O Retorno da Abelha escrita por Olívia Ryvers


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

De acordo com as leis da aerodinâmica, as abelhas não poderiam voar. Seu peso, a forma e as dimensões de seu corpo, aliados ao pequeno tamanho de suas asas tornaria impossível o seu voo. Entretanto, como a abelha não tem conhecimento de tais leis, elas simplesmente voam, pois este é o seu instinto, assim como se organizarem e sociedade, com divisões bem definidas de tarefas e organização cooperativa que tem como único objetivo proteger a sua rainha e é claro… produzir mel.



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—O dia está adorável. Não acha, Marguerite?_George a questionou enquanto a mesma tentava se organizar entre as anotações e exsicatas de Summerlee.

—Arthur podia ter sido mais claro quando fez estes desenhos._resmungou ela ignorando a pergunta de Challenger._Vocês cientistas realmente sabem a diferença entre uma Achyrocline satureioides e uma Achyrocline vargasiana?_questionou com descrença. Estavam caminhando há horas em busca de plantas medicinais e o bom humor causado pelas carícias compartilhadas com John pela manhã já estavam dando espaço a irritação causada pelo calor, esforço físico e mosquitos que a cercavam.

Embora não fosse algo oficial, a herdeira e o caçador haviam evoluído consideravelmente no patamar de sua relação desde que ficaram presos, a beira da morte, em uma certa caverna, semanas atrás. Frequentemente Lorde Roxton a visitava na surdina da noite em seus aposentos, se amavam intensamente e antes do amanhecer furtivamente o amante voltava para seu quarto evitando qualquer tipo de constrangimento para a bela e cada vez menos misteriosa dama. Aos poucos ele a convenceria de que não havia motivos para se envergonharem por estarem juntos, porém, sabia que Marguerite prezava por sua privacidade e preferiu levar a relação conforme a velocidade que ela impunha, caso contrário corria o risco de vê-la escapar viscosamente por entre suas mãos. Naquela manhã, após compartilharem seus corpos e suas almas eles se despediram pois passariam todo o dia separados. Roxton e Verônica passariam o dia caçando enquanto Challenger e Marguerite coletariam plantas medicinais para repor o estoque farmacêutico da Casa da Árvore.

—Ora, minha cara Marguerite, perceba a pilosidade nas bordas inferiores da A. vargasiana, são completamente diferentes das encontradas na A. saturioides._deferiu o cientista com irritante obviedade.

Marguerite observou cuidadosamente a imagem e então notou a pequena e quase imperceptível penugem, jamais notaria tal característica se esta não lhe fosse apontada. Revirou os olhos antes de responder.

—Isso é quase uma infâmia… só um botânico se atentaria a tão mínimo detalhe.

—Aí está a grandiosidade da natureza, minha querida, nos detalhes.

—Muito filosófico, Challenger, mas pouco prático._a mulher deu de ombros antes de solta um suspiro resignado._estou cansada_admitiu_ ainda faltam muitas?

O cientista olhou para o pedaço de papel em suas mãos e avaliou a lista de espécimes escrita com grafite, quase todas haviam sido coletadas, exceto por uma.

—Pelo que posso observar só nos falta Baccharis dracunculifolia. Vi um arbusto de alecrim do campo próximo a casa da árvore._lembrou ele.

—Então o que ainda estamos esperando?_resoluta Marguerite tomou a dianteira na direção indicada por ele. Estava ansiosa por chegar em casa, talvez houvesse tempo antes do jantar para um banho de lago, e, talvez, por sorte John e Verônica também já estavam de volta. A ideia maliciosa e refrescante de um mergulho com o caçador povoou seus pensamentos e a incentivou a caminhar mais depressa. Era tentador imaginar os braços fortes de Roxton envolvendo seu corpo nu molhado pela água fria. A simples lembrança de seus beijos já aqueciam seu coração e ela permitiu-se rir de si mesma “parecia uma adolescente ansiosa e apaixonada”, entretanto isso não a incomodava, os sentimentos que experimentava ao lado dele a renovavam, depois de muito tempo ela se sentia viva, leve, relaxada e motivada a ser uma pessoa melhor. John a resgatara das profundas e escuras trevas em que sua alma se encontrava, ele a fez acreditar que merecia ser feliz, lhe oferecera seu amor sem impor nenhuma condição. Marguerite estava cada vez mais convencida de que não haviam motivos para esconder a relação dos dois, exceto por seu passado… porém, enquanto não tinham perspectivas de retorno a Londres por que não viver intensamente todas as saborosas sensações que esta paixão lhe proporcionava? Ela quase admitia que pela primeira vez desde quando chegara ao platô não tinha ânsia por achar sua saída. Sabia que era egoísta pensar de tal modo, mas, ali, naquele lugar inóspito e assustador, descobrira que era mais importante focar em quem havia se tornado do que encontrar sua origem. Ali não haviam tradições, nem fazia diferença as convenções impostas pela sociedade aristocrática. No mundo perdido ela podia ser quem ela desejava ser, era sua segunda chance, e isto lhe fazia bem.

Logo atrás dela, Challenger tagarelava sobre as propriedades terapêuticas da planta que iriam recolher, ao que parecia a citada erva tinha atividade antimicrobiana e anti-inflamatória, e segundo o cientista a resina produzida por ela era uma das favoritas usadas pelas abelhas para a fabricação de própolis.

—Talvez, poderíamos instalar algumas caixas de abelhas na floresta._sugeriu George._Teríamos mel e própolis durante todo o ano.

—Nossa experiências com esses insetos já foram por demais perigosas, melhor deixá-las afastadas.

—Bobagem, Marguerite. Uma colmeia de Apis melífera não é algo difícil de manejar.

Ele mal tinha terminado de falar quando um zumbido ensurdecedor alcançou os ouvidos de ambos.

—Challenger! O que é isso?_gritou Marguerite assustada.

—Não faço ideia… a frequência parece de abelhas, mas nessa amplitude… seria um enxame._percebeu os olhos assustados da mulher._corra e proteja-se.

Os amigos correram pela selva até a clareira na base da casa da árvore. O som que os seguia estava cada vez mais alto. George arriscou olhar para trás e finalmente percebeu dois imensos animais que voavam ziguezagueando atrás dele.

—Abelhas gigantes, Marguerite._avisou.

A mulher olhou para trás e então entendeu o que o amigo lhe dizia. Assustada desequilibrou-se caindo sobre um pequeno tronco. Challenger a alcançou a ajudou-a se levantar, porém, a fração de tempo em que gastou para se recompor foi crucial para que os insetos macabros pudesse aproximar o suficiente para atacá-los. Marguerite se atrapalhou para sacar a arma do coltre, e antes que pudesse se defender viu seu corpo içado pelas patas ásperas do animal.

—Socorro! Challenger… aqui em cima.

George tentou abater a abelha inimiga, mas a companheira bicolor usou seu corpo rechonchudo para derrubá-lo, fazendo com que sua cabeça encontrasse a quina de uma pedra e ele perdesse os sentidos.

Os dois insetos seguiram seu curso levando consigo a mulher relutante.

 

****

 

O som do tiro ecoou pela mata. O caçador sentiu o cheiro nitroso da pólvora recém-deflagrada e observou através fumaça gerada pela pequena explosão o javali caído a alguns metros de distância. Sorriu satisfeito.

—Belo tiro, Roxton._parabenizou Verônica.

—Obrigada._disse sem falsa modéstia._Isto tem um valor especial vindo de você._provocou o caçador. Era comum quando os amigos saiam juntos para caçar estabelecerem um tipo de competição para determinar quem era o melhor caçador dentre os dois. Ambos eram habilidosos, cada um a sua técnica, e da mesma forma, lhe agradava a disputa sadia como um ato de pura irmandade. Porém, hoje, John desejava ser mais objetivo e não se atrelar a brincadeiras. Queria o mais rápido possível estar novamente nos braços de sua amada Marguerite_Agora que já temos o jantar e carne para alguns dias, podemos voltar.

—Quanta pressa._a jovem loira o olhou com dúvida_Quem o ouve assim impetuoso pode acreditar que você tem um encontro._provocou.

Roxton lhe ofereceu um sorriso maroto. Sabia que todos desconfiavam de sua relação com a herdeira, ainda sim, para conforto dela, se dispunha a fingir que eram apenas amigos.

—Se Marguerite a ouvir falando desta maneira será o seu fígado que comeremos no jantar._alertou sem confirmar ou negar qualquer coisa.

—Não entendo porque não assumem de uma vez a relação entre vocês, afinal, acreditam mesmo que ninguém sabe que estão juntos?

—Escute, Verônica… o que está em questão não é o que eu acredito ou que os outros pensam. Marguerite é uma mulher que construiu muralhas de autodefesa porque a vida já lhe foi traiçoeira mais de uma vez. É natural que ela tenha receio de se entregar, de falar abertamente sobre seus sentimentos. Eu sabia disso quando me apaixonei por ela, e eu a amo por inteiro, independente de qualquer coisa. Se ela quer manter segredo, e, se é essa a condição que estabelece para que eu esteja a seu lado, esta será a condição que eu seguirei.

—Você a ama de verdade, não é?

—Mais do que a minha própria vida.

Verônica sorriu, talvez fosse ainda muito jovem para compreender a profundidade do que o caçador acabara de lhe dizer, mas, era evidente que o amor de John era impecavelmente correspondido por Marguerite, então só lhe restava torcer para que os dois fossem felizes.

—Vamos para casa._disse por fim, batendo nos ombros do amigo.

 

 

 

 


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