Steampunk escrita por Aiwa Schawa


Capítulo 1
Capítulo 0




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Capítulo 0

Aiwa Schawa

Meu nome é Aiwa Schawa e eu sou um cientista. Um cientista insanamente louco, diria. Apesar que eu imagino que ouvir meu nome já deve dizer tudo, ainda assim, eu não faço ideia de quem exatamente lerá isso, portanto, uma apresentação é ao menos aceitável.

E a minha história começa em 1897. Nasci não onde estou hoje, na verdade, muito longe daqui. Eu venho da Alemanha. Meus dois pais também, ambos vieram de lá.

Desde o momento do meu nascimento eu diria que minhas chances de viver uma vida normal não eram boas. “A pele que mal tinha tom. Os cabelos de neve...” foi o que disseram sobre mim.

Em termos médicos, eu nasci com um caso perfeito de albinismo, meu corpo é absolutamente incapaz de produzir melanina, me expor ao sol por apenas alguns minutos sempre causou queimaduras notáveis, a dor não era diferente de colocar todo meu corpo em chamas até.

Portanto... eu nunca tive tantas chances de conviver com outras crianças. Enquanto elas brincavam do lado de fora, tudo o que eu podia fazer era assistir. Não que naquele tempo eu pudesse sentir falta disso. Era o normal para mim. Aquelas outras crianças eram estranhas. Elas estavam fazendo aqueles jogos que não faziam tanto sentido, eram inconsistentes, eu preferia passar meus tempos... em outras coisas.

Estudando, por sorte meus pais tinham um dinheiro decente, além de haver uma criada cooperativa suficiente para trazer livros da biblioteca até meu quarto. E assim eu ascendia minha vela, naquele quarto fechado e abafado, mas que ainda assim parecia frio como uma gruta. Eu passava horas absorto na literatura, os textos foram de ficção infantil, para ciências de vários tipos, cada vez mais avançados, e meu caminho começava a ser feito.

Quando tinha em torno de sete anos, meus pais ouviram que havia um país que poderia ser um pouco mais adequado para mim, um onde talvez o sol não fosse tão cruel nos verões. E ainda insuportável fora dos piores invernos. Ao menos, foi essa a razão que me disseram, pensando agora... devia haver um pouco mais que isso.

“O sol nunca se põe sobre o império britânico” mas ele certamente não bate igual para todos. Nós iríamos para a Inglaterra, a minha família passaria a morar em Londres agora.

Exceto que... só eu chegaria ao destino.

Sendo direto e o quão conciso é possível para mim. O trem que tomamos para Londres foi tomado por alguns bandidos, os motivos deles eram patéticos e seu treinamento seguia, ainda assim, eles conseguiram matar algumas pessoas... naquele trem, foi um total de sete. Dentre eles, tanto minha mãe, quanto o meu pai.

Eu mesmo ter sobrevivido foi, de certa forma, um milagre, apesar de que eu dê créditos as habilidades que já havia cultivado naquele tempo, em parte ao talento que sempre tive. Conseguir alcançar o fim daquele trem, lembrar-me do funcionamento do telégrafo e ainda o consertar tão brevemente, diria ter sido algo como uma obra do destino.

Os malfeitores foram presos, mas meus pais nunca voltaram. Pelos próximos dias eu não tenho memória alguma, senão a de observar os dois, apenas minhas mãos, os seus corpos em um vazio escuro sem forma nem fim. Enquanto minha mãe caiu nos braços do meu pai, eles se encararam em seus últimos momentos, as suas últimas lágrimas são por razões além do meu entendimento.

Claro, eu não fui a qualquer outra dimensão e isso não é mais que um truque da mente. Enquanto eu não possa lembrar por mim mesmo, há uma pessoa que pode, ela então me conta vividamente como, após saberem daquelas circunstâncias que eu me encontrava, de minhas ações terem levado a prisão dos malfeitores, eu fui levado para uma família que, para mim, naquele tempo, não era a minha.

E quem conta isso é a pessoa mais importante que eu já conheci. Naomi Saki. Naomi e sua família, obviamente de imigrantes asiáticos me tomaram como um filho, portanto, um irmão de Naomi, oficialmente eu tomei esse novo nome. Aiwa Saki. Contudo ainda vira um dia em que o usarei para me apresentar, peço perdão, perdão a meu “pai” e a minha “mãe”

Por alguns anos, eu não havia mudado minha vida, Naomi era como outra criança estranha, ela sempre foi absolutamente energética, podia correr por toda a cidade, de um canto a outro, sem parar sequer um instante quando ainda éramos crianças. Nosso pai as vezes ficava incerto sobre isso, especialmente conforme ela pareceu mostrar alguns interesses de garotos, o que não posso o culpar por estar incerto. Nossos primeiros contatos de verdade vieram quando ela pedia para pegar meus presentes de aniversário, na verdade, nossa mãe dizia que era assim nessa idade, no futuro isso não entraria no caminho dela cumprir seu papel como uma dama... meu coração ainda não se curou do rosto dela ao ver essas palavras voltando-se contra si...

E bem, foi gradativo, mas com o tempo eu não achei que ela fosse tão esquisita, nossos pais faziam questão de não me tratar diferente, assim como a Naomi sequer parecia perceber como nossos rostos, especialmente nossos olhos, não se pareciam sequer um pouco e nosso sangue era completamente diferente.

O dia em que tudo mudou, foi o dia em que pedi para acompanha-la durante um passeio pelo parque. Imediatamente uma carruagem foi solicitada e eu fiz poucos e breves comentários sobre as espécies de pássaros e sapos que estavam naquele parque, enquanto ela falava em longos monólogos sobre seus dias e o que ela fazia em boa parte do tempo, quando não estava trancada em um quarto lendo livros horas a fio.

Nessa primeira vez, eu ocultei minhas reações, fechei meu coração e deixei isso passar com uma resposta que desviava das questões que os livros não iriam me dar uma resposta.

“Certamente... diferente”

E conforme o tempo passava, nós continuamos a nos aproximar, foi tão lento que eu sequer percebi como meu coração estava se abrindo a alguém pela primeira vez. Primeiro, eu a visitei em seu quarto, apenas para avisar que o jantar estava pronto. Então para acordar, pontualmente às sete da manhã. Em seguida apenas para ler um livro em sua companhia, para falar sobre algo que imaginei ser do interesse dela, depois para mostrar algum invento novo, entusiasticamente falando de seu funcionamento nos níveis mais técnicos, sendo respondido com olhar de surpresa.

Bem, há algum limite dentre o que “posso” falar e o que “devo” dizer. Isso não é um diário, afinal. Logo então, devo prosseguir ao passo mais recente para o caminho de onde estou agora.

Edwin Thursby, um cientista recluso que vivia na mesma rua que eu. Pois eu não podia aprender junto a outras crianças, após a Naomi me elogiar com bastante entusiasmo, contando de o quão esperto eu era. Nossos pais então viram uma chance de que eu pudesse aprender além dos livros.

Naquele tempo, Edwin Thursby usava sua própria casa de laboratório, mas ele parecia feliz ainda, tinha uma bela esposa com os cabelos e olhos de caramelo, enquanto o governo o pagasse para desenvolver todo tipo de coisa, ele poderia manter a si e a sua esposa sem o menor dos problemas, enquanto trabalhava em seu sonho.

Eu apareci em sua porta, no mesmo dia me tornei o aprendiz de Edwin Thursby, em troca de o ajudar em seus experimentos, ele disse que eu deveria me tornar, um dia, tão bom quanto ele...

Não sei dizer o que o motivou a fazer isso, ao menos aquele eu não tinha ideia. Ele não era exatamente um homem bondoso, nunca o vi mostrar um sorriso fora dos sucessos de seus experimentos, ou demonstrar raiva e frustração fora dos momentos que nós falhamos em um experimento. Era um exterior frio e pragmático. Não tão diferente do meu... naquele tempo, eu pensei que esse era o único motivo. Ao lado de Edwin Thursby, eu era alguém normal, pensava se ele se sentia de tal forma.

Isso deve ter sido quando eu já completei dez anos, em pouco tempo, estranhamente vi Edwin cada vez mais parecer mais focado em seu trabalho, ele então tinha um laboratório próprio, onde apenas nós dois trabalhávamos. E logo ele estava fazendo projetos bem mais importantes, ouvia rumores de como Edwin tinha alguma conexão com o rei, mas… seria aquilo mesmo uma verdade? O quão importante ele poderia ser?

Essa foi boa parte da minha vida. Eu cada vez mais cheguei mais próximo de minha “irmã” Naomi e cada vez mais podia colocar meu real talento à mostra ao lado de Edwin Thursby.

Porém… todos esses tempos acabariam abruptamente, um após o outro.

Quando a esposa de Edwin começou a ficar cada vez mais doente, seu pulmão estava mais fraco e ela tossia constantemente, era uma criança, mas não era estupido, sabia como a saude dele havia se enfraquecido com o tempo.

E a um ano e meio, ela foi para o hospital e nunca mais voltou.

Foi quando finalmente, junto ao que parecia a ameaça de uma guerra, nosso mais novo projeto começou, o que eu e Edwin faríamos seria uma revolução de toda a ciência, um produto que apenas as duas mentes mais brilhantes da Inglaterra poderiam fazer!

Também uma que eu mesmo precisaria logo.

A apenas metade de um ano atrás, algo terrível aconteceu, a pior coisa que eu já presenciei.

Eu sabia que Naomi não era do tipo que poderia aceitar qualquer tipo de injustiça, naquele país, nossa mãe era uma advogada e nosso pai um policial, eu também sabia que, desde que eu estivesse por perto, eu saberia quando nós tínhamos que desistir de perseguir os problemas, quando apenas bater neles com punhos ou ameaças vazias não nos levariam a vitória, no entanto… eu falhei.

Pois nosso nome, na verdade, acabou ficando mais forte do que nós.

“Por que?”

Ela tinha a mesma idade que eu, apesar de insistir, ninguém havia até aquele ponto, me tratado como um adulto. Por que havia tantas pessoas querendo nossa morte? Por que aquilo parecia um exército inteiro que havia nos cercado?

Em um instante, tantos tiros vieram em nossa direção, quem me salvou de ser eliminado… foi a própria Naomi.

Ainda assim, aquelas balas atravessaram seu corpo, através dele, meu próprio corpo, eu não era um décimo do guerreiro que a Naomi era, apesar dela ainda mal ser tão boa quanto um soldado de verdade.

Enquanto eu quase encontrei minha morte, sem sequer poder fazer o sacrificio dela valer algo… uma especie de corda me puxou, o destino dizia que ainda não era minha hora, eu o aceitei e... fui eu quem “sobreviveu” aquela emboscada.

Depois daquilo, ninguém pensou que sequer um de nós pudesse estar vivo, nossos corpos não tinham valor, eles foram embora e eu pude… eu pude gritar e correr por ajudar, enquanto meus braços finos e que mostravam as camadas interiores da minha pele tentavam levar Naomi comigo.

Claro apesar da medicina ter evoluído tanto, aquele tipo de ferimento era… simplesmente impossível de ser curado, ao menos fácilmente. Desde aquele dia, ela não estava mais viva, porém não chegou a morrer, foi esse o dia em que nossa mãe fez aquele rosto.

Meu pai mordeu seu dedo com força suficiente para sangrar, enquanto eu mesmo já havia desistido de segurar minhas lágrimas, para toda a minha familia, a familia que restava desde o dia em que o trem foi atacado, eu decidi que só havia uma coisa a ser feita.

—Eu vou consertar isso! Eu vou consertar tudo!

Foi essa a promessa que me ligou para sempre, uma que eu nunca pensei que se estenderia muito além da garota em minha frente, da minha irmã, Naomi Saki, ou da minha familia.


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