A matter of time escrita por Alice


Capítulo 10
Nine




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/800042/chapter/10

Henry estendeu a mão com cuidado, segurando os dedinhos minúsculos do pequeno ser humano dentro da incubadora. Seus olhos ardiam pelas lágrimas não derramadas, se forçou a afasta-las, não queria nada o impedindo de ver claramente o movimento suave da respiração de sua filha.

— Ela terá que ficar alguns dias tomando banho de luz. - a enfermeira se posicionou do outro lado da incubadora. - Essa pequenina aqui está com excesso de bilirrubina, o que causa o tom amarelado em sua pele e se não tratada pode provocar problemas piores. Por conta dos meses em que sua namorada ficou presa, ela não pôde receber luz solar suficiente e pelo visto teve uma alimentação precária, então devemos ficar monitorando sempre cada suspiro dela.

Assentiu com a mente ainda nublada, seus olhos pesados da exaustão que queria consumi-lo, porém, não conseguiria ficar longe dela até que tivesse certeza de que poderiam ir para casa. Pelo visto ainda iria demorar um pouco.

— Então ela... ela vai ficar bem?

— Vai sim. - respondeu em um tom reconfortante. - Ela é uma pequena guerreira.

O Hart somente assentiu, um sorriso emocionado escondido sob a máscara que usava. Sua filha lutava para receber alta, o médico responsável por ela havia dito que ela estava com um baixo nível de algumas vitaminas em seu organismo, além do fato de ter nascido com um peso abaixo do ideal assim como o seu tamanho. A bebê então deveria permanecer alguns dias internada até chegar ao peso esperado para assim poder ir para casa.

Soltou o ar lentamente pela boca, acariciando os dedinhos finos onde a pele estava saindo; disseram ser normal e que acontecia com quase todos os recém nascidos. Henry tentava manter a calma e perguntar a quem tivesse mais experiência toda vez que uma dúvida surgia, Nora estava com Charlotte para que ele pudesse ficar com a filha. Queria estar com as duas ao mesmo tempo, porém, Charlotte ainda estava desarcordada e o esperado era demorar algumas horas para voltar a consciência.

A cesariana de emergência foi longa e assustadora, a pressão da Page baixou e tiveram que colocá-la no oxigênio antes que fosse tarde. A bebê foi retirada logo, mas Charlotte ainda precisou de outra cirurgia quando encontraram um corte infeccionado em sua coxa. Com a imunidade baixa o resfriado que pegou por sorte não se transformou no início de um quadro de pneumonia. Ela não estava bem, se encontrava em uma alternância de medicamentos e soros, porém, se recuperava aos poucos.

Henry se forçava a não pensar no que Charlotte passou no casebre frio e isolado, não queria imaginar o motivo do corte em sua perna, da sua quase desnutrição e dos hematomas roxos em seus braços. Lutava contra as lágrimas e o ódio cansativo que o dominava toda vez que olhava para ela e para sua filha, poderia tê-las perdido, quase as perdeu.

— Senhor Hart.

A voz controlada de um enfermeiro o trouxe de volta, encarou o homem assentindo levemente em sinal de reconhecimento.

— Sua namorada está acordada.

 

Não o corrigiu, aquele substantivo era o mínimo, Charlotte estava finalmente acordada. Mal percebeu que sorria, o coração martelando forte em seu peito ao passo que seu corpo tremia em antecipação. Era hora de vê-la.

 

 

■ ■ ■ ■ ■


Charlotte estava parcialmente sentada quando ele abriu a porta do quarto, o corpo de Henry paralisou ao vê-la sob a luz do hospital. A pele escura se encontrava acinzentada, olheiras profundas chamavam a atenção para o rosto fino e visivelmente cansado. Ela apertou a colcha que cobria seu corpo com força, fitou o nó dos dedos que se evidenciavam pelo gesto dela. Se forçou a encarar os olhos apagados do brilho natural que continham, em seu lugar estava o brilho das lágrimas não derramadas.

Soltou a maçaneta fria sentindo sua mão doer pela força que fizera, deu passos vacilantes em direção à ela, se impedindo de cair por cima de Charlotte e abraça-la até o fim dos tempos. Sentou na cadeira ao lado da cama, cobrindo a mão dela com as suas, não percebeu que chorava até sentir o toque quente em seu rosto quando ela começou a limpar suas lágrimas.

— Oi.

A simples saudação o fez fechar os olhos, seu corpo tombando para frente enquanto apoiava a testa na perna de Charlotte. Os dedos dela se entrelaçavam pelos fios compridos em sua nuca, há tempos não lembrava de cortar seu cabelo. Apoiou a lateral do rosto na colcha, encarando o rosto aflito da Page.

— Eu senti tanto a sua falta. - declarou, a voz embargada enquanto apoiava os cotovelos na cama e segurava novamente a mão dela entre as suas. - Eu quero te falar tanta coisa, Char. Tanta.

— Eu também. - sussurrou, lágrimas escorrendo por suas bochechas. - Vem aqui, por favor.

Charlotte se moveu para o lado, dando espaço para o Hart. Ele sentou, a envolvendo em seus braços quando ela apoiou o rosto em seu peito. Em silêncio, os dois choraram, abraçados fortemente com medo de que tudo aquilo fosse somente um sonho e que a qualquer momento o outro fosse desaparecer. Henry a sentiu se aconchegar ainda mais contra ele, deslizou um pouco para baixo permitindo um maior conforto para os dois.

— Como ela está? - a voz baixa de Charlotte cortou o silêncio.

— Está indo muito bem. - respondeu, um pequeno sorriso nascendo em seu rosto. - O doutor Noah disse que talvez ela receba alta primeiro que você.

— Eles achavam que eu pudesse estar com pneumonia, fizeram... tantos exames quando acordei e tenho certeza de que foram ainda mais enquanto... eu estava dormindo. - tossiu, resmungando baixo antes de esticar a mão em direção à jarra de água.

— Vou buscar pra você. - avisou, afastando-se dela para buscar um copo d'água. - Sua garganta ainda está muito inflamada, tente não se forçar.

A Page revirou os olhos enquanto bebia o líquido, uma clara expressão de que ele não precisava dizer o óbvio. Riu apesar de tudo, mesmo com a sensação angustiante que ainda apertava seu peito ao vê-la tão debilitada, o medo que o tomaria enquanto sua filha não saísse daquele lugar, apesar de tudo isso ele riu. A familiaridade do gesto de Charlotte, a maneira como ela franzia as sobrancelhas em uma pergunta muda, todos os mínimos gestos e expressões, tudo era ainda tão ela que a felicidade misturada com alívio voltava a rastejar por sua pele.

— Eu te amo muito. - não conseguiu controlar, na verdade, não quis. Ela o encarou surpresa, fechando os olhos quando ele se inclinou para beijá-la na testa. - Só quero que você saiba.

Ao se afastar a viu assentir, um sorriso carinhoso em seu rosto antes de encostar a testa em seu peito. Ficaram mais alguns minutos assim, novamente em um silêncio calmo e confortável. Charlotte soltou um leve suspiro, afastando-se dele enquanto voltava a deitar na cama, pelo lampejo de cansaço em seu rosto, Henry percebeu que já estava em sua hora.

— Quando você estiver mais descansada eu volto com a nossa filha.

— Você vai voltar com ela na hora que o médico liberar. - o corrigiu rapidamente, arrancando outra risada de Henry. - Mesmo que eu esteja dormindo, inconsciente... não importa, você vai me acordar. Promete?

— Você tem que dar o tempo para o seu corpo descansar. - falou lentamente, ganhando um olhar afiado em resposta. - Nem adianta me olhar desse jeito, você sabe que estou certo.

— Posso muito bem descansar depois de ver o rosto da minha filha. - rebateu, gemendo irritada quando se mexeu na cama. Soltou o ar lentamente pela boca, olhando para o teto em uma desistência frustrada. - Sei que você tem razão, mas não ver ela... não é certo, Hen.

— Prometo que trago ela assim que puder. - se ajoelhou ao seu lado, cobrindo as mãos delas com as suas. - Confia em mim? - a encarou sério, não queria que ela tivesse dúvidas, podia ver o medo lívido em seus olhos.

— ... sim. - cedeu após alguns segundos, desviando olhar para o tecido da colcha quando ele beijou o nó de seus dedos. - Você pedir para a minha mãe entrar? Não quero ficar sozinha.

— Claro. E você nunca estará sozinha. - declarou firme, depositando um beijo em sua testa antes de se afastar.

Charlotte ainda encarava as próprias mãos quando ele fechou a porta, Nora apareceu à sua frente assim que saiu do quarto. Trocou um leve aceno com a mulher mais velha antes de se afastar, caminhou apressado em direção ao banheiro, entrando em um compartimento a tempo das primeiras lágrimas começarem a escorrer por seu rosto. Sua visão ficou embaçada, sentou na tampa do vaso, entrelaçando os dedos em sua nunca quando inclinou a cabeça para baixo.

Chorava de alívio por ver que Charlotte estava viva, de felicidade por poder ficar perto de sua filha, de raiva dos traumas que Drex provocou em Charlotte e de frustração por saber que não poderia fazer muito por ela. Porém, tê-la em seu braços, poder sentir a respiração dela, saber que não havia chegado tarde fazia com que a pequena esperança que habitava seu peito se espalhasse por todo o seu corpo. Ela iria ficar bem, juntos iriam encontrar um caminho, então todos ficariam bem.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "A matter of time" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.