A arte de amar com os olhos (Kagehina) escrita por Linesahh


Capítulo 1
Kagehina I One-shot


Notas iniciais do capítulo

Line na área!

Depois de um tempão saiu one de Haikyuu no perfil, glória kkkkk

Sim, não vai ser a Sahh que trará o tão amado Kagehina dessa vez :3
Confesso que nunca pensei em escrever algo desse shipp, acho que porque sempre tive receio e também coloquei na cabeça que só a Sahh faria coisas deles, então estou feliz em estar trazendo uma minha para vocês!

O que era para ser uma fluffy curtinha, acabou saindo esse monstrinho! Espero que gostem



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A arte de amar com os olhos

por Line 

 

O treino daquela terça-feira havia sido mais do que revigorante para Hinata. Mesmo após os veteranos irem embora e ele e Kageyama terem pedido para ficar até tarde a fim de treinar o novo rápido, o ruivo não sentia-se nem um pouco cansado depois de ficar pulando e correndo por mais de duas horas. O relógio já batia às 21:00 quando enfim terminaram.

Já estavam mais do que acostumados a ficar após o treino diário do time, principalmente porque poderiam evoluir ainda mais depressa e afinar cada vez mais a sincronia daquele novo rápido que vinha empolgando a mente do baixinho mais do que qualquer outra coisa no momento.

Ambos organizavam o resto das coisas, prontos para apagar as luzes e trancar o ginásio. Hinata comentava alegremente sobre ter achado os levantamentos de Kageyama daquele dia mais “certeiros” do que o costume, enquanto que o moreno ocupava-se em catar as últimas bolas perdidas pelo chão.

Hinata não reparou, mas a todo momento o olhar profundo e impetuoso de Kageyama acompanhou cada gesto que fazia, fosse dobrando as toalhas, enrolando a rede ou durante o simples ato de sorrir em meio às palavras animadas que saíam de seus lábios rosados enquanto carregava o comum brilho nos olhos cativantes.

Kageyama não sabia dizer, mas Hinata parecia mais vívido naquela noite.

… E isso mexeu com o levantador mais do que o normal.

Ao saírem, discutiram rapidamente sobre quem levaria as chaves do ginásio. Considerando que da última vez Hinata quase perdeu-as à caminho de casa — acabando por atiçar a fúria insana de Tanaka —, Kageyama se prontificou a ficar com elas daquela vez.

A noite estava linda. Nem muito fria ou abafada, um bom clima para se passear à luz das estrelas. Como de costume, iam seguindo parte do trajeto juntos, com Hinata tagarelando sem parar enquanto levava a bicicleta logo ao lado. Kageyama apenas acenava e fazia alguns comentários superficiais.

Se Hinata não estivesse tão focado no próprio falatório, teria notado que o moreno estava mais calado que o normal e que seus olhos azuis o observavam de uma forma pouco intolerante e muito mais sugestiva. Os passos silentes e morosos escondiam o desejo do levantador em permanecer um pouco mais de tempo na companhia de Hinata, mas, obviamente, teve de rebater os comentários trocistas do outro que dizia estar um pouco “mole” demais, retrucando em seguida que sentia-se apenas com sono.

Em meio a travessia da rua deserta e o findar de um último olhar à face infantil do ruivo que era refletida pela luz do luar, Kageyama foi tomado por um impulso não calculado, e antes que pudesse perceber, as palavras já estavam deixando seus lábios com naturalidade, interrompendo a narrativa do outro:

— Hinata — chamou-o.

— Hum? O que foi? — Hinata confundiu-se por ter sido brecado no meio do raciocínio verbal, erguendo os olhos límpidos e inocentes para Tobio.

O corpo de Kageyama reagiu à atenção que recebia do dono de seus pensamentos mais veementes nos últimos meses. Sentiu a garganta secar e as palmas formigarem de leve.

Mas, ainda assim, decidiu ir até o fim com o questionamento que já o acompanhava há algum tempo:

— Por que você decidiu confiar em mim desde o início? — sua voz saiu baixa e neutra, sem emoções aparentes, o que não condizia com a palpitação ansiosa em seu peito.

Confusão pura inundou as feições delicadas de Hinata.

— Hã? Por que isso do nada?

— Só responda.

Hinata continuou encarando-o um pouco incerto, o cenho franzindo-se levemente. Uma moto passou por eles, e após o som irritantemente alto do motor se afastar junto com ela, o ruivo arriscou:

— Hum… com “desde o início”, você quer dizer…?

— Sim, desde o nosso primeiro ataque-rápido — Kageyama assentiu.

Com a confirmação, Hinata ficou pensativo. As pequenas mãos descansavam no guidão da bicicleta que ia sendo manipulada conforme caminhavam, e os olhos castanhos-claros perderam-se no céu. Não demorou muito, e uma não-tão-discreta-careta tomou forma no semblante delicado.

— Bem… a resposta é óbvia — desviou os olhos. — Foi porque eu já sabia o quão incrível você era desde o nosso primeiro jogo no fundamental — murmurou, como se admitir tal coisa fosse um verdadeiro martírio para seu coração e uma dolorosa punhalada em seu ego.

— Sério? — Kageyama o olhava com atenção.

— Sim, sim; só não me faça repetir de novo, é frustrante demais pra mim, ok? — reclamou, um pequeno bico formando-se em seus lábios.

— Tá — foi só o que o moreno respondeu.

Tobio não faria comentários sobre aquilo, mas seu interior encheu-se de orgulho ao saber que, de alguma forma, Hinata o admirava — mesmo sabendo muito bem que essa admiração dita pelo ruivo estava voltada especificamente para seus levantamentos, e não num sentido favorável para seus atuais sentimentos em relação ao baixinho.

E, diferente das outras vezes, em que o conformismo perdurava em seus pensamentos em primeira mão, Kageyama, naquela noite que, até então, não tinha nada de especial, desejou ir um pouco mais longe e dar voz ativa para as emoções dolorosamente reprimidas em seu peito.

Enfim, alcançaram o ponto em que teriam de se separar, onde Kageyama viraria à esquerda e Hinata continuaria a subir a rua de bicicleta. Contudo, antes que o ruivo pudesse pensar em subir no “veículo”, foi impedido pelo enlace da mão de Kageyama em seu antebraço. Novamente confuso, buscou os olhos do moreno, deparando-se com um curioso brilho de obstinação presente na cor azul-escura.

— Você… continua confiando em mim? — Kageyama perguntou com voz anormalmente baixa.

Hinata franziu o cenho pela segunda vez.

— Você tá estranho, Kageyama… — comentou, os olhos analisando cada centímetro das feições glaciais do levantador, atento a algum sinal de enfermidade. — Confiar como? É sobre o rápido de novo? — questionou.

Kageyama não respondeu, somente continuou a encará-lo em silêncio, o que fez Hinata deduzir que ele estava esperando sua resposta. O cantar solitário de um grilo ao longe preencheu o silêncio estranho que se formou entre eles, e, desejando sair daquele clima anômalo, decidiu responder logo a dúvida do outro:

— Bem… eu confio em você, sim, Kageyama — o olhar intenso que recebia do levantador o fez ficar levemente nervoso, levando-o a explicar-se melhor: — Confio em você de muitas formas… bom, com exceção de pedir ajuda para os testes de inglês e outras matérias, é claro, além de que às vezes você me dá um pouco de medo — acrescentou rapidamente. — … Mas é, confio sim — deu de ombros. — É natural já que somos amigos, certo? — um sorriso simples pincelou-se em seus lábios, buscando trazer de volta a aura habitual entre eles.

Kageyama, porém, divagou profundamente sobre suas palavras, o semblante distraído.

— Muitas formas... — murmurou, parecendo não dar importância para o resto da frase.

Hinata apenas o observou um pouco sem jeito. Kageyama estava mais do que estranho… o que havia com ele? O levantador estivera tão normal o dia todo, mal-humorado e excelente no treino, como sempre. O que mudou de antes para agora?

Constatando que a situação estava complicada demais para que ele resolvesse sozinho, Hinata somente abriu um meio sorriso hesitante, libertando seu braço lentamente da mão que o segurava. Dirigiu-lhe um acenar de despedida. O fim do contato entre suas peles foi o que despertou Kageyama, que voltou os olhos para seu rosto.

— Bem… eu já vou indo — disse, se preparando para subir na bicicleta enquanto ajeitava a bolsa no ombro. Ergueu os olhos uma última vez. — Nos vemos aman...

Não houve tempo ou espaço para perceber ou sequer digerir o que exatamente havia acontecido no instante seguinte. De alguma forma extraordinária, entre o intervalo de um segundo para o outro, a mão de Kageyama jazia firme em sua nuca, enquanto seus lábios eram pressionados pelos do levantador.

A explosão dentro de Hinata foi tão violenta que nem mesmo o alto estrondo da bicicleta se estatelando no chão foi capaz de adentrar sua mente conturbada. Seu cérebro, por outro lado, só conseguia digerir pouquíssimas coisas, como a respiração quente e rápida do levantador misturando-se com a sua própria; a leve pressão das mãos grandes que seguravam-lhe as faces com parcial sutileza; e a mínima e delicada movimentação que os lábios de Kageyama faziam sobre os seus, incitando o aprofundamento do contato de forma lenta e ao mesmo tempo… arrebatadora.

E, assim como cerca de três segundos atrás, o cenário mudou drasticamente no momento em que o alto estalo do tapa desferido freou não só o beijo, como também o turbilhão de emoções escandalizadas e chocadas no interior de Hinata, que voltou a si de imediato.

Sua palma direita ardia da mesma forma de quando praticavam saques, e a marca avermelhada era visível no rosto de Kageyama, parado à sua frente.

— O-O que… o que você tá fazendo?! — mais tarde, Hinata com certeza sentiria vergonha do quão fina sua voz soou naquele momento, mas, por hora, estava pouco ligando para isso. — Seu... seu idiota!

O rosto de Kageyama transpassava confusão e atordoamento enquanto observava a reação totalmente escandalizada dele.

— Mas... foi você mesmo que disse que confiava em mim de muitas formas! — alegou, o tom de voz denunciando o quão confuso estava.

— Tá, mas você não me avisou que faria algo assim, caramba! Enlouqueceu?! — Hinata nunca mostrou tanta indignação nas feições e no tom de voz, deixando o moreno totalmente sem reação.

— Eu... Eu pensei que...

De repente, uma voz muito familiar disparou a suas direitas, os fazendo pular de susto no lugar:

— Hey, o que tão fazendo na rua a essa hora? Amanhã tem aula, vocês têm que levantar cedo, moleques! — o treinador Ukai, parado diante da porta de sua loja de conveniência, bradou irritado, um cigarro equilibrando-se em seus dedos conforme gesticulava para os dois garotos.

— Nós… nós já estamos indo — Kageyama tratou de dizer, contudo, seus olhos logo acompanharam a movimentação agitada do ruivo ao seu lado, que, incapaz de permanecer ali por mais tempo, subiu na bicicleta e pedalou para longe com uma rapidez invejável, sumindo de vista em poucos segundos. A respiração ofegante e o rosto tomado pela vermelhidão foram as últimas coisas que Kageyama viu em seu semblante delicado e, agora, decididamente tomado pelo puro transtorno.

Enquanto o técnico se recolhia em sua loja em meio aos resmungos, Kageyama observou o ponto em que Hinata sumiu de vista, sem saber o que pensar. Os lábios ainda queimavam pelo recém contato, e a adrenalina ainda estava presente em cada veia de seu corpo, assim como as batidas aceleradas de seu coração que fazia com que seus ouvidos vibrassem.

Há poucos segundos, estava tão feliz… e agora, tudo virou um verdadeiro pesadelo — acompanhado de brinde por aquele forte tapa que levou. Seu rosto ainda apresentava claros sinais de ardência.

Podia jurar que aquele era o momento certo… por que ele reagiu daquela forma? O que havia feito de errado?

Quando uma pessoa diz que confia na outra, uma situação dessas não deveria ser um problema, certo?

E foi enquanto retornava para casa, com a rua deserta e silenciosa pairando no ambiente exterior, ao mesmo tempo em que os pensamentos e dúvidas ensurdecedoras preenchiam sua cabeça sem pausas, que Kageyama cogitou a última possibilidade plausível; uma que deixou-o totalmente sem chão:

… Talvez, houvesse uma chance de que Hinata não sentisse absolutamente nada por ele.

▪️▪️▪️

No dia seguinte, Hinata atravessou os portões de Karasuno sem saber como encararia Kageyama.

Sua verdadeira vontade era de nunca mais pisar no mesmo chão que ele. Se o visse cara a cara, poderia infartar de tanta vergonha ao recordar-se daquilo. Ainda que buscasse pensar em qualquer outra coisa que existisse na face da terra, nada parecia ser capaz de tirar aquela sensação inédita e apavorante que foi estar nos braços de outro alguém, enquanto lábios macios e firmes pressionavam sua boca com claro desejo e ímpeto.

Kageyama havia lhe beijado. Beijado. Justo Hinata, seu amigo e parceiro de time. Onde ele estava com a cabeça? Qual era o problema dele? Desde quando as coisas estavam daquele jeito entre eles?

… Há quanto tempo Kageyama estava planejando fazer aquilo?

Não tinha como negar: um beijo era um beijo. Pessoas apaixonadas se beijavam, assim como os namorados e casados. Com certeza não era um ato a ser praticado por dois amigos, certo?

A não ser que um deles… talvez…

— Hey, Shouyou! O treino já vai começar, vambora! — a imagem hiperativa de Nishinoya interrompeu seus pensamentos, puxando-o para fora da sala de aula vazia. Hinata mal percebeu que o último tempo já havia terminado…

De fato, estava pior do que pensava. Normalmente, ficava contando os minutos para o treino começar, e hoje sequer prestou atenção no relógio. Tinha que se acalmar. Tinha que parar de pensar em Kageyama. Tinha…

— Oh, já está aqui, Kageyama?

Hinata petrificou ao escutar a fala do líbero. O cérebro entrou em curto-circuito. Viu a imagem do levantador parado em frente ao ginásio fechado como se fosse um verdadeiro filme-de-terror. Nishinoya, por outro lado, continuou a se aproximar normalmente.

— Boa tarde, Nishinoya-san — o levantador cumprimentou, aparentando ser o mesmo de sempre. Quase no automático, ele olhou por cima do ombro do líbero, enquadrando o atacante em sua visão.

O contato não durou nem meio segundo, pois logo Hinata abaixou a cabeça e desviou os olhos para o chão, sentindo o rosto esquentar e o coração disparar de uma forma aterradora. Nishinoya não pareceu perceber a reação do ruivo. Abriu o ginásio e mandou que montassem logo a rede, pois os outros estavam para chegar. Forçando-se a se mover, Hinata passou por Kageyama sem encará-lo, sentindo-se ainda menor do que o habitual. Afastou-se e pôs-se a ajudar o segundanista.

Aquilo estava pior do que esperava. Ver Kageyama à sua frente era mais excruciante que enfrentar mil bloqueadores, isso era certo. Seu coração não acalmava-se um segundo sequer, e o rubor não deixou suas bochechas mesmo quando entornou a garrafa d'água com apenas cinco minutos de treino. A todo momento, podia sentir a queimação dos olhos azuis em sua nuca, e mesmo quando não era o caso, algum fenômeno em sua volta o fazia sempre saber quando o levantador estava próximo de si, causando calafrios em seu corpo.

Mesmo tentando disfarçar o embaraço que sentia, Hinata acabou chamando a atenção dos outros quando escolheu cortar apenas os levantamentos de Sugawara, evitando Kageyama de todas as formas possíveis. Os cochichos não demoraram a crescer entre os colegas, que começaram a indagar se havia acontecido alguma coisa entre eles.

Kageyama permaneceu inexpressivo durante todo o treino, como se absolutamente nada tivesse acontecido no dia anterior. Para Hinata, ele parecia como um perfeito robô, sem demonstrar o mínimo de emoções e com os levantamentos excelentes de sempre; em contrapartida, o ruivo encontrava-se em um de seus piores dias em consequência da distração, errando mais do que qualquer um ali.

— Me desculpem!... — falou ao receber a bola da forma errada pela sexta vez, pondo-se a correr atrás dela.

Foi um dia terrível. Hinata nunca ficou tão feliz quando o treino finalmente acabou, e aquela foi a primeira vez que isso aconteceu desde que entrou no clube de vôlei. O clima de tensão estava tão evidente que até os técnicos perceberam que havia algo de errado com os dois calouros.

— Bem… o treino de hoje foi mediano — Ukai lançou um olhar estranho para o levantador e o isca, mas não fez comentários. — Podem ir, por hoje já chega.

— Ué, não vai ficar para treinar com o Kageyama, Hinata? — Tanaka perguntou ao ver o primeiranista juntar suas coisas rapidamente e dirigir-se até às portas de saída.

— Ah… hoje não — o ruivo evitou os olhos de todos os companheiros de time, forçando um sorriso. — Estou um pouco cansado… até amanhã — despediu-se, deixando o ginásio antes que o alguém o chamasse de volta.

— Eu também já vou — para a surpresa de todos, Kageyama já havia juntado suas coisas, passando por eles e dando um curto aceno. — Boa noite a todos.

Um silêncio decididamente intrigante apossou-se da quadra. Todos os semblantes estavam tomados por confusão.

— Será que eles brigaram ontem? — Tanaka sugeriu, coçando a nuca.

— O Kageyama deve ter xingado ele demais da conta... — Nishinoya tinha a mão no queixo, pensativo. Logo, os olhos intensos assumiram um brilho decidido. — Como o senpai exemplar que sou, peço permissão para dar uns cascudos no Kageyama para fazê-lo parar de ser babaca com o Shouyou!

— Nem pensar, Nishinoya — Sugawara revirou os olhos, soltando um suspiro ao voltar a atenção para as portas novamente. — Deixe-os, logo eles se resolvem sozinhos. Tenho certeza de que está tudo bem — disse com esperança.

Infelizmente, a previsão de Sugawara acabou sendo completamente equivocada. O estranhamento entre os dois primeiranistas piorou deveras nos próximos dias, chegando a ponto de a péssima sincronia de ambos levar o time a perder todos os sets de um amistoso.

No fim, até Takeda teve que intervir.

— Hinata-kun, tem certeza de que o Kageyama-kun não te fez nada? Seja sincero — ele pedia com calma e gentileza.

Hinata, por outro lado, só sentia-se ainda pior com a situação, principalmente porque parecia ser o único abordado pelos colegas, que lhe mandavam revelar o que havia de errado. Àquela altura, estava arrependido de ter sido tão transparente…

Mas não conseguiria ser diferente disso. Não depois do que Kageyama fizera.

— Não foi nada, sensei, é só que… — tentou desviar da pergunta, contudo, os olhos analíticos do professor o encurralou de todos os lados. Engoliu em seco, apertando as mãos. — … é que… bem, ele até fez uma coisa... mas não da maneira que estão achando — remexeu-se desconfortável no banco. — Ah, eu não quero falar sobre isso, por favor, não me obrigue! — tapou os rosto.

Takeda não insistiu, mas Hinata o viu falando seriamente com o treinador Ukai enquanto se exercitava com os outros antes do treino começar. Só no fim do dia foi descobrir o cerne da conversa dos professores, e isso aconteceu no momento em que Ukai bateu palmas e ordenou de modo firme e prático:

— Hinata, Kageyama, vocês ficam para limpar o ginásio.

Seu estômago embrulhou. Completamente.

Hinata sabia que eles decidiram isso de propósito a fim de que ele e o levantador fizessem “as pazes”. Mesmo que fosse algo extremamente ruim, ainda assim sentiu-se um pouco mal por estar deixando o time preocupado. Eles só queriam ajudar, afinal.

E foi pensando firmemente sobre isso que tomou coragem para falar com Kageyama pela primeira vez em dias. Deixou a tarefa de dobrar as toalhas para depois, indo encontrá-lo no depósito do ginásio, onde o moreno pegava os produtos que seriam passados no chão. Observou-o da porta, sem anunciar sua presença a princípio. Kageyama estava ocupado em despejar os líquidos coloridos e perfumados num balde, onde seriam mergulhados os panos a fim de passarem no chão da quadra.

O levantador tinha as mangas da blusa creme arregaçadas, carregando uma expressão neutra e pensativa enquanto cuidava do serviço. Um arrepio familiar voltou a circundar a espinha de Hinata. Sentia-se nervoso por estar sozinho com ele num ambiente fechado, mas tinha que ajeitar as coisas de alguma forma.

Esquecendo-se por hora do nervosismo, respirou fundo.

— Kageyama — chamou, dando um passo para o interior da salinha.

Ele voltou-se em sua direção, sem reação aparente.

— O quê? — perguntou.

O jeito glacial do levantador o perturbava mais do que nunca naquele momento. No íntimo, Hinata preferia que ele se irritasse, perdesse a paciência e o xingasse como de costume. Qualquer coisa era melhor do que aquele silêncio tortuoso e a inexpressividade absoluta.

Diferente dos últimos dias, Hinata sustentou o olhar dele. Achou que a melhor escolha era ir direto ao ponto e foi exatamente o que fez.

— Olha… eu não quero que a gente atrapalhe o time — disse baixo, e o conteúdo da conversa pareceu causar uma reação “a mais” do que a atual indiferença do levantador, que o olhou com mais atenção. Dessa forma, o ruivo desviou os olhos para as próprias mãos, apertando-as uma na outra. — Então... eu proponho que o melhor a fazer… — suspirou, finalmente voltando a erguer os olhos. — É esquecermos o que houve.

O silêncio de Tobio o fez se sentir… estranho. A sugestão que era para ser uma válvula de escape, acabou por se tornar muito mais pesada após sair de seus lábios.

De repente, a voz baixa de Kageyama cortou o silêncio, mais

séria do que nunca:

— Você realmente odiou, não é?

Hinata sentiu-se baqueado. Não esperava uma pergunta dessas. Não agora. Não dessa forma. Não quando sequer teve tempo de pensar verdadeiramente no que aquele beijo representou para si.

— Eu... eu não disse isso — murmurou. Massageou o braço direito, agora sendo incapaz de encarar o mais alto.

A aura de Kageyama mudou. Sua presença ficou ainda mais forte, e quando ele se aproximou alguns passos, ficando a meio metro de Hinata, o ruivo sentiu o ar tornar-se cada vez mais difícil de inspirar. Deu um passo para trás.

O levantador o encarava mais fechado que nunca.

— Mas também não parece ter ficado feliz. Você mal me olhou nesses últimos dias — pela primeira vez, havia mais do que só frieza na voz grave, e Hinata sentiu-se a pior pessoa do mundo ao reconhecer o claro sentimento de mágoa.

Por algum motivo, foi como se encolhesse vários centímetros com a presença marcante do levantador tão próxima, assim como na noite em que tudo foi por água abaixo no instante em que ele o beijou. Não olhou-o em momento algum. A coragem esvaiu-se de seu corpo completamente.

Comprimiu os lábios.

— Sim, mas...

— Eu gosto de você, Hinata — as palavras foram diretas, acertando-o como se fossem toneladas de tijolos. Pela primeira vez naquela noite, Kageyama não soou frio, tampouco irritado. Os olhos azuis buscavam os castanhos com autêntica necessidade. — E, por um tempo... também achei que você gostasse de mim — revelou. — Mas depois do que houve... — ele desceu os olhos para o chão, amargurado. — Vejo que me enganei.

— Kageyama...

— Vamos fazer como você disse, então — o tom decidido do levantador surpreendeu Hinata, que ergueu os olhos para ele. Kageyama continuou, impassível: — Esquecer é a melhor escolha.

Ainda que dissesse aquilo, os olhos dele refletiam o contrário, e Hinata soube na mesma hora que aquela decisão não o agradava de nenhuma forma.

… Assim como descobriu, um pouco depois, que não agradava a si próprio.

Hinata sabia que aquele era o único momento para dizer algo que decidisse permanentemente o rumo daquela situação estranha entre eles, nem que fosse um “vamos conversar melhor sobre isso”, ou até mesmo um “ok”. Sabia que qualquer coisa teria sido melhor do que apenas permanecer em silêncio enquanto assistia a decepção inundar o semblante de Kageyama e a infausta escuridão preencher seus olhos antes deste sair do depósito, deixando-o sozinho.

Simplesmente não foi capaz de dizer nada.

Terminaram de arrumar o ginásio num silêncio insuportável para o ruivo, e muita vezes pegou-se olhando para Kageyama, indeciso entre aproximar-se ou ignorá-lo como vinha fazendo nos últimos dias. No fim, não fez absolutamente nada, e após se separarem na rua de sempre trocando um baixo “boa-noite”, Hinata, enquanto pedalava sua bicicleta em direção às montanhas, sabia que aquele último olhar de Kageyama o atormentaria pelo resto da noite.

▪️▪️▪️

No dia seguinte, encontraram-se com Yachi para estudar depois do intervalo, como sempre faziam às sextas-feiras. A loira buscava deixar um clima mais ameno com comentários leves e conversas banais, contudo, sua parcial ansiedade em relação ao desentendimento dos dois garotos era um pouco evidente nos olhos castanhos-claros e no sorriso nervoso.

Hinata conversava com naturalidade, dando corda aos assuntos diversos que a garota puxava, mas era quase uma missão impossível ignorar a presença do levantador ao seu lado, ainda mais com seus pés tocando-se vez ou outra quando um dos dois abaixava-se para pegar algum livro ou material nas mochilas. Cada vez que isso acontecia, o sorriso tranquilo nos lábios do ruivo vacilava, e o tremor nervoso de seu corpo não passava despercebido pelo moreno.

Após um tempo em que treinaram alguns verbos em inglês, Kageyama levantou-se, dizendo que iria comprar algo para beber, deixando a sala em seguida. No momento em que o levantador deixou o assento, um alívio gigantesco apossou-se do corpo de Hinata, que soltou todo o ar que estivera segurando até então.

… E, é claro, isso não passou despercebido para Yachi.

— Hinata-kun… — o tom animado que ela usara até então fora substituído por um mais sério e franco agora que estavam sozinhos. Ela o olhava profundamente. — Normalmente não gosto de me intrometer… mas o que aconteceu com vocês dois?

Naquele momento, Hinata sentiu-se derrotado. Não era mais capaz de mentir ou esconder a verdade, principalmente de Yachi, que lhe confiou seus problemas e inseguranças relacionados à mãe dela quando se conheceram. Seria injusto com a garota que apenas estava verdadeiramente preocupada consigo.

E, considerando a vez em que ela quase surtou quando ele e Kageyama tiveram aquela briga feia — antes de serem parados pelos punhos de Tanaka —, o melhor a se fazer era ser sincero com a gerente.

Assim, contou tudo a ela. Não omitiu nada daquela terça-feira que ficaria marcada para sempre em sua mente, apesar de ainda não saber catalogá-la como sendo memórias positivas ou negativas.

O que precisava era de uma luz, e, felizmente, Yachi foi capaz de dar isso a ele.

— … Eu até já esperava que fosse algo assim, mas ainda é difícil acreditar que Kageyama-kun foi capaz de tomar essa atitude tão extrema… — a garota confessou, os olhos preenchidos por surrealismo.

Hinata surpreendeu-se.

— Espera, então você já esperava que isso acontecesse? Digo… o Kageyama te falou alguma coisa antes?

— Não, não; não é nada disso — ela negou rapidamente, buscando explicar de uma maneira melhor: — O papel de gerente, como me ensinou Shimizu-senpai, é observar tudo que acontece com os integrantes do time e com a atmosfera da quadra no geral… e desde que entrei no clube, sempre estive observando vocês dois — admitir aquilo a deixou um pouco corada, limpando a garganta para continuar: — E bem… como posso dizer isso? O Kageyama às vezes te olha de uma forma que os olhos dele… tipo… meio que brilham...

— Brilham? Tipo… com lágrimas? — o ruivo estranhou.

Yachi suspirou, vendo que teria que explicar de uma maneira que o ruivo entendesse corretamente o que queria dizer.

— Eles brilham como… como… ah, já sei! — ergueu o indicador, animada. — É exatamente como quando eu vi o rápido de vocês pela primeira vez!

O risível entendimento perpassou pelas feições inocentes de Hinata, que também se empolgou.

— Oh, eu lembro que seus olhos ficaram grandões e cheios de brilho, Yachi-san! — recorda.

— Uhum, isso! — a garota assentiu várias vezes, animada por estar no caminho certo.

Sem perder tempo, Hinata pôs-se a continuar com a lógica, colocando a mão no lábio inferior enquanto raciocinava:

— Então é tipo como o Asahi-san fica feliz depois de passar pelo bloqueio do Dateko… ou como o Nishinoya-san e o Tanaka-san sorriem quando vêem a Kyoko-san… ou como o Kenma perde aquela cara de desinteresse quando tá jogando aqueles negócios no celular dele?... — ergueu os olhos, no que a loira, agora um pouco atordoada, somente acenou. Mesmo sem entender metade dos exemplos, acreditou estarem num caminho semelhante.

— Isso, isso… é assim que ele te olha o tempo todo.

— disse, ganhando a atenção do amigo. — Eu já tinha começado a me perguntar se isso não significava algo… mas depois do que você me disse, tudo foi esclarecido — ela parecia satisfeita.

— Então… sou eu o motivo no caso do Kageyama? — baixou os olhos para o caderno aberto do levantador ao lado do seu, com as informações todas embaralhadas e desorganizadas de sempre, ainda que a letra fosse um pouco melhor que a sua.

— É. Podem ser objetos, situações ou até mesmo pessoas. O que importa é o que sentimos ao vermos um deles na nossa frente — a garota sorriu.

Hinata refletiu em silêncio as palavras da gerente. Nunca tinha pensado nisso. Nunca parou para prestar atenção em como os olhos das pessoas podiam dizer muito mais do que palavras verbais, assim como esse tal “brilho” que vinha acompanhado quando se vê algo que gosta…

Então… no caso… Kageyama realmente…

— Eu vou falar com ele — ergueu-se repentinamente, fazendo a garota tomar um susto. — Pode cuidar das nossas coisas por enquanto, Yachi-san? Prometo que logo voltaremos — ao acenar positivo de Hitoka, agradeceu e retirou-se dali, seguindo pelos corredores largos do prédio.

Algo lhe movia. Um sentimento de decisão, ainda que não tivesse nada ensaiado ou planejado. Simplesmente queria vê-lo, falar com ele sobre tudo aquilo, consertar as coisas de uma vez por todas. Seu coração estava acelerado, assim como a adrenalina que varria suas veias, mas ignorou tudo aquilo com o máximo de vigor. Adentrou os pátios externos do colégio, encontrando Kageyama onde sabia que ele estaria.

Como sempre, a máquina sofria com o ataque de dedos duplos do levantador em seus botões, apostando na sorte de qual bebida cairia daquela vez. Talvez ele tivesse usado um pouco de força a mais na visão de Hinata…

Mas isso não importava agora.

— Kageyama, preciso falar com você — parou atrás dele, obstinado, sem gaguejar ou corar.

O levantador virou-se, a caixinha de iogurte esperando para ser “resgatada” no compartimento inferior da máquina. Os olhos azuis impetuosos encontraram-se com os castanhos idealistas, e só foi naquele momento, naquele segundo, que Hinata foi capaz de ver; túrbido, mas claríssimo:

O brilho. Aquele brilho que Yachi lhe apresentara, e que de fato existia.

Como nunca havia reparado naquele olhar? Era como se Hinata fosse uma pintura, tamanha a intensidade com que era fixado. Nas poucas vezes em que flagrou-o olhando-o daquele jeito, foi quando faziam algum ponto incrível em cima de um time forte, sendo assim, nunca… nunca...

“Nunca percebi”, completou, sentindo-se um idiota.

Ser o alvo daquele tipo de olhar… sim, era constrangedor, mas não ruim. Sentia seu rosto esquentar, e era difícil sustentar aquelas orbes a sua frente, mas a palpitação estarrecedora em saber que era o único a ser contemplado daquela forma, o único que receberia aquele olhar do levantador, o único a ser desejado e almejado…

Sim. Era bom.

— Achei que já havíamos conversado ontem — o levantador falou devagar.

— Sim, mas não foi o suficiente — disse, aproximando-se mais um passo. Não havia alunos por ali, o que o ajudou a tomar coragem para continuar: — Você… falou sério quando disse que gostava de mim?

O semblante do moreno não se alterou.

— Sim.

Uma fisgada de vergonha assolou os sentidos de Hinata. Ele era tão direto... mas fez o máximo para esconder isso, organizando os pensamentos céleres e frenéticos que rondavam sua mente.

— Ah… ok — assentiu algumas vezes para si mesmo, recobrando o foco. — Sabe, eu… eu pensei muito nesses últimos dias — começou lentamente, cada pequeno gesto seu sendo acompanhado por Tobio.

— … E? — Kageyama o incentivou a continuar.

— E o caso é que... — engoliu em seco. — Eu reparei numa coisa — ergueu os olhos, dessa vez disposto a terminar o que havia começado. — O vôlei sempre foi a única coisa que eu pensava vinte quatro horas por dia, mas só agora me toquei que a única coisa que tenho pensado desde que acordo até a hora que vou dormir... é em você.

Aquelas palavras foram como uma libertação. Um peso enorme deixou seus ombros, e, enfim, pôde respirar com liberdade.

A verdade fora revelada. Hinata, mesmo não sabendo o que aquilo exatamente significava, sabia que era algo importante a ponto de ultrapassar — mesmo que um pouco — seu vício pelo vôlei.

… E, por isso, sabia que Kageyama era o único que poderia ajudá-lo a entender o significado, já que era o responsável pela existência daquela sensação em seu interior.

O olhar surpreso de Kageyama não passou despercebido. O levantador o observava como se temesse acreditar que realmente havia escutado aquelas palavras saindo de sua boca, talvez esperando que a qualquer momento Hinata surtasse e saísse correndo dali, como vinha fazendo todos os dias. Sendo assim, Shouyou fez questão de perdurar aquele contato entre os olhos, disposto a mostrar que falava sério, e que não, não se acovardaria daquela vez.

Kageyama enfim concluiu que as palavras eram verídicas, mas, ainda assim, precisava de mais uma confirmação.

— Você… — baixou os olhos por um momento, as mãos inquietas cerradas nos bolsos do uniforme. — … O que quer dizer com isso?

— Eu não sei — foi sincero. — Queria saber o que você acha.

O levantador pensou um pouco, para então avançar alguns passos morosos em sua direção, parando a sua frente. O rosto de Hinata estava agora um pouco erguido, os olhos presos nos do moreno, e não foi capaz de esconder o forte arrepio que apossou-se de cada centímetro de seu corpo quando o moreno inclinou-se um tanto, perto o suficiente para que Hinata ficasse armazenado num estado de pura tensão.

— Eu penso em você, Hinata — os olhos azuis contemplavam seu rosto como se fosse uma das coisas mais extraordinárias daquele mundo, e o ruivo perdeu o fôlego automaticamente ante a mira intensa. — Penso todo tempo, desde acordar até dormir, assim como você disse. Eu já sei o que significa pra mim. Mas e pra você? O que isso significa, Hinata?

O ruivo tremia. As mãos agarravam o tecido da blusa com força para não desabar. Aquilo estava tão rápido e sufocante… mas ao mesmo tempo era estranhamente fascinante ter aqueles sentimentos expostos e manipulados daquela forma por Kageyama, sem medo ou receio algum.

E ele estava tão perto…

Sim. Queria ir até o fim.

— … Eu acho que sinto o mesmo que você, Kageyama — sussurrou, o coração retumbando em seus ouvidos. — Eu não odiei o que você fez naquele dia… só fiquei surpreso, mas com certeza não odiei. Então ficou mais claro pra mim.

As feições do levantador amenizaram-se de súbito. Um brilho esperançoso varreu os olhos azuis-escuros e, pela primeira vez em todos aqueles dias, ele permitiu-se soltar o peso armazenado em seu peito com uma inspiração profunda. A palma direita ergueu-se, pousando no topo da cabeça do ruivo, como já havia feito tantas vezes num gesto de intimidação, mas agora repleto de pura estima e apreço.

— Vou deixar você pensar mais, Hinata — foi só o que ele disse, o rosto tranquilo e a voz calma despertando sensações únicas no interior do ruivo, que pensou nunca tê-lo visto daquela forma leve desde que se conheceram. — Não vou forçar a barra. Te darei o devido tempo para decidir o que fazer.

Hinata piscou, sentindo a sutil carícia dos dedos em seu cabelo um pouco inebriado.

— T-Tá.

— Vamos voltar, boke — o levantador deu-lhe as costas, pegando a caixinha de iogurte na máquina e rumando para dentro do colégio.

Um sentimento quente e aconchegante tomou conta de Hinata ao ouvi-lo chamar-lhe daquela forma que só ele poderia chamar. Tudo havia voltado ao normal. Não terminou com brigas, decepções ou choros. Foi com um largo sorriso que acompanhou-o para dentro, com destino a Yachi, como havia prometido.

Dali por diante, a convivência deles voltou praticamente ao normal, o que foi um alívio para todo o time. Os treinos voltaram a ser divertidos, e o novo rápido ficava melhor a cada dia. Hinata e Kageyama voltaram a permanecer até mais tarde para treinarem sozinhos, e mesmo com os sentimentos agora totalmente expostos nos olhos-azuis, Kageyama honrou sua palavra e não pressionou Hinata de nenhuma forma.

Foi só depois de uma semana que o ruivo decidiu que já havia pensado mais que o suficiente. Tomou sua decisão numa noite de terça-feira após o treino acabar. O clima não estava tão frio ou abafado, com as estrelas iluminando-os enquanto caminhavam lado a lado, seguindo parte do caminho juntos. Exatamente o mesmo cenário da última vez.

… Só que, dessa vez, quem puxou a manga do outro, impedindo-o de continuar o trajeto, foi Hinata.

— Kageyama, espere — olhou-o, reprimindo todo e qualquer receio que poderia sentir ao tomar aquela atitude. — Você… você pode fazer aquilo mais uma vez?

Agradecia pela noite mascarar um pouco a vermelhidão que tomava seu rosto. Suas mãos apertavam fortemente o guidão da bicicleta. Kageyama, por outro lado, pareceu somente confuso, como se não tivesse entendido a que se referia.

— … Beijar você?

— S-Sim… — assentiu constrangido, desviando os olhos.

— Por quê? — o levantador indagou com interesse.

— Só vai logo, Bakageyama! — irritou-se, sentindo-se cada vez mais arrependido de ter tido aquela ideia.

Já ia resmungar para esquecerem aquilo quando, sem prévias, Kageyama se aproximou, pegando-o pelo rosto e, sem hesitar, inclinou-se em sua direção, fazendo Hinata entrar num semi-pânico.

Engasgou violentamente.

— Para, para, tá muito rápido! — segurou as mãos do levantador pousadas em sua face, brecando o ato. O som da bicicleta se estatelando ecoou como um déjà vu para seus ouvidos. — Vai mais devagar, poxa!

O moreno não pareceu gostar.

— Você quer que eu faça, ou não? — o olhou com severidade e fina impaciência.

Hinata demorou um pouco para ceder, assentindo enquanto respirava fundo e se esforçava para fazer o coração parar de bater tão rápido. Soltou as mãos de Tobio, permitindo que ele continuasse. O moreno acariciou seu rosto com a ponta dos dedos, voltando a aproximá-los, a respiração acelerando-se assim como a do ruivo, que fechou os olhos com firmeza. Ouviu as últimas palavras de Kageyama antes que este selasse seus lábios como vindas de um sonho distante:

— Só relaxe… Shouyou.

A pressão dos lábios foi delicada num primeiro momento, mostrando que Kageyama queria fazer as coisas direito daquela vez, indo devagar e dando espaços para que Hinata se acostumasse. O movimentar só começou após Hinata subir as mãos suavemente pelos braços do levantador, incentivando-o a dar-lhe mais do que aquilo, sentindo-se totalmente entregue àquele ato.

Beijar Kageyama era como marcar o ponto mais incrível, daquele que todos do time adversário se jogam em vão para salvar a bola, seguido dos olhares frustrados e insatisfeitos ante o som do apito do árbitro. Era engraçado pensar que os mesmos lábios que pronunciavam xingamentos e ofensas para sua pessoa diariamente, pudessem ser tão doces e calorosos a cada investida que faziam sobre os seus, aprofundando a sensação única e incrível que o momento proporcionava a ambos os corações. Os suspiros perdiam-se na noite silenciosa, a maioria vindos de Hinata conforme os beijos vagavam por sua face, dando-lhe espaço para repor o ar antes de retornarem com cada vez mais vigor e intensidade, levando-o a desejar que aquilo durasse para sempre, que pudesse ter Kageyama daquela forma pelo resto de sua vida.

Os olhos azuis-escuros nunca estiveram tão brilhantes como no instante em que findaram o contato, as bochechas rubras e as respirações ofegantes. Olhando no fundo daquelas íris que carregavam todos os sentimentos mais profundos do moreno, num lapso, Hinata soltou:

— Você tem um espelho?

Assistiu o semblante ainda desfocado de Kageyama franzir-se de leve, confuso.

— Espelho? — o ruivo assentiu. — Pra quê?

— Eu quero ver se meus olhos estão brilhando mais do que os seus — respondeu com naturalidade, a obstinação transbordando nas írises castanhas. — Não vou ficar pra trás!

O véu do que pareceu ser quase um sorriso preencheu o rosto do moreno, que ergueu uma sobrancelha.

— Você quer competir até com isso? — disse um pouco incrédulo.

— Claro que sim! — Hinata assentiu como se fosse óbvio. — E eu vou superar você, pode apostar!

Kageyama recolheu a bicicleta, decidido a entrar no desafio.

— Eu gosto de você há mais tempo, então estou na frente — rebateu, observando, convencido, o ruivo inflar as bochechas com irritação.

— Então eu vou gostar de você dez vezes mais rápido e mais forte! — Hinata prometeu, enfático. — Eu não vou perder.

— Muito menos eu.

A partir dali, a promessa estava selada. Enquanto voltavam para suas casas, a única coisa que os dois garotos tinham na cabeça era a obrigação de amar um ao outro com toda a veemência e intensidade que pudessem reunir, decididos a se superarem de alguma forma, como os dois cabeças ocas que eram.

… Até hoje, não se sabe quem foi o vencedor. 


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Notas finais do capítulo

Aí, sério, amei escrever sobre eles. Me deu muita vontade de trabalhar mais com esse casal, eu shippo eles desde o primeiro ep, e esse amor só vem crescendo mais e mais

O que acharam da fic? Gostaram? Digam aí pra autora, onegai

Beijos, e até a próxima one (do jeito que eu a Sahh estamos viciadas, certamente será ou de Haikyuu, ou BNHA ).



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