Presos Por Um Olhar escrita por Carol McGarrett


Capítulo 93
Cunhadas


Notas iniciais do capítulo

Voltei com mais um capítulo. Esse bem levinho.
Tenham uma boa leitura.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/799284/chapter/93

Minha cunhada já me esperava na porta de casa, mochila no ombro, chapéu de cowboy na cabeça e uma cara de sono de dar dó.

— Bom dia! – Ela falou assim que abriu a porta de trás para jogar a mochila.

— Bom dia! – Respondi quando ela se sentou do meu lado. – Está tudo bem? – Referia-me ao estado de completo sono dela.

Pepper tirou o chapéu e colocou um par de óculos escuros antes de me responder.

— Sim. Está tudo bem, bem mais ou menos. Estou morta de sono e com saudades do Will. Creio que você pode entender isso.

— Ô e como! – Fui solidária a ela. – E isso está te mantendo acordada de noite?

— Não. O Will está me mantendo acordada de noite. Depois de uma semana sem me ligar, ontem conseguimos nos falar, e, mesmo sabendo que eu tinha que madrugar hoje, porque a Dona Amelia gosta de ir cedo para a fazenda, acabamos estendendo nossa conversa noite adentro e quando eu vi, eram quatro e meia da manhã e eu não tinha nem arrumado a mochila.

— Ou seja, você não dormiu. – Resumi a conversa.

— Exatamente. Nem um mísero minuto. Estou o pó da rabiola. A capa da gaita, e todos os adjetivos e expressões que você puder encontrar para traduzir o estado de cansaço extremo! – Disse infeliz.

Dei uma olhada para Pepper que parecia que ia dormir e chorar ao mesmo tempo.

— Vai por mim, eu sei o que é ficar acordada por várias noites e praticamente virada assim. Mas aproveita que são quase duas horas de viagem e dorme, esse imenso chapéu que você trouxe deve servir para tampar a claridade.

Pepper olhou para mim e depois para o chapéu que estava em seu colo.

— Você não gosta disso, gosta?

— Nem um pouco.

— GRAÇAS A DEUS!! – Ela gritou.

— Calma aí... – Comecei. – Se você não gosta, por que usa?

— Porque não quero fazer desfeita! – Pepper falou como se fosse a coisa mais comum do mundo.

— Por que você simplesmente não diz que esqueceu essa coisa em casa?

— Porque a Dona Amelia sempre tem mais um na Fazenda... é terrível!! E eu fico toda constrangida de falar que eu não gosto dessa moda de cowboy do Oeste, porque parece que a família inteira curte, então eu engulo o meu orgulho e me fantasio disso aqui. – Ela apontou para si própria. – Se você ao menos soubesse o quanto essas botas me machucavam quando Will comprou para mim...

Eu tentava bancar a cunhada solidária, mas estava difícil, então, sem querer, uma risadinha escapou.

— Não é motivo para rir. – Pepper disse infeliz. – É de chorar!! Meus pais morrem de rir da minha cara toda vez que eu falo que fui para a Fazenda. E foi ainda pior, meu irmão quase morreu engasgado de tanto rir quando, um belo dia, Will cismou de passar na casa dos meus pais, logo depois de sair de lá. Nós dois estávamos com a roupa completa, inclusive com as franjas... foi...

— Me desculpa, Pepper, mas até eu tive que segurar a risada quando vi você, Will e Alex com essas roupas... aquilo lá é a coisa mais ridícula que eu já vi alguém usando... vocês ficam parecendo palhaços de Rodeio.

— Foi isso que meu irmão falou!! E pergunta se o Will se sentiu ofendido?

— Não, porque ele continuou a usar... – Completei o raciocínio dela.

— Sim. – Ela abraçou o chapéu e fingiu chorar. – Eu achei que a piada do meu irmão ia ser um divisor de águas. Foi nada. Eu queria puder usar botas como a sua. São muito melhores e mais confortáveis.

— Eu vou tentar resolver o seu problema. Vou te arranjar um par de botas de montaria de verdade, aí, aos poucos, você esquece essa fantasia.

— Está mais fácil você se vestir assim do que eu me livrar da roupa.

— Por que diz isso?

— Dona Amelia te comprou um chapéu desses;

— ELA FEZ O QUE? - Foi a minha vez de gritar.

— Sim, amiga, você vai ganhar um desses. O seu é bege, cor de areia. Até que é bonito... para quem gosta disso.

— Não! – Gemi em desespero.

— Verdade. E comprou dois rosas. Um para a Elena e outro para a Olivia. Eu juro que até tentei salvar as meninas dessa sina horrorosa, dizendo que talvez elas não gostassem disso, mas foi em vão, ela comprou.

— Não estou crendo nisso... – Murmurei.

— Pois é... pode acreditar e preparar a cara de surpresa e felicidade. Você vai ganhar um chapéu de cowboy.

Parecia inacreditável que isso fosse acontecer, eu que ri da cara de Olivia quando Dona Amelia colocou um chapéu na cabeça dela, agora ia sentir na pele o que era usar aquilo.

— Você está com uma cara de quem vai vomitar. – Pepper disse segurando a risada.

Só confirmei com a cabeça, ainda um tanto chocada sobre a revelação que tinha escutado.

— Não fica assim, lembre-se estamos no mesmo barco. Nós duas odiamos essas coisas e temos que usar para não ferir o sentimento de nossos sogros.

— Esse é exatamente o motivo. Não ferir os sentimentos de Dona Amelia e do Senhor Pierce.

— O que a gente não faz para manter a paz, hein? Se sente uma palhaça de rodeio, mas mantem a fachada de felicidade. – Pepper completou.

— Pelo menos temos uma a outra para chorar quando ninguém estiver vendo. – Comentei.

— Essa é uma boa coisa. Isso jamais aconteceria se a Suzanna estivesse por perto. Fazendo uma fofoca do passado, Dona Amelia nunca fez isso por ela. No começo ela até tentou agradar, sabe como ela é, mas Suzanna era tão grossa e sem educação que ela simplesmente se afastou. E olha, é difícil achar uma sogra como a Dona Amelia, ela poderia ser uma sogra pé no saco, cheia de dedos porque além de famosa tem dois filhos lindos e bem-sucedidos, mas não, a mulher é uma simpatia e te aceita na família de braços abertos, sem se importar de onde você vem ou quem é a sua família!

— Suzanna conseguiu destratar a Dona Amelia e Alex não falou nada? – Questionei espantada.

— Claro que não foi na frente dele. Com Alex do lado ela era mil amores, mas bastava que ele virasse as costas, fosse atender um telefonema ou montasse no cavalo ou na moto e a mulher se transformava em uma bruxa. Ninguém podia conversar, ou tocar nela!

— Não me surpreende que Suzanna seja assim. – Murmurei.

— Você a conheceu?

— Dei de cara com ela no banheiro, no dia do lançamento da campanha da Porsche.

— Meus pêsames.

— Mas não é só por isso que disse o que disse. Conheço muito bem a melhor amiga dela.

— A tal de Mia?! Coitada de você. Como você a conhece? Estudaram juntas?

— Muito pior do que estudar juntas. Somos irmãs.

Pepper soltou um palavrão tão alto que eu achei que tinha atropelado um cachorro.

— O que foi?

— Você é irmã da Mia? Daquele ser monstruoso e completamente egoísta e megalomaníaco?

— Infelizmente sou. Nós não escolhemos os irmãos. Ou, no caso, as irmãs.

— Mas como? Eu conheci seus pais, seus irmãos. Seus sobrinhos. Seus avós! Meu Deus, sua família me recebeu de braços abertos e eu nem faço parte da família Pierce, era só uma intrusa no meio das comemorações... não pode ser possível que vocês sejam irmãs.

— Mas somos. Você não deve ter prestado atenção nas fotos de família. Bem, nas fotos mais antigas.

— Não... Eu não vi. E ainda bem que não vi... ou não ia conseguir segurar o palavrão. E me desculpa se te ofendi ao xingar a sua irmã.

— Não ofendeu. Não converso com a Mia.

— E o Alex sabe desse parentesco?

— Sabe, foi uma das primeiras coisas que contei para ele quando o assunto surgiu. Eu não fazia ideia de que ele a conhecia.

— Olha, vou te contar uma coisa, se eu não soubesse que Alex foi muito bem criado, eu tinha a certeza de que ele ia caçar a Mia e acabar com a raça dela, tamanho é o ódio que ele sentia e acho que ainda sente dela, foi ela quem começou o boato de que ele batia na Suzanna.

— Ele não me disse o motivo do ódio que ele tem pela Mia, só me disse que essa ideia realmente passou pela cabeça dele.

— E o que você falou?

— Para ele entrar na fila. O primeiro lugar é meu.

Pepper riu.

— Nossa, fico aliava em saber que você não se ofendeu.

— Nenhum comentário sobre a Mia me ofende. Somos irmãs por infortúnio, nem mesmo meu pai suporta a filha e ela não faz questão nenhuma de falar da família. Assim, é mais fácil para todos simplesmente ignorar a existência dela.

— Entendo. Deve ser bem difícil para a sua mãe.

— Ela nunca comentou nada, mas não deve ser fácil. Contudo, Mia nunca teve uma boa índole. Sempre foi ruim. Nunca tratou a ninguém bem, mesmo que meus pais insistissem, mostrassem a ela.

— Céus, como pode! – Pepper ainda parecia desacreditar da informação que passei.

— E já vou dizendo, se ela fez qualquer coisa que te deixou chateada, já peço desculpas.

Pepper riu.

— Ah, ela fez. Ela aprontou no meio da festa de aniversário do Alex. Estávamos todos lá na casa onde vocês moram, e que nada mais tem daquela casa... e, enfim, Suzanna chegou se achando a dona da festa, ao lado da Mia. Você conhece o Will e sabe que ele pode ser bem sarcástico quando quer, e ele nunca foi com a fachada da Suzanna e nem com a da sua irmã, assim, ele já me olhou de lado e começou a rir. A Mia viu o sorrisinho debochado do Will e meio que veio tirar satisfação, puxando o tal noivo rico dela. Seu cunhado fingiu que não era com ele e, mesmo assim, Mia saiu reclamando, chamando-o de pobre e qualquer coisa sem noção e acabou que sobrou para mim e eu fui chamada de brega.

— Típico d’Aquilo.

— Pois é. Acontece que Will e eu não levamos desaforo para casa, mas também não gostamos de confusão, assim, esperamos.

— Senhor, me digam que vocês fizeram Mia passar vergonha. - O sorriso que Pepper deu, me disse que sim, eles tinham feito isso. – Nem sei o que é, já venero vocês por isso.

— Deixamos a festa rolar, ficamos perto da turma que você já conhece. Suzanna hora nenhuma foi conversar com a gente, e toda vez que o Alex parava para bater papo e perguntar das novidades, ela o tirava de lá. E sempre podíamos ver a sua irmã no canto, rindo. Aquele sorrisinho foi nos cansando, até que bolamos um plano.

Nessa hora eu já estava era rindo.

— Não ria antes da hora. Primeiro tenho que te explicar que tinha uma jacuzzi perto da piscina e que a bendita estava ligada e meio que enfeitada com algumas luzes e velas e era mais ou menos perto de onde estavam Mia, Suzanna e a horda de modelos mortas de fome.

Minha risada ficou mais alta.

— Passou um tempo e toda a turma resolveu mudar de lugar. Fomos, aos poucos chegando para perto de onde estava essa turma nojenta. Foi pouquinho a pouquinho, nada para chamar a atenção de ninguém, nossa desculpa era conversar com o Alex. Claro que a parte rica da festa não gostou do que fazíamos e começou a se afastar. Era um passo nosso, uma chegada para lá das modelos. E foi assim até que elas não tinham para onde fugir, e nós continuamos a chegar mais perto.

— Quem empurrou? – Eu já tinha deduzido isso sozinha.

— Benny.

— TINHA QUE SER!! – Gargalhei.

— Alex e Suzanna deram uma saída para se despedirem de sei lá quem que estava presente e nós demos outro passo. A modelo que estava mais perto de Benny reclamou dele, Benny tentou bancar o educado e se desculpou, a mulher não acreditou e ele, muito deliberadamente, fingiu que ia se ajoelhar para se desculpar, quando a modelo percebeu, tentou se esquivar, porque ele ia pegar a mão dela. Ela deu um passo para trás, levantou a mão, batendo na Mia, que não gostando disso, xingou, só que o salto dela ficou preso entre a grama e a lajota que fazia o beiral da jacuzzi. Não teve onde ela se segurar e a insuportável acabou despencando dentro da jacuzzi, mandando água para todos os lados e chamando a atenção dos presentes.

— Meu Deus! Obrigada por terem feito isso. Só fico chateada porque não vi.

— Nós gravamos!!

— NÃO!!! – Gritei animada!

— SIM!! Espera que eu tenho que achar aqui na galeria. – Pepper respondeu batendo os pés, animada demais para se conter.

—  Conheço gente que vai adorar ver isso.

— Quem?

— Pietra, Mel e Vic. Kim também vai adorar.

— Vou te mandar. Não vou colocar no grupo da família para não chatear seus pais.

— Tudo bem. Achou?

Pepper me mostrou a tela do celular e eu reduzi o carro passando para a faixa da direita, só para poder ver o vídeo da desgraça da Mia. Acabei foi parando o carro no acostamento de tanto que eu ria, porque a melhor parte do vídeo não era minha irmã caindo dentro da Jacuzzi. Era ela saindo... porque ela parecia a Samara do filme “O Chamado”!!

— Isso aqui é épico. E todos vocês merecem o Oscar de melhor atuação! Porque as feições de preocupados de vocês estão perfeitas!

— Pois é. Tivemos que manter essa pose e o silêncio, mas bastou que Alex se separasse da Suzanna e que ele estivesse um pouco mais calmo, que jogamos isso no grupo. Até bem pouco tempo, ele ria de chorar ao se lembrar do vídeo.

— E com razão!  - Concordei. – Por favor, me mande o vídeo. Vou mandar para as meninas... melhor, você vai mandar essa pérola. Vou te colocar no grupo que tenho com elas e serei obrigada a mudar o nome do grupo de Quarteto para Quinteto das Loucas!

Fiz isso e dei as boas-vindas à Pepper no grupo.

— Agora é com você! Faça a sua apresentação! – Falei com minha cunhada e dei a partida no carro, voltando à estrada e ao caminho.

Pepper não se fez de rogada e já foi mandando a mensagem.

Me falaram que talvez, só talvez, vocês gostariam de ver isso. E esse é o meu cartão de visitas!

Ela enviou o vídeo e não deu três minutos.

— Pietra acaba de responder.

— Se prepare, ela é Louca! – Adverti.

— Ela disse: "Como que uma coisa dessas demorou tanto tempo para chegar nas minhas mãozinhas?? COMO?? Pepper você é mais do que bem-vinda, ainda mais se tiver mais desses aqui".

Pepper respondeu à Pietra e depois levantou a cabeça só para me perguntar:

— Que história é essa de que as Três Loucas da Europa estão vindo para Los Angeles?

— Pietra deu a data?

— Não. Melissa.

— Céus! É sempre a Mel! – Tive que rir. – Quando é?

— Próximo final de semana. Vão ficar duas semanas aqui. – Pepper me informou.

— DUAS SEMANAS??

— Sim, na sua casa. Pietra diz que será "épico"! – Minha cunhada vez aspas com as mãos.

— Pode apostar que será. Quando se trata das três, cada passo é um momento a ser guardado.

— Acho que nem tenho roupa para esse evento!!

— Você tem um vestido preto, daqueles de funeral? – Questionei.

— Claro, todo mundo tem que ter um.

— Separe-o. Do jeito que Pietra é, alguém morre nisso. Nem que seja a nossa dignidade.

— Exagerada!

— Você verá, Rebecca. Você verá.

— Deu até medinho. Acho que vou fugir para o Canadá.

— Você não tem mais férias para tirar. Vai ter que aturar as três.

— Tomara que não acabemos presas.

Fiquei calada.

— Ou periga?

— Acho que não. Acho.

— Vou deixar o número do advogado na discagem rápida, só por precaução. – Pepper murmurou e depois só ficou vendo o celular mostrando notificação atrás de notificação.

— Eu avisei. – Apontei para o celular que não parava de piscar. – Isso é só o começo.

Pepper, esperta, desligou o 5G do telefone e depois colocou o chapéu em cima do rosto para tentar dormir um pouco até que chegássemos ao nosso destino e eu aproveitei que a estrada estava vazia, para acelerar o Jipão e tirar o atraso que o trânsito pesado da saída da cidade tinha me dado.

Uma hora e meia depois, chegávamos na Fazenda, e pelo visto, antes de meus sogros.

— Isso é estranho. – Pepper falou depois de um bocejo. – Desculpa. Mas eles sempre chegam antes de todos. Onde será que foram?

— O que me informaram era que iam comprar algumas coisas que eu não sei o que era, mas que eles precisavam.

— Quer saber, se você não se importa, eu vou entrar rapidinho e ainda tentar tirar um cochilo. Inventa uma desculpa para mim, caso eles cheguem e eu ainda estiver apagada.

— Pode deixar. – Confirmei e minha cunhada entrou correndo, tirando as botas.

Estando sozinha no meio do gramado que levava à casa, liberei meus cachorros, peguei minha bolsa, deixando-a na varanda e fui guardar o carro.

Voltei contando passos na direção da casa, e depois de tirar as botas, fui para o quarto, guardei minhas coisas e nada dos meus sogros chegarem.

Os funcionários estavam trabalhando como era o normal e eu decidi ir direto para o estábulo da família, e mal abri a porta, chamando por Perigo e Hal e os dois começaram a relinchar.

Eu ainda não tinha visto a reforma que meu sogro tinha feito aqui. Sabia que tinha sido ele, porque ele comentou numa noite, no jantar, e também não tinha visto onde meus cavalos estavam, porém, me surpreendi com o tamanho das baias e com tudo o que fora colocado ali.

— Vocês estão só na mordomia, hein? – Parei na frente das portas e olhei para eles, que continuavam presos porque tinha uma grade que ainda bloqueava o caminho.

Hal relinchou alto e Perigo começou a bater os cascos no chão. Todo esse barulho chamou atenção dos tratadores que vieram correndo ver que tipo de rebelião acontecia no estábulo que era de uso exclusivo da família.

— Ah! – O Senhor Pine, um dos tratadores mais antigos do Fazenda e de confiança da família, apareceu na porta. – Seja bem-vinda de volta, Katerina! Vejo que já encontrou a dupla de encrenqueiros.

— Bom dia, Sr. Pine! Obrigada pelas boas-vindas! E pelo visto eles já deram trabalho para o senhor!

Hal nem tanto, é fácil de ser conduzido. Mas Perigo? Só Amelia para tirá-lo e colocá-lo aqui.

Acariciei o focinho de Perigo.

— É, ele não gosta de muita gente.

— Então, vai andar com qual agora?

— Pensei em tirar os dois, dar uma volta com Perigo e deixar Hal esticando as pernas.

Ao fundo escutei mais dois relinchos e eu sabia de quem eram.

— E acho que serão quatro. Furia e Duke estão pedindo atenção também. - Falei com um sorriso e parando em frente as baias onde estavam os cavalos de Alex.

— Sele os seus dois, que os de Alexander eu dou conta. Capaz que dê tempo para você dar atenção aos quatro.

— Tomara que sim!

E Pine saiu, assobiando para Furia, chamando-o de mimado. E ainda o comparou com Alex.

Selei Hal e depois Perigo e sai condiuzindo os dois pelo arreio até uma área cercada, claro que no meio do caminho acabei encontrando com o Sr. Pine que conduzia Duke e Furia. Perigo e Furia se estranharam à primeira vista. Que maravilha.

— Não me surpreende. – Pine comentou. – São dois cavalos alfas, com o mesmo temperamento. Não se dariam bem mesmo.

— Isso não é nada bom. Detesto quando dois cavalos não se dão bem, é prejuízo na certa. – Falei assim que soltei meu Puro Sangue Inglês na área cercada e dei um tapinha em seu lombo para que ele saísse correndo. – Espero que pelo menos Prince Hal não se estranhe com ninguém.

Hal não. Faço isso com ele e ele já está mais do que acostumado com os demais cavalos. Perigo que gosta de exclusividade.

Montei no Cavalo Árabe e só comentei:

— Na verdade, acho que Filho do Perigo está mal-humorado porque tem muito tempo que não dá uma corrida. Vou resolver isso agora! – Dei o comando batendo com os pés no torso do cavalo e ele logo saiu em um galope rápido.

— Mas como você vai controlar esse cavalo sem chicote e sem esporas? – Foi tudo o que ouvi do senhor Pine.

— Foi sem isso que eu o domei. Ele já sabe o que quero, sem que eu precise disso! – Gritei contra o vento e instei o veloz Puro Sangue Árabe a correr mais rápido. Tanto eu, quanto o cavalo, precisávamos disso. Era como se pudéssemos nos libertar depois de muito tempo presos, Perigo em uma baia, e eu em minha mente.

A cada segundo eu acelerava ainda mais na cavalgada, já estava em um galope bem rápido e sabia que meu cavalo poderia ir ainda mais rápido, assim dei a liberdade que ele queria e juntos voamos morro acima e depois passamos pelo local onde Alex havia me pedido em casamento. Esse era um dos meus lugares favoritos de toda a propriedade, porém, não parei ali. Continuei firme em cima da sela e deixando que Perigo decidisse o caminho. E ficamos assim por um tempo, até que tive que puxar as rédeas e o freio de Perigo para fazê-lo parar.

Tinha chegado no alto de um morro, bem à beira de um penhasco, porém, a vista dali era maravilhosa. Tinha até um mirante de onde eu via, ao longe os picos nevados das Montanhas de São Gabriel que circulam Los Angeles. Mas a beleza era na direção oposta. Eu tinha me virado para o Leste, e a cadeia de Montanhas de Sierra Nevada se estendia, esplendorosa e imponente, com seus picos cobertos de neve.

Era meio do inverno, as temperaturas estavam amenas, pelo menos para mim, já que os termômetros marcavam máximas de 15ºC, nos dias mais quentes, contudo, para quem enfrentou -40ºC, estava até quentinho, porém era fácil de se notar que ali, ali estava nevando de verdade.

Eu estava boquiaberta com a vista que tinha dali. Esse mirante era, com certeza, o ponto mais belo de todo a Fazenda. Para todos os lados em que eu me virava, era surpreendida pela paisagem, picos nevados, vales profundos e, eu tinha certeza, até mesmo um pedaço do Deserto do Mojave, com o Vale da Morte, era possível de ver dali.

E, sem querer, me imaginei ali, no meio da noite, vendo as estrelas que deveriam pipocar no céu. E foi pensando nisso que me lembrei da promessa que Alex havia me feito, que ele iria me levar para um lugar especial.

Eu apostaria tudo o que tenho que aqui era o local.

Tirei o celular do bolso, com o intuito de chamá-lo, para mostrar que tinha encontrado o mirante, sozinha, na sorte, mas sozinha, porém, ali não tinha sinal.

— É claro que não tem sinal aqui. Nada pode atrapalhar a paz e a beleza desse lugar. Nada.

Respirei fundo, o ar aqui era bem mais puro do que no centro de Los Angeles, onde, nessa época do ano, fica praticamente impossível de se respirar, devido a poluição que não se dissipa.

— Eu poderia construir um chalé aqui e ficar pelo resto da minha vida nesse local. – Falei alto para ninguém em particular.

Tirei algumas fotos e me arrependi de não ter trazido a minha câmera profissional, contudo eu sabia que eu voltaria mais vezes aqui. Muitas vezes. Por fim, acabei me sentando no chão, logo Perigo veio e se deitou às minhas costas e eu acabei me apoiando nele, ainda absorvendo o lugar. Quando dei por mim e tive a curiosidade de olhar no relógio, vi que já eram quase onze e meia da manhã e, a essa altura, meus sogros já deviam ter chegado e era muito provável que estivessem me procurando.

Com muita falta de vontade, levantei-me do chão, bati a poeira da minha calça e instei meu cavalo a fazer o mesmo. Acabei notando que nem Perigo queria ir embora dali.

— Nós vamos cavalgar mais vezes para esse lado, te prometo. Agora temos que voltar, que tal mais uma corrida para que eu te deixe descansar na parte da tarde, hein? – Perguntei enquanto montava.

Meu cavalo só esperou que eu me ajeitasse para a corrida e já saiu no galope rápido. Apesar de eu não ter muita certeza do caminho, sabia que tinha vindo praticamente em linha reta, assim, tentei manter uma direção oposta de onde estava e guiei minha montaria na direção que supunha, ficava a casa.

Por um tempo, achei que estava perdida e comecei a pensar se não era melhor procurar por um lugar mais alto, onde talvez tivesse sinal de celular, para tentar chamar por ajuda, acontece que logo reconheci onde estava, então pude dar mais um comando e pedir que Perigo acelerasse ainda mais no galope.

Nós descíamos um morro em uma velocidade alucinada, e a sensação que eu tinha era de estava em cima de uma moto, não montada em um cavalo. Olhei para trás rapidamente e vi que estávamos deixando um rastro de poeira bem alto. Mais ou menos no meio da descida, vislumbrei a casa e os estábulos, não reduzi o galope, na verdade, pedi para meu cavalo aumentar mais um pouco a corrida e logo terminamos de descer e passamos correndo por entre as áreas de treino e de doma dos cavalos, chamando a atenção de quem ali estava. Ao fundo, escutei Sr. Pine gritar ao levantar o chapéu:

— Agora sim esse cavalo amansa! Bela cavalgada, Katerina!

Só levantei uma mão na direção dele, como que concordando, não poderia virar o corpo ou perigava cair da sela. E pouco tempo depois, cheguei perto da casa, onde comecei a diminuir a velocidade, porém, nem isso impediu que meu cavalo empinasse quando o mandei parar.

Quando desmontei e o levei para perto dos cochos com água Perigo bufava, mas não estava de todo cansado.

— Você precisava disso. – Falei ao acariciar a crina dele.

— E você também! – A voz de meu sogro me deu um susto.

— Bom dia, Senhor Pierce! – Me virei para ele que olhava para o Cavalo Árabe.

— Bom dia! E que cavalgada foi essa, filha? Queria cruzar as Américas em um dia?

— Não. Só gastar a energia desse aqui. Fazia tempo que ele não dava um sprint assim. A última vez foi com Alex como cavaleiro e não terminou muito bem...

— Ah, sim. O dia em que você teve que salvar o meu filho de cima de um cavalo arredio.

Dei um sorriso para meu sogro. Ele também tinha visto aquele mico do meu noivo.

— Quando você disse que Filho do Perigo era um cavalo rápido, eu não pensei que ele fosse tão rápido! Por aqui não tem um cavalo como ele.

— É da natureza dele ser veloz assim. Tem um DNA estelar que o fez ser um dos cavalos mais rápidos que conheço.

— E por que você não o colocou nas competições de derby? – Meu sogro quis saber, e muito mansamente, tentou acariciar Perigo, que de primeira estranhou o toque, mas como estava mais interessado em comer e beber água, não se importou em quem lhe dava carinho.

— Porque ninguém, além de mim, consegue montar nele sem cair. Ele é um tanto traiçoeiro.

— Pior do que Loki?

— Sim, muito pior do que Loki. – Concordei rindo.

— Se eu consegui me entender com o Ruivo, vou me entender com esse aqui, pode levar tempo, mas eu vou.

— Com certeza.

— E, para que você não diga que eu não avisei. Amelia vai querer o seu pescoço. Ela te viu galopando de longe e tenho certeza e que vai mandar você nunca mais fazer isso. Concorde com ela e, na próxima vez, faça tudo de novo.

Com bem pouco tempo, Dona Amelia e Pepper apareceram.

— Foram vocês que eu escutei? – Pepper perguntou. – Estava nas seis balizas e só vi poeira e ouvi um barulho alto de cascos.

— Sim, fomos nós.

— Ele é um cavalo, não uma moto. – Dona Amelia chiou.

— Achei que era uma manada, mas era só ele. E como ele corre rápido! – Completou minha cunhada.

— É, já vimos que Perigo é rápido e uma excelente concorrência para Furia, mas não precisa mais fazer isso. Foi perigosa a maneira como desceram o monte. – Dona Amelia começou com o sermão.

Eu somente concordei com a cabeça.

— E onde a mocinha se meteu que demorou tanto? Pine já estava aflito com a sua demora. Não me diga que se perdeu?

— Não me perdi, Dona Amelia! – Fui respondendo enquanto ela liderava o caminho para a casa, deixei Perigo na sombra de uma imensa árvore para que ele descansasse, mais tarde trataria dele. – Na sorte, acabei achando um lugar muito bonito e resolvi ficar por lá um tempo.

— O mirante. – Os três me responderam.

— Sim!! E por que ninguém nunca me falou daquele lugar, posso saber?

— Alex não vai gostar de saber que você já achou o mirante. – Meu sogro comentou.

— Bem, se ele vai gostar ou não, eu não sei, mas eu amei aquele lugar. Amei a paisagem e a paz que tem lá. – Falei.

— Bem, eu que não vou espalhar a notícia. Quero falação na minha cabeça não. – Pepper disse e foi entrando para tomar um banho.

— Ele nem precisa ficar sabendo. Para que? Ninguém tem que dar com a língua nos dentes. – Comentei, enquanto dava atenção para o trio peludo que veio me farejar para descobrir por onde eu andava.

— Ninguém vai falar nada com o Alexander. Menos uma dor de cabeça para nós. Agora, meninas, vão tomar um banho, porque todos estão na cozinha hoje.

Tomei um banho depressa e logo já estava na cozinha, começando o almoço. A conversa girou em torno de cavalos e sobre as melhorias (mais umas) que ainda iriam fazer. E, como sempre, foi diferente ter esse momento com meus sogros quando Alex e Will estavam tão longe.

E, como não poderia deixar de ser, com tudo arrumado dentro da casa, voltamos para os estábulos. Eu aproveitei que Filho do Perigo já tinha descansado bastante e fui tratá-lo, para logo em seguida, colocá-lo na baia para descansar até o dia seguinte.

— Seja um bom menino e, por favor, não me envergonhe mordendo nos tratadores, eles estão aqui para cuidar de você! Seja um cavalinho educado! – Despedi-me dele e fechei a baia. Indo para a parte dois do meu dia.

Com isso pronto, desci devagar, devidamente acompanhada por Loki e Thor, até onde tinha deixado Prince Hal pela manhã. E, assim que cheguei na porteira, ele veio trotando na minha direção, relinchando e abaixando a cabeça, para que eu o acariciasse.

— Hei, garoto! Agora é a sua vez de dar uma corrida e alguns saltos! O que acha, está pronto para testar a pista daqui? – Perguntei já abrindo o trinco. Meu cavalo trotou mansinho até parar do meu lado. – Bom garoto! Sempre muito educado, como um príncipe! E quanto a vocês dois. – Falei com Duke e Furia. – Eu ainda volto aqui para tratar de vocês. Agora, Hal, vamos ver o que podemos fazer naquela pista! – Estalei a língua, fazendo o barulho que Hal bem conhecia que era para me seguir e ele foi andando devagar ao meu lado, enquanto que do outro estavam Thor e Loki.

— Então ele é ensinado?! – Ouvi a voz de minha sogra bem atrás de mim.

Parei de andar, meu cavalo parando ao meu lado e me dando uma pequena cabeçada.

— Esse aqui é. Obedece a alguns comandos. – Respondi olhando para ela e logo vi que Dona Amelia tinha algo nas mãos. Um enorme chapéu country, cor de areia, que tinha até uma pequena fivela em um dos lados.

 - Bem, então vamos ver o que ele sabe fazer, não? Acho que ele está há tempo demais parado. – Ela comentou, acariciando o lado dele.

— Tanto ele quanto Perigo estavam de férias. A moleza acabou hoje!

— Ótimo! Pedi para que Pine limpasse a área de saltos. É toda sua!

— Não precisava. Eu sei esperar.

Minha sogra só olhou para mim com aquele ar de: não se esqueça quem é a manda chuva desse lugar.

— Mas, mesmo assim, muito obrigada. – Consertei minha fala anterior. – Estamos indo para lá agorinha!

— Muito melhor agora! E para ficar ainda mais no clima, isso. – Ela me estendeu o chapéu. Olhei para o acessório, depois para minha sogra e quando levantei os olhos, vi Pepper deu de ombros, como que dizendo: “Eu te avisei!”.

— Para mim?! – Tentei fingir surpresa. Não era bem um fingimento de verdade, porque eu ainda estava surpreendida, não por ganhar um presente, mas por ser justamente algo de que eu tinha pavor.

— Todos tem os seus. Está na hora de te batizar como uma Pierce!

Arregalei meus olhos. Eu não era uma Pierce. Seria com o casamento, mas ainda faltava tempo. Muito tempo.

— Anda, Kat. Vamos ver como fica em você! – Meu sogro me pediu para colocar o chapéu.

Pepper olhava para os próprios pés para tentar segurar a risada.

— Tudo bem. – Estendi a minha mão na direção do chapéu e, depois de ajeitar meu cabelo, passando do coque para um rabo de cavalo baixo, passei a cordinha em volta ao meu rosto e ajeitei o bendito na minha cabeça. Eu não precisava de fotos, sabia que estava ridícula, ainda mais porque eu usava óculos escuros, que tive que acabar tirando.

— Falei que esse combinava mais com ela! – Dona Amelia disse feliz em ter acertado a cor do presente. – Kat gosta de tons mais claros e esse casou bem com a cor do cabelo dela.

Eu não tinha muito o que falar, só tentar controlar a minha cara de desgosto com o que estava usando.

— Próximo passo serão as botas! – Disse meu sogro. – Vamos tirar essa mania inglesa de você.

Eu tinha que agir rápido, ou daqui a pouco estava me vestindo como uma cowgirl completa, com a camisa xadrez e as abomináveis franjas!

— Agradeço a oferta, Senhor Pierce, mas acho que meus pés merecem um descanso do bico fino, nem que seja no final de semana. – Apontei para o bico arredondado da minha bota e depois para o bico fino da bota que Pepper usava. – Eu fico a semana inteira com os pés enclausurados nos scarpins de bico fino... por que não um pouco de conforto na hora de cavalgar? – Joguei verde balançando meu pé, como que mostrando a ele, que pelo menos fora do trabalho eu merecia descansar os pés, já que a minha bota, além do bico diferente, também não tinha salto, algo que a de Pepper tinha.

— Você tem razão. – Foi Dona Amelia quem entendeu o meu ponto. – Tem que descer do salto nem que seja aqui. E nós sabemos a altura dos saltos que você usa durante a semana.

— Pois é. Além do mais, não é a roupa que faz a amazona. – Completei com cara de inocente.

Minha cunhada observava a conversa com interesse. Sabendo que se eu me livrasse da fantasia de cowgirl, ela conseguiria também.

— Então essa amazona está fazendo muita hora para montar. Suba em Prince Hal e nos mostre como eles ensinam a montar na Inglaterra. – Minha sogra me deu um tapinha nas costas e indicou o meu cavalo. – Já que não terá as botas, pelo menos coloque o chapéu direito.

Fiz o que ela pediu e finalmente montei em Prince Hal, que faltava pouco se abaixar todo para que eu não precisasse pular. E só essa cena já fez os três ficarem ainda mais fãs do meu cavalo.

Trotei mais rápido até a área de saltos, a mesma onde Olivia tinha treinado. E ao invés de abrir a porteira para entrar, simplesmente fiz Hal saltar, não era um salto alto ou complicado, era só uma espécie de aquecimento mesmo, e tenho certeza de que se Alex estivesse aqui teria me chamado de exibida.

Já dentro da arena, dei algumas voltas no entorno, para que Hal se aquecesse e para que eu estudasse a pista, que possuía nada menos do que trinta obstáculos, separados a uma boa distância um do outro, em seu interior.

Acelerei do trote rápido para um galope, já me preparando para o primeiro salto. Um saltinho simples, só para que Hal se acostumasse com o terreno.

Passei sem problemas do primeiro, e fui aumentando o nível de dificuldade da sequência, até que comecei a escutar palmas, quando aterrissava do outro lado.

Mesmo sabendo que era errado, olhei de relance para o local onde tinha visto meus sogros e Pepper parados, junto com meus cachorros, e notei que todos os funcionários da Fazenda, assim como algumas das pessoas que vêm treinar no local, já que existe uma área para quem usa o local como Haras, estavam lá, parados, observando o que eu fazia como se fosse uma competição oficial.

Na mesma hora senti meu rosto corar. Eu não estava acostumada e nem gostava de plateia... contudo, ergui a cabeça (que pesava quase meia tonelada com esse chapéu absurdo) e continuei com os saltos, até o último, que fora aquele onde Olivia tinha caído. Fiz a última curva, alinhei meu cavalo com o obstáculo, me levantei da sela, mantendo-me quase que agachada, somente apoiando meus pés nos estribos e, assim que ficamos frente a frente com o obstáculo que era o mais alto e mais complicado de toda a sequência, dei o comando para Hal, que saltou na hora certa, se alongando completamente no meio do pulo, para aterrissar com maestria do outro lado, primeiro com as patas dianteiras, depois as traseiras, que evitaram o obstáculo conjugado que era um pequeno lago.

Eu tinha a noção de que o salto fora perfeito, pois conhecia o meu cavalo e sabia o que estava fazendo, afinal eu tinha anos de prática em cima de uma sela, contudo não estava esperando os aplausos e assobios que ouvi assim que terminei a série com um trote ritmado.

— É, realmente ensinam direitinho na Escola Inglesa de Montaria! – Ouvi o comentário de meu sogro.

Um tanto envergonhada, direcionei Hal até onde estava a parte americana de minha família, assim como os demais curiosos.

— Vou começar fazendo a pergunta de um milhão de dólares. Quem domou e treinou Prince Hal? – Minha sogra, que já tinha passado para o lado de dentro da cerca, perguntou assim que desmontei e estava agradecendo ao meu cavalo pela volta fantástica que ele dera.

— Eu. Ainda tinha muito tempo de sobra na época em que o escolhi para ser meu, não é, Hal? – Fiz um carinho entre as orelhas dele.

— Então, está de parabéns, seu cavalo é magnífico quando salta. Sem contar na elegância e sincronia do conjunto. Prince Hal nem precisa olhar para onde está aterrissando, de tanto que ele confia em você e vice-versa! Vocês dois formam uma das duplas mais bonitas que já vi! – Ela continuou, me deixando ainda mais sem graça, e com as bochechas queimando.

— O crédito é todo dele. – Falei, tentando encerrar o assunto.

— Mas não é mesmo! Para um cavalo chegar nesse nível, teve um trabalho muito árduo do treinador por trás. – Senhor Pierce disse.

Os demais que estavam à volta, concordavam com a cabeça e começaram a me perguntar se eu era atleta de nível olímpico. E ao mencionarem Olimpíadas, algo dentro de mim se contorceu e eu tive que me lembrar onde eu estava e que eu estava segura.

— Não. Nunca fui atleta de nível olímpico e nem sonhei com isso. Só gosto muito de montar e me entendo bem com Prince Hal. – Foi a minha resposta sincera.

— Um desperdício de talento. – Alguém falou no fundo, porém não pude ver quem era.

Dona Amelia balançou negativamente a cabeça, mas continuou a me elogiar.

— Muito obrigada. – Falei quando íamos de volta para os estábulos, onde iria tratar e guardar Hal, achei melhor deixá-lo um tanto longe de tanta gente. Pelo caminho, acabei pegando Duke e Furia. – É como eu disse, são muitos anos montado e minha parceria com Hal já é bem longa.

— Agora está explicado o motivo de você nunca ter pegado um dos cavalos daqui para montar. Uma confiança como essa que você tem com Hal é bem rara de acontecer.

— Pois é, Dona Amelia, quando ganhei Hal, ele ainda era um potrinho, deve ser por isso que somos tão ligados. – Comentei e meu cavalo me deu uma cabeçada, como que concordando com o que eu falava.

— Estou vendo. E vai fazer o que com Furia e Duke?

— Queria dar uma volta com Furia, sei que ele deve estar irrequieto, doido para dar uma corrida por aí, mas acredito que seja melhor eu ficar só por aqui, muita gente lá embaixo, não quero chamar ainda mais atenção.

— Você e Pepper são duas bobas! São excelentes amazonas e deveriam mostrar isso. Você no salto e Pepper nas seis balizas. Difícil ter alguém que ganha de vocês aqui. Mas preferem ficar nas sombras. Ande, vão e mostrem do que são capazes, tem muita gente que tem que ter os egos diminuídos por aí. – Instou minha sogra. – Eu trato de Duke e Furia por você. – ela pegou a guia dos dois e só apontou para o outro lado e ainda mandou Thor e Loki ficarem com ela.

Um tanto sem graça, sai cavalgando devagar, até que parei perto da área onde Pepper estava. E vi o que Dona Amelia quis dizer, minha cunhada realmente dava show nas balizas, Cookie nem encostava nas balizas e passava com maestria entre elas, seja de frente ou de ré.

Do outro lado da área vi que algumas meninas observavam os movimentos do conjunto, chegando a filmar e a anotar como ela fazia para dominar o cavalo sem precisar de chicote.

Depois de algumas idas e vindas, Pepper trotou até perto de onde eu estava e só brincou:

— Olha se não é a celebridade da Fazenda dos Pierce!

— Eu? Acho que não. – Apontei com a cabeça para o outro lado da arena na direção a plateia que assistia ao que ela fazia. – Estão filmando e tomando notas de tudo o que você faz. Só porque não teve palmas, não quer dizer que você não tem fãs.

Pepper ficou um tanto vermelha e abaixou a aba do chapéu.

— Pelo menos para isso essa coisa serve. – Comentei rindo. – Foi bem útil pra mim.

— Nem fala. E voltando a você, precisava da humilhação?

— E você tinha que humilhar também? Cookie nem esparra um pelo nas balizas!

Uma encarou a outra.

— Pelo visto é cada uma em seu quadrado.

— Levando-se em conta que as duas arenas são quadradas, não há alusão melhor. - Dei de ombros.

— Precisamos de um desempate... – Ela comentou rindo.

— Quer fazer outro show para todas essas pessoas?

— Diria que é propaganda... Três tambores. Agora cada uma com seu próprio cavalo!

Pensei no tanto que Hal deveria estar cansado, mas Cookie também estava.

— Por que não?

Pepper deu um comando e saiu correndo na direção porteira da área onde estava, e eu fiz o mesmo com Hal, tendo a vantagem de estar do lado de fora, instei o cavalo para ir mais e mais rápido.

Nossa correria chamou a atenção dos tratadores, e logo Pine, que estava fazendo a ronda para ver se não tinha nenhum cavalo perdido por aí, nos gritou querendo saber o que tinha acontecido.

— Precisamos de alguém para ser o nosso juiz! – Pepper gritou de volta.

Pine só parou onde estava e nos indagou:

— Juiz de que?

— Três tambores! – Foi a minha resposta.

— Vocês duas realmente querem saber qual dos dois cavalos é o mais rápido nos três tambores, depois de ficarem montadas a tarde inteira?

— SIM!

Pine fez aquela cara, mas nos acompanhou. Parou perto da cerca, ajeitou o chapéu e nos esperou tirar no par ou ímpar quem iria ser a primeira.

Pepper ganhou e foi logo se aprontando com Cookie.

Antes mesmo que minha cunhada pudesse iniciar a corrida, meu sogro apareceu e só comentou:

— E eu achando que só os meninos que eram competitivos!

— Não temos mais nada para fazer. – Foi a minha resposta. E logo Pine assobiou e Pepper saiu voando pela pista e contornou os três tambores com maestria, voltando como um flash para o ponto de partida.

— Agora, é a vez da Realeza Inglesa! – Ela brincou ao dar um tapinha no pescoço de Hal.

Confesso que tinha certeza de que iria perder. Primeiro porque Hal já estava cansado e segundo, Cookie era extraordinário nas balizas e fez as voltas nos tambores com uma precisão absurda. O ponto fraco do meu conjunto era contornar os obstáculos.

— Bem, Prince Hal, seja qual for o resultado, você já foi brilhante hoje. Isso aqui é só divertimento! – Falei na orelha dele e pouco depois Pine assobiou novamente.

Nem precisei dar o comando de correr, só bastou que eu me inclinasse para que Hal começasse a galopar. Nem ele longe Hal é tão veloz quanto Filho do Perigo, mas era mais rápido do que Cookie, assim eu tinha certeza de que eu chegara nos tambores mais rápido do que Pepper, já contornar os três... não sabia dizer qual seria o resultado. Só sei que eu não respirei durante os quase quinze segundos que levei para fazer a prova e voltar e quando parei, no lugar exato onde havia saído, o chapéu que eu usava não estava na minha cabeça e meu cabelo estava uma bagunça só.

— E o veredicto é?! – Meu sogro perguntou, já que ele tinha ficado para assistir às duas noras brincando de quem era a mais rápida.

— Não marquei. – Pine disse rindo. – Deixa as meninas brincando com os cavalos. Fazia tempo que não tínhamos um dia agitado assim. Temos que arranjar outro cavalo para Pepper, assim ela não vai estropiar Cookie. – Foi a resposta que ele deu antes de subir no cavalo. – Agora, se me permitem, vou terminar a ronda e dar o dia por encerrado. E vocês, meninas, deveriam fazer mais isso. Faz bem para vocês e para os cavalos. Agora, tanto vocês quanto eles merecem descansar.

— Sério que ele não marcou os tempos? – Pepper estava indignada ao meu lado, enquanto voltávamos, devidamente acompanhadas por nosso sogro, para a casa. – E eu jurando que fui mais rápida que você.

— Eu acho que foi. Cookie é muito bom nos contornos. Dá um banho em Hal, sem nem precisar fazer muita força.

— É, só nos contornos mesmo. Porque nos saltos...

— Cada um tem seu ponto forte. Só por favor, não cismem de apostar corrida. Nenhum dos dois é para isso. E deixe Perigo fora dessa. – Meu sogro falou.

— Kat vai com Perigo e eu vou pegar o Furia emprestado.

— Alex dá um infarto, não se conforma até hoje de Furia ter se acostumado comigo tão rápido.

— As duas vão tratar muito bem dos dois cavalos agora e encerrarem o dia. – Foi o comando que meu sogro nos deu. Claramente não discordamos e logo estávamos nos estábulos, escovando, dando banho e tratando dos animais. Tentando planejar algo para que pudéssemos fazer no dia seguinte e que incluísse, se possível fazer muita inveja nos dois Pierce desaparecidos.

—-----------------------------

O domingo foi um tanto mais quieto, tendo hora para voltar para Los Angeles e assim não ficar presa no congestionamento da entrada da cidade, só pude aproveitar os cavalos na parte da manhã, e decidi fazer um pequeno agrado para Duke e Furia e levei os dois para um passeio pelas trilhas da fazenda, devagar e sempre, até porque minha sogra, que estava junto, disse que se eu saísse em uma cavalgada louca na frente dela, ela mandaria meus dois cavalos de volta para a Inglaterra.

Achei uma ameaça meio boba, mas decidi não brincar com a sorte, Pepper que tinha deixado Cookie descansando também, estava com Rocky, o Mustang marrom escuro com patas pretas de Will, ela bem que tentou selar e trazer Apolo para o passeio também, mas o cavalo estava um tanto mal-humorado longe do dono.

Quem nos acompanhou pelo passeio foi Loki e Stark, que iam latindo na nossa frente, hora saindo correndo em disparada, ora ficando para trás, mas bastava um assobio e os dois logo estavam do meu lado.

No meio da tarde, deixamos a Fazenda e voltamos para a cidade, e eu tive que prometer para minha sogra que iria procurar ajuda para a minha falta de sono – apesar de que eu dormi muito bem de sábado para domingo, e que não hesitaria em ligar caso precisasse.

Ao deixar Pepper em casa, ela, antes de fechar a porta do carro, só soltou:

Cookie é melhor do que Prince Hal, aceite isso. Nomes pomposos não ganham corridas!

Tive que rir.

— Na próxima vez, vamos tentar o Conjunto Completo da Equitação para tirar a dúvida!

— Claro. Me fale com a antecedência mínima de dois meses, para que eu possa treinar com Cookie a nossa cara de membros da Realeza Britânica!

— Pode deixar. Vamos marcar o desempate! – Confirmei.

Pepper me disse tchau e saiu falando que ia tentar contato com o namorado desajustado e desnaturado que tinha.

Voltei para casa, soltei os cachorros para correrem um pouco no jardim dos fundos enquanto fui ajeitar o que precisaria para a segunda-feira.

Não tinha terminado o que precisava fazer quando recebi duas mensagens, uma de Pietra que me deu até um frio na espinha:

Aguarde-nos nesta semana, vamos botar Los Angeles no chão.

E outra de Alex:

Ainda está acordada, ou é muito tarde para uma conversa?

Sorrindo, liguei para ele.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado desse final de semana do meio do mato! E aguardem o próximo capítulo, o trio de Loucas europeias aportara na Cidade dos Anjos!
Muito obrigada a você que chegou até aqui!
E sejam muito bem-vindos os novos leitores!
Até na próxima semana!
xoxo



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Presos Por Um Olhar" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.