Desaparecendo escrita por Dama das Estrelas


Capítulo 15
Mudança de planos


Notas iniciais do capítulo

E aí, pessoal, cheguei com mais um cap aí pra vocês. Desculpem-me o pequeno atraso e espero compensar a paciência com mais uma parte da história. Boa leitura!



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— Eu não sei... nós... fazermos isso... 

— Está louco?!... Não sabemos o que... 

Haviam muitas vozes permeando os ouvidos de Sara. Vozes, sussurros, exclamações. Nada fazia muito sentido, palavras demais chegando sem que ela pudesse acompanhar o ritmo deles. 

O ambiente do qual ela se encontrava era diferente da sala de reunião. A cabeça girava e uma sensação de náusea invadiu seu corpo. Os olhos relutavam em se abrir e tudo o que via eram borrões. 

— Esqueceu do que vimos?... 

— ... Não vamos arriscar a vida dela! 

Antes que seus olhos focassem na imagem à sua frente, ela apagou de novo. 

Acabou sonhando nesse meio tempo. Viu-se no Departamento de Criminalística, sabendo de alguma forma que foi após ter voltado de Hong Kong. Sentia-se bem ainda por cima, como se já estivesse curada. O peso no peito e nos ombros não existia mais e podia perceber muito bem que estava sorrindo. 

Viu seus amigos reunidos na sala de descanso esperando por ela. A felicidade ao encontrá-la foi nítida, assim como o desejo de saber o que houve nesse meio tempo. Desinibida de qualquer vergonha, tomou coragem e revelou a todos o motivo de sua ausência. Catherine, Nick, Greg, Warrick e Sofia; estavam todos lá ouvindo sua história, exceto por Grissom, a quem não se lembrava de ter visto em momento algum. 

Ao término de sua revelação, o que parecia estar se encaminhando para um desfecho positivo — ou ao menos favorável —, tornou-se um revés. Aqueles rostos dos quais conhecia bem, visavam-na com espanto e confusão, vergonha, inclusive. Vergonha por se depararem com uma história tão bizarra e surreal como aquela. Os olhares alegres deram lugar à confusão, medo... rejeição. 

Lembrava-se muito bem de ouvir uma risada no meio daquela história. Nick, talvez? Era difícil discernir a origem, mas sabia que houve uma risada; disso ela tinha certeza. Aqueles rostos, como uma mistura de cores, fecharam-se como o tempo. Então começaram a questioná-la se estava tudo bem, se não estava delirando. Tantas vozes chamando por seu nome, assustadas, mal se importaram em saber se a história era verdadeira. 

Ela os viu se aproximar em conjunto e como se isso não bastasse, viu-se também incapaz de se mover. Uma dor pontual em seu pescoço atiçou seu instinto de sobrevivência; era uma agulha perfurando sua pele. Quando se virou para o lado esquerdo, enxergou apenas uma parede branca e o vazio ao seu redor. 

Sara acordou novamente. Sentia-se zonza ainda, desorientada. Seus olhos, úmidos, davam a entender que estava chorando há pouco. Ainda estava sonhando? Era o que perguntava a si mesma. O ambiente, frio e claro, era incômodo. O cheiro de soro pairava sobre o ar e isto a trouxe de volta a más lembranças. 

— Ah... — Ao tentar erguer a mão direita notou algo preso em seu dedo indicador. Bastou pouco para reconhecer o objeto: um oxímetro. 

Sara tentou mover os dois braços, mas a exaustão era tamanha que imaginava sentir o peso de uma tonelada sobre eles. Somente quando seus olhos se acostumaram com as imagens recebidas foi que notou que não havia nada sobre os braços, nem uma agulha sequer. Estavam tão livres quanto seu corpo. Nada a prendia. 

Mexeu também as pernas cobertas por um lençol, na esperança de que estivessem por lá. O volume sobre o tecido era visível por ambos os membros; também era possível sentir o lençol resvalando sobre sua pele. Aparentemente estava inteira. 

Ela respirou fundo. O corpo mole a induzia a fechar os olhos mais uma vez no intuito de dormir e descansar, porém ela relutava. Algo nela a dizia para se manter alerta e esperar pelo que haveria de acontecer em seguida. 

Passados alguns minutos viu a porta do quarto se abrir bem à sua frente. Duas pessoas entraram. Uma era o doutor Langston e a outra era uma mulher vestindo um jaleco branco. Uma médica, talvez? Sara não reconheceu o rosto. Era amarela, provavelmente chinesa ou honconguesa. Aparentava ter não mais que quarenta e cinco anos. 

— Senhorita Sidle, que bom que acordou — disse o doutor Langston ao se aproximar da cama. A mulher com jaleco também se aproximou. — Esta é a doutora Liang Jie, é médica. Ela veio cuidar de você assim que passou mal. 

— O-o que houve...? — Sara perguntou, visando desconfiada a mulher que lhe fazia um check-up. Tentava se lembrar dos eventos anteriores, porém a pontada na cabeça serviu-lhe de limite para não seguir adiante. 

— Não se lembra? — Liang se manifestou finalmente. 

— Tem um... borrão na minha cabeça — admitiu. Fechou os olhos a forçar-se novamente, mas sem sucesso. — Só me lembro de estar em pé na janela... depois tudo apagou. 

— Você sofreu mais um daqueles episódios. — Langston cruzou os braços. Também não tirava os olhos da médica a atentar para seu semblante; estava ansioso para saber se haveria algo para se preocupar. 

— Eu nunca desmaiei antes com isso. Por que agora? 

— Nós não sabemos. — O cientista se encontrava nitidamente frustrado. Ele descruzou os braços antes de continuar e apontou para ela. — Vimos sua perna e seu braço direito desaparecerem naquele momento. Você caiu desacordada e não respondia a nenhum estímulo... Chegamos a achar que perderíamos você. 

— O quê?! 

Emitindo um suspiro incrédulo, Sara tentou mais uma vez se recobrar dos eventos. A ansiedade era nítida; logo, sentiu as mãos suarem e o coração bater mais rápido. Nem as pontadas a impediam mais; continuaria até que surgissem imagens do ocorrido. 

— Pare com isso, se não eu terei de sedar você — alertou a médica, ainda ao seu lado. 

— Que droga! — Sara disparou. Enraivecida ela tentou se erguer, porém tudo o que conseguiu foi mudar de posição e ficar sentada na cama. 

Vendo o comportamento rebelde de Sara, Liang se limitou a sorrir.  

— Como se sente agora? — perguntou a médica. — Além de frustração.  

Tão focada em forçar a mente a trabalhar Sara mal reparou em seu próprio estado. Ela respirou fundo e buscou relaxar o corpo. Não escondeu o que sentia e nem faria sentido fazê-lo. 

— Cansaço... — comentou por comentar. — Um pouco de dor nas costas... fome também — completou ao tocar no estômago.  

Ela retornou para perto de Raymond e visou os dois antes de falar. 

— Como eu disse antes, vamos ter de realizar alguns exames para saber se está tudo ok. Superficialmente não há inconsistências, mas não posso dar uma palavra final sem o resultado dos exames nas mãos. 

— O que acha, senhorita Sidle? — Langston se dirigiu a ela. — Podemos partir agora. O hospital fica ao norte da ilha, não vai demorar muito.  

Balançando a cabeça por instinto, Sara se viu muito aquém de desejar sair dali até um hospital por 'n' motivos. O ambiente era o principal deles. Ansiedade, confusão. Havia algo de errado naquela história. 

— Espera. O que tá acontecendo comigo, hein? — perguntou aos dois. A ausência de respostas a irritava. — É tão grave que eu preciso ir pro hospital? 

— Só queremos checar se está tudo bem. Se não houve algum dano sério ao seu corpo. — O cientista explicou, tentando aplacar seu nervosismo. — Pode não se lembrar, mas você permaneceu sobre aqueles efeitos por um tempo considerável. 

— Quanto? — questionou incisiva. 

— Quase vinte segundos. 

Que merda. 

Para alguém que não "contava" o tempo de duração de seus episódios, quase meio minuto parecia ser uma eternidade. 

— Te levamos às pressas até aqui para prestar socorro. Chegamos a deixar a sala vermelha disponível caso fosse necessário, mesmo que isto indicasse realizar o procedimento sem os dados completos. — O tom de voz de Langston saiu carregado de culpa. — De repente você acordou e começou a gritar desesperada. Seus batimentos cardíacos aceleraram tanto que achávamos que estava prestes a ter um ataque. Então precisamos te sedar. Isto faz umas três horas. 

— Quê? Eu acordei? — questionou ainda mais tensa. — Não, não. Eu não lembro de nada disso. 

Sara voltou a respirar ofegante. Tudo o que ouviu parecia mentira, um fato criado para explicar o que aconteceu naquele meio de tempo. Nada disso, nada daquelas palavras faziam sentido para ela. Quanto mais fechava os olhos na tentativa de se lembrar, mais se decepcionava. Simplesmente, foi como se as lembranças de horas atrás tivessem sido apagadas para sempre.  

— Tá ficando pior, não está? — Ela olhou para os dois, mas focou sua atenção em Langston. Pelo olhar atormentado do cientista pôde receber sua resposta. 

— Já era um desejo antigo nosso que você realizasse alguns exames, apenas para nos certificar se está tudo bem com o seu corpo. O que aconteceu com você só reitera nosso pedido — concluiu Langston, na tentativa de amenizar o clima. 

— Não gosta de hospitais, não é, Sara? — A doutora se dirigiu a ela como quem a conhecia há certo tempo. 

— Como adivinhou... — retrucou sarcástica. No momento não foi muito com a cara da doutora. 

— É escolha sua ficar aqui. Mas se fizer isso não poderemos te ajudar como gostaríamos e a nossa prioridade é o seu bem estar. — Ela gesticulou ao erguer as mãos. 

Dentro de si um conflito para saber se aceitava ou não a sugestão. Já fez muito se deslocando meio mundo em busca de ajuda, então o que seria uma ida ao hospital? Tinha de pensar que não passaria de um exame checkup e verificar suas condições. Quando desse por si já estaria de volta. Era assim que deveria pensar. 

— Mas e Grissom...? — Ao perceber que se exaltou um pouco ao citar o nome dele, retraiu-se um pouco para disfarçar a vergonha. 

— Mesmo que você não fosse ao hospital, não achamos prudente a sua ida até o aeroporto. 

— Vai deixá-lo lá? — Ela arregalou as sobrancelhas. Simplesmente não concebia a ideia de que ele fosse largado à própria sorte num lugar estranho. 

— Não precisa se preocupar, vou pedir que Liu vá buscá-lo. Ele será muito bem tratado e vai poder se instalar num dos quartos do prédio residencial. 

Ouvir que o braço direito de Langston seria a pessoa a recebê-lo deixou Sara um pouco mais tranquila. Ele não estaria com qualquer um e isto foi um pequeno alento ao menos.  

Descansando os ombros e disfarçando um suspiro, Sara aparentou estar satisfeita. Restava a ela escolher o que faria adiante.

— Tá. E o que acontece se os exames constarem alguma coisa anormal? — perguntou, não sabendo se temia mais as próprias palavras ou a resposta que viria a seguir.

— Vou ser sincero com você, senhorita Sidle.

Já começara mal. Foi o estopim para despertar nela sentimentos negativos.

— Vamos torcer para que tudo esteja bem. Mas caso haja alguma alteração nos seus exames... teremos de mudar nossos planos. Talvez até avançar algumas etapas.

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Eram dez e trinta e oito da noite quando Grissom aterrissou em Hong Kong. 

Finalmente. 

Anúncio do término da viagem e logo a mente voltou a trabalhar em ritmo total e logo a imagem de uma mulher surgia em sua mente. Sara nunca saiu de seus pensamentos, desejos e aflições. Faltava pouco, bem pouco para reencontrar aqueles olhos castanhos tristes e talvez revoltosos por ele. Pensou nela e em como estaria esperando por ele. Pensou se realmente estava feliz por vê-lo ali ou se continuava quase tão irredutível quanto antes. Era tão ingênuo que chegava a soar engraçado: nunca desejou tanto ver Sara. 

A cena do seu encontro lhe parecia tão real que poderia enxergá-la nitidamente.

E lá foi ele, em busca de um rosto conhecido no meio de centenas de outros rostos. Passos vagarosos, valeu-se de sua habilidade de observação minuciosa para encontrar Sara. Mas o tempo ia passando e a decepção de uma criança que esperava receber um presente e não recebeu se tornou evidente. Tem que estar por aqui... pensava ele enquanto caminhava a passos curtos. Não podia ficar parado no meio do caminho e atrapalhar a circulação de pessoas, porém quanto mais o tempo passava e o rosto conhecido dela não era encontrado, menos ele caminhava com receio de tê-la perdido. 

Cadê você... 

Não podia acreditar que Sara mentiu desde o começo, forçando-o a desistir e desencorajá-lo para tomar seu caminho de volta para os EUA. Não, ele não acreditava nisso. Conhecia bem sua índole para afirmar que Sara não era uma pessoa desse tipo. Mas onde ela estava? Ao olhar para o lado de fora do aeroporto, notou que alguns pingos de chuva caíam timidamente pelas janelas ao redor. Talvez fosse esta a culpada, a chuva, por ter feito Sara se atrasar para o encontro ou talvez ela tenha se esquecido do horário. Não aparecer por simples raiva não estava em sua mente. 

Grissom estava frustrado, isso ele não podia mais esconder. Imóvel, ficou sem saber o que fazer no meio de tantas pessoas. O estômago se revirava e a mente custava a crer que ela não estava ali porque mudou de ideia. Alguém que passava apressadamente esbarrou nele, que mal conseguiu discernir se as palavras foram um pedido de desculpas ou insultos. A cabeça estava a mil. 

Caminhando mais um pouco na tentativa de reorganizar os pensamentos para os próximos passos, a dúvida que outrora o matava aos poucos foi sanada — ou ao menos em parte — ao se deparar com o próprio nome escrito em uma folha branca. Uma mulher local o segurava enquanto atentava na direção de onde ele vinha. Seria coincidência demais que um outro homem chamado Gilbert Grissom tivesse pego o mesmo voo e chegado no mesmo horário que o dele. Coincidências como aquela eram absurdas demais. 

Cauteloso, o supervisor se aproximou da mulher com um pedido de desculpas já ensaiando pelo possível equívoco. Nem precisou gesticular algo para chamar sua atenção porque ela já o avistara antes mesmo de chegar a um metro. 

— O-olá, boa noite. Meu nome é... Gilbert Grissom. Imagino que esteja esperando por mim...?  

— Senhor Grissom? — A mulher tratou de cumprimentá-lo com um aperto de mão. — É amigo de Sara Sidle? 

Aquele nome fez o coração dele disparar. 

— Sim! Eu sou. — Ele assentiu rapidamente. Olhos arregalados, descobriu finalmente que estava no caminho certo. 

— Que bom. Seja bem-vindo. Eu sou a doutora Zhang Liu, estou na equipe responsável por cuidar da senhorita Sidle. 

— O-onde ela está? Sara não veio? — Grissom falou tão rápido que faltou pouco para as palavras se embolarem em sua boca. — Ela... disse para mim que me encontraria aqui. 

— Infelizmente ela não pôde vir. — A feição de Zhang se fechou. O sorriso profissional de boas-vindas deu lugar à seriedade. 

Se tivesse certeza, diria que seu coração parou por um instante. Como em um pesadelo, notícias ruins chegavam a cada minuto e o cenário se encaminhava para o pior possível. Não podia ser verdade. Não podia ser o que ele estava pensando. De repente, a bolsa de viagem que carregava em seu ombro pesava uma tonelada e Grissom não teve escolha senão deixá-la sob o chão. 

— O que houve com ela? — O rosto de Grissom empalideceu. Visão e audição direcionados somente a ela enquanto o restante ao seu redor perdeu o foco. Tudo o que ele queria era uma resposta o mais rápido possível. — Sara está bem? 

— Venha comigo e eu te explico isto no carro- 

— Doutora, por favor. O que houve? — Os lábios de Grissom tremiam com o nervosismo que o assombrava. Ele não moveria mais um passo até que tudo (ou quase tudo) fosse esclarecido. 

Não era o desejo de Zhang contar detalhes tão explícitos do que estava acontecendo no Complexo. Haviam regras e orientações de não comentarem sobre o que acontecia por lá em locais públicos. Mas ao encarar o rosto de um homem à beira do desespero, o que lhe restou foi contar uma parte do que houve. 

— Sara passou por um daqueles episódios e precisou ficar em observação — explicou.   

Episódios? 

Foi uma questão de segundo para ele compreender o real sentido daquelas palavras.

— No momento ela está no hospital realizando alguns exames, mas logo estará de volta. 

— Deus — lamentou em um suspiro. Começando a ofegar, tentava manter a postura diante dela. — Ah, Deus. Hospital? Ela está bem? 

— Está se recuperando.  

Passando a mão sobre a testa um pouco suada devido ao momento de tensão, Grissom tentou se recompor do susto. Se não vê-la de início já o deixara ansioso, o sinal de alerta foi ligado ao ouvir aquela notícia.  

— Pode me levar ao hospital aonde ela está? 

— Infelizmente não posso atender seu pedido.   

A resposta foi um banho de água fria para seu corpo cansado e frustrado. A feição de quem não gostou de ouvir aquilo não foi o suficiente para reverter a decisão da cientista. O combinado era de trazê-lo até o Complexo e apresentá-lo às instalações, nada mais que isso. No fundo pensava o mesmo do colega de trabalho ao não concordar com a ideia de trazer um estranho. Entretanto, toda e qualquer decisão adiante tinha de ser tomada com cautela, já que pela primeira vez em suas vidas o "objeto de estudo" era um ser humano, que tinha vontades, sentimentos e crenças.  A proteção daquele projeto era uma prioridade, mas o bem estar de sua paciente também era. 

 


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