Herói ou Vilão? escrita por Flor Da Noite


Capítulo 2
Herói - Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Oiie gente, mais um capítulo para vocês!!!



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— Cara, você é rápido. - Um homem de roupão abre a porta, parece que não sai da cama há dias, ele tira algumas notas do bolso e me entrega.

— Eu tento. - Dou de ombros, entregando as sacolas de remédios para ele. -Melhoras. - Acrescento quando ele faz uma cara estranha, talvez com vontade de espirrar.

— Valeu. Minha namorada meio que me arrastou para fazer aquelas trilhas malucas, mas aparentemente, ela se esqueceu de olhar se ia chover no dia. Você acredita que ela teve a cara de pau de virar para mim com um: pelo menos ficamos doentes juntos? - Ele balança as sacolas revirando os olhos.

— Ela parece divertida. - Comento por não saber o que falar.

— Ela é, tenho sorte de tê-la como namorada, estamos juntos faz dois anos. Enfim, valeu pelo serviço, cara.

Faço um sinal com a mão, indicando que estou a dispor e me despeço. Desde que comecei a trabalhar como entregador para um aplicativo de entregas – que vão desde comidas até peças de carros – descobri que existem dois tipos de pessoas: as que pegam suas entregas e simplesmente voltam para suas vidas; e as que matracam sobre qualquer coisa como se me conhecessem há séculos. Apesar de o primeiro tipo acelerar o meu trabalho, as do segundo são as que me animam mais. Um pouco de simpatia é sempre bom.

Sem contar que o atraso não é um problema quando se tem a velocidade da luz.

Não, você não leu errado.

Cinco anos atrás, nesse mesmo dia, o cometa Corvus passou pela Terra e, aparentemente, fui "O escolhido" pelo meteorito que se desprendeu dele. Foi a experiência mais bizarra que já tive em minha vida – e eu estou levando em conta a vez cai de cara no cocô de cavalo durante a excursão para o rancho na frente da turma inteira, na oitava série.

Lembro-me tão perfeitamente daquela madrugada que se fechar os olhos talvez consiga ver o brilho do meteorito atravessando o céu em direção ao chão.

Meu pai trabalhava muito e queria estar totalmente desligado da cidade, foi quando um parente do interior, avisou-lhe sobre um sítio em que os donos estavam alugando para o feriado. Meus pais ficaram super empolgados e eu... Bem, que garoto de 19 anos fica animado em ser arrastado para longe da civilização?

Enfim, eu fui.

Admito que eu até estava me divertindo fazendo as atividades malucas que meus pais inventavam. Mas naquela noite, quando eles resolveram jogar cartas na casa do tio John, que havia nos avisado do sítio, resolvi ficar na propriedade alugada.

Um raio tinha caído em uma das antenas, logo, eu não tinha televisão ou internet naquele dia e acabei me rendendo em sentar na rede e revezar entre o violão velho e a coleção de gibis empoeirados que eu havia encontrado. Com um balde de salgadinhos e uma lata de refrigerante o cenário parecia até bem agradável, por tanto nem me preocupei quando meus pais ligaram avisando que dormiriam na casa do tio John.

Quer dizer, bem estúpido, afinal, quem nunca viu um bom filme de terror?

Mas esse não é o ponto.

Eu estava tão relaxado ali, iluminado apenas por algumas lamparinas e abençoado com o som calma dos grilos e corujas, que por um momento, quando vi o cometa, pensei que fosse coisa da minha cabeça e voltei a dedilhar alguma canção hippie dos anos 60 que havia escutado tocar no rádio do carro durante o percurso de ida.

Só percebi que havia algo de errado quando a iluminação do local mudou e eu comecei a ouvir um som estranho. No momento em que os meus olhos encontraram o meteorito se aproximando do chão bem próximo de onde eu estava, senti-me paralisar. Uma sensação estranha percorreu o meu corpo, como se eu precisasse urgentemente ir de encontro àquilo.

Assim que a pedra acertou o chão, minha paralisia se desfez e eu larguei o violão de qualquer jeito, apressado para sair da rede e ir até o objeto. Lembro-me de ter desperdiçado um bom refri nessa correria e acredito que os salgadinhos esquecidos foram parar na barriga de algum animal silvestre mais tarde. Naquele momento, nada disso me importava.

Fui me aproximando do buraco feito na terra devagar, receoso. Eu já tinha visto filmes demais sobre alienígenas que usavam todo o tipo de isca para abduzir humanos trouxas o suficiente para cair nelas.

Apesar da ansiedade em saber do que se tratava aquilo, fui obrigado a recuar porque a pedra deu inicio ao incêndio no mínimo assustador. Chamas pretas e pratas balançavam em volta do objeto, alcançando o mato em volta.

Corri para a casa e depois de dois ou três baldes de água, consegui conter o fogo bizarro que eu nunca tinha visto em toda a minha vida, em contato com a água a pedra fez o clássico barulho de chapa quente sendo resfriada rápido demais.

Fiquei alguns segundos esperando ela parar de fumegar para me aproximar. Agachei-me ao lado buraco e analisei a pedra preta antes de estender a mão para finalmente tocá-la. Era menor que minha mão, cabia facilmente em minha palma e não era pesada.

Parecia mágica, me fez ficar vários minutos encarando-a em silêncio. Eu estava hipnotizado. Encantado.

Até que uma dor tomou conta do meu corpo. Tão intensa como nenhuma outra. Queimava e ardia como o inferno, sentia como se a palma da minha mão estivesse derretendo. Balancei os braços como um louco até tropeçar e cair de joelhos no chão, mas aquela maldita pedra se recusava a sair de minha mão.

A última coisa que me lembro dessa noite é de engatinhar pelo chão para dentro de casa e desmaiar de dor no chão de madeira.

No dia seguinte fui acordado pelo grito aterrorizado da minha mãe. Eu estava largado no chão e ela apontava desesperadamente para a minha mão, parecendo prestes a desmaiar.

Quando, finalmente, encarei meu braço vi o motivo do desespero. O meteorito havia derretido o meio da minha mão direita e se fincado ali. Marcas pretas, em forma de galhos subiam por todo o meu pulso – que mais tarde tomou todo o meu braço direito até o ombro. O meteorito parecia uma semente que criava raízes profundas em meu braço.

Raízes essas que transformariam completamente minha vida.

— Alec falando. – Atendo o celular que toda enlouquecidamente em meu bolso, estourando minha bolha de lembranças.

— Estamos a sua espera. – Uma voz calma e serena fala do outro lado. Não preciso de nenhum identificador para saber quem é: Tony.

— Desculpe, estou indo. – A ligação se encerra sem nenhuma despedida, masjá estou acostumado com isso.

Entro no aplicativo de entregas e encerro o meu horário do dia. Ainda é cedo, mas até que consegui fazer uma quantidade legal de encomendas. Dei sorte que a maioria eram próximas umas das outras.

Nos últimos anos eu tentei estar em empregos mais estáveis, entretanto, minha nova condição – agora não tão nova assim mais – requeria muitos desaparecimentos repentinos... Acho que isso não deixou meus chefes muito felizes. Eu tentei inúmeras vezes, até que um amigo me sugeriu os aplicativos de entrega. O trabalho de entregas é autônomo, o app cobra apenas uma pequena porcentagem para achar os estabelecimentos que precisam de um serviço, por tanto se eu sumir por algum tempo, ninguém vai perceber.

Sem contar que sou mais rápido que uma moto, então consigo ganhar muito mais dinheiro em menos tempo.

Guardo o dinheiro do pagamento e o celular no bolso. A rua está bem movimentada, o que é rotineiro dessa parte da cidade. Olho em volta disfarçadamente, localizando as câmeras, quando encontro um ponto cego, vou sumindo aos poucos, para não chamar atenção no campo de visão de ninguém.

Num piscar de olhos, não sou mais nada.

E ao mesmo tempo sou tudo.

As pessoas não percebem a sombra preta sem dono andar como um borrão veloz pelas paredes e calçadas.

Mesmo depois de cinco anos, os primeiros milésimos de segundos são estranhos. A mudança é muito drástica. Nunca passei por experiência humana parecida em toda minha vida, nem nunca ouvi ninguém narrar algo que se aproxime da sensação de ser uma sombra.

Eu não dependo exatamente da luz pra existir, se tudo estiver escuro, só não serei distinguível, mas tenho uma relação muito grande com ela. As cores são todas diferentes. Não é o preto e branco que vemos nos filmes antigos. É claro, iluminado, mas diferente. Acho que diferente é a única descrição que poso dar, afinal, também nunca havia visto essas cores quando era apenas um humano qualquer. Para o resto, elas simplesmente não existem.

Ei, na verdade, já vi um vídeo de um daltônico colocando aqueles óculos especiais pela primeira vez para ver como a maioria das pessoas vê... Talvez essa sensação seja parecida.

Agora quero conversar com um daltônico.

Acho que no ensino médio uma das minhas colegas de classe tinha o pai daltônico. Lembro-me disso porque ela pediu que ele levasse algumas tintas na escola para um trabalho que estávamos fazendo, mas ele se esqueceu de ler os rótulos e levou as cores todas trocadas. Nós ficamos conversando sobre com ele, depois do ocorrido. Por que não perguntei a sensação? Eu devia ter perguntado.

Talvez precisamos passar por situações parecidas para realmente se interessar pela experiência alheia.

Ah, outra coisa que desenvolvi nessa brincadeira de virar assombração – dessa vez, muito comum – foi o TDAH (déficit de atenção), mas isso você já deve ter percebido. É absurdamente difícil para o meu cérebro acompanhar a mudança de uma velocidade tão alta para uma tão lenta.

Quero dizer, ignorando todos os outros fatores, eu só levaria pouco mais de oito minutos para chegar ao sol, quando pessoas normais levam quase duas horas andando até o outro lado da cidade.

Claro que nunca cheguei à velocidade da luz, nem perto, arrisco dizer. Só tenho as informações porque faço vários testes com os grandes especialistas da Academia das Sombras. Tudo tem efeitos colaterais sobre o meu corpo e eles me avisaram que a sombra acompanha a luz em vários aspectos, mas se eu tentasse usar o máximo de velocidade, provavelmente teria de dizer adeus a minha forma humana.

Eu sempre fui meio idiota, mas não a esse ponto.

Paro de divagar quando passo por debaixo das portas da Academia, o prédio todo ondulando em minha visão. Sem me importar com os olhares do sombranos, me materializo em um corredor qualquer.

— Acho que o mais impressionante disso tudo é o fato de você conseguir se atrasar.


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Notas finais do capítulo

Espero que estejam gostando, o próximo capitulo sai em breve!!



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