Presos Por Um Olhar escrita por Carol McGarrett


Capítulo 136
Preparação


Notas iniciais do capítulo

Voltei com um capítulo curtinho, mas que é necessário para o que está por vir!
Boa leitura!



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É claro que não deixaram de procurar por alguma declaração de alguém dos Pierce ou até mesmo de meu irmão em Chicago. Kim chegou a me ligar para me perguntar que bagunça Mia tinha aprontado dessa vez, quando eu resumi a história, ele só soltou:

— Eu deveria ter dito que era muito bem-feito para ela. Mas ainda bem que fiquei calado.

Algo que somente Kim e sua língua solta poderia pensar em dizer.

A primeira semana depois das publicações foi a mais conturbada. Tivemos que evitar alguns lugares e, mesmo assim, paparazzi seguiram Alex, fizeram plantão na porta de nossa casa e até mesmo na casa de meus sogros, porém, à medida que a história foi se tornando velha, e na era das redes sociais, nada dura como manchete para sempre, tem sempre alguém fazendo algo, o interesse diminuiu e nossa vida voltou ao normal, ou pelo menos à rotina de sempre.

Alex nem se incomodou em pedir um tempo das gravações da série, só solicitou que seus horários fossem um pouco mais convencionais. Quanto a mim, ninguém no escritório comentou nada. Nem mesmo Amanda ou Milena que são ávidas consumidoras de fofoca de celebridades, Wendy não ligava muito para isso, mas me perguntou como meus pais estavam, tendo em vista o tanto que falaram de Mia nos últimos dias.

E, quinze dias depois da bomba, ninguém lembrava de mais nada. O que foi uma excelente notícia para mim, já que eu voaria no dia seguinte para Londres para pegar minhas sobrinhas e ter uma rápida reunião presencial com o Conselho e a Direção da empresa sobre os temas do Conselho Anual.

Alex fez de tudo para conseguir ir comigo, porém, as gravações foram rearranjadas de última hora devido a uma das atrizes ter contraído uma doença, então tiveram que cortá-la do restante do episódio e dividiram suas cenas com os demais atores.

— Não fique assim. Estaremos aqui na sexta-feira à noite. Não vai dar nem tempo de você sentir saudades de mim. – Brinquei com ele na noite que antecedeu minha viagem.

— Mesmo assim, Kat, vai tomar conta das duas sozinha dentro do avião?

— Alex, pelo amor de Odin! É um avião pequeno e não é como se Liv ou Lena resolvessem abrir a porta do jato só de brincadeira. Além do mais, irei trazer as motos, agora até Elena terá a dela por aqui.

— Com um ano de atraso... – Ele falou sarcasticamente.

— Acontece. Coloco a encomenda de estranhos como prioridade e acabo esquecendo as da minha família. No mais, quer algo especial de Londres?

— Não. Em quinze dias irei com você para lá. – Alex respondeu com um sorriso.

Mordi o lábio e me pus a pensar na minha situação... em quinze dia seria o lançamento do filme. O tão aguardado filme e, como é de praxe, tem toda aquela história de press tour, idas à programas de TV, entrevistas com jornalistas de todas as partes do mundo e o tão aguardado, para os fãs pelo menos, tapete vermelho da première.

O cronograma com todas as viagens de Alex já havia sido enviado por sua equipe, Maggie, Bradley e Sarah, responsáveis respectivamente por assessorar Alex e cuidar de suas redes sociais, já tinham tudo programado. Desde o tempo das entrevistas, até em quais programas ele iria. Além, é claro, dos posts no Instagram, Twitter e seja lá qual rede social mais Alex tinha. Tanto que um contador regressivo já tinha sido lançado, fazendo alusão ao primeiro tapete vermelho.

Os estilistas ainda procuravam as melhores roupas para que meu noivo brilhasse nas fotos e, para minha surpresa, me questionaram o que eu queria usar.

— Eu... não sei... acho que não vou.... – Comecei a gaguejar na frente de Hillary e Vicenzo, na tarde do último sábado.

— Se você completar essa frase com “eu não vou ao tapete vermelho”, Finlândia, eu te juro que te afogo na sua piscina ali. – Vicenzo me cortou e apontou dramaticamente para fora, já que estávamos todos tomando um café na cozinha, enquanto Chris Russell, o novo empresário de Alex, conversava com ele sobre novos projetos.

— Eu iria dizer exatamente isso. – Confirmei e Vicenzo fez uma carranca.

— Temos que dar um jeito de achar alguns vestidos para você. Não que seja difícil, mas temos que ter certeza de que combinem com a sua personalidade e estilo pessoal. – Hillary foi mais além e já anotava algo no tablet.

— É sério, gente! O trabalho de vocês é vestir Alex.

— Ele vai de Armani. Tem contrato com os italianos. Já com você, podemos brincar à vontade. – Vicenzo disse.

— No ano passado você usou Versace no lançamento do Porsche, certo? – Hillary perguntou.

— Sim.

— Você comprou aquele vestido ou alugou? – Ela continuou prática.

— Comprei. Espera, eu podia só alugar?!

E os dois deram uma gargalhada.

— Kat, pense em você como uma propaganda ambulante para qualquer marca. Se você aparecer ao lado de Alex, é claro.

— Ela vai aparecer. - Vicenzo disse em tom autoritário.

Hillary lançou um olhar mortal na direção do parceiro de trabalho e continuou:

Quando você aparecer ao lado de Alex, todos vão olhar para você, para sua roupa, seus sapatos, sua maquiagem, seu cabelo, e só depois para seu rosto. Primeiro, como você está vestida, depois para a pessoa. E, isso, isso atrai olhares do mundo inteiro. Você, desfilando um vestido vintage ou uma coleção que ainda não está à venda, faz com que curiosos de plantão busquem pelas peças, queiram saber a marca, a Maison, e, isso traz engajamento para eles. É tudo um negócio. E, um bom negócio para ambas às partes. Você economiza o dinheiro que pagaria nos vestidos, que eu digo, não são baratos, e eles ganham em propaganda. Claro que temos que convencê-los de que você é digna de usar a roupa que eles têm, mas isso é fácil. Você é quase uma celebridade por associação. Tem fã-clube na internet, as meninas se inspiram em você, você está no comando de uma multinacional. É uma pessoa interessante como um todo. E, dois pontos que não são importantes, mas pesam no final, é bonita e elegante e, já é quase uma Pierce. Como diriam alguns representantes das grifes: você é investimento, não dor de cabeça.

Olhei estupefata de Hillary para Vicenzo.

— E não nos olhe assim! Quando mencionarmos que Katerina Nieminen, está à procura de um vestido de gala para uma première, Finlândia, vai chover propostas.

— Eu ainda não sei se isso vai acontecer. – Murmurei em dúvida.

Hillary balançou negativamente a cabeça e pediu que eu esperasse e, logo em seguida, começou a digitar freneticamente no celular.

— O que ela está fazendo? – Questionei para Vicenzo.

Ele só me deu um sorriso e, assim que Hillary tornou a levantar a cabeça, gritou:

E voilà! – Os dois apontaram para a tela do celular.

Peguei o aparelho e li a conversa que me mostravam. Era uma troca de mensagens entre Hillary e o responsável pela Versace.

Na conversa, a personal stylist pergunta de forma despretensiosa se a Versace poderia ceder um vestido para uma mulher ir a um tapete vermelho.

Logo vem a resposta:

Te conheço, Hillary, não é qualquer mulher, quem é ela?

Hillary cita meu nome, a pessoa, Giovanni, diz que reconhece o nome, mas não liga à pessoa. Hillary responde com o básico, diz que sou noiva de Alex Pierce e vou com ele na première de um filme em Londres e que, inclusive, já tinha até usado um vestido da marca, em um tapete vermelho antes e, para finalizar, manda a minha foto.

A resposta vem carregada de reconhecimento.

Sim! Claro! Questa ragazza! Si! Sim, podemos ceder um vestido ou dois...

A conversa continua com pedido de descrição de meu corpo e minhas medidas, além, de uma oferta para usar sapatos e bolsa da mesma grife.

Acabei de ler a troca de mensagens e devolvi o celular para Hillary.

— Viu? É só ter as credenciais certas, Katerina. E então, vamos de Versace de novo, ou podemos abrir o leque de milhares de possiblidades? – Ela me retrucou e, ao meu lado, Vicenzo murmurava a palavra “possibilidades”

— Deixo na mão de vocês. – E foi aqui que ambos gritaram de felicidade e depois me intimaram a aparecer no ateliê deles para que minhas medidas fossem tiradas com precisão.

Minha ida para tirar as minhas medidas aconteceu hoje depois do meu expediente, e os dois malucos da moda, como eu passei a chamá-los já tinham quase vinte opções de vestido para me mostrarem.

E, quando saí de lá, eu não sabia mais o que pensar sobre essas possibilidades... não sei se queria sair correndo, gritando e assustada, ou se fingia que eu nunca fora lá e seguia a minha vida fingindo ignorância.

— Eu sei que você ainda está um tanto assustada com a dupla, mas podemos voltar ao tópico principal? – Alex me fez voltar para o presente e, depois de balançar a cabeça, olhei na sua direção.

— Eles são eficientes. E sabem muito bem o que estão fazendo. Meu medo é essa première, eu não confirmei presença em tapete vermelho nenhum. – Comentei.

Alex fez uma careta e se jogou na cama, quase fazendo o meu celular voar do outro lado do quarto.

— Achei que sua presença era certa.

— Falei que vou ver o filme com você dentro do cinema. Não que ia desfilar com você no tapete vermelho. – Corrigi meu noivo.

— Ainda pode trocar de ideia?

Olhei para cima, lá vinha ele com esses pedidos e tentativas de mudar a minha cabeça!

— Não sei, Alex. Nem sei se é o momento certo para fazer esse movimento depois de tudo o que aconteceu! Acho prematuro demais.

— Você não precisa ir em todos os tapetes vermelhos. – Ele começou em tom apaziguador. – Mas eu gostaria que fosse nesse, por favor.

Encarei Alex e, mesmo que ele não dissesse nada, seus olhos diziam. Era o primeiro tapete vermelho em quatro anos. Era a confirmação da volta dele para as telonas, ele me queria lá da mesma forma que eu aceitei de bom grado a sua presença no primeiro dia em que fui ao Conselho Administrativo no ano passado. Para me passar forças.

— Tudo bem. Mas não me arraste para festas ou qualquer coisa do tipo. Lembre-se o famoso é você. Meu lugar é nos bastidores.

Alex abriu um sorriso enorme e depois me agradeceu.

Acabei de arrumar a minha bolsa, não precisava de uma mala para um dia de trabalho, já que a viagem duraria praticamente 3 contando os fuso-horários, e fui me arrumar para me deitar.

— Ah! – Alex me chamou quando eu já estava quase dormindo. – Esqueci de te contar...

— O que?

— Vou te levar amanhã no aeroporto...

— Não precisa.

— Precisa sim! Até porque assim eu tenho a responsabilidade de ir buscar minhas sobrinhas e você quando desembarcarem. E serei o primeiro a ver as duas, não deixando que meus pais já aluguem as meninas ou pior, que Will tenha motivos para clamar que ele é o melhor tio americano delas.

— Maluco... – Murmurei contra o peitoral dele.

Senti mais do que escutei a sua risada.

— Seu maluco favorito. Você sabe disso. Agora, Rainha do Gelo, vá dormir que você terá dias agitados pela frente.

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 Minha viagem até Londres foi bem tranquila, sozinha, pude terminar os diferentes pontos do relatório orçamentário e de gestão do escritório. Logo depois comecei a analisar os dados dos demais escritórios e me dei conta que era isso que eu fazia há dois anos em Londres... sem saber, fazia o trabalho de outros, o que não deveria me surpreender, tendo em vista o fracasso que foi o último Conselho no quesito organização.

A pauta para a reunião do Conselho já estava pronta e tinham me enviado no dia anterior, e eu percebi que ao invés de uma semana, passaria quinze dias na Inglaterra.

— Ossos do ofício. – Murmurei. E, eu sabia exatamente as reações que minha família teria a essa notícia. Minhas sobrinhas ficariam eufóricas com a possibilidade de me terem como motorista particular por duas semanas, minha mãe teria a filha de volta temporariamente e meus avós, com certeza, me arrastariam para o Haras no final de semana.

Cheguei com o dia raiando em Londres, e, depois do desembarque, caminhei preguiçosamente até o carro, estava informando à família da minha chegada, quando escutei alguém falando o meu nome e, logo em seguida, um flash de câmera estourou.

— Ótimo! – Reclamei e só baixei os óculos escuros e continuei o meu caminho, agora andando um pouco mais rápido, para evitar que alguém me seguisse até o carro.

Nos primeiros metros após o aeroporto, fiquei observando os retrovisores para me certificar de que não estaria sendo seguida, não vendo ninguém, relaxei no banco e me concentrei totalmente nas ruas.

Como a minha reunião era na parte da tarde, fui direto para casa com o intuito de descansar um pouco. Era essa a minha ideia, mas bastou que eu tirasse a mala do carro, para que a campainha tocasse.

Busquei na câmera quem poderia ser. E vi minha mãe.

Corri para a porta e logo a abri.

Hei, äiti[1]! – Cumprimentei-a.

Ela me abraçou antes mesmo de entrar.

— Senti sua falta, filha! Tem muito tempo que você não parece.

— Sinceramente, mãe, sei disso. Mas não tive como voltar depois do verão. As coisas ficaram bem corridas.

— Eu imagino. E agora você vai levar minhas netas para Califórnia de novo...

Encarei minha mãe.

— A senhora não pode ficar tão triste assim. Papai comentou comigo que está indo para o Sudão do Sul! Quantos meses dessa vez?

— Serão quatro, porém, não estou indo agora. Somente em janeiro, após as festas de final de ano.

— Então vamos reunir as famílias novamente? – Perguntei alegre.

— Sim. E será onde dessa vez?

— Ainda temos que conversar sobre isso. E, não é só a minha opinião que conta!

— E com urgência, filha. As famílias são grandes, mas ainda bem que tem alguém que sabe como levar todo mundo pelo globo.

— E ainda aumentou neste ano, não? – Comentei e decidindo deliberadamente ignorar a segunda parte.

— Agradeça ao seu irmão e à Vic. E, por conta dos dois, acredito que seria melhor se fossemos todos para os EUA.

— Com relação a isso, creio que deveríamos conversar com Vic primeiro. Ela não saiu daqui muito feliz.

— Converso com ela mais tarde. Sei como ela está chateada com a própria família e, talvez, conosco também. Ser uma mãe de primeira viagem, ter que aguentar todos as opiniões e conselhos e tudo com um bebê que está dando trabalho para se alimentar, é bem complicado.

Fiquei quieta, esse era um território desconhecido por mim. Porém, minha mãe logo trocou de assunto, ou pelo menos começou outro, completamente diferente.

— Sei que deve estar cansada e querendo dormir um pouco, porém, quero conversar sobre outras coisas.

— Que seriam?

— Você comentou que irá trazer as meninas e que vai ficar por aqui por alguns dias.

— Sim. Alex e eu traremos as meninas dentro de quinze dias.

— Algum motivo especial? Achei que você tinha comentado com Ian que viria buscar as meninas e depois ele as pegaria em Los Angeles, quando voltasse do Brasil.

— Mudança de planos, vamos trazer as duas e teremos um compromisso aqui.

— Katerina, pare de andar em círculos e dê a informação completa. – Ela me cortou, já perdendo a paciência.

— É a première do filme. Tapete vermelho. – Resumi.

— E você vem com ele para...

— Não era minha intenção atravessar o tapete vermelho, mas... é importante, para ele.

— Em resumo, você vai estar do lado dele para apoiá-lo durante todo o tempo.

— Exatamente.

— E você acha isso seguro depois de tudo o que saiu na mídia?

Sentei-me no sofá e encarei a minha mãe.

— Então, não sei o que pensar quanto a isso. Fizeram todo aquele estardalhaço com as revelações e as reportagens, colocaram todos no foco, e, para mim, Katerina, eu preferiria ficar nos bastidores, até porque sei que vai ter gente que vai comentar que eu agora estou querendo aparecer... contudo, Alex me pediu. É claro que ele não disse com essas palavras, mas, estar do lado dele, nessa estreia, é quase a mesma coisa que aconteceu no início do ano... ele do meu lado no momento mais complicado do julgamento. Eu precisei de todo o apoio lá e ele estava ao meu lado. É a mesma coisa agora.

— Pensamento correto.

— Não será sempre. Acompanhei-o em setembro quando ele deu aquelas entrevistas na TV, não apareci, mas estava na plateia, e ele me agradeceu o apoio, dessa vez é a mesma coisa. Em uma escala muito maior... a série ainda está restrita aos EUA, o filme, é o mundo, né?

— Apoio é sempre importante, Kat. Às vezes, discretamente, como você vive fazendo na privacidade da vida de vocês, outras, é necessário estar na frente de todos também. Não acho que é o melhor momento para isso, você deve se preparar para ouvir comentários positivos e negativos, porém, como bem disse, ele precisa de você nesse momento. Esteja lá por ele, filha, tenho certeza de que Alex vai ficar muito feliz, e, também irá te defender caso algo aconteça...ele também aprendeu a lição depois de setembro, não foi?

— Aquelas semanas foram complicadas... – Rememorei.

— E vocês superaram. Um relacionamento é assim, nem tudo é o mar de rosas que vocês achavam que era. Haverá situações em que o amor de vocês será posto à prova, haverá momentos em que brigas acontecerão, o importante é que de tudo há uma lição a ser aprendida, às vezes é uma lição dolorosa, mas se vocês estiverem dispostos à aprender com os erros e superarem as adversidades, o relacionamento dará certo.

— Foi isso que falamos, claro que não com estas palavras bonitas... – Comentei.

— Sei disso. Ou nós não estaríamos tendo essa conversa tão calmamente. E, por fim, uma preocupação de mãe, mas pode chamar de curiosidade também, como você irá para essa estreia? Não entendo muito, contudo, todas as que já vi, as pessoas vão muito elegantes...

— É, vão... Talvez eu não tenha comentado com a senhora, mas Alex tem uma equipe por trás, pessoas que cuidam de sua agenda de trabalhos, das entrevistas que dá, das redes sociais e até mesmo o que ele veste e da sua aparência para momentos assim. E Hillary e Vicenzo, seus estilistas pessoais, resolveram tomar a tarefa de me vestir para eles. Da última vez que os vi, para tirar as minhas medidas, eles já tinham algo como uns quinze vestidos separados para que eu escolhesse...

E minha mãe deu uma gargalhada.

— Não é para rir, é desesperador! – Gemi aflita.

— Estou rindo, minha filha, porque nunca imaginei ou melhor, nem nos meus sonhos eu vi isso acontecendo! Você cercada de pessoas que estão te vestindo para uma ocasião que envolve câmeras, tapetes vermelhos e muito glamour de Hollywood.

Afundei-me no sofá e escondi meu rosto atrás de uma almofada, enquanto minha mãe ia enumerando os muitos lugares onde ela nunca pensaria que eu colocasse os pés...

E, lá no fundo, eu acabei por pensar que as chances de alguns acontecerem era realmente alta... bastava que Alex fizesse o papel certo e eu talvez estivesse lá também, como Oscar, Emmy, Globo de Ouro... e esse pensamento fez meu estômago dar voltas.

— Mãe, por favor, pode parar. – Pedi.

— Deixei você desconfortável?

— Mais para a senhora ter desbloqueado uma nova ansiedade em mim. – Murmurei.

— Então, vamos trocar de assunto e voltar ao que me trouxe aqui. Está tudo pronto lá na fazenda para receber minhas netas?

— Como a senhora sabe que esse será o nosso destino principal?

— Porque Elena não para de falar que vai montar em um cavalão. Laura e Ilsa estarão lá?

— Não sei. Acho duvidoso que Dona Ilsa vá, apesar de que no aniversário de minha sogra ela ter comentado sobre. Já Dona Laura, ela está decidida em transformar ou Elena, ou Liv, ou as duas, em amazonas campeãs olímpicas. Assim, a chance de ela aparecer é bem grande.

— Esse desejo dela é bem igual ao de Elena. Um trabalho da escola que ela recebeu era justamente sobre esse tema. Além de entrevistar parentes sobre o que eles queriam ser quando crescessem e o que são hoje, estava a pergunta, “o que você quer fazer quando crescer?”.

— E não me diga que Lena colocou campeã olímpica!

— Sim. Montando um cavalo chamado Saint Etiennè, que é marrom, com patas pretas e uma estrela na testa.

Saint Etiennè? Um nome francês? De onde ela tirou isso?

— Ainda não consegui descobrir. Talvez você tenha mais sorte. E boa sorte em encontrar um cavalo com essas características para a sua sobrinha.

— Somente Elena para ser tão específica assim... não, espera... Algodão Doce é assim!

Minha mãe me olhou com os olhos arregalados, como se não tivesse se atentado para a descrição do cavalo imaginário de Elena antes.

— Ela realmente está achando que o pônei vai crescer do tamanho de um cavalo, não está? – Perguntei.

— Pelo visto, sim. E temos que começar a explicar que isso jamais irá acontecer... essa é a pior parte de ver as crianças crescerem... ter que cortar um pouco as asas de sua imaginação. Com você foi a mesma coisa. Ainda me lembro de um dia que você chegou falando que era uma princesa igual a Jasmine de Alladin... e que tinha um príncipe encantado que andava em uma armadura brilhante ao seu lado... repetiu essa história muitas vezes, algumas com detalhes que me assustavam, e, infelizmente um dia, eu tive que falar que contos de fadas não existiam. Nunca te vi tão triste quanto naquele dia.    

Olhei para minha mãe tentando manter uma expressão neutra no rosto. Não sei se consegui, mas ela não me olhou com muita atenção enquanto discorria como foi contar para os filhos que alguns personagens do imaginário infantil não existiam. E, enquanto ela falava como queria ter feito algumas coisas diferentes, eu só conseguia pensar que eu contava para todos um de meus passados, ainda sem saber é claro, porque, eu só fui ter certeza muitos anos depois...

Com um pouco de dificuldade, voltei a me concentrar na conversa e agora minha mãe me dava conselhos sobre o que eu não deveria fazer com meus filhos.

Depois disso, acabamos que saímos para um brunch, já que ela tinha que ir para o hospital antes da hora do almoço e eu não tinha comido nada depois do desembarque.

Nos despedimos ainda no café, minha mãe seguindo para o trabalho e eu me permitir fazer uma visita a um lugar que eu sempre adorei, o Sky Garden, já que era perto do prédio da NT&S e, o melhor, poderia ir a pé, mesmo estando frio.

Estava observando Londres do alto, quando meu celular tocou, um tanto constrangida por ter me esquecido de colocar o aparelho no silencioso e ter atrapalhado a calma do lugar, fui me direcionando para a saída enquanto atendia à chamada.

Do outro lado da linha eram os advogados da firma que estava organizando toda a burocracia da minha fundação e eles tinham uma ótima notícia. Todos os papéis foram aprovados e agora era só realmente assinar a papelada da criação e, claro, montar a sede.

Tendo minha mãe como presidente, e sabendo que ela só estaria de volta do Sudão no mês de maio, agendei para que finalizássemos tudo no meio do próximo ano, até lá, eu teria tempo de comprar o imóvel sede e reformar com o que fosse preciso, além, é claro, de colocar algumas coisas em andamento.

Era uma ótima notícia, e que eu não esperava que fosse sair do papel nem tão cedo, tendo em vista cada entrave que o processo passou.

Já estava a caminho do escritório quando encerrei a ligação e, quase que automaticamente, enviei a seguinte mensagem para minha mãe:

Aproveite o seu último turno como médica dos Médicos Sem Fronteiras. A Broken Pieces Shine será aberta oficialmente em junho de 2023.

A resposta que ela me deu:

Sabia que de um jeito ou de outro, você acabaria ajudando quem precisa.

Segui radiante para o escritório, tendo a certeza de que nada me abalaria nessa reunião.

E eu estava mais do certa, dessa vez, pisar na enorme sala de conferências da NT&S não me abalou, como eu achei que faria, assumi meu posto de Vice-Diretora ao lado de Camila e a reunião com o Conselho transcorreu sem maiores problemas, resolvemos todos os pontos que estavam pré-estabelecidos e ainda pudemos confirmar toda a pauta da Reunião do Conselho Administrativo.

Saí a tempo de buscar minhas sobrinhas na escola, e, a carinha de feliz de Elena ao me ver, me garantiu que ela estava mais do que esperando por essa viagem.

— Oi, täti[2]!! Eu senti tanta saudade da senhora!! – Ela veio pulando na minha direção e me abraçou apertado.

— Eu também, Pequena, mas me conta, como foi a escola?

— Eu aprendi um tantão de coisas novas! E a senhora acredita que eu tenho dever de casa de férias?! – Ela perguntou injuriada.

— É mesmo? E é sobre o que? – Perguntei enquanto afivelava o cinto nela.

— Minhas férias! Como eu vou escrever sobre uma coisa que eu nem sei como vai ser?

Tive que começar a rir, Elena era mais ansiosa do que Liv.

— Calma, Leninha! Essa é uma tarefa que você só vai poder fazer no último dia de férias!

— Mas eu queria fazer antes de ir viajar, para poder aproveitar muito a minha família americana. – Ela começou a murmurar no banco de trás enquanto eu manobrava o carro no trânsito.

— E você vai, Lena. E vai poder contar tudo para seus colegas quando voltar.

— Por isso a redação, täti? – Ela questionou coçando a cabeça.

— Exatamente. Quer maneira melhor do que poder se lembrar de cada momento que você viveu, do que eternizando no papel?

E pelo retrovisor interno só vi Elena levando a mão a testa, um gesto um tanto dramático e só falou:

— É mesmo! A minha professora é MUITO inteligente! E sabe o que mais, täti?

— Não, Lena.

— Eu vou escrever dois textos, não, três textos iguais, um vai para a escola, o outro eu vou deixar com a senhora e o terceiro eu vou dar para a vovó Amelia! Será que ela vai gostar?

— Aposto que vai. – Garanti.

— Eu vou fazer tudo com muito carinho, em uma folha toda desenhada que a Liv me deu! Vai ficar muito lindo!

Concordei com ela e me concentrei no trânsito, Elena ia falando sobre todas as coisas que ela iria fazer nas férias, como sempre era coisa demais para tempo de menos, porém, não comentei nada, minha sobrinha é muito tranquila e nunca se importou se seus planos mirabolantes irão dar certo ou não, ou se ela vai nos lugares que pensou. Para Elena, todo lugar está bom, desde que as suas pessoas favoritas estejam juntas.

Alguns minutos depois estava parando perto da escola de Liv e ela, após se despedir da turma de amigas, veio correndo e se jogou no banco do carona e me deu um beijo na bochecha.

Hei, täti! Oi, Lena! Boa tarde!

— Olá você! Como foi seu dia?

E ela deu uma risada.

— Última prova. Depois os professores passaram um filme... juro que tentei assistir, mas dormi. Espero que não tenha uma prova sobre ele, mas acho que não, passaram isso só para matar tempo, pois faltava muito para nos liberarem, mas pouco para se dar aula... isso fez sentido?

— Fez sim, Liv.

— Ah, que bom. E... – E aqui ela parou e olhou em volta. – Cadê o setä? Ele não veio ou tá dormindo?

— Ele não veio. Está trabalhando. Mas vai nos buscar no aeroporto.

— Saímos hoje mesmo?

— É a intenção. Às sete decolaremos.

E as duas começaram a pular e dispararam a falar.

— E sabe o que vai ser mais estranho? Vamos chegar em Los Angeles e ainda vai ser sexta-feira!! Eu adoro isso de fuso horário.

— Quero ver falar isso quando voltar... – Comentei.

— Aí eu não vou gostar não... Dá muito trabalho voltar ao fuso daqui... nossa eu fiquei só o pó quando voltamos das férias de verão. Levei quase uma semana para voltar a dormir direito. Como o papai e o vovô aguentam viajar para tantos fusos assim e não ficarem com o relógio biológico todo bagunçado?

— Não me pergunte isso. Às vezes em que fui para muito longe, também custei me acostumar com o fuso. Deve ser de pessoa para pessoa.

— Faz sentido. – Liv concordou comigo.

— Sei que ninguém perguntou, mas eu não sinto diferença nenhuma! – Lena falou do banco de trás. – Então eu sou igual ao papai.

— É claro, Leninha! Alguém tinha que puxar o papai, né?

— SIM! – Vibrou minha sobrinha no banco de trás.

Pouco depois estava parando na garagem da casa de meu irmão e o próprio veio receber as filhas que passaram igual a um furacão por ele e foram correndo para os quartos para tomarem banho e se arrumarem para a viagem.

Meu irmão só olhou para a direção que as filhas tomaram e depois veio me cumprimentar.

— Conseguiu descansar da viagem? Porque paz agora você só terá quando me devolver as duas.

— Eu não dormi nem um segundo desde que cheguei... ainda bem que dormi um pouco no voo. – Devolvi o abraço que ele me dava enquanto o respondia.

— Para situações assim existe algo chamado café... – Ele comentou me estendendo uma caneca.

— Que eu dispenso. Estou bem.

— Quero ver falar isso quando chegar na Califórnia.

— Lá terei Alex para quem empurrar as duas. E, você acha que elas vão querer ficar na cidade quando tem uma fazenda todo para elas? E não se esqueça de que estou levando as novas motos de motocross que o pai deu, então, coisa para fazer é o que não vai faltar.

Ian deu uma risada.

— É, maninha, dessa vez você vai ficar moída.

— É para isso que existe tias e tios, Ian. Para aliviar o fardo dos pais de vez em quando. E, só para saber, você vai levá-las ou eu já saio daqui com elas e passo em casa para tomar um banho e ir para o aeroporto.

— Eu levo. Porque só Deus sabe o que elas podem aprontar enquanto você demora um ano debaixo do chuveiro.

— Então vou indo. Encontro com você no aeroporto.

Heathrow?

London City. Facilita a minha vida, né? Não, melhor. Passa lá em casa e me pega, assim é menos um trabalho para trazer meu carro, o que você acha?

— Tudo bem! Mais fácil mesmo. – Ele concordou e me levou até a garagem. – Até daqui a pouco, Kat!

— Até!

Voltei para casa, tomei um longo banho, fechei minha mala, que só foi aberta para que eu pegasse o básico do banho, nem nas roupas eu mexi, e depois de conferir se a casa estava toda fechada, desci para o térreo, onde, mal coloquei os pés, Ian já buzinava lá fora.

— Nem para tocar a campainha. – Murmurei nada feliz.

Quando entrei no carro, era possível de se sentir a empolgação de minhas sobrinhas e o quase desespero de Tanya e Ian.

O caminho até o aeroporto foi barulhento, Lena e Liv não pararam de fazer planos e tudo o que Tanya ia falando era:

— Bem menos, meninas. Vocês vão ficar duas semanas em Los Angeles, não vinte anos!

E nem isso acalmou as duas.

Na hora do embarque, minhas sobrinhas se despediram dos pais e correram para dentro do jato, sobrando para mim, ouvir cada uma das recomendações que eles passariam para as filhas.

Foi-me entregue também o documento que me passava a guarda provisória das meninas, para que ninguém fosse barrado na alfândega na chegada.

E, quando eu achei que estava tudo liberado para podermos partir, eis que as duas descem correndo do jato e abraçam os pais novamente, clamando que iriam morrer de saudades.

Ian mandou que elas subissem de volta e que se comportassem, que respeitassem todos e que ele não queria nem pensar que elas foram mal-educadas nem com uma formiga.

Tanya falou quase a mesma coisa e, chorando, soltou o abraço e guiou as filhas até a escada. Eu estava na porta, só esperando que elas subissem.

— E tome conta delas como se fossem suas, Kat! – O casal me falou.

— Pode deixar! – Confirme e guiei Elena até o banco perto da janela, por onde ela ainda poderia acenar para os pais.

Menos de dez minutos depois, nossa decolagem foi autorizada, e, às sete da noite em ponto, deixamos Londres com destino à Califórnia.

A primeira hora de voo foi uma bagunça, com Lena ainda agitada e eufórica e com Liv se passando por entendida em voo, só porque voou uma única vez sozinha. Depois disso, elas se cansaram e foram dormir na cama que tem no fundo do jato.

E eu fiquei na cabine sozinha, aproveitando a calma temporária até o completo caos dos próximos quinze dias.

 

[1] Oi, Mãe!

[2] tia


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Notas finais do capítulo

E é isso!
Espero que tenham gostado.
Muito obrigada a quem está lendo!
Até o próximo capítulo!



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