I want (every other freckle) escrita por Martell


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Olá, olá, sejam bem vindos a mais uma fic para o Pride 2021!

Essa é minha primeira Deamus, então a caracterização pode estar um pouco... diferente, mas é o que vamos estar tendo para hoje.

agora uma playlist para escutar enquanto encara as sardas dos seus bros: https://open.spotify.com/playlist/7bMjkixrexqavMrsFk2vAm?si=dd6e2d5f16cb4886

Boa leitura!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/802908/chapter/1

 

Dean se considerava uma pessoa tranquila – não ligava para dramas desnecessários, evitava brigas por motivos fúteis, não perdia tempo se preocupando com coisas que não mereciam a sua atenção e tentava viver de uma maneira tão calma que beirava o entediante.

Desde que havia se formado em Hogwarts tinha um emprego simples, não muito além de suas capacidades, fazendo designs para acessórios em uma loja em Hogsmeade – um trabalho perfeito para um jovem de 18 anos gravemente traumatizado, que não tinha grandes ambições para o futuro além de, talvez, reduzir seus pesadelos para eventos mensais e não o ritmo de uma ou duas vezes na semana a qual estava acostumado.

Em comparação com seus amigos, que tinham todos os hábitos desgastantes mencionados – Seamus, Ron, Neville e Harry, respectivamente – poderia dizer que era o menos propenso a ataques de ansiedade repentinos ou ser acometido por obsessões sem sentido. Para o seu desgosto e surpresa, ambos vinham acontecendo com uma frequência alarmante nos últimos meses.

Tudo começou quando, por algum motivo, Dean reparou distraidamente que algumas sardas no pescoço de Seamus pareciam ter o formato de Orion, a constelação do caçador. Não importava o porquê estava olhando para o pescoço do amigo ou por quanto tempo o fizera para ter chegado nessa observação, mas o fato era que o havia feito. Não seria um problema, mas desde esse momento não conseguia parar de pensar nas sardas de Sea.

O que era um interesse simples, feito de momentos de epifania repentinos e inocentes, com olhares discretos e distraídos, logo se transformou em uma espécie de fixação que, francamente, o estava deixando mais nervoso do que deveria ser humanamente possível. E a insistência dessa atração inesperada e inoportuna havia começado a afetar sua amizade com Seamus, uma das únicas coisas constantes na vida de Dean após tudo.

A verdade era que não queria apenas observar as costas da mão do amigo ou o topo das bochechas levemente avermelhadas – ele já conhecia todas essas sardas, conseguia mapeá-las de olhos fechados. Sua curiosidade se expandira com o tempo, desejava saber até onde elas iam no corpo tão familiar e ao mesmo tempo desconhecido. E o pior de tudo era que sentia, aos poucos, que apenas traçar as sardas com os olhos não seria o suficiente.

O que o trazia de volta para um fato muito relevante e até o momento inquestionável da sua vida: ele era hétero. Sempre havia gostado de garotas e nunca havia sequer dado um segundo pensamento para nenhum cara. Não era preconceituoso, nada do tipo, apenas nunca havia se sentido atraído por homens antes e, depois de viver cercado de adolescentes de todos os tipos e variados níveis de beleza por meses durante sete anos, isso servia como uma prova quase absoluta da sua heterossexualidade.

Dean sabia que algo sobre esses dois fatos – sua obsessão por partes do corpo de outro homem e a certeza na sua sexualidade – soavam incompatíveis. Não precisava ser Hermione Granger, com sua capacidade intelectual obscena, para entender que sonhar acordado com a possibilidade de beijar cada uma das sardas que decoravam a linha do maxilar de Seamus não era um comportamento comum entre homens heterossexuais, mas simplesmente não conseguia evitar os pensamentos cada vez mais frequentes e cada vez menos inocentes. 

A grande questão era não conseguir agir normalmente ao redor do amigo, passando metade do tempo o encarando intensamente e a outra metade incapaz de lançar um olhar em sua direção, o que normalmente acontecia quando o outro notava que estava encarando. Dean não tinha provas, apenas a convicção de que se isso continuasse por mais tempo iria enlouquecer.

Principalmente levando em consideração que ambos dividiam um apartamento pequeno, mas confortável, na vila de Hogsmeade. Depois de tudo o que haviam passado juntos e as camadas de trauma e paranoia que haviam desenvolvido no último ano, apenas fez sentido não se separarem. Não era estranho, foi uma escolha prática da qual não se arrependia, mas o seu pequeno problema em relação às sardas de Seamus estava tornando a convivência um pouco constrangedora.

Tinha sorte dos seus horários não se alinharem com o do amigo, que estava trabalhando no Cabeça de Javali – tão sem perspectiva de futuro quanto Dean, mas confortável o suficiente para não ter pressa em procurar algo que não estava pronto para encarar. “Sorte”, porque havia demorado uns bons dois meses para Seamus notar seu comportamento incomum, já que se encontravam brevemente apenas na parte da noite, quando chegava do trabalho e Sea estava se preparando para começar o seu turno no bar.

Isso era algo que costumava o perturbar profundamente. Sentia falta da companhia confortável de seu melhor amigo, de passarem horas acordados jogando conversa fora, de desenhar na luz quente do salão comunal da Grifinória enquanto escutava distraidamente as teorias da conspiração que Seamus sempre criava ou as fofocas que havia escutado de Lavender.

Mas com os desenvolvimentos recentes, talvez fosse melhor ter o tempo juntos restritos a momentos em que ambos estavam cansados demais para realmente conversarem, porque Dean sentia um misto de vergonha e culpa a cada vez que se pegava observando fixamente o antebraço do amigo, tentando diferenciar as pequenas sardas que o cobriam. 

Porque, desde que passara a tentar ignorar o problema, passara também a ignorar o seu melhor amigo e não aguentava ver o olhar confuso em seu rosto, doía ver a confusão dar lugar a mágoa. E mesmo sabendo que poderia perder Seamus em seu silêncio, escolheu não falar nada. Não sabia o que dizer, como se justificar, quando nem mesmo entendia o que estava acontecendo.

Até chegar em casa mais cedo um dia e viu ao lado da porta duas malas feitas, vermelho vibrante, a cor favorita de Sea. No meio da sala, uma caixa enchia-se de objetos que flutuavam calmamente vindos da direção do quarto do amigo.

Sua mente se recusava a compreender o que aquilo representava, pois era impossível um universo em que Seamus o estava abandonando sem mais nem menos, sem uma conversa ou justificativa. Tudo isso sem considerar questões como o aluguel, como ele esperava que Dean conseguisse manter a casa sozinho e onde ele iria morar saindo de última hora.

— Ah, você não deveria estar aqui.

Não reconheceu o tom de voz de Sea, frio como nunca tinha ouvido antes, harmonizando com seu rosto sério e os braços cruzados sobre seu peito. Notou, distraidamente, as sardas que sumiam por debaixo das mangas da camisa, complementando os músculos contraídos de tensão. Estava parado na porta de seu quarto encarando Dean fixamente.

— O que pensa que está fazendo?

 – O que parece que estou fazendo? – Seamus respondeu, encostando-se no batente da porta, os braços ainda cruzados.

Ele estava irritado e sua postura emanava isso, mas na cabeça de Dean, claramente sobrecarregado com o influxo de informações e sentimentos, o amigo apenas parecia… atraente. Algo que não se permitiu ponderar por muito tempo. Estava magoado com o amigo e não tinha tempo para ficar questionando seus pensamentos inapropriados.

— Você decidiu fugir, é isso? Porque, pelo que eu estou vendo, você pretendia apenas ir embora enquanto eu estava no trabalho sem dar satisfações.

— “Fugir”, você diz, como se não estivesse me ignorando e me deixando desconfortável na minha própria casa!— E agora Sea estava furioso, o vermelho ofuscando as adoráveis sardas espalhadas por seu rosto e não era o momento de pensar nisso Dean Thomas, controle-se.

— Você não me dá bom dia, não olha na minha cara, sai de um cômodo quando eu entro e espera que vá ficar tudo bem com isso? Eu tentei tantas vezes entender o que estava acontecendo, mas todas as vezes você apenas sumiu sem nem mesmo me responder! – Continuou, agora gesticulando violentamente, enquanto Dean apenas se encolhia cada vez mais a cada palavra, envergonhado tanto por suas ações quanto com o que estava sentindo com a figura irada do amigo.

— Sea, eu…

— Não vem com “Sea” pra cima de mim, Dean Thomas, não quando eu sei que você não tem nenhuma desculpa boa o suficiente para ter me tratado como lixo!

O sotaque irlandês de Seamus ficava ainda mais forte quando estava chateado e Dean não deveria achar isso adorável, mas não conseguia controlar mais o que sentia no que diz respeito ao amigo, principalmente sabendo que fora ele quem o magoara no meio de sua confusão.

— Você está certo, Sea, – admitiu, andando até onde o amigo estava, lágrimas acumuladas nos lindos olhos azuis que sempre admirara, mas nunca havia admitido, – não tem nada que eu possa dizer que possa justificar o que eu fiz, okay? Eu sei disso. Eu sinto muito.

— Sentir muito não muda os dois últimos meses, Dean. E nem muda o fato de que eu estou aqui feito um idiota buscando motivos para ficar quando eu deveria ter ido embora na primeira vez que você se recusou a olhar para mim, – foi o que respondeu, ainda furioso, mas tão, tão decepcionado que Dean queria chorar. – Após tudo, você era uma das únicas pessoas que eu achei que poderia confiar.

As palavras doeram, mais do que o momento parecia permitir. Essa discussão havia acontecido abruptamente e ele não estava preparado para ver as consequências de sua negação expostas assim, sem anúncio prévio. Sabia que não estava no ponto de admitir o que quer que fosse, já que nem compreendia muito bem o que sentia e o que queria, mas não podia perder Seamus. Não se permitiria deixá-lo escapar por suas mãos dessa maneira. 

— A verdade é que eu estou confuso, com muitas coisas, e eu não deveria ter te tratado como tratei. Você é muito importante para mim, Sea, talvez a pessoa mais importante da minha vida, – começou, segurando o rosto do amigo em suas mãos, inclinando a cabeça do mais baixo para encará-lo nos olhos, deliciando-se, de maneira culposa, com a diferença de altura, – e eu me odeio por ter feito o que fiz, mesmo que sem intenção.

— Dean…

— Você é meu melhor amigo, Seamus, sua amizade é essencial na minha vida.

O momento que estava sendo criado foi subitamente destruído pela última frase de Dean. Percebeu que vinham inclinando-se um para o outro ao longo da conversa quando o irlandês afastou-se de maneira abrupta da posição íntima que se encontravam. Retraindo suas mãos para o lado de seu corpo, as flexionou uma, duas vezes, ainda sentindo a pele calorosa sob seus dedos.

— Hmm, sua amizade também é importante para mim, okay? Por isso essa cena toda, – Seamus respondeu, parecendo sem graça e coçando distraidamente a bochecha, em cima de onde se concentravam inúmeras sardas. Dean, absurdamente, quis afastar a mão do amigo e substituí-la pela sua. Estava enlouquecendo, ah meu Merlin.

— Nós podemos conversar melhor antes de você tomar alguma decisão repentina? – Perguntou de maneira esperançosa, disposto a abrir mão de tudo para fazer o amigo ficar.

— Tudo bem, Dean. Mas não se acostume, essa é a única vez que eu perdoo algo do tipo!

E conversaram durante horas, como não faziam há muito, muito tempo. Chegaram a acordos para facilitar a convivência e também para fortalecer o laço que tinham, colocaram seus horários lado a lado para encontrarem momentos em que poderiam apenas ficarem juntos, como nos velhos tempos, quando tudo era mais fácil.

Dean suprimiu mais uma vez seus desejos incômodos e decidiu apenas apreciar que estava recebendo uma segunda chance. Tentaria negar o máximo possível qualquer emoção que não fosse equipado para lidar e ficaria tudo bem, desde que Sea estivesse feliz.

•••

Sabia que algo daria errado mais cedo ou mais tarde, mas nada havia preparado Dean para  a sua reação desastrosa na manhã fatídica em que a obsessão pelas sardas de Seamus ultrapassou o seu senso comum. Fugir para perto do limite entre a Floresta Proibida com a vila parecia excessivo, mas preferia encarar uma possível morte nas garras de uma acromântula do que tentar decifrar a expressão no rosto do melhor amigo após o que havia feito.

As coisas pareciam ter voltado ao normal, Sea o havia perdoado finalmente e Dean conseguia fingir que os seus sentimentos se limitavam a uma atração peculiar pela figura do amigo misturada com laços criados por trauma e dependência. Não estava apaixonado, não mesmo, ninguém poderia acusá-lo de tal coisa.

Seguindo o acordo que firmaram, passaram a fazer todas as refeições juntos, Dean preparando o café da manhã que Seamus se forçava a ficar acordado para tomarem juntos, ambos visitando algum restaurante na hora do almoço e o amigo preparando o jantar, o esperando chegar da joalheria. A rotina apenas se alterava nos fins de semana, onde quem acordasse primeiro cozinhava para os dois.

E foi durante um domingo lento que o desastre aconteceu: Dean, praticamente a força, arrastara–se para fora da cama, seguindo o cheiro de café até a cozinha. Seamus detestava o gosto amargo da bebida, limitando–se a tomar chá quando forçado a consumir algo além de suco ou água, mas havia aprendido a fazer da maneira que Dean gostava. Eram esses pequenos detalhes que tornava difícil se convencer de que não estava totalmente rendido pelo irlandês.

Nesta manhã específica, encostara–se no balcão que dividia a sala da cozinha, observando sonolento a precisão do amigo no preparo da comida. Para quem costumava não conseguir mexer uma poção sem explodi-la, Seamus era um chef obscenamente talentoso. Logo o cheiro de torradas e ovos havia se juntado ao de café, uma mistura deliciosa e familiar, a cena doméstica aquecendo cada parte do corpo de Dean.

O amigo, ao vê-lo parado observando, apenas lançou um sorriso rápido e voltou a se concentrar no que estava fazendo, tão lindo que a mente de Dean demorou a responder, seus lábios se curvando em uma resposta automática, incapazes de não retribuir qualquer sentimento positivo que emanava do outro. Viu–se sorrindo para o ar, puramente por poder desfrutar da presença de Seamus, por tê–lo ali, tão perto, real, sólido, emanando um calmo contentamento que um ano atrás seria impossível.

A luz fraca da manhã de primavera iluminava toda a cena, refletindo nos ombros pálidos de Seamus, completamente descobertos. Ele estava usando apenas uma calça de moletom dobrada na barra e caindo de seus quadris, resultado da sua insistência em usar as roupas de Dean, mesmo sendo consideravelmente menor. As sardas destacavam–se na pele clara, descendo pelas costas firmes até desaparecerem por debaixo da roupa que usava.

Com a proximidade do verão, observava as sardas se multiplicando lentamente, ocupando espaços onde antes predominava a palidez macia de pele imaculada. Como poderia conhecer cada uma das marcas que formavam Seamus se eram mutáveis? Parecia uma afronta pessoal a Dean, ou um desafio, o instigando a memorizar cada detalhe do corpo do amigo, notar cada adição inesperada, investigar os novos relevos e formas que criavam.

Em seu foco sonolento, bebendo da figura iluminada pelo sol, percebeu novas sardas dispostas na curva onde seu pescoço encontrava o ombro esquerdo, um local que se orgulhava, de maneira tola, por conhecer intimamente – não tanto quanto desejava, mas tão intimamente quanto os limites da amizade permitia. Um sentimento estranho o invadiu, uma necessidade de observar de perto os detalhes que havia perdido.

Sem pensar muito sobre o que estava fazendo, aproximou–se lentamente do outro, seus passos deliberados e silenciosos, como havia aprendido durante o ano anterior. Antes que Seamus pudesse reagir, seus braços estavam em volta da cintura do amigo, o puxando para junto de seu corpo, respirando a mistura herbal da loção que o mais baixo negava usar.

O sentiu enrijecer em surpresa, mas isso não o deteve de alcançar o objetivo final, inebriado por seus sentimentos, inibições baixas em consequência do sono. Curvando o seu corpo para alcançar o local desejado, traçou com seus lábios as novas sardas, finalizando com um beijo demorado no ombro de Seamus, que parecia não estar respirando.

Finalmente seu cérebro computou o que havia feito e foi a sua vez de parar de respirar, incapaz de se desvincular do amigo, com medo de se mover e despertar Seamus do estado de choque que parecia estar. Não estava pronto para ver o desgosto refletido nos olhos claros que tanto amava. Não estava pronto para perdê-lo semanas depois de ter o convencido a ficar.

Dean… a voz do amigo estava fraca, ligeiramente rouca.

Não respondeu a pergunta implícita, nem mesmo se permitiu tentar decifrar o tom que havia usado ou o que os tremores no corpo pressionado contra o seu significavam. Sentiu o amigo relaxar em seus braços, mas continuou imóvel, incapaz de fazer algo além de se recriminar por suas ações absurdas, até que Seamus se virou completamente, ainda junto a Dean, o calor que emanava friccionando contra o seu.

Dean… repetiu, o olhando fixamente, azul acinzentado contra castanho escuro, levando uma mão repleta de pequenas sardas até o rosto de Dean.

Nesse momento, finalmente se deu conta de que não tinha como fingir que nada havia acontecido, ignorar o seu erro e seguir em frente. Seamus estava ali, esperando por sua reação, provavelmente para confrontá-lo sobre sua atitude patética, sobre a forma como vinha agindo de maneira estranha a meses. Dean não tinha uma resposta que conseguisse manter a amizade dos dois intacta, então ele fez a única coisa que podia fazer: ele fugiu.

E foi assim que ele se encontrou correndo descalço e apenas de pijama por Hogsmeade, o vento gelado o fazendo lembrar que havia deixado sua varinha em casa, até que parou indefeso nas bordas da floresta, arrependimento escorrendo por seu rosto, embaçando a sua visão, o gosto salgado misturando-se com o da pele de Sea.

Estava perdido, sozinho, com frio e provavelmente havia estragado anos de amizade em questão de minutos. Como poderia ter sido tão estúpido? Trabalhara tanto para não se permitir imaginar como seria ter Seamus em seus braços, convencido que era um devaneio tolo e passageiro, que isso não implicaria em nada na sua sexualidade e que jamais deixaria afetar a relação que tinha com o amigo novamente.

Mas estivera errado esse tempo todo. Negar o que sentia só o deixara miserável e o fizera perder a noção de seus atos, prejudicando e provavelmente destruindo qualquer chance de manter o melhor amigo por perto.

 –Dean, seu idiota, onde você está? – Ouviu a voz irritada de Seamus, o sotaque pesado o confirmando que seus medos haviam se tornado realidade.

Resolveu não responder e fez o que parecia ser a melhor coisa na situação: sentou no chão da floresta e chorou como não fazia desde o fim da guerra. Chorou por ter perdido o seu melhor amigo, por temer a reação dos outros quando soubessem o motivo de porque Sea o odiava e chorou, principalmente, por não saber se conseguia aceitar quem era. O que era. Não quando isso poderia ter causado o fim da melhor coisa que já havia lhe acontecido.

Em seu desespero, não notou a proximidade do amigo, apenas percebeu a sua presença quando sentiu os braços o envolverem, o acalentando no chão úmido, murmurando palavras de conforto que contradiziam o que os pensamentos de Dean o fizeram acreditar.

— Você tem sorte dessa calça ser sua, Dean, eu nunca ia te perdoar se eu sujasse minhas roupas só porque você decidiu rolar no chão.

Riu da tentativa fraca de piada do amigo, já que qualquer um que conhecesse o Finnegan sabia que ele não poderia se importar menos com coisas supérfluas como roupas, principalmente levando em consideração a sua propensão ao desastre. Mas ele estava ali, esforçando-se para quebrar a tensão, ajoelhado na beira de uma floresta, descalço e com um casaco jogado às pressas por cima de seu corpo, indicando que saíra correndo atrás de Dean sem pensar duas vezes.

— Você não me odeia? – Perguntou baixo, sem tirar o rosto das mãos, com medo de ver o que estava refletido no azul tempestuoso.

— Por que eu te odiaria, ein? – Seamus respondeu, a voz em um tom que não conhecia, algo entre desconfortável e, talvez, esperançoso.

— Você não vai me odiar se eu disser a verdade? – Continuou perguntando, precisando se certificar que não arruinaria tudo.

— Dean Thomas, deixa de ser idiota, se eu te odiasse eu estaria quase congelando no meio do nada? – E agora Seamus estava impaciente e esse tom era muito mais comum e familiar. Sem nem mesmo o ver, conseguia imaginar a ruga entre os olhos que aparecia quando franzia as sobrancelhas.

— Eu acho… – tentou começar, mas sua voz falhou. Reuniu toda a coragem de sua antiga casa e se forçou a abrir a boca: – Talvez, bem, não sei, mas… – as palavras lhe escaparam novamente, mas precisava dizer o que sentia antes que explodisse, – eu acho que estou apaixonado por você.

Pela segunda vez no dia, sentiu o corpo do melhor amigo enrijecer. Antes que pudesse entrar em pânico, o ouviu perguntar hesitantemente: 

— Você acha?

— É, sim, eu sinto muito, mas eu acho que sim,  – respondeu envergonhado, a voz abafada pela posição em que estava, mas recusando-se a encará-lo, repetiu, – estou apaixonado por você.

— Okay, isso pode ser um problema. 

E era como se o seu coração estivesse se rasgando na frente de seus olhos lentamente, cada fantasia que havia criado virando pó. Não estava particularmente esperançoso, era verdade, mas alguém podia o julgar por querer os seus sentimentos retribuídos? Seus olhos voltaram a encher de lágrimas, mas não teve tempo de sucumbir ao drama, pois logo foi interrompido por Seamus.

— Porque eu estou apaixonado por você, Dean, não tem nada nesse mundo que me faria duvidar disso.

— Você… Por mim? – Permitiu que o amigo retirasse as suas mãos e liberasse o seu rosto, o deixando encarar Seamus com incredulidade. – Tem certeza?

— Sim, por você, sim, eu tenho certeza. Eu te amo. E por isso eu preciso que você também tenha certeza.

Mas o problema era que Dean mal conseguia decifrar o que estava sentindo, como poderia prometer amor eterno quando não entendia a complexidade de suas emoções? Não seria justo com o outro apenas dizer sim sem pensar nas consequência, sabendo que poderia descobrir que fora tudo um misto de delírio e necessidade de conexão, busca por algo mais profundo no relacionamento mais estável que possuía.

— Eu nunca me senti assim antes, por ninguém, menos ainda por um homem e eu não sei, Sea, eu não sei o que te dizer.

O amigo absorveu as suas palavras, parecendo pensar no que elas representavam para ele. Era a verdade, Dean jamais o enganaria, mesmo que isso o fizesse desistir de explorar o que existia entre os dois. Sorrindo, Seamus pareceu chegar a uma decisão – e Merlin, a forma como as sardas se encolhiam e esticavam com cada expressão de seu rosto era material para metade dos seus sonhos.

— Eu vou estar aqui até que descubra, – falou, ainda sorrindo, caloroso e tudo o que o fizera se apaixonar em primeiro lugar, – se estiver bom para você, eu não vou a lugar nenhum.

— E se eu te magoar?

— É um risco que estou disposto a correr. Certas coisas valem a pena e você, nós, é uma delas.

Impulsivamente, Dean o beijou, tentando experimentar a veracidade das palavras que mal saíram de seus lábios. Foi desconfortável e estranho até o momento em que não foi, encaixando-se nos braços de Seamus com dificuldade, forçando o seu corpo a relaxar no espaço do outro, até tornar-se a melhor sensação que já havia experimentado.

Se Seamus acreditava que Dean valia a pena esperar, então talvez fosse verdade. E, tendo a chance, Dean queria descobrir todos os detalhes de Sea que não conhecia, o tocar como nunca havia tocado. O queria pela manhã, com seus olhos inchados de sono, e traçar caminhos que ninguém nunca havia traçado. Queria aprender as constelações que se espalhavam por suas costas, o topo de seus ombros, suas bochechas e mãos e pernas. Queria toda e cada pequena sarda que o cobria.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

E então, o que acharam?

O Dean é 100% dramático, mas nós o amamos assim mesmo, eu espero k

Aceito comentários, críticas (construtivas, claro), especulações, enfim, vou adorar saber os pensamentos de vocês sobre a história, de verdade.

Até a próxima!



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "I want (every other freckle)" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.