Henry sentiu a temperatura de seu corpo diminuir tal como o mundo congelado ao seu redor, a pulsação de seu coração sendo sentida em seus ouvidos. Os olhos de Drex se prenderam ao dele, deu um passo adiante ignorando o aperto de Ray em seu braço, mas o leve movimento de cabeça do homem adiante o fez parar. A expressão de aviso em seu rosto o fez se contrair internamente, a neve adentrando suas botas e molhando as meias quando seus pés afundaram alguns centímetros no tapete branco.

— Solte ela.

Pediu, sua voz vacilando diante da menção de um sorriso no rosto de Drex.

— O que ganho em troca?

Ray xingou ao seu lado, se mantendo calado somente pelo fato de que queria evitar complicar a situação. Henry fechou suas mãos em punho, os nós de seus dedos levemente doloridos pelo esforço que fazia para não socar o outro.

— Você não vai conseguir escapar daqui com ela. Não vai muito longe com toda essa neve e com nós dois aqui.

Tentou apelar para a lógica dele, o que julgava ser difícil ao se levar em conta que ele havia sequestrado uma mulher grávida por vingança. Drex estalou a língua em um som desdenhoso, seus olhos recairam sobre Charlotte que ainda se encontrava desarcordada. O Hart quis arranca-la de seus braços e tirar aquela expressão vitoriosa do rosto dele.

— Sabe. - ele começou, parecia estar se divertindo com toda aquela situação. - Eu até pensei em levar ela para um hospital, procurar uma ajuda ou sequestrar alguém para colaborar com o plano, mas aí dei de cara com vocês e a minha vontade de ajudar meio que... sumiu. - declarou, rindo ao dar de ombros em pouco caso.

— Eu vou matar esse cara.

Esticou o braço para impedir Ray de avançar, por mais que ele também quisesse acabar com Drex, ele estava com Charlotte em seus braços e qualquer movimento errado deles poderia tornar tudo pior para ela. Ignorou o nó que se formava em sua garganta, soltou a respiração pela boca a fim de conseguir controlar sua raiva.

— Vamos fazer um acordo.

— E o que eu poderia querer de vocês? - fingiu um tom triste. - Da última vez que nos encontramos eu fui empurrado de um dirigível, não foi o melhor dos nossos encontros.

— Deixe ela e não vamos atrás de você.

— Kid.

Soltou sua mão da de Ray que a apertava forte após o claro aviso em sua voz.

— Deixe ela e não vamos atrás de você.

Repetiu firme, algo deve ter chamado a atenção de Drex já que ele o encarou intensamente como se buscasse por um lampejo de mentira. Henry sustentou seu olhar, ele estava falando sério, só queria tirar Charlotte dali e nada mais importava naquele momento.

— Como posso saber se está falando a verdade?

Por mais que ele parecesse estar despreocupado, Henry sabia que o fato de Drex estar considerando aceitar sua palavra era a prova de que ele não via uma saída daquele impasse. Eram dois contra um, por mais que ele estivesse com Charlotte, sua vantagem não iria durar muito e ele precisava escapar o mais rápido possível. Seu plano havia sido impedido, ele só possuía duas opções, ou seguia pelo caminho mais racional ou acabava com tudo da maneira mais sádica possível. Henry precisava que ele não tentasse mais nada, só poderia contar com isso.

— Eu lhe dou a minha palavra, só quero sair daqui com a Charlotte e o meu filho.

Sua voz embargou na última palavra, engoliu em seco sentindo seu nariz pinicar em prelúdio as lágrimas que tentava segurar fortemente. Drex desviou seu olhar para Ray que soltou um alto bufo e virou de costas, uma atitude que demonstrou que ele não interferiria. Drex assentiu, abaixando-se para colocar Charlotte deitada no chão da varanda, deu dois passos para o lado, seus olhos injetados de fúria nunca desviando dos de Henry, então se apressou para sair da frente deles.

O Hart esperou dois segundos antes de correr em direção à Charlotte, seus pés afundando na neve enquanto vislumbrava o vulto de Ray sair em direção ao caminho que Drex tomou. Não ligou para o que o seu mentor iria fazer, toda a sua atenção estava na mulher pálida que respirava com dificuldade. Levou uma mão ao rosto dela, não conseguia falar, a angústia se enrolando ao redor de seu pescoço dificultando sua própria respiração, se forçou a não desmoronar. Charlotte precisava dele, seu filho precisava que ele se mantivesse inteiro por mais alguns minutos.

— Vou tirar vocês daqui. - prometeu, a pegando no colo com cuidado. - Vocês vão ficar bem. Vão ficar bem.

Repetia como um mantra, eles precisavam ficar bem. Chutou uma bola de metal em direção à neve, ela se expandiu em uma cápsula que os levaria embora dali, olhou por sobre o ombro para a floresta escura, por mais que quisesse não poderia esperar por Ray. Reunindo toda a sua coragem e esperança, entrou na cápsula que se fechou e começou a flutuar. Olhou para Charlotte, ela parecia tão frágil e até menor mesmo com a enorme barriga, não parecia em nada com a mulher cuja presença sempre era sentida por todos onde pisava.

Piscou rapidamente para evitar as lágrimas, por mais que sentisse algumas escaparem e escorrerem por seu rosto em direção ao de Charlotte. A respiração dela estava fraca, seu peito subia e descia lentamente, sua pele fria fazia seu corpo esfriar na mesma intensidade. Ele não poderia perdê-la e não iria, nenhum dos dois. Beijou carinhosamente sua testa, colando seu rosto ao dela enquanto sussurrava:

— Por favor, por favor, não me deixe. - um soluço escapou por entre seus lábios ressecados. - Eu não posso viver sem você. Eu não quero viver sem você.

A cápsula flutuava por cima da cidade em direção ao hospital, as luzes intensas das casas e prédios alcançavam o material transparente e iluminavam os dois. Henry a beijou novamente no rosto, nunca fora de rezar, não sabia se acreditava ou não na existência de qualquer ser superior, mas naquele instante se viu pedindo para que ela ficasse bem, para que seu filho fosse salvo, para que tudo desse certo. Naquele instante se viu rezando, implorando para que não fosse tarde, se viu pedindo por uma misericórdia que nunca achou que precisaria, se viu à procura de uma chance para viver com o seu amor.