Too Damp for a Spark escrita por prongs


Capítulo 1
U: i'm sick of faking diary entries


Notas iniciais do capítulo

OIZINHO ♥ ahhhhh, estou aqui com a minha terceira fic pro pride 2021, finalmente estou na metade da minha participação desse ano hihi

eu estava muito ansiosa pra postar essa história. eu tive a ideia pra ela enquanto escutava uma das minhas músicas favoritas da vida, when da dodie, que não é necessariamente sobre assexualidade, mas quando eu escutei alguns versos eu relacionei automaticamente.

eu escolhi a Lucy pra protagonizar essa história porque ela é uma personagem meio ignorada e esquecida da newgen, mas eu sempre gostei de pensar sobre ela (os antigões vão lembrar que há MUITOS anos eu tinha uma fic sobre ela) e achei que o headcanon fez muito sentido na hora que apareceu na minha cabeça.

eu fiquei meio insegura num primeiro momento, e queria agradecer muito a Morgana (que também posta uma fic sobre personagens ace hoje! assim como a saintjily! e um beijo pra Morgan, que também posta, mesmo sem ser sobre personagem ace!) por ter me ajudado a tirar essa ideia da mente e colocar no papel de forma concreta, respeitosa e, espero, fidedigna.

também quero agradecer novamente a Thais por ter me emprestado o Charlie aro/ace por algumas palavras ♥ espero que aqui ele esteja tão incrível quanto ele é nas suas palavras.

sem mais delongas, espero que curtam a leitura e que as pessoas ace encontrem aqui uma boa representação ♥



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/802924/chapter/1

Lucy passara sua adolescência toda se sentindo um tanto invisível no meio de sua família e amigos. Na verdade, “apagada” talvez fosse uma palavra melhor para descrever seus sentimentos; ela estava lá, as pessoas lhe enxergavam, mas era como se ela fosse uma pessoa existindo em tons de cinza num mundo repleto de cores. 

Ela não se importava muito em ser diferente. Não era boa em quadribol como James ou Lily, nem tinha notas excepcionais como Rose ou Victoire. Não era ruiva como sua irmã ou seus primos, muito menos loira como os filhos de tio Bill — seus cabelos curtos e castanhos, vindos de sua mãe, seriam considerados tão normais em qualquer outra situação, mas eram vistos com estranheza quando ela andava junto dos outros Weasley.

Lucy não tinha grandes ambições de conseguir um emprego no Ministério, no St. Mungus, ou até mesmo fora da Grã-Bretanha. Tudo o que ela queria era viver em um chalé nas montanhas da Escócia, escrevendo suas histórias, como sempre gostara de fazer, sem fama, olhares curiosos ou perguntas sendo feitas o tempo todo.

A única coisa que verdadeiramente lhe incomodara durante toda a adolescência, os anos em Hogwarts e até mesmo a perseguindo até o começo de sua juventude, já que agora ela tinha vinte e três anos, era como todos apontavam como era estranho que ela nunca tinha namorado ninguém. Não; o que lhe incomodava era que ela nunca tinha sentido nem menos vontade de namorar alguém. Ou ir a um encontro. Ou beijar. 

Parecia algo tão natural para todos! Scorpius e Rose começaram a namorar depois de agirem como namorados por meses, Roxanne e Luke eram feitos um para o outro, James estava sempre com garotas, assim como Dominique, e até mesmo Molly encontrara uma namorada enquanto estava com tio Charlie na Romênia durante o verão. Lucy não entendia que sentimentos levavam as pessoas a se apaixonarem, a terem vontade de dividir uma cama e uma vida com alguém, a quererem beijar bocas estranhas. Não fazia sentido para ela.

Ela tentara se encaixar, claro, como sempre fazia com as outras coisas que a faziam se sentir estranha, mas aquilo era diferente demais. Tentara sair com Edward Leclerc, da Lufa-Lufa, no sétimo ano, e até mesmo o beijara algumas vezes, mas não parecia certo. O rapaz era doce, ela gostava de suas conversas, e ele dizia até que seus olhos eram lindos, mas a sensação de seus beijos e lábios molhados não despertava nada dentro da garota, como suas amigas sempre diziam que iria acontecer quando ela encontrasse a pessoa certa. 

Também havia tentado conhecer melhor algumas garotas depois de formada, por conselho de Molly, mas a experiência havia sido tão decepcionante quanto. Ela não sentia borboletas no estômago, mãos suadas ou um rufar de tambores em seu peito. Tinha amigos muito próximos, amava eles do fundo de seu coração, e era até mesmo uma pessoa carinhosa, que gostava de abraços, mãos dadas e cafuné, mas aquilo não significava que ela se sentia atraída por nenhum deles. 

Aos vinte e poucos anos, Lucy se sentia perdida e achava que estava quebrada. Não era hétero e apaixonada por pessoas de outro sexo, como James, nem lésbica, como sua irmã, e muito menos bi ou pan, como Dominique ou Louis. Sentia como se estivesse à deriva num mar escuro e gelado sempre que lhe perguntavam sobre namorados, ir a encontros casuais, sair atrás de pessoas para beijar. Talvez Lucy já tivesse vindo ao mundo defeituosa, e se sentia exatamente como fósforos que estão úmidos e não conseguem causar faíscas. Nada lhe causava faíscas.

Bem, não exatamente. Ninguém lhe causava faíscas. Ela tinha suas paixões, elas só não respiravam e tinham pés, mãos, braços e pernas. Lucy era apaixonada pelo cheiro de pergaminhos antigos que contavam contos extraordinários, pela sensação da tinta escorrendo entre seus dedos quando enchia demais sua pena, pelo som de máquinas de escrever que ficava preso em sua cabeça o dia inteiro. Lucy era apaixonada pelo cheiro da grama antes de chover, pelo vento com cheiro de maçã que vinha do pomar de sua avó na primavera, pelo calor em seu ventre quando viajava para um lugar novo.

Lucy era perfeitamente capaz de amar. Lucy era repleta de paixão em todo o seu ser, então por que não conseguia direcionar isso a ninguém? Qual era o seu problema? Sendo sincera, estava extremamente cansada de deixar aquilo dominar seus pensamentos e sua vida dia e noite. Não era o que ela queria. Queria explorar montanhas, ouvir o quebrar das ondas rebeldes na costa escocesa em contraste com o batuque de seus dedos enquanto ela colocava mais uma história magnífica de aventura no mundo. Será que ela precisava esperar até encontrar o tal amor da sua vida para poder começar sua vida?

Então, aos vinte e três anos, ela fez o que sempre fazia quando se sentia exausta de tudo e todos no mundo: arrumou suas malas, beijou o pai e a mãe no rosto e foi para a Romênia para passar um mês com seu padrinho, Charlie. Mesmo que Molly tivesse trabalhado com ele por um tempo, eram eles dois que tinham uma cumplicidade extraordinária e um relacionamento que não precisava de conversas ou atividades cansativas para satisfazê-los. Gostava de ficar em silêncio com ele desde que era criança, cada um em seu mundo, mas aproveitando a companhia amável um do outro.

Ao chegar lá, imediatamente sentiu que um peso enorme sumiu de seus ombros, carregados para longe junto dos ventos tempestuosos do leste da Europa. Fez trilhas pelas montanhas com Charlie, que lhe contava sobre as últimas descobertas do mundo da dragonologia, deixou que ele a arrastasse para os melhores pubs da região, onde ela falou sem parar sobre suas últimas ideias para contos bruxos infantis, e também passou horas ao seu lado em silêncio, lendo em frente à lareira da casa do padrinho.

Foi numa dessas noites frias, cada um sentado em uma poltrona com um livro em mãos, que Lucy fez uma pergunta que tinha vontade de fazer desde criança.

— Charlie — Ela o chamou apenas pelo primeiro nome, como tinha o costume de fazer, e o ruivo levantou o olhar para a afilhada. — Por que você é o único que nunca casou e teve filhos? 

Ela queria que aquela pergunta levasse a conversa até um caminho que a permitisse se abrir sobre o que vinha sentindo ultimamente, mas também era uma curiosidade genuína que ela alimentava há anos.

Charlie a encarou interessado, fechando o livro de couro em seu colo. Certamente deveria estar acostumado a responder aquela pergunta, mas era como se Lucy merecesse uma resposta digna e verdadeira, não o que ele simplesmente dizia a qualquer um que o questionasse.

— Porque eu nunca precisei — Lucy franziu as sobrancelhas, confusa com a resposta.

— Como assim? Você nunca achou que precisava se casar?

— Não, veja… são coisas diferentes — Charlie se empertigou na poltrona, pensativo. — Eu posso achar que não preciso de algo, mas no fundo desejá-la até o fim da vida, mas não é isso. Eu simplesmente nunca senti que precisava, ou até mesmo queria a companhia de outra pessoa romanticamente, sabe? — Ele soltou uma risada. — Eu expliquei isso ao Louis uns anos atrás, quando ele ainda era uma criancinha, e não usei metade das palavras complicadas que estou usando com você.

Lucy observou o tio com curiosidade e sentiu o peito borbulhar.

— Então você nunca se apaixonou?

— Claro que já! Pela Romênia, por dragões, pela autobiografia da Celestina Warbeck, pelo Quadribol — Ele deu de ombros, um sorriso leve em seu rosto sempre descontraído. — Me apaixonei por muitas coisas, Luce, só nunca por pessoas. Amo muitas pessoas também, como você, Molly, Eva, que é minha dupla de trabalho há anos… eu só não sinto, nem nunca senti, nada romântico por ninguém, e isso não me incomoda. Até porque não é nada anormal. Você sabe disso, não é? — Ele questionou a afilhada com uma sobrancelha arqueada, enquanto Lucy encarava os troncos de madeira queimando lentamente na lareira, tentando analisar todas as palavras do padrinho e fazer sentido de seus sentimentos, daquela ideia estranha de que tudo que ela sentia não era bizarro ou errado. Era tão normal que seu próprio padrinho se sentia da mesma maneira.

— Então é normal se sentir assim? — Lucy falou, sem perceber que sua voz estava embargada ou que haviam lágrimas descendo de seu rosto sem ela nem entender por que.

Charlie sorria para ela como se estivesse vendo sua própria imagem refletida na sobrinha.

— Completamente. Você também sente isso, Luce? — Ela o encarou, enxugando os olhos.

— Eu acho que sim, mas nunca tinha pensado desse jeito. Achei que eu era defeituosa ou algo do tipo, como se eu tivesse que mentir pra mim mesma e pra todo mundo pra me sentir normal — Charlie suspirou e se levantou de sua poltrona, sentando-se ao lado da afilhada e abraçando seus ombros. — Por que eu tô chorando? Meu Merlin — Os dois riram juntos e Charlie a apertou contra si.

— Porque você começou a perceber que não tem absolutamente nada de anormal com você. 

Lucy chorou mais, sentindo que seu coração ficava menos apertado a cada lágrima derramada. Charlie sugeriu que ela escrevesse uma carta para sua prima Dominique, que estava na França, ao final da estação, perguntando sobre assexualidade, já que, de acordo com ele, a loira era mais jovem e sabia explicar melhor sobre aquelas coisas do que um velho como ele. 

Enquanto não fazia isso, Lucy aproveitou suas últimas semanas na Romênia, usufruindo da inspiração que lhe atingia durante as noites geladas e cheias de neblinas para escrever uma história infantil sobre um dragão que não conseguia cuspir fogo e se sentia diferente de todos os outros dragões por causa disso. Ela não sabia se aquele iria ser o próximo “Os Contos de Beedle, O Bardo” do mundo bruxo ou se as pessoas iriam entender seu conto bobo, mas já era suficiente que ela tinha conseguido transformar sua confusão interior em arte naquele verão.

Quando estava prestes a voltar para a Inglaterra, contou para Charlie seus planos sobre conseguir um chalé na costa escocesa para focar no que era realmente apaixonada.

— E você vai ficar sozinha? — Seu padrinho perguntou, uma sobrancelha arqueada.

— Por um tempo, acho que sim. Eu gosto de estar sozinha. Não há nada de anormal nisso, afinal — Os dois sorriram juntos e Lucy passou uma mão pelos cabelos curtos. — Mas espero que papai, mamãe e Molly achem algum tempo para me visitar. E você também! — Ela empurrou o homem levemente no ombro, que riu para a garota.

— Vamos fazer muitas trilhas pela Escócia na próxima vez que eu tirar uma folga, prometo. Ah, e Luce... não desista daquela história sobre dragões — Ele apertou o ombro da afilhada. — Sei que pode parecer bobo, mas pode ajudar muita gente a perceber que eles não são esquisitos mais cedo do que nós dois percebemos. 

Lucy sentiu as lágrimas ameaçando caírem de seu rosto mais uma vez, mas respirou fundo e assentiu antes que elas deslizassem por seu rosto.

— Não vou. Prometo. Obrigada, Charlie.

Ela o abraçou apertado, querendo colocar no gesto todas as palavras não ditas entre o silêncio confortável que só eles compreendiam no outro. Charlie era definitivamente um dos melhores amigos de Lucy e ela seria eternamente grata ao padrinho por ele ter lhe ajudado a descobrir que não havia nada de bizarro nela; e se houvesse, ele seria tão bizarro quanto ela. E estava tudo bem nisso, pois Charlie era uma das pessoas que ela mais admirava no mundo, e ser igual a ele seria uma verdadeira dádiva.

Lucy subiu a colina enevoada em direção ao espelho quebrado que era, na verdade, sua chave de portal de volta para a casa dos pais, e olhou para a Romênia do alto de monte. Observou as árvores, a fumaça dos dragões à distância, um pequeno ponto laranja que indicava Charlie voltando para sua cabana. A garota respirou fundo, completamente apaixonada até pelo ar que respirava ali.

De cima daquela montanha, Lucy se sentiu cheia de paixão, como se pudesse incendiar o mundo sozinha apenas com o fogo que tinha descoberto dentro de si. Ela era apaixonada por suas palavras, pela Escócia, pela vida não escrita em sua frente que ela iria construir. Lucy se abaixou para agarrar o espelho, sentindo pela primeira vez em muito tempo que não havia nada quebrado ou incompleto dentro de si. Ela só era diferente e iria mostrar para o mundo, com suas palavras, que não havia nada de errado com isso.

 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

EEEEEEEEEEEE foi isso. temos uma Lucy feliz, mais segura com quem é, e com mais esperança para o futuro. só felicidade essa fic heinnnn!!! espero que tenham gostado, e comentários são extremamente bem-vindos ♥