Ei, cara, do que você tá falando?

— Eu gosto de você, Drake. Desde que nos conhecemos sinto algo especial entre nós, e essa sensação só aumentou com o tempo.. Me sinto num misto de felicidade e ansiedade toda vez que estou do seu lado. Toda vez que admiro o seu lindo sorriso, meu coração queima. Quero superar meus medos e me entregar de coração a esse sentimento…

Suspirei, minhas mãos estavam trêmulas e meus olhos lacrimejados. Evitei encará-lo nos olhos.

— Às vezes, me pego meio frustrado porque já faz quase seis meses desde que nos conhecemos e ainda não rolou nada entre a gente. Parece que tô cuidando de uma plantinha que não quer crescer, saca?

— Você queria que algo acontecesse? — Perguntou com um tom baixo.

— Ah, queria sim, mas sei que é meio complicado, porque você tá afim do Butch. Eu percebo como você fica feliz perto dele. — Senti as primeiras lágrimas escorrerem. — Como eu disse, seu segredo está a salvo comigo. Só queria ser sincero em relação aos meus sentimentos.

Drake ficou estático.

— Eu não sei o que te dizer. Só que… sinto muito.

— Tudo bem, não estou bravo.

— Mas Drake, me diga que você ficou um pouco feliz em saber dos meus sentimentos.

— Sim. Agradeço.

Vi ele balançar a cabeça e se retirar, em passos lentos. Nisso, me permiti chorar.

POV BUTCH 

Após o fim das aulas, não consegui encontrar “Drake” em lugar nenhum. Aquilo foi me dando uma ansiedade sem que eu quisesse. E se alguém descobrir que se trata de uma menina?

Por sorte, “ele” logo apareceu na minha frente, mas estava cabisbaixo. Parecia que tinha acontecido algo.

— Hã… Drake?

Silêncio.

— Ei, tampinha — Tentei novamente. — Tudo certo?

Parece que as ondinhas que fiz na frente do rosto dele surtiram efeito. Ele acordou do transe e me deu uma risada fraca.

— Ah, é você, Butch. Foi mal. Tô bolado com uma parada.

— Quer falar sobre isso?

Ele me fitou por uns instantes e se não tô cego e nem nada, ele corou de leve.

— Besteira, deixa pra lá. Bora comer alguma coisa? — disse ele, desconversando e forçando-se a sorrir. — Ouvi dizer que no refeitório tem pizza.

— Ah. — Fiquei desapontado, pois parecia que ele não se sentia tão à vontade comigo para desabafar. Aquilo me deu uma pontada no peito. — Pode ser.

— Tô cansado depois do futebol. E ainda mais depois que o Mitch… — Então parou de falar de repente.

Mitch Mitchelson. Ele de novo.

— Você tava com ele? 

Então ela tava bolada por causa dele?

— Hã… Ele tá meio esquisito comigo, sei lá. — Corou de novo. Será que essa tampinha gosta daquele sardento maldito? — Mas fica bolado, não. Eu ainda te amo, parça.

Te amo, parça. Aquelas palavras desarmaram qualquer raiva ou rancor do meu coração. Como pode essa baixinha mexer tanto comigo? Foi só algo que amigos falariam, então por que… meu coração não quer voltar ao pulso normal?

— Butch?

— Eu.

— Cê tá vermelho. Levou um torrão? Tá com febre? — Levou a mão a minha testa, fazendo-me congelar.

— Q-Qual é, cara! Tira a mão daí! — Rapidamente me desvencilhei. — Tô de boa. Bora comer e esquecer os problemas.

— Aí sim! Demorô! — Ouvi ele, digo, ela comemorar.

A cada passo que eu dava, parecia estar sincronizado com as batidas do meu coração. Não posso continuar negando pra mim mesmo. Eu tô gostando dessa garota misteriosa. E eu tô morrendo de ciúmes dela com o Mitch.