Academia de Poderes Inúteis escrita por Creeper


Capítulo 13
Ela tem três lados, ela é um triângulo?


Notas iniciais do capítulo

Olá, pessoal! Como foi a semana de vocês? Agradeço pelos comentários nos capítulos passados, já tratei de responder todos com muito amor ♥

Sem mais delongas, tenham uma boa leitura.



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Em algum momento do jogo, Victor, Ienaga e Yara competiam fervorosamente, os dois primeiros chegando a fazer apostas absurdas como seus próprios quartos ou dizendo que usariam o short-saia do uniforme. Esse último valia para ambos, já que Ienaga nunca usava short-saia.

A décima sexta partida acabou quando Ienaga ameaçou cair no soco com Victor e teve de ser segurada por Eduardo. Fazia uma hora e meia desde a entrada dos novos membros e eles já estavam quase pedindo para sair.

Amanda me ajudou a guardar o baralho, se desculpando pelas atitudes insanas do irmão em um sussurro. Não sabia se devia me desculpar por Ienaga, acho que ela não era um problema meu.

— Jogos são ótimos, não é mesmo? – Ienaga jogou sua franja para o lado, arfando nos braços de Eduardo. Mal parecia ter acabado de lutar contra o vice-líder para que ele a soltasse.

— Pensei que você fosse melhor nisso, líder. – Victor deu um sorriso torto e estalou o pescoço. 

E bastou isso para que a guerra voltasse a acontecer e a sala das cadeiras estivesse prestes a se tornar um ringue. Não queria nem ver o que seria daquele grupo se algum dia jogássemos Banco Imobiliário.

— Todos dispensados. – Eduardo oscilava entre afastar Ienaga e sussurrar ameaças entredentes para Victor. Estava claro em seu rosto que ele queria muito soltar a garota e deixá-la fazer o serviço.

Érica agarrou sua mochila cheia de bottons e acenou para o resto do pessoal, perguntando para Yara se ela não iria acompanhá-la. Fiquei aliviado por sua onda de azar não ter se manifestado durante o jogo, na verdade, ela parecia bem feliz de estar conosco.

— Eu volto para o dormitório depois. – Yara me olhou de soslaio.

— Ei, Norte, vai fazer alguma coisa agora? – Amanda deu pequenos passos até mim, embora sua atenção ainda estivesse voltada para Victor.

— Meio que sim. – respondi sem jeito.

— Ah… –  a garota me fitou por um instante. –  Tudo bem, nos vemos amanhã. – sorriu dando de ombros.

Yara segurou a alça de sua mochila preta e deixou a sala, antes que a perdesse de vista me despedi brevemente de Amanda sem falar coisa com coisa e fui atrás da outra garota.  

— Será que é seguro deixá-los sozinhos? – indaguei preocupado.

— Para nós sim. Para eles, eu já não sei. – Yara girava uma das mechas maiores de sua franja entre os dedos, distraída. Olhou para trás, conferindo o quão longe estávamos, apesar de ainda ouvirmos os berros.

Esperei subirmos as escadas para enfim perguntar qual era a ideia dela.

— É o seguinte… – ela começou ao ter certeza de que havíamos nos afastado o suficiente.

Sua frase não foi concluída, pois no topo da escada havia dois homens. Um tremendamente familiar com o cabelo ruivo bagunçado e as combinações duvidosas de estampas: Miguel, o estagiário. Na sua frente, um homem de pele bronzeada e barba por fazer girava uma das pernas dos óculos entre os dedos.

Pensei que passaríamos despercebidos, porém, eles realmente estavam impedindo o caminho. Tentavam conversar por sussurros, não notando que as vozes saíam altas demais. Pararam assim que nos viram.

— N-Norte! Yara! – Miguel arregalou os olhos rodeados por olheiras pesadas. O sorriso contradisse seu cansaço, mas fiquei lisonjeado por ele lembrar nossos nomes.

O homem nos analisou, uma de suas grossas sobrancelhas ergueu-se em um ângulo impecável e a boca entortou-se.

— Conhecem o diretor, sim? –  o estagiário riu nervoso.

Avaliamos de cima a baixo aquele que ele chamou de diretor. Usava uma camisa amarela com estampa de folhas brancas do tipo que meu tio vestiria em um churrasco. Bermuda cinza e chinelos com meia. Aquele cara não era diretor.

— Na verdade, Heitor é o chefe do R.C.E. Estás a ser diretor aqui provisoriamente, por esse motivo não o veem muito. – Miguel disparava mil palavras por segundo, enrolando uma a outra e exagerando no sotaque. 

— Estão se comportando, molecada? –  Heitor indagou mais por “educação” do que por interesse. Reparei em seus poucos fios prateados misturados às medianas e cheias madeixas pretas, chutando que ele estava na casa dos 40.

Instintivamente, visualizei o final da escada, torcendo para que de onde estávamos não fosse possível ouvir a gritaria no esconderijo. Então voltei para ele e assenti.

— Miguel, vá para minha sala depois. – o homem entregou-lhe uma pasta de plástico. – Até mais, crianças. Não usem drogas.

Devo ter feito a mais pura expressão de incredulidade e Yara tornou-se praticamente parte do cenário, pois Miguel teve de repreendê-lo baixinho:

— S-Senhor, por favor.

— Desculpa, não sei o que dizer aos jovens. Você é o ser humano mais novo que tenho próximo de mim depois do meu sobrinho recém-nascido. E olha que você tem dezessete anos.

— Dezenove. – Miguel corrigiu ruborizado.

— Vai querer que as pessoas errem quando tiver minha idade. – Heitor lhe mandou uma piscadela e preparou-se para ir embora.

Agi em um impulso que nem eu mesmo reconheci. Minha cabeça continuava no espaço de reuniões de alguns dias antes.

— Espera, diretor. – pedi subindo um degrau. Yara estranhou minha atitude, todavia, não me impediu. 

Heitor fez um gesto para que eu prosseguisse, conferindo discretamente seu relógio de pulso.

— Gostaria de saber quando começaremos a ser treinados. – cerrei os punhos. 

— O que quer dizer, garoto? – o homem franziu as sobrancelhas.

— Quero dizer que… –  pigarreei, ficando nervoso de repente. –  Temos poderes. Estamos em uma academia. Devíamos aprender a controlá-los. – sugeri encabulado.

— Vejo isso outra hora. – ele olhou novamente para seu relógio. Também olhei, reparando que marcava 12h30, quando na realidade já passava das cinco horas da tarde.

Meu peito apertou-se e a boca secou. “Estamos aqui para sermos observados.” Essa frase martelou minha cabeça de maneira incessante, me preenchendo de apreensão.

O homem se virou outra vez, preparado para partir. Endurecidamente, subi mais um degrau, indagando:

— E quando nos deixarão sair?

— Quando acharmos que está tudo bem. – Heitor respondeu. Todas as respostas eram rápidas, parecendo automáticas. Não pré-ensaiadas, ele não passava a impressão de reservar algum tempo pensando em perguntas de alunos.

— E quando vai estar tudo bem? – um nó se formou em minha garganta ao deixar essas palavras tornarem-se reais.

Miguel olhava de mim para Heitor, a pasta sendo usada para esconder a boca e o nariz. Yara percorreu os dois degraus que faltavam para me alcançar, como que para me dar apoio.

— Alguma hora. Agora preciso ir. – ele exclamou impaciente e não me deu brecha para mais questionamentos, saindo a passos apressados.

Outra fala ficou presa dentro de mim que eu nem ao menos sabia qual era. Praguejei baixinho, encarando as costas largas de Heitor a se afastarem.

— Perdão. – Miguel se colocou na nossa frente. – Vejam bem, ele apenas fundou o R.C.E. por perder uma aposta e… Céus, eu não devia ter contado isso. –  cerrou os dentes, aflito. –  A questão é, agora ele tem trabalho em dobro. 

— Problema é dele, não é motivo para ser curto e grosso com um aluno. –  Yara rebateu. Confesso que me surpreendi por ela estar me protegendo indiretamente.

— É, tem toda razão. – o estagiário encolheu os ombros. – Irei… Tentar falar com ele.

O silêncio seria esmagador caso Ienaga e Victor não tivessem aumentado o tom da voz no andar debaixo. 

— Estás tudo bem? – Miguel inclinou-se para ver o final da escada. 

— Pergunte ao seu chefe. – Yara resmungou e pisou firme, indo na frente. Envergonhado e cabisbaixo, continuei nosso caminho, escutando Miguel balbuciar outro de seus milhares pedidos de desculpas.

Não toquei no assunto e ela também não. Andamos sem emitir nenhum som, ela na minha dianteira, exalando seriedade. Nossos passos nos levaram ao terraço, que por sorte estava vazio, por mais que eu esperasse ver Kaíque dormindo ali sob uma HQ. 

Yara soltou um longo suspiro e espreguiçou-se de costas para mim. Caminhei até a borda cercada pelo alambrado, enfiando meus dedos ali e admirando as nuvens tornando-se laranjas aos poucos. A brisa fresca batia em meus cabelos, levando-os para trás.

Não havia muito depois dos muros esbranquiçados, somente uma área gramada que ladeava a estrada. Se você forçasse a vista, encontraria uma construção ou outra e nossa cidade, totalmente distante e desfocada.

— Não consigo acreditar que estamos sob responsabilidade daquele cara. – Yara surgiu ao meu lado, irritada.

— Nem eu. – murmurei. – Você acha que… Esquece, é idiotice. 

— Vindo de você, talvez. – ela encostou o ombro no alambrado, fazendo-o tremer.  – Mas eu escuto.

— Você é muito…  – torci a boca.  – Bobona. – deixei escapar um suspiro pesado.

— E você é bobão. – Yara cerrou o punho e bateu de leve em meu braço.

Mostrei-lhe a língua e ela deu um sorriso fechado. Respirei fundo, reformulando a frase que tinha em mente e não possuindo hesitação em revelá-la:

— Acha que a União mudará alguma coisa? 

— Do tipo, se conseguimos sair daqui? – ela apreciou a paisagem também. Confirmei.  –  Tenho receio de que…

— Você quis dizer medo.  –  provoquei. De soslaio, a vi revirar os olhos.

— Tenho receio de que descobrir a origem dos poderes não nos ajude em nada. Quero dizer, se os adultos estivessem realmente interessados em saber da origem, não seria um bando de adolescentes que estaria reunindo as informações, certo? 

Mordi o lábio inferior, refletindo sobre sua fala. Cruel e verdadeira. Cortante feito lâmina.

— E se não se importam? E se somos problemas que foram jogados aqui para dar menos dor de cabeça para a cidade? – os dedos de Yara fecharam-se nos buracos do alambrado. – Viu como o Heitor agiu. – cuspiu as palavras.

Yara tinha diversos lados. O durão, sério e quase inexpressivo que todos conheciam. O de amiga e companheira que Érica e eu conhecíamos. E o que tinha medos e receios. O qual apenas eu conhecia. 

— Não somos problemas. – a encarei confiante. – Somos pessoas. Não podem fingir que não existimos. – dei uma pausa na tentativa de barrar qualquer besteira. – E faremos o que a União Rebelde faz de melhor. Encher o saco até nos notarem. 

Inconscientemente, sorri e estendi meu punho cerrado para ela. Yara hesitou, analisou minha face e ao perceber que eu falava sério, expirou e tocou meu punho com o seu.  

— Vou te contar minha ideia. – Yara recolheu sua mão. – Pelo visto, eu e você somos péssimos em fazer amigos. Tivemos sorte com Érica e Amanda. 

Isso me incomodou um pouquinho, mesmo que fosse verdade.

— Se esperarmos até termos amigos para perguntar o que a Ienaga quer saber, vamos terminar quando entrarmos para a faculdade. – ela resmungou.  – Então, podemos usar o favor que o Thiago nos deve.

Tive um estalo na cabeça e ergui as sobrancelhas perante a ideia.

— Já que ele tem vários clientes…  – raciocinei.

— Exatamente, pedimos a ele que pergunte o lance do hospital quando fizer seus contrabandos. – Yara colocou sua franja para o lado.

— Genial! – estalei os dedos. – Vamos falar com ele hoje à noite. – sugeri animado.

— É. Hoje à noite. – a voz de Yara não soou muito segura. 

— O que foi? – coloquei as mãos na cintura e sorri. – Tem outro compromisso? –  indaguei malicioso.

— Claro que não. – ao dizer isso, sua expressão endureceu-se.

— Tem. Você tem. – afirmei convencido.

— Eu não vou.  – ela afastou-se do alambrado.

— Qual é o compromisso? – meu tom saiu mais divertido do que deveria e ela ficou brava por isso.

A observei puxar algo de dentro do bolso do short-saia e atirar em minha direção. Peguei no ar uma bolinha de papel, desamassei e li o garrancho em voz alta:

Me encontre no terraço depois do jantar. Sozinha.

Ass: alguém que quer te ver.

— Só faltou ter colado letra por letra de recortes de revista para ser o assassino perfeito. – opinei. – Tem ideia de quem possa ter sido? – a encarei, reparando nas bochechas ruborizadas.

— Nenhuma. 

Lembrei-me de algumas conversas dos garotos sobre as garotas mais bonitas da academia. Eles sempre colocavam alguém do Super Gatinhas no topo da lista e diziam coisas que não deviam ser repetidas, então eu não prestava muita atenção, contudo, tinha certeza de que em uma dessas citaram Yara e eu preferi esquecer. 

— Ora, ora, ora, a garota tem admiradores.  – brinquei.

— Não tem graça. – ela bufou.  

— Não quer pelo menos saber quem é? – dei uma última olhada no papel.  –  Você sabe muito bem se defender caso ele tente algo.

— Sim, eu sei. – Yara cerrou os dentes e olhou para baixo.

Eu nunca fui um amigo suficientemente íntimo de uma garota para entender que tipo de atitude era aquela, então chutei:

— Você está tímida?

Tive de me encolher, pois ela fez a mais pura menção de me bater. Porém, respirou fundo e ficou estática.

— Acho que você deveria ver quem é. – aconselhei. – E se não estiver se sentindo confiante…  – toquei a parte de trás de meu pescoço e desviei o olhar. –   Eu posso te acompanhar.

— Eca, não aja como minha mãe no meu primeiro dia de aula no fundamental.  –  Yara murmurou.

— Estou mais para possível vela do que mãe, mas se você gosta de ter visões estranhas de mim, tudo bem, baby. – zombei.

— Céus. –  foi a única coisa que ela conseguiu sussurrar depois de uma expressão de indignação.

Okay, eu me arrependi do que eu disse, foi esquisito e vergonhoso. 

— Nos vemos depois do jantar? – pigarreei.

Yara resmungou algo que eu não entendi, bateu em suas bochechas e atravessou a porta do terraço. Revirei os olhos e os fechei, aproveitando um pouco mais da brisa em meus cabelos.

>>>

Sem nenhum sinal de vida da garota dos coques, jantei com Érica. Ela me mostrou algumas fotos de sua irmãzinha e eu não soube muito bem o que dizer. Era um bebê cheio de dobrinhas dentro de um vestidinho amarelo e rosto amassado. Afirmei e sorri, comentando sobre como aparentava ter saúde e não ter cara de joelho quando na verdade tinha um pouquinho sim.

— A Yara disse que não estava com fome. – Érica não olhava para mim e nem para o celular.  – Acha que devo me preocupar?

Eu ainda analisava a foto da bebê no colo de uma mulher de cabelos castanhos e rosto semelhante ao de Érica, mas engasguei assim que registrei a frase.

— Não, não se preocupe. – ergui a cabeça rapidamente.

Precisávamos evitar a todo custo os sentimentos negativos de Érica para cancelar a ativação da onda.

— Queria que parassem de mandar bilhetinhos para ela. – a garota inflou as bochechas rosadas. 

Ao dar uma garfada em meu jantar e colocá-la na boca, senti o calor queimar minha língua. Não podia cuspir na frente de Érica, então apenas engoli, ignorando a dor. 

— Espera, tem mais bilhetes? – arfei e abri meu refrigerante.

— É. Alguém da letra feia tem mandado bilhetes para ela. – Érica apertou o botão de desligar do celular, apagando a tela.  – Flertando, sabe? 

O som familiar de tecido se rasgando veio debaixo de nossa mesa. Em choque, conferi a calça de moletom que usava, todas as costuras pareciam no lugar. Ao inclinar a cabeça para cima, percebi que a expressão de Érica denunciava que ela era a fonte do ruído.

A garota cerrou os dentes e abaixou as mãos, provavelmente cobrindo a parte rasgada, murmurando desesperada algo do tipo: “minha calça!”. 

Devagar, liguei alguns pontos e de feição bagunçada, chamei:

— Érica.

Assustada, ela deu um pulinho no lugar e me fitou, os lábios retos em uma linha e o rosto vermelho.

— É sua onda do azar, não é? – usei toda a cautela do mundo para falar. Primeiro, eu me queimei. Depois, ela teve a calça rasgada.

— O quê? Não, não. Minha calça que é velha! – retrucou afobada.

Mentira. Ao mostrar as diversas fotos de sua irmã, havia uma em que Érica a segurava nos braços e fez um comentário: “Eu estava usando minha calça jeans nova e ela vomitou em cima. Aliás, é a calça que estou usando agora, mas claro que foi lavada.”

Pelas bochechas antes rosadas e o tom de raiva, fiz meu segundo chute do dia sobre garotas:

— Está com ciúmes?

— Não. – Érica balbuciou. Arqueei uma sobrancelha. – Um pouquinho. –  sua voz tremeu de constrangimento.

Suspirei e massageei as têmporas, não sabendo exatamente o que dizer. 

— Escuta…  –  pedi, o rosto esquentando. – Tudo bem ter ciúmes dos amigos. A Yara não vai deixar de ser sua amiga só porque alguém está dando em cima dela.

E não sei o que deu em mim para dizer tudo o que disse em seguida, as palavras surgiram de algum lugar e quiseram sair. 

— Isso é normal, principalmente por ela ser linda, inteligente e ter aquele jeitinho sarcástico que…  –  sorri descontraído, abanando a mão.

As sobrancelhas escuras de Érica estavam levemente franzidas, os olhos fixos em mim. Levei um segundo para digerir o que aquilo podia significar e sussurrei:

— Ai, meu Deus, é outro tipo de ciúmes?

— Não. Essa é minha expressão de “ela está atrás de você”. – vacilou ao confessar.

Arregalei os olhos, um choque percorreu todo meu corpo e o deixou estático. Virei o pescoço de modo endurecido, torcendo para que Érica estivesse brincando, todavia, se tratava da mais genuína verdade. Parada atrás de mim, Yara me olhava vagamente de cima, os cabelos presos em um rabo-de-cavalo e o corpo coberto pela camiseta larga cuja metade estava enfiada dentro do short jeans. 

— Precisa melhorar esse tipo de expressão, é importante. –  falei entredentes para Érica. A garota engoliu em seco e encolheu-se no lugar. 

— Bom saber o que acha de mim, Norte. – Yara levantou uma sobrancelha.

A vermelhidão subiu desde o meu pescoço para o rosto e as bochechas arderam feito fogo (não tem graça). De repente, tudo em mim tremia e suava. Eu não conseguia dizer uma vogal sequer para me defender, era vergonhoso demais.

— Então, você irá comigo ver o assassino em potencial ou prefere se trancar no seu quarto e remoer o que disse? – ela perguntou. Viu, era desse jeitinho sarcástico que eu estava falando.

— Me dá um tempinho e eu já vou.  – minha voz saiu fina e falha. 

Ela balbuciou um “ok” e afastou-se. Afogado em todo meu rubor, dobrei os braços na mesa e debrucei-me sobre eles, choramingando.

— Pelo menos, você estava falando bem dela. – Érica tentou ajudar.

— Seria menos constrangedor se eu estivesse falando mal. – resmunguei.

— Então, Norte... – ela pigarreou. – Me empresta sua jaqueta para eu cobrir o rasgo?

Então pensei que Yara ter aparecido justo naquela hora fazia parte da onda de azar, graças ao ciúmes bobo de amizade da Érica. Desfiz o nó da jaqueta em minha cintura com uma mão, ainda não tendo coragem de desgrudar o rosto da mesa e passei a peça para a garota. 

Como se eu não estivesse mal o suficiente, ergui a cabeça automaticamente ao sentir a necessidade de espirrar. E lá se foi meu jantar, completamente queimado.

>>>

Yara: Me encontre na escada para o terraço. [19:48]

Depois de dar um jeito em meu jantar queimado e me certificar de que Érica voltou para o dormitório para se trocar sem que nenhum engraçadinho mexesse com ela, lavei o rosto, me recompus e fui de encontro a garota.

Acho que minha expressão deixou claro que ela deveria se conter nos comentários em relação ao refeitório. Procurei agir normalmente, entretanto, eu não conseguia encará-la de jeito nenhum.

— Então… – tossi. – Eu fico atrás da porta. E você vai encontrar o tal assassino.  – meus ombros ficaram tensos. – Mas saiba que eu vou embora se vocês começarem a… Sei lá, fazer sons estranhos.

Me senti um idiota. Bom, ela já achava que eu era um.

— Eca. – Yara murmurou. – Não vai ter sons estranhos. A menos que ele faça o que não deve. Aí sim você vai ouvir algo como ossos quebrando.

— É, não duvido disso. – mordi o lábio inferior e apertei as mãos. Respirei fundo e tomei coragem para olhá-la nos olhos, arrependendo-me ao ver que ela já o fazia. 

Ela suspirou e colocou o dedo indicador e o médio em uma das têmporas, fechando suavemente os olhos.

— O que está fazendo? – franzi as sobrancelhas.

— Esquecendo o que você disse de mim. – Yara abriu os olhos. – Então pare de ficar… Desse jeito. É estranho.

Sabe, o pior de tudo não era ter dito aquilo e ela ter escutado. O pior de tudo era ter sido completamente verdade, mesmo que eu sequer soubesse que pensava aquilo dela. E depois de ter dito em voz alta, não conseguia “despensar”.

— Tudo bem. – forcei um sorriso. – Agora, vai para o seu encontro.

Ela subiu os degraus necessários e me xingou antes de abrir a porta de ferro do terraço em um rangido, deixando a luz azulada do luar banhar brevemente minha silhueta e depois cobrir-a de preto na escuridão da escada.


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Notas finais do capítulo

Pelo jeito, Victor vai dar trabalho, hein? E esse diretor que não tínhamos visto até agora? Quanto a suposição de Yara no terraço, será que ela está certa?
Comentem o que acharam!

Até o próximo capítulo, preparem-se para o que está por vir em: "Um nome, duas notícias"
Beijos.
—Creeper.



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