Presos Por Um Olhar escrita por Carol McGarrett


Capítulo 95
Amizade


Notas iniciais do capítulo

E depois de um pequeno hiato (que eu peço desculpa!). Estamos de volta!
Boa leitura!



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— Eu escutei direito? Você estava cantando antes de dormir ontem? – Mel perguntou assim que entrou na cozinha, com cara de sono, cabelo despenteado e amarrando o roupão.

— Sim, eu estava cantando.

— Não era um tanto tarde? – Questionou ao abrir a geladeira e tirar de lá uma jarra de suco.

— Preciso disso.

— Ahn... entendi. Está ruim assim, amiga?

— Melhorou muito. Agora eu consigo dormir de novo no quarto. Antes nem isso.

— Maldito seja o Cavendish! Velho safado!

— Amém para as suas palavras! – Vic fez coro. – Bom dia! O que temos para comer?

— Bom dia! – Respondemos.

— E a comida? – Insistiu a morta a fome.

— O fogão está ali, as panelas naquele armário e a comida na geladeira. Pode ficar à vontade! – Comentei.

Minha cunhada só me mostrou a língua.

Com pouco, Pietra apareceu, ainda com a máscara de skincare no rosto, uma touca de cetim na cabeça e um roupão vermelho.

— Senhor toma conta!! Tem um avatar nessa cozinha!! – Vic gritou assim que tirou o rosto de dentro da geladeira e viu a assombração que era Pietra.

— Credo, mulher!! Tira esse troço do rosto antes de aparecer em público! – Mel reclamou.

Eu não falei nada, mas a reação de Thor e Stark que saíram correndo, traduziram a minha intenção.

Madonna Mia! Não se pode nem continuar com o skincare depois de acordada que tem gente que reclama! Pleno 2022 e vocês com essa mentalidade! – Reclamou a Louca jogando as mãos para cima.

— O problema não é o skincare, todas nós estamos trabalhadas nos hidratantes, o problema é a cor da sua máscara! Essa coisa azul berrante aí, combinada com o roupão vermelho e essa touca de cetim verde... você está parecendo um E.T.! – Mel se explicou.

— Um E.T. bem feio, que assustou os cachorros. – Vic, recuperada do susto, disse rindo.

— Cachorros não enxergam cores. – Pietra retrucou.

— Mas eles viram algo que os fizeram correr. E foi você. Admita, Louca, até para você e sua extravagância toda, isso está demais. – Falei e mostrei a foto.

Pietra pegou o celular da minha mão, observou a foto e depois com um balançar de mãos, me entregou o aparelho.

— O importante é que eu vou estar deslumbrante no final do dia, quando sairmos para jantar, enquanto as três vão estar com cara de velhas de 70 anos. – Praguejou.

— Tudo bem, Pietra, veremos no fim do dia. – Concordei com ela e ia saindo da cozinha, quando a própria me para na porta. – O que foi agora?

— Somos convidadas. Você cozinha!

— Mas não mesmo! Não sou empregada de ninguém e vocês sabem cozinhar muito bem! – Respondi e encarei as três que me encararam de volta com os braços cruzados. – Ah! Tudo bem!

Acabei no fogão com as duas humanas e o projeto de Avatar tagarelando na minha cabeça, sobre planos para o final de semana. Pelo visto, eu não teria um segundo de descanso se dependesse das amigas mais tresloucadas que alguém pode ter.

Por conta de toda a falação e do excesso de comida que tive que fazer para que as três ficassem alimentadas por todo o dia (até parecia que eram crianças indefesas e não mulheres adultas!), acabei chegando atrasada no trabalho.

— Sem visita hoje, Chefa? – Amanda me perguntou, pulando ao meu lado assim que pisei no andar.

— Não. As três loucas ficaram na minha casa. Receio que posso não ter uma casa no final da manhã.

Milena riu do meu exagero e começou a me passar a minha agenda. Reuniões e mais reuniões, inclusive com Londres, e telefonemas para os portos com o intuito de verificar como iam os trabalhos.

No meio do dia, Amanda só colocou a cabeça dentro da minha sala para se despedir, já que ia para casa, pois estava em semana de provas e a política dos trainees era que eles trabalhariam meio período para terem tempo hábil para estudar. E, aproveitou o ensejo e me avisou que Milena estava indo almoçar.

Como eu estava no meio de uma das minhas ligações só balancei positivamente a cabeça, desejando a ela uma excelente prova.

Novamente sozinha, voltei minha atenção totalmente aos problemas do porto de Buenaventura, na Colômbia. Ia anotando tudo o que o administrador comentava, alguns problemas eu poderia resolver, já outros (a violência dos grupos criminosos) estava além da minha alçada. Da Colômbia parti para o Peru e, por fim, Chile. Passei mais da metade do meu dia falando em espanhol, contornando problemas e tentando administrar cargas, navios e até aviões à distância.

No meio da tarde, dei uma parada para comer algo, meu almoço há muito esquecido dentro da bolsa térmica, já estava gelado.

— Tenho que aprender a controlar meus horários... porque comer comida esquentada no micro-ondas todos os dias não vai dar. – Falei alto, como um lembrete para minha própria cabeça.

Depois de comer, dei uma andada pelo escritório, estava descalça e tentava reaver a circulação das minhas pernas, quando meu celular começou a tocar. Achando que era uma ligação fora de hora de Alex, corri para atender. Não era ele, mas uma chamada do bando de Loucas.

Revirei os olhos, o que Pietra queria agora? – Me perguntava quando aceitei a chamada e, bem, dei de cara com Mel e Vic chorando de rir e com Pepper sem entender muita coisa na outra telinha.

— O que foi agora? – Ela perguntou primeiro.

Mel e Vic só viraram a câmera e uma Pietra muito vermelha e com o rosto todo inchado apareceu. Se pela manhã ela era um projeto de Avatar, agora ela era a encarnação do Baby da Família Dinossauro.

— MAS O QUE ACONTECEU COM VOCÊ?? – Pepper deu um grito.

Já eu estava tentando não rir muito do infortúnio alheio, afinal Pietra é conhecida por mandar umas zicas bem fortes e de aplicação imediata.

— Esse aí é o skincare perfeito que ela disse que tinha. – Mel disse entre risadas.

— Estava se vangloriando de manhã e agora está assim. – Vic ria.

— CALADAS!!! Todas vocês! – Pietra reclamou. – Todas deveriam estar pensando em como me ajudar, e não em rir da minha cara!! Olhe só para o meu rosto perfeito.

Ex rosto perfeito! Olhe o tamanho dos seus lábios! Estão mais desproporcionais do que os das Kardashian/Jenner!! – Mel continuou.

— Não comece, Melissa! Não se esqueça que no Ano-Novo foi você quem passou perrengue! – Pietra avisou ameaçando a brasileira com uma escova de cabelo.

— E ninguém me ajudou! Assim não tenho que ter misericórdia de você!

— MAS EU NÃO POSSO FICAR DESSE JEITO!!! – Chorou a Italiana, em uma cena típica de um filme pastelão. – Temos um final de semana inteiro pela frente! Prometemos que íamos tirar a Kat de casa.

— E agora teremos que ficar dentro de casa. – Murmurei um tanto feliz demais com a notícia.

— Bem, meninas, o que exatamente a Pietra passou no rosto? - Quis saber Pepper.

Vic e Mel, que estavam ao lado da Louca, olharam para ela, tão curiosas quanto nós que estávamos do outro lado da chamada.

— Uma misturinha que vi na internet...no vídeo deu certo. - Tentou se explicar a Louca.

Revirei meus olhos, Pepper se engasgou e foi Mel quem reagiu primeiro e deu um sonoro tapa atrás da cabeça de Pietra.

— Isso doeu! Eu já estou toda ferrada, quer me deixar com enxaqueca também?

— Isso é para você ter mais um pouco de noção das coisas. Já com 30 anos nas costas e fica passando "misturinha que viu na internet" na cara. Agora está aí, igual a Peppa Pig! – Vic respondeu.

Pietra se jogou dramaticamente no sofá e escondeu o rosto atrás de uma almofada. Reclamando em italiano e soltando todos os palavrões que conhecia.

— E como nós vamos reverter esse quadro aí? – Pepper perguntou.

Eu não fazia a menor ideia, tudo o que eu queria nesse exato momento, era que alguma delas, ou todas elas, decidissem por ficar em casa, comendo pipoca e vendo uma comédia romântica na televisão.

Contudo, minhas expectativas logo foram jogadas água abaixo, pois a própria Pietra veio com a solução.

— VAMOS PARA UM SPA!

— Um Spa?! – Perguntamos juntas.

— Sim. Eu preciso reverter essa coisa e nada melhor do que em um Spa! Podemos ir todas e tirar o dia para cuidar de nós, e caso meu rosto tenha voltado ao normal até o final do dia, quem sabe ainda não entramos na fila de alguma casa noturna daqui?

Era um péssimo plano. Porque eu não queria me enfiar em uma casa noturna, mas também não poderia desejar para minha amiga de longa data que ela continuasse com o rosto como estava. Assim, só pude concordar e eu sabia que iria me arrepender disso no exato momento em que eu desligasse a chamada.

 - Então está confirmado! Eu vou procurar o melhor spa para nós! – Pietra disse e já estava com a cara enfiada no meu IPad para reservar nosso dia no Spa.

— Garanta que eles aceitem alienígenas no local! – Mel não deixou barato e levou uma almofadada na cara.

— Eu vou desligar isso aqui, porque tenho certeza de que a Pepper e a Kate tem que trabalhar. Mandamos o cronograma do nosso dia no Spa por mensagem... – Vic falou, mas foi interrompida por Pietra que gritava algo como:

— TEM QUE SER ESSE! EU PRECISO IR NESSE!

Vic deu um tchauzinho para a câmara e desligou, restando eu e Pepper na chamada, uma encarando a outra, sem entender nada.

— Eu tenho que ter medo dessa última frase?

— Tem! Muito. Ainda mais quando ela diz que “precisa”. – Fiz aspas com as mãos para dar bastante ênfase no drama que Pietra pode fazer.

— Senhor! Aonde ela vai nos meter no sábado?

— Não sei, Pepper. Não faço ideia. Mas vindo da Louca Italiana, espere por qualquer lugar.

Minha cunhada americana só arregalou os olhos e, se não fosse pela assistente dela tê-la chamado, acho que ela teria dado uma síncope bem ali.

— Ok, tudo bem. Eu acho que sobrevivo a isso. Devo sobreviver, né?

— Eu venho sobrevivendo nos últimos 22 anos, Pepper. Você vai também. Talvez vá ficar traumatizada e precisará de terapia para superar o choque, mas passa.

— Obrigada pela dica. Já vou procurar o terapeuta e encomendar o tarja preta! – Pepper deu uma risada da minha brincadeira. -  E só para constar... o jantar sei lá aonde...

— Está cancelado. Pietra JAMAIS mostrará a cara inchada e cor de rosa em público. Jamais!

— E como ela vai fazer no sábado?

— Capaz que vai colocar um véu na frente do rosto. Ela é capaz de fazer qualquer coisa.

— Vou fingir que nem conheço!

— Agora você começou a entender como uma amizade com a Pietra funciona!! Simplesmente ignore as presepadas, grave o king kong e depois ria da cara dela!

— Vou anotar isso, Kat! E vou anotar o dia, a hora e quem me deu a dica, para, caso aconteça algo comigo, alguém possa te culpar.

— Will virá te defender, é?

— Espero que sim, porque senão, eu volto dos mortos para assombrá-lo!

— Falando nele, como está meu cunhado desaparecido?

— Vivo, bem, trabalhando a morrer, morrendo de frio, quase que teve o dedão do pé congelado, porque caiu num lago congelado e não trocou a meia... enfim, Will sendo Will e fazendo a gente passar um susto por hora... mas ele volta no final do mês! E o Rei do inverno? Onde está Alex?

— Polônia. Vai para Hungria ainda nessa semana. Depois Romênia. Aí Londres.

— É... meu cunhado ainda vai ficar muito tempo desaparecido. Mas eu não duvido que ele apareça por aqui antes...

— Não vou dizer que não iria gostar, porque eu ia, mas acho muito difícil.

— Bem, veremos, diferentemente de Will, Alex é chegado em fazer surpresas, não vou apostar nada com você, porque sei que só perde, mas espere. E falando em esperar, tenho que ir, meu próximo paciente já está lá fora. Beijos para você e me avise se tiver algo de noite!

— Pode deixar que aviso sim! Bom trabalho para você!

— O mesmo por aí.

Pepper desligou e eu tentei retomar o raciocínio do meu trabalho, porém logo fui interrompida por duas mensagens.

A primeira da Louca Italiana que já tinha decidido em qual Spa queria ir. Mandou até o link da página na internet.

É aqui que nós vamos no sábado! Um dia de Cleópatra!— Ela dizia.

Abri o link e me deparei com o site do The Peninsula[1]. Um dos spas mais chiques da área de Beverly Hills. E fazendo uma procura rápida da internet, descobri o motivo de ela ter citado Cleópatra. Pois nesse hotel, ninguém mais, ninguém menos do que Elizabeth Taylor passou a Lua de Mel.

E como eu fechei o pacote completo e tem que ser com seis ou mais pessoas, tomei a liberdade de convidar Dona Amelia, que já aceitou o convite! Passaremos o sábado no Spa com direito a tudo!!

Diante dessa última mensagem eu fiquei boquiaberta.

Tinha sobrado até para a minha sogra!

 Decidi não responder a essa e passei para a outra conversa que me esperava.

Oi, täti!!

Tudo bem por aí?

Sumi, né?

Culpe as provas. Mas já acabaram e eu fui bem!

Fiquei sabendo que tem visita... só cuidado pra Louca não te deixar louca (dumpass)

E como vai a sua terapia? A minha tá indo bem, já não tenho tanto receio assim de sair sozinha na rua, mas de vez em quando me pego nervosa do nada. Dois finais de semana atrás, sai com as minhas amigas, bem, virei fotógrafa delas, e também de Londres. Vou te mandar as fotos para a senhora ver!

E lá vieram quase cem fotos.

Sei que são muitas, mas tem da nossa última visita ao Haras. É tão estranho ir lá e não ver o Perigo ou o Hal... como eles estão? Já montou neles lá na Fazenda? Perigo se deu bem com Furia?

Tô com saudades da senhora e de todo mundo daí... dê um abração na Dona Amelia por mim. E diga pra ela que conversei com papai sobre o Super Bowl, ele falou que nossas notas irão definir se vamos ou não!!

Liv ainda digitava a próxima mensagem, quando decidi por ligar, seria mais rápido e me pouparia os dedos.

— OIII! – Ela atendeu sorrindo.

— Oi para você também. E como vai Londres?

— Frio, chuva, névoa, do jeitinho que a senhora gosta! E Los Angeles?

— Fria, não tanto quanto Londres. E praticamente impossível de se respirar aqui no centro financeiro.

Liv fez uma careta.

— E respondendo às suas perguntas, as três estão aqui... perturbando a minha paciência. E quero saber das provas...

— Ainda não tenho nenhum resultado, só na próxima semana, mas pelo que me lembro e andei conferindo, fui muito bem! Creio que papai vai realmente liberar a nossa ida ao Super Bowl.

— Não conte nada como certo. A vinda aqui vai fazer com que vocês percam, no mínimo três dias de aulas, e no meio do semestre isso não é legal.

— Eu sei, se nem pra Fórmula 1 ele nos deixa ir quando não estamos de férias... – Disse com biquinho. – Mas a esperança é a última que morre, né?

— Você realmente gostou de Futebol Americano, hein?

Liv ficou vermelha.

— Talvez não tenha sido o futebol em si, acho que foi porque o Senhor Pierce me tratou tão bem e me explicou tudo tão direitinho que eu acabei gostando do jogo.

— Entendo. E só te aviso, não crie muitas expectativas, nem comente com Elena, não quero que ela fique achando que virá para Los Angeles e depois não vem.

— Pode deixar, täti. E o que a senhora achou das fotos que te mandei?

— Não tive tempo de abrir todas, foram mais de cem. Porém, as poucas que vi aqui, estão excelentes!

Liv começou a pular mesmo que sentada na cama e só soltou:

— Eu vou tomar o lugar da senhora como fotógrafa da família!

— Estou contando com isso!

E a minha fala pegou minha sobrinha de guarda baixa e ela quase caiu da cadeira.

— Eu falei brincando! Não quero o seu lugar.

— Mas não eu. Você tem talento, Liv. E como não é nada profissional, você pode, sim, virar a fotógrafa da família.

Minha sobrinha só arregalou os olhos. E depois eu consegui ver uma ideia passando pela cabeça dela, só pela forma como seus olhos azuis claros brilharam.

— Eu vou ser a fotógrafa do seu casamento!!! – Gritou.

— Eu não me oponho. Agora pergunte para o seu tio se ele vai querer.

— Mês que vem eu pergunto. Ele ainda vem para Londres, não vem?

— Sim, creio que em duas semanas estará aí.

— E a senhora, vai vir nos ver?

— Na última semana de cada mês. Decolo daqui na quinta-feira e volto no domingo. Não é muito tempo, porém é uma boa forma de matar a saudade.

— Todos os meses?

— Sim, todos os meses!

— Isso vai ser tão bom!! – Ela jogou os braços para cima e rodopiou com a cadeira.

— Para de ser exagerada, Olivia.

— Eu só estou feliz, täti.

— Sei.

— É verdade! Esse arranjo é muito melhor do que só ver a senhora pela tela do computador. Sabia que a vovó ia ser uma melhor CEO do que o Matti.

— Eu não quero você se intrometendo na política interna da empresa.

— Não estou. Só estou pensando em voltar a trabalhar lá... como trainee, nos dias em que saio mais cedo da escola. Mas mamãe pediu que isso só acontecesse depois do verão, que por enquanto eu tenho que me tratar.

— E ela está coberta de razão!

— Sei disso também. Mas é que como todas as laranjas podres já foram embora, pensei que poderia voltar.... já que o clima por lá está bem melhor.

— Olivia, cada coisa no seu devido tempo. A empresa está passando por uma reestruturação. Não é hora de ficar fantasiando com nada.

— Entendo, na verdade, não entendo não, mas aceito a opinião de vocês.

— Um dia você vai entender. Ainda não é hora. Mas sabe que horas são?

— Ah, não...

— Sim, você tem aula amanhã e tem que ir cedo para a cama para descansar e eu tenho que voltar ao trabalho.

— Tudo bem... nos falamos no final de semana. Beijos para a senhora, täti.

— Beijos! E boa noite para você.

Liv mandou vários beijos pela tela e depois desligou. Logo em seguida conferi o relógio e vi que ainda tinha um par de horas para conseguir trabalhar direito, assim, depois de fazer um bule de chá, me concentrei no que tinha que fazer, terminando de analisar o relatório que Camilla havia me mandando sobre os itens de suprimento que alguns escritórios haviam encaminhado para Londres.

Às 18:00 horas, encerrei meu dia, quase toda a semana estava completa e assim pude ir para casa, já tinha avisado no Pilates que não iria nesse resto de semana por motivos de visita e, sabendo que Pietra não iria querer colocar a cara na rua por conta de seu estado lastimável, passei no mercado para ver o que poderia fazer de jantar, já que isso iria sobrar para mim também.

Andei por todos os corredores do supermercado, olhando os produtos e pegando alguns que eu sabia que não precisaria, mas porcaria para comer é sempre bem-vinda, paguei tudo e fui para casa.

Chegando perto, acionei o botão para abrir o portão e antes mesmo que eu conseguisse manobrar o carro para efetivamente entrar em casa, vejo dois mísseis correndo para rua. Levei alguns segundos para entender que eram Stark e Loki e quando, um tanto desesperada, deixei o carro em ponto morto e estava para abrir a porta, Pietra, Mel e Vic saem correndo atrás dos meus cachorros.

— O que aconteceu? – Perguntei.

— Aquelas duas pestes peludas roubaram a minha touca de cetim e estão fazendo cabo de guerra com ela. Quando saímos correndo atrás deles, eles vieram para a frente da casa, e foi quando você abriu o portão! – Pietra gritou.

Nós quatro saímos correndo atrás dos cachorros, e eu só parei para pensar na cena inusitada que aquela vizinhança estava vendo, quando, depois de correr três quarteirões de salto, gritando os nomes de Stark e Loki, consegui fazer Loki me obedecer e assim que olhei para trás, Vic e Pietra tinham praticamente pulado em cima de Stark para imobilizá-lo, que percebi que alguns vizinhos que andavam com seus cachorros por ali, tinham parado tudo o que estavam fazendo, para observarem o quarteto de loucas e os dois fujões.

Quando vi que nós éramos as atrações do início da noite de quinta-feira, me levantei, murmurei meus boa-noite para os vizinhos, e fui puxando Loki e Stark pelas coleiras.

— Por que eles estão nos olhando dessa forma? – Pietra perguntou em italiano.

— Porque nunca viram uma pessoa correr de salto alto e outra de roupão e rolinho no cabelo, no meio da rua.

E Pietra se lembrou da sua roupa.

— Mas que droga! – Ela deu aquela olhada para o roupão que ela usava. – Sem querer ser a inconveniente aqui, mas alguém lembrou de fechar o portão quando saímos correndo?

— Não dava para fechar, o carro da Kat estava meio para dentro, meio para fora...

Nós quatro paramos e só gritamos:

— THOR!!!

E voltamos a correr.

Porém, eu deveria me lembrar que Thor é uma pamonha completa, pois quando chegamos perto da casa e o chamamos, ele não respondeu. Só fomos encontrar o terceiro cachorro da casa, dentro da sala de visita, todo à vontade em cima do sofá, roncando alto, com as patas viradas para cima e a língua para fora.

— Thor é a encarnação daquele ditado: Quero que o mundo acabe em barranco para poder morrer encostado... não é possível. – Mel falou, olhando incrédula para o husky que nem se mexia.

— Um pandemônio danado dentro dessa casa, três loucas gritando, e esse cachorro assim. Grande cão de guarda. – Vic passou perto dele e deu um tapinha perto de onde ele estava dormindo, Thor nem se mexeu.

— Bem, este é só Thor sendo Thor! – Comentei e voltei para a garagem, pois ainda tinha que tirar as compras do porta-malas.

— Olha! Agora ela resolveu fazer a comida para nós. – Pietra falou como se eu tivesse deixado as três com fome por todo o dia.

— Não exagera. Tinha comida aqui. – Murmurei quando acabei de separar o que eu efetivamente iria precisar e o que eu iria guardar. – Só vou tomar um banho rápido e trocar de roupa. – Avisei e subi correndo.

Quando desci, nosso grupinho tinha um acréscimo, Pepper resolveu passar para ver como Pietra estava e já que nosso jantar estava cancelado, veio para comer também.

— Vamos pedir pizza com abacaxi? – Ela perguntou e Pietra só virou uma almofada no rosto dela. – Hei! Por quê?

— Não se coloca abacaxi na pizza. JAMAIS! Que coisa mais de americano!

— Eu sou americana! – Pepper se defendeu.

Mel, Vic e eu só nos ajeitamos para ver a briga.

— Na presença de uma italiana, que vai herdar um dos restaurantes mais famosos da Itália, você não vai estragar uma das receitas mais populares e típicas. Na pizza não vai abacaxi. – Disse a italiana em tom ameaçador.

— Tudo bem... nada de pizza, ou de abacaxi na pizza. – Pepper falou. – Não quero ser o próximo alvo da Máfia.

— E pode apostar que seria. – Pietra se levantou dramaticamente e quando ela passou na frente da porta, a campainha tocou.

— Alguém está esperando alguém? – Mel perguntou.

— Não. – Falei. E fui atender. Porém, nem precisava, pois só pela reação dos três cachorros eu sabia que era alguém conhecido.

Ao fundo escutei Pietra dar um grito e sair correndo para o andar de cima e eu mal abri a porta e dei de cara com meus sogros.

— Oi! Boa noite! – Cumprimentei-os com um abraço. – Chegaram bem na hora, ia começar a fazer o jantar.

— Vai ter sobremesa? – Meu sogro falou ao entrar.

— Faço. Sem problemas.

Quando entramos na sala, Dona Amelia, que já sabia que as meninas estavam por aqui, só mencionou:

— Deveria ter deixado o Jonathan em casa, assim virava o Clube da Luluzinha.

Meu sogro só olhou para a esposa muito injuriado como se dissesse que ele também tem direito a comer.

E a noite foi uma verdadeira bagunça, pois ninguém parou de falar por um minuto sequer, cada um tinha uma história para contar.

A certa altura, Pepper recebeu uma ligação de vídeo de Will, e pelo visto era engano, pois quando ela atendeu, ele não olhava para a tela, estava todo concentrado olhando para a tela do computador, e pudemos ver além, era um jogo em conjunto, pois no cantinho da tela era possível ver Kim, Alex, Tuomas, Benny, Matt e Grant.

— Ligar para mim que bom não liga, mas jogar online com a turma tem tempo!! – Pepper falou e foi hilário, pois Will deu um pulo, desconectou o headset e ao pegar o celular, só perguntou:

— Como eu liguei para você?

Com o som do computador de meu cunhado alto, pudemos ouvir as risadas dos meninos.

Will, tentando sair da encrenca, só falou:

— Não fiquem muito felizes, pois Vic e Kat estão do lado da Pepper.

Na mesma hora Kim, Tuomas e Alex desconectaram.

— Covardes! – Benny gritou. – E oi para vocês, maninhas!! Não cortem a cabeça deles, tem tempos que estamos tentando marcar para jogar, mas só hoje deu jeito.

Eu mandei uma mensagem para meu sobrinho, na hora:

Vou contar para a sua mãe que ao invés de dormir, você está virando a noite, jogando sei lá que porcaria!

Claro que ele não me respondeu, mas outra pessoa me ligava.

E Vic também recebia uma ligação no mesmo instante.

Alex e Kim tinham a cara mais lavada do mundo quando atendemos, ao fundo escutamos Grant, Matt e Benny se despedindo, e claro, Benny tinha que soltar a pérola:

— Foi bom conhecer vocês. Vocês são bons amigos.

E nessa hora, Kim, Alex e Will tinham a mesma frase pronta na ponta da língua:

— Eu posso explicar. – Disseram os três.

Pietra e Mel começaram a rir, meus sogros se ajeitaram nos bancos da ilha para ouvirem as desculpas esfarrapadas, já Pepper, Vic e eu, encaramos as telas dos celulares que tínhamos colocado em cima da bancada, para que todos pudessem ver a cara de culpados dos três.

— É que já estava marcado há um tempo. – Começou Will.

— Eu ia te ligar, Vic, mas achei que você e o Bando de Loucas iam sair...

— Ainda é relativamente cedo aí na Califórnia, Kat, MAS eu ia te ligar assim que a partida acabasse.

Como nenhuma de nós falamos nada, eles soltaram a seguinte pérola:

— Jogo online não tem pausa!!

E depois começaram a brigar, culpando Will por ter ligado para a Pepper.

Eu só fiquei parada vendo Alex se enrolar nas desculpas, até que soltei:

— Já que jogo online não tem pause, volta pra lá e vê se ganha.

— Eu estou um tanto encrencado, não estou? – Alex perguntou muito desconfiado da minha calma.

— Quando você voltar para Los Angeles, a gente conversa. Boa noite.

Estava desligando e pude ouvi-lo falando.

— Espera, Kat... mais tarde...

E dessa vez deixe-o no vácuo.

Pepper e Vic fizeram a mesma coisa. E não deu trinta segundos a primeira mensagem chegou, depois mais uma e outra.

— É sempre assim... são pegos no flagra e depois a culpa corrói até as entranhas. – Vic falou rindo.

— A cara de desespero dos três quando desligamos! – Pepper ria.

— Agora eles vão ver como é bom ficar sem notícias... – Comentei rindo também e me lembrando da carinha de Alex de quem sabia que tinha ferrado com tudo e agora estava com medo da minha ira.

Meus sogros só riram das nossas reações e Dona Amelia tinha só uma certeza:

— Amanhã vai aparecer presentes de desculpas para vocês, tenho certeza.

— Mas onde foi que paramos mesmo, antes de descobrirmos que os bonitos preferem um jogo online a conversar conosco? – Vic continuou a conversa.

E parecia que nada tinha interrompido o nosso jantar, pois continuamos de onde paramos.

Meus sogros e Pepper ainda ficaram um bom tempo, pois logo em seguida, alguém apareceu com um baralho e começamos a jogar, já era quase madrugada quando fui para cama e, foi só aí que vi as mensagens de Alex.

Kat... você não ficou com raiva por conta do jogo, ficou?

Tentei de ligar, mas você não atendeu...

Eu te juro, ia te ligar mais tarde, para gente conversar antes que você dormisse.

Kat... me manda só uma mensagem me falando que está tudo bem.

E a última, depois de três tentativas de me ligar pelo FaceTime:

Pelo visto você não vai me atender hoje... tenha uma boa noite, Kat. Te amo. Amanhã nos falamos.

Não está nem um pouco culpado e arrependido o menino... – Comentei alto e rindo. Estava sendo engraçado ver Alex todo culpado, afinal, eu não tinha falado nada, na verdade, nem tinha ficado com raiva por ele estar jogando online com a turma. Ele era meu noivo, mas também tinha a vida dele, e não é porque estamos juntos que temos que fazer tudo juntos!

Mas que eu estava me divertindo com o desespero dele, ah, isso eu estava!

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E a sexta-feira chegou, e com ela, antes mesmo que eu saísse para dar uma volta com o trio peludo, apareceu um entregador.

— Nossa, nem toquei a campainha, moça! – Ele falou assustado quando trombamos no portão.

— Bom dia, eu que estava saindo. Em que posso te ajudar?

— Entrega para Katerina Nieminen.

— Sou eu.

— E para Victoria Williams.

— É aqui também.

— Só um minuto.

E ele voltou para a van e depois reapareceu com dois buquês de flores, daqueles imensos. Um era todo de rosas cor de rosa, de Vic, claramente, pois o buquê que ela carregou no dia do casamento com Kim foi exatamente assim. E o outro, uma mistura com frésias, hortênsias, lírios, amores perfeitos e rosas vermelhas, brancas, cor de rosa e amarelas. As mesmas flores que estavam espalhadas pela casa naquela noite em que Alex preparou aquele jantar especial para mim.

E não acabava nos buquês, o entregador retornou à van e reapareceu com duas cestas imensas de café da manhã.

— Moça, eu não sei o que vocês fizeram, mas seus maridos estão muito arrependidos. – Ele comentou quando assinei pela entrega.

A minha resposta foi apenas um sorriso.

Desisti de sair para andar com os cachorros e voltei para dentro de casa, onde chamei por Vic.

— Hei, cunhadinha, parece que tem alguém que está muito arrependido. – Falei alto.

Logo que atrás de Vic, apareceram Mel e Pietra, que já tinha melhorado o rosto consideravelmente.

Dio Mio!!! Olha o arrependimento e a culpa desses dois! – Falou a italiana ao ver o tamanho dos buquês.

— Vocês não viram nada. – Falei.

— Tem mais?

— Só esperem. – Disse por sobre o ombro e logo voltei com as duas cestas.

Minhas amigas só riram.

— É... e olha que vocês nem falaram nada... – Mel comentou. – Imagine se tivessem soltado cobras e lagartos? Eles estariam de joelhos aqui e agora.

— Podem apostar que sim! – Vic ria enquanto abria a cesta e observava o que tinha dentro.

— Dá para alimentar um pequeno país com a quantidade de coisa que veio nessas cestas. – Pietra falou e já foi roubando alguns morangos.

— Como vocês disseram, arrependidos. – Comentei.

— Mas eles não falaram mais nada? – Mel quis saber.

Olhei para Vic que me olhou de volta e nós duas colocamos os celulares em cima da mesa, com as últimas mensagens dos dois.

— E vocês não responderam? – Pietra questionou. – São más... os meninos à beira de um colapso de total arrependimento e vocês pagando de bravas, enquanto riem deles... MAS, quem sou eu para falar, quando... eu faria a mesma coisa!

Mel ainda não acreditava no que estava vendo, mas depois entrou na onda.

— Eu também faria a mesma coisa... mesmo que eu não ficasse chateada... de vez em quando é bom fazer isso.

— Eles têm que dar valor também, não é? – Vic falou. – Jamais vou brigar com o Kim por conta de videogames ou jogos, mas de vez em quando, fingir uma certa indiferença, faz até muito bem.

Tomamos nosso café da manhã planejando como íamos deixar Kim e Alex no gelo por mais algumas horas e depois eu fui trabalhar.

— Hoje acho que dá pra gente sair! – Pietra gritou quando me viu descendo a escada. – Então vê se não chega muito tarde!

A sexta até que estava indo bem tranquila, sem nenhum evento interessante, a não ser as reuniões com os chefes dos setores, até que quando eu voltei para minha sala, Milena estava na porta com uma cara de assombrada.

— Eu sei que eu não deveria me intrometer na sua vida, mas quem te mandou essa quantidade de flores?

— Flores? - Questionei assustada.

— Sim. – Ela abriu a porta e já de longe era possível sentir o perfume.

Entrei e tinha não um ou dois buquês. Mas cinco.

— Eu não fiz nada, Milena. A verdade, estão achando que eu estou com raiva... então esse é o resultado.

E o meu braço direito saiu rindo, caminhei até um dos buquês e tirei uma das flores, colocando na minha orelha e pensando que já estava na hora de tirar Alex do gelo, quando vi o cartão.

Não me chame de exagerado.

Me desculpe.

Te amo.

A.

Peguei o telefone e mandei a seguinte mensagem para o desesperado:

Não estou com raiva de você, Alex. E nem fiquei chateada de te ver jogando com os meninos. Pode parar com o drama. Estamos bem. Obrigada pelas flores, pela cesta de café da manhã e por mais estas flores. Acho que minha sala vai ficar perfumada por uma semana. Também te amo e estou com saudades.

A resposta dele veio na hora, parecia que ele estava com o telefone na mão, só esperando que eu desse sinal de vida.

 Você não ficou com raiva, Kat? De verdade? Mesmo assim eu deveria ter te falado que ia jogar com os meninos. Tem algum plano para hoje à noite?

Não fiquei, Surfista da Neve. Você não tem que me dar satisfações de tudo o que faz. E quanto a mim, acho que vou sair com as meninas, quando chegar em casa, te mando mensagem.

Vou ficar esperando. – Foi a resposta que ele me deu, e eu tinha certeza de que bastaria um simples “olá” meu, que ele me responderia na hora.

Me deu vontade de mandar essa conversa para as meninas, para que pudéssemos rir do desespero de meu noivo, porém acabei não fazendo, essa era a primeira vez que eu via Alex ser tão desesperado pelo meu perdão, mesmo que ele não tivesse feito nada de errado, e acabei por achar o momento meio pessoal demais. Assim, acabei guardando as mensagens só para mim e até mesmo evitei comentar que tinha recebido mais flores.

Quando o expediente acabou, nem fui em casa, as meninas já tinham escolhido um destino e só me mandaram o endereço.

Ficamos por lá até quase 22:00, comendo, bebendo (Pietra e Mel, eu não pois estava dirigindo e Vic também pediu drink sem álcool) e jogando conversa fora, como há muito não fazíamos, foi como estar de volta à Europa, à Londres, antes que qualquer loucura tivesse acontecido, ou que eu tivesse o conhecimento do que planejavam para mim.

Chegamos em casa e como Pietra estava um tanto alta, acabamos indo dormir, afinal, nosso sábado iria começar cedo, no spa do The Peninsula.

Mas antes eu precisava conversar com um certo noivo que estava se sentindo um tanto culpado lá na Hungria.

 

[1] https://www.peninsula.com/en/beverly-hills/wellness/luxury-hotel-spa


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Notas finais do capítulo

Bem, é isso. Ficou um tantinho grande, mas é para compensar!
Espero que tenham gostado.
Muito obrigada a quem está lendo e acompanhando a história!
Até o próximo capítulo!
xoxo



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