Kakashi via a vida pela perspectiva de um artista. Talvez por ser formado em Música; talvez por morar na cidade que foi palco do início do movimento musical que mais o fascinava… ele não sabia dizer. Mas, com toda certeza, tão certo quanto o sucesso da música Garota de Ipanema, andar no calçadão de Copacabana sempre trazia ao homem pensamentos reflexivos à tona. 

Às vezes, ele pensava em como inserir a Bossa Nova, mais uma vez, em uma de suas aulas — mesmo quando já havia falado tanto sobre o movimento que já não havia mais nada a acrescentar; e então, quando percebia que teria que esperar outra turma de calouros chegar para poder voltar a falar sobre isso, ele se lembrava de sua namorada e como ela era sua contradição; sua hipocrisia.

Enquanto sua paixão pela Bossa Nova era, justamente, por ser um ritmo calmo, aquele “canto-falado”, quase um sussurro, que parecia tão pequeno, mas que trazia significados tão grandes para um homem melancólico e sozinho como ele; que só sabia amar de forma intensa quando se entregava, nada menos que isso, ele se via apaixonado, perdido, por uma pessoa completamente oposta a ele.

Em meio à Bossa Nova havia Elis Regina; em meio a Kakashi Hatake havia Sakura Haruno.

Sakura era sua Elis.

Sakura sabia nadar em meio às águas calmas que era Kakashi. Sakura, no entanto, agitava por muitas vezes, essas mesmas águas calmas; transformando sua lagoa em mar; transformando Bossa Nova em MPB. 

Não que sejam movimentos completamente opostos. Não mesmo! O movimento MPB nasceu, cresceu, e a todo momento traz referências da Bossa. Mas quando ele pensa nela como sua Elis, ele pensa nela como a pessoa que tem voz e quer mostrar; ele pensa nela como a agitação em sua vida monótona e cinza. 

Mais cinza que o seu cabelo em tão pouca idade para tal.

Quando compara Sakura a Elis, Kakashi não pensa na polêmica opinião da intérprete sobre a Bossa Nova — que ela chegava a detestar! —, mas sim sobre como era inevitável que ela fizesse parte; que ela contribuísse, ao menos um pouco, para o repertório desta fase. Mesmo com tanto atrito entre ela e Tom Jobim, nasceu Águas de Março, onde ela cantou que eram essas mesmas águas fechando o verão, que seriam a promessa de vida no coração.

Mesmo com muitas diferenças, tanto nas personalidades quanto no entorno social de ambos, nasceu o amor de Kakashi e Sakura. Mesmo entre tantos desencontros, as promessas se concretizaram e fizeram jus às águas derramadas pelas chuvas de março, que fizeram o amor e a cumplicidade deles florescerem. Mesmo com tanta força e vontade de cantar alto, quase em um ritmo estrondoso como o funk, Sakura conseguia compreender seus sussurros; Sakura conseguia responder aos seus sussurros.

No entanto, o homem não considerava o puro e simplista amor como base de tudo. Ele acreditava que, assim como em Samba de Uma Nota Só, o amor era uma construção; tem uma única base e outros componentes vão chegando; vão se integrando. Não sabia se sua personalidade era reflexo da Bossa ou uma consequência; mas sabia que o amor agitado que Sakura lhe direcionava, o transformava em uma massa maleável em suas mãos, o tornando uma consequência inevitável dela.

No fim, Kakashi achava que eles eram transição. Eles coexistiam, pois nada se extingue de uma hora para outra. No fim, eles eram conexão; pois não há como criar sem conectar. Tudo é inspiração. Nada é novo, se pararmos para pensar bem. Então, enquanto Kakashi deu a Sakura uma nova perspectiva do que era o amor sussurrado e calmo, Sakura devolveu com tons mais altos, agitados, mas igualmente cheios de significados.

Talvez, mas só talvez, Kakashi fosse mais amante do movimento MPB do que imaginava.