S.H.I.E.L.D.: Guerreiros Secretos (Marvel 717 2) escrita por scararmst


Capítulo 27
Debaixo D'água




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Era estranho para Aurelius, considerando como ele e Praxis nunca tinham sido do tipo de se falar muito, o quanto o silêncio recente vinha o incomodando. Já fazia uns bons dias desde o contato da S.H.I.E.L.D. que tinha solicitado a entrega dos prisioneiros e, embora Aurelius tivesse uma predileção pela execução correta das leis de acordo com as definições de seu país, mesmo ele entendia se tratar de uma questão de impacto internacional: a importância das testemunhas não podia ser limitada a seu uso para Attilan apenas. Ele acompanhou a entrega dos homens para um avião da S.H.I.E.L.D. naquela manhã depois de toda a papelada ser processada, e agora ele e Praxis estavam oficialmente livres de qualquer obrigação política ou judicial em relação ao caso.

E era exatamente isso o que tornava toda a situação tão esquisita. Aurelius tinha assumido o comportamento recente — e anormal — de Praxis como resultado de alguma tensão com a situação de testemunha na qual se encontrava, mas agora estavam livres da obrigação e nada parecia ter mudado. Ela estava sentada na cabeceira oposta da mesa, como costumava fazer, comendo seu peru assado com o mesmo silêncio e interesse de semanas atrás, prestando atenção única e absolutamente em seu celular.

Aurelius pensou estarem fazendo algum progresso. Tinha sido um tolo ao acreditar em algum tipo de relação surgindo entre eles. Talvez fosse simplesmente um romântico incorrigível, agarrando-se a sinais pequenos de afeição como uma declaração não dita de amor ou sentimento profundo. Talvez tudo existisse apenas em sua cabeça.

Ainda assim, mesmo considerando tais possibilidades, algo não parecia certo. Mesmo antes, mesmo quando os dois mal conseguiam se tolerar, acabavam se provocando por cima da travessa de salada, trocando farpas e comentários atravessados e, às vezes, descartando tudo isso em uma rodada de sexo. Agora, nem isso existia. Praxis não se comunicava com ele nem mesmo para reclamar de sua atitude, ou dizer que o odiava. Encontrava-se completamente apática, e ele não sabia porquê.

Tinha passado os últimos dias tentando decidir se devia ou não fazer algo a respeito. Sabia que a decisão seria sua, pois algo estava se passando com sua esposa e ela não estava interessada em dividir por conta própria. Então, ele podia deixar o assunto quieto e perder de vez o fio de relação o qual tinha conseguido estabelecer entre eles, ou perguntar algo e correr o risco de receber uma recusa rude — ou, talvez, uma resposta.

O que seria pior? A incerteza e a apatia, ou uma declaração direta de ódio? Não sabia dizer, mas começava a sentir que, a longo prazo, para sua própria saúde mental, seria melhor não ter dúvidas. Não ficar se abraçando a uma versão de vida a qual não existia mais.

Aurelius pigarreou, terminando seu prato e sinalizando para a criada retirá-lo. Então pensou por um instante no que dizer, e acabou se decidindo pelo mais simples.

— Você tem estado terrivelmente calada, Praxis.

A mulher levantou o rosto de seu prato de peru, já quase terminado. Parecia triste… Não, não triste. Cansada. Como se estivesse lidando com um problema complexo demais para uma pessoa resolver sozinha. Tinha visto essa feição no rosto da esposa pouquíssimas vezes, depois de um dia estressante de trabalho, e em todos os casos, ela se mantinha majoritariamente calada, direcionando um ou outro comentário atravessado a Aurelius e indo para a cama bem cedo para descansar. Mas isso costumava acontecer um dia ou outro, não por uma semana inteira.

— Não sabia que tinha assinado uma cláusula de conversa no contrato nupcial.

Aurelius suspirou. Ao menos uma parte da acidez parecia ainda estar presente. Mas, para Aurelius, que agora estava muito preocupado, uma resposta dessas não cortaria seu interesse na discussão. Ele se levantou de sua cadeira, limpando a boca com o guardanapo de pano e caminhando até a outra ponta da mesa. Ele puxou uma cadeira ao lado dela, sentando-se e apoiando o cotovelo na mesa, com um olhar analítico no rosto.

Praxis não rolou os olhos, nem bufou ou emitiu qualquer sinal de desagrado com sua presença, e a conhecendo já por alguns anos, Aurelius sabia que no mínimo significava que ela não queria que ele saísse dali, embora também não significava que ela queria que ele ficasse. Poderia ser um meio-termo qualquer.

— Depois de tantos anos, eu te conheço ao menos um pouco. O suficiente para saber que você não está bem. Eu quero saber como posso ajudar.

Isso pareceu atrair a atenção da mulher. Ela pousou o garfo no prato, olhando Aurelius nos olhos e franzindo a testa. Estava confusa, ele percebeu. Consideravelmente.

— O que disse?

Aurelius franziu a testa, sentindo-se confuso também. Ele coçou a garganta, pensando em como poderia ser mais claro do que já tinha sido.

— Eu disse que você não parece bem, e perguntei como posso ajudar.

O queixo de Praxis caiu. Ela piscou os olhos, encarando-o embasbacada, e então sua expressão se contorceu em um franzir irritado de testa e lábios muito familiar para Aurelius.

— Por que está fazendo isso? Pare com isso, Aurelius! Só pare!

Ela bufou, abaixando a cabeça e passando as mãos pelo rosto, em um sinal de certo descontrole nunca antes presenciado por ele. Excelente. O que tinha feito de tão errado dessa vez?

— Parar com o quê? — Ele perguntou, agora se sentindo mais confuso que Praxis parecia. — Eu estou fazendo isso porque estou preocupado, porque mais…

— Pare!

Praxis se levantou de uma vez, largando o peru interminado no prato e dando as costas para a mesa, encaminhando-se para o quarto. Era isso o que ganhava por ter se preocupado? Ao menos agora sabia qual era a resposta definitiva dela, e não passaria a vida em dúvidas.

— É, Praxis — ele comentou, alto o bastante para ser ouvido. — A culpa é minha, quem mandou eu criar sentimentos pela minha esposa? Que ideia mais estapafúrdia, não é mesmo? Se importar com o bem estar de quem se casou comigo? Que imbecil sentiria uma coisa dessas?

Mas ele não conseguiu dizer mais nada, pois sua garganta apertou e de repente ele desejou ficar sozinho. Não conseguiria privacidade indo para o quarto, pois tinha certeza de que ela estava se dirigindo para lá, então optou pelo jardim, saindo da casa para o ar fresco da noite e se sentando no primeiro banco que encontrou.

Ele não soube por quanto tempo ficou sozinho ali, mas certamente havia de ser muito tempo, pois aos poucos as luzes da casa foram se apagando, indicando que os criados estavam saindo. Ele continuou no banco mesmo quando a única luz acesa na mansão era a de seu quarto, e também depois, quando aquela apagou.

Havia sido sua escolha, não é? Tinha decidido que era melhor ter certeza, e mesmo que isso doesse — pois doía — era mesmo melhor saber onde estava se enfiando, e o que podia esperar de sua vida. Talvez agora que tinha assumido um papel bem mais proeminente em sua família, depois de toda a investigação a mando da Família Real, pudesse puxar as rédeas da família o suficiente para conseguir um divórcio se assim Praxis quisesse. Sabia que ele não queria, mas a decisão não era sua somente, e se não pudesse ser feliz com ela, era no mínimo decente dar a ambos a chance de procurarem felicidade em outro lugar.

Era nisso que estava pensando quando ouviu um som suave de passos sobre grama atrás de si. Ele se virou em silêncio, um pouco surpreso e um pouco ansioso em ver Praxis caminhando pela grama, descalça — algo muito estranho — com os cabelos presos para cima da cabeça e usando o roupão de seda favorito de Aurelius. Ela seguiu devagar até o banco onde ele estava e se sentou com uma delicadeza quase etérea ao lado do homem, sem dizer nada, apenas encarando a noite à sua frente.

Aurelius esperou. Ela não tinha se sentado ao seu lado à toa, e se queria dizer ou questionar algo era certo haver um motivo para tal. Ele ficou em silêncio como ela, encarando a grama orvalhada do chão, até Praxis, ainda encarando o próprio colo e sem olhar para ele, disse alguma coisa.

— O que foi aquilo sobre sentimentos? Eu ouvi.

É claro que tinha ouvido. Aurelius rangeu os dentes por um milésimo de segundo, sentindo o impulso de responder algo como “é claro que ouviu, não é como se eu estivesse sussurrando sozinho”, mas preferiu não ser sarcástico naquele momento. Praxis estava visivelmente fazendo um esforço para a conversa ser decente e, tratando-se da temática, era algo muito sério para se resolver com piadas e patadas cruzadas. Era bom levar a sério também.

— Foi o que foi — ele disse, dando de ombros. — Não sei como responder. É isto. Depois de todos esses anos te aturando, comecei a gostar de te aturar… A gostar de você. Não me pergunte por que, eu não saberia responder.

— Gostar quanto?

Mais uma vez, ele mordeu a língua, impedindo algo na linha de “que interessa?” sair em resposta. Ele suspirou e respondeu.

— Um tanto. Não sei que tanto. Bastante.

— Quero saber algo mais… Bem… Se eu fosse embora hoje, o que ia acontecer?

Se ela fosse embora? Aurelius a olhou, surpreso, e a mulher virou o rosto para encará-lo também. Os olhos lilases dela traziam um brilho misterioso, uma mistura de reflexão e algum outro sentimento o qual ele não conseguia identificar. A pele dela reluzia muito sutilmente, refletindo de leve a luz das lâmpadas externas da mansão.

— Eu ficaria muito triste se você fosse embora — ele respondeu, abaixando o rosto, incapaz de responder olhando nos olhos dela. — Mas mais triste ainda se você se sentisse obrigada a ficar aqui e isso a fizesse miserável pra sempre. Você quer ir, não é? Se separar de mim?

— Não exatamente — a mulher respondeu, para a surpresa de Aurelius. Se não tinha entendido isso certo, então… O quê? Praxis puxou as faixas do roupão, soltando o laço e o abrindo, e em seguida pegou a mão de Aurelius, levando-a até sua barriga um pouco abaixo do umbigo. — Estou grávida.

Se Aurelius pudesse inserir algum efeito sonoro naquele momento, seria o de um disco parando de girar de repente. Foi como se o próprio planeta tivesse parado em um segundo, arrancando-o do chão e o lançando vários metros para a frente como um projétil em direção ao infinito.

Ele encarou Praxis por alguns segundos, absorvendo as palavras dela, e depois olhando para a própria mão pousada sobre a barriga da esposa. Havia mesmo uma elevação ali, pequena, mas existente. Poucas semanas, mas havia.

— Eu… Eu vou ser pai?

A resposta de Praxis foi confirmar com um aceno de cabeça, e Aurelius sentiu os olhos lacrimejarem, aquele delicado anel dourado se formando ao redor da íris enquanto ele olhava para a própria mão. Não sabia o que dizer. Não sabia nem como dizer, e até esqueceu do que tinha ido fazer no jardim em primeiro lugar. Parecia ter sido transportado para outra terra, outra realidade. O mundo parecia outro, em um átimo de segundo, um piscar de olhos, e tudo tinha mudado.

— Praxis… Eu…

— É algo que você tinha vontade na sua vida? Ser pai? — Ela perguntou, e Aurelius percebeu nesse instante que nunca tinha sequer falado disso com ela. Ele piscou os olhos, enxugando-os e tentando se livrar das lágrimas acumuladas, e confirmou com a cabeça.

— Sempre quis… Sempre. Mas… Eu não sei, com o nosso casamento do jeito que é, nunca pareceu um bom momento para falar sobre.

— Não acho que teria um bom momento do jeito que as coisas eram, mas tinha de ser feito. E… Eu mesma não sabia como… Ou se falar com você.

Aurelius, ainda com o coração acelerado e sentindo o corpo tremer em uma mistura maluca de adrenalina e nervosismo, não deixou o uso daquela partícula “se” escapar. Ele franziu a testa, abrindo a boca e tentando encontrar as palavras certas em seu cérebro para dizer a ela, mas este parecia ter parado de funcionar. E Praxis decidiu se aproveitar disso.

— Eu odiei crescer aqui, Aurelius. Passar pela terrigênese tão nova… Ou não passar… A forma como isso muda a vida de uma criança, eu jamais iria querer algo assim pro nosso filho. Ou você aceita a terrigênese e se torna uma moeda de troca, ou não aceita, e passa a não ser nada ou ninguém. Tudo isso aos oito anos de idade. Por mais que um filho nosso vá ter várias proteções sociais que eu não tive, essa ainda não é uma pressão social que eu quero para ele. Nunca. Entende?

Aurelius engoliu o bolo de nervosismo em sua garganta. Entendia? Sim. Não tinha gostado nada da forma como tinha crescido também e, de repente, imaginou seu filho passando pelas mesmas pressões às quais tinha passado; sentiu o estômago revirar. Sim. Realmente, entendia.

— O que você ia fazer? — Ele perguntou, torcendo para conseguir disfarçar o aperto na garganta e a expressão de ansiedade em seu rosto. Precisava manter a calma. Ela estava conversando com ele, não estava? Pois então.

— Não sei. Ir para algum lugar. Qualquer um — ela enfiou a mão no bolso do roupão, tirando de lá um cristal de terrígeno. — Eu encontrei os Samudri antes de serem presos, tentei assegurar um possível futuro caso meu filho quisesse sua terrigênese livre das pressões daqui…

Ela tinha falado com os Samudri? Aurelius franziu a testa, pronto para repreendê-la pelo ato, mas antes de fazê-lo, a mulher colocou a mão sobre a boca dele em um toque delicado o bastante para ele sequer poder reclamar.

— Eu sei que foi idiota e arriscado, eu sei. Mas eu não sabia o que fazer — Praxis tirou a mão e Aurelius decidiu deixá-la terminar de falar. — Ainda não sei… Eu só sei que não quero ficar aqui, não posso ter meu filho aqui, não posso. Eu preciso ir embora.

E Aurelius a conhecia bem o bastante para saber não ser da boca para fora. Nunca tinha a visto tão nervosa daquele jeito. Quase assustada, até. E quando pensava sobre seu filho crescendo, um garotinho correndo desajeitado no jardim atrás de uma bola, também não conseguia visualizar a perspectiva em Attilan. Não havia felicidade para uma criança naquele lugar.

— Eu já te contei que queria abrir uma filial? Não sei onde, mas tenho ficado interessado na Inglaterra e na costa oeste dos Estados Unidos, ou um país emergente como o Brasil ou a África do Sul. Qualquer um deles seria bom pra mim, bom para os negócios também e… não seria aqui.

Praxis olhou para Aurelius, um pouco surpresa e um pouco atordoada. Ainda havia alguma apatia ali, e agora ele era capaz de apostar, era resultado de exaustão. Aurelius segurou a mão da mulher, entrelaçando seus dedos nos dela devagar, esperando ela aceitar o contato.

— Você tem um olho bom para negócios — ele continuou. — Meu plano original era enviar um representante pra filial, mas nessas circunstâncias… Podemos escolher onde… E nos mudar. Se você me quiser por perto.

Pois ela também poderia não querer. Era uma possibilidade, não negaria.

— Você iria comigo?

Aurelius soltou uma risadinha meio nervosa. De todas as perguntas dela, era essa que fazia? Chegava a ter graça.

— Tá brincando? Odiar Attilan é a única coisa que temos em comum desde que decidimos nos casar. Mas eu nunca pude pensar em sair porque estava casado com você aqui e todo o resto, mas nesse caso, então…

Ele não terminou de falar. Praxis levou as mãos ao seu rosto, inclinando-se e deixando um beijo sobre os lábios do marido. Aurelius, que não esperava nada parecido com esse gesto da parte dela, não reagiu até a mulher se separar dele.

— Então nós vamos.

Aurelius abriu um sorriso pequeno e confuso, levando uma mão ao rosto dela e passando uma mecha de cabelo que escapava do coque para trás da orelha da esposa.

— Então você me quer por perto. Hum. Interessante.

— Um pouco. Bem pouquinho. Não se convença demais, não é nada indispensável — ela respondeu com um sorriso atrevido no rosto.

— É o bastante para mim — Aurelius respondeu, beijando Praxis em seguida.

De alguma forma, naquela noite, naquele momento enquanto pegava a esposa pelos braços e a carregava de volta para dentro de casa, foi quando Aurelius se sentiu verdadeiramente casado pela primeira vez. Como se tivesse começado ali. Como se aquela fosse a noite de núpcias, e aquele fosse o momento no qual realmente tinha aceitado Praxis como sua esposa.

Não sabia dizer se isso era recíproco, mas aotropeçar escadas acima com ela nos braços, largando os chinelos pelo caminho, pôde ver, aos poucos, a pele dela começar a refletir e brilhar mais. Como sempre, era a coisa mais bonita a que já tinha visto na vida, não importando quantas vezes visse, nunca se cansaria.

Aurelius a colocou de pé no chão ao entrarem no quarto, tirando o roupão de seda dela e a empurrando devagar para a cama. Assim, com a camisola de seda, ficava ainda mais visível a elevação na barriga, e aquilo lembrou Aurelius em algum nível muito consciente do quão sortudo era. Seria pai. Praxis ia ter um filho. Ele seria pai.

A mulher puxou a camisa de Aurelius para cima, arrancando-a e jogando no chão, e prendeu as pernas nos quadris dele. Aurelius a carregou até a cama, sua boca encontrando a dela em um beijo no momento em que a pele dela começou a refletir as luzes do quarto em um padrão colorido como um arco-íris no teto do quarto.

Aurelius separou o beijo, olhando maravilhado para as reflexões luminosas no teto e nas paredes, e a forma como os padrões de luzes dançavam sobre a pele dela.

— Eu acho que nunca te falei isso — ele disse, abrindo um sorriso e puxando a camisola dela para cima. — Mas eu nunca vi nada mais bonito que você quando está excitada.

Era difícil dizer por baixo de todas as luzes dançando no rosto dela, mas Aurelius teve muita certeza de que ela tinha corado. Praxis terminou de tirar a peça de roupa, jogando-a no chão e puxando o rosto de Aurelius para perto.

— Tem razão. Eu sou mesmo a coisa mais bonita que você já viu.

Aurelius riu, uma onda mista de alívio e felicidade tomando conta de si ao ver o sorriso sarcástico de Praxis, exatamente como antes, mas muito diferente.

Ele se inclinou para beijá-la de novo.

[...]

Erasmus sabia que tinha de agradecer pela situação atual. Não fosse a Balsa, seria a guilhotina, e não tinha dúvidas de que Attilan teria muita coragem de seguir em frente com a punição. Ele apertou os dedos de Alexis mais uma vez antes de soltar a mão dele e seguir para a porta da cadeia.

— Rapidinho eu volto — anunciou, acenando para Alexis. — Eu só tenho uns cinco minutos aqui dentro.

— Ok. Eu tô esperando.

Eras olhou meio nervoso para o helicóptero que tinha levado os dois até ali. A Balsa não era uma prisão a qual se podia simplesmente visitar, e sabia, só estava ali pelos seus antigos colegas da S.H.I.E.L.D. terem puxado algumas cordinhas. Tinha sorte. Precisava se lembrar disso.

Ele se aproximou do guarda parado na porta e deixou o homem guiá-lo para dentro. Nunca tinha estado em uma prisão antes, então não saberia dizer com certeza, mas pelo pouco que se lembrava, não eram locais tão fechados e restritos quanto aquele. A Balsa era mesmo um caso único, e o fato de seu pai, avô e tio estarem nela só o lembrava da seriedade da situação — e do quanto poderia ter sido pior.

Erasmus engoliu em seco, seguindo o guarda até uma salinha de visitas lateral. Então ele entrou junto lá dentro, e os dois precisaram esperar algum tempo até a porta se abrir e Drausus entrar, acompanhado de outro guarda.

— Pai! — Erasmus exclamou, levantando-se e indicando uma tendência a se aproximar, mas o guarda o parou com uma mão.

— Cada um de um lado da sala, garoto.

Sim. Sabia. Bem como sabia que tinham dois minutos no máximo e que os guardas não sairiam dali. Eras suspirou, acenando para o homem embora sua vontade fosse o abraçá-lo.

— Olhe só para você… — Drausus comentou, abrindo um sorriso pequeno. — Como você está?

Não sabia. Vinha tentando lidar com o fato de que sua família ia ficar eternamente presa naquele lugar horrendo e que nunca mais poderia vê-los, mas era muito estranho ficar de luto por isso quando já tinha passado pelo mesmo pesar antes, ao deixar Attilan. Era como perder um cachorro de estimação e encontrá-lo só para descobrir que teria de devolvê-lo, antes mesmo de ter entendido que o tinha encontrado de fato. Era complicado demais.

— Eu vou ficar bem. Estou com aquele amigo.

— Bom… Muito bom. Seu tio Crispinus vai te ajudar, ok? Ele vai mandar um dinheiro pra você se cuidar também. Eu arranjei isso em Attilan, você só precisa ligar pra ele num número… Você tem algo aí pra anotar?

Não tinha, mas o guarda ao lado foi gentil o suficiente para emprestar uma caneta e pedaço de papel para Eras. Ele anotou o número do tio e, rápido assim, o tempo deles tinha acabado.

— Eu sinto muito, pai… — Eras disse, quando o guarda começou a guiá-lo para fora.

— Você nos salvou, meu filho — o homem respondeu com um sorriso no rosto. — Eu estou muito orgulhoso de você.

Eras sentiu o rosto esquentar. Isso não era algo que ouvisse com muita frequência, principalmente agora, tendo ficado tanto tempo longe do pai. Eras teve tempo de responder com um sorriso, e os guardas começaram a levá-los embora.

O garoto caminhou para fora da Balsa apertando o papelzinho na mão pelo caminho. Encontrou Alexis do lado de fora, e segurou a mão dele mais uma vez, apertado, tentando não pensar muito no que estava deixando para trás. Seu pai estava bem. Seu tio Marcellus estava bem. Seu avô estava bem. Esse era o melhor cenário que poderia esperar.

Ainda assim, fez o caminho de volta em silêncio. Mesmo quando Alexis o perguntou se estava bem, sua resposta foi um aceno silencioso e depois, andando de helicóptero em direção à Nova York, apenas observava o mar abaixo deles, pensando nas ondas, querendo mergulhar mais que qualquer coisa, ficar algum bom tempo debaixo d’água e não pensar em mais nada. Talvez escapasse de noite para isso.

O helicóptero pousou em um heliponto na costa, e Eras saiu do helicóptero, agradecendo ao piloto pelo favor e seguindo Alexis para a praia, para começarem a seguir o caminho para casa.

— Você quer conversar? — Alexis perguntou em algum momento, enquanto caminhavam para casa.

— Não. Tá tudo bem, eu só preciso de um tempo.

Ou ao menos, esperava que um tempo fosse o suficiente. Não queria deixar Alexis preocupado depois de tudo que o garoto vinha fazendo por ele. Alexis entendeu a necessidade de Eras de ficar um pouco sozinho, e quando chegaram em casa, deixou Eras na sala e foi para dentro da casa.

O garoto ficou ali, no banco da bancada, olhando para o jardim e para piscina do lado de fora, sentindo-se sozinho de uma forma estranha. Não na casa, isso seria muito fácil de resolver: era só caminhar para dentro e procurar Alexis onde estivesse. Estava sozinho em saber que tinha, de certa forma, perdido sua família. Não tinha como substitui-la, e sabendo o que a alternativa significava, sequer podia se permitir ficar triste. Estavam vivos. Devia comemorar.

Ele piscou os olhos, sentindo lágrimas começarem a escorrer e as deixando cair sem impedi-las. Então pegou seu celular. Queria nadar e ficar o resto da tarde na piscina debaixo d’água sem pensar em nada, mas tinha algo que precisava fazer antes. Discou o número de Niko e esperou até que a garota atendesse.

— Eras?! Minha nossa, quanto tempo! Como você está?

Não muito bem.

— Ótimo. Consegui visitar minha família graças a vocês, então… Obrigado. Só estou ligando pra agradecer.

— Ah… Imagina, foi tranquilo de arranjar. Fico feliz que tenha dado tudo certo.

Mais ou menos. Era o melhor cenário, mas certo era uma palavra muito forte.

— Pois é… Graças a vocês. Me desculpem por ter fugido daquele jeito. Eu entrei em pânico.

— Tudo bem, a gente entende. O que importa é que você está bem. Você vai voltar?

Eras olhou para a grama do lado de fora, para a casa silenciosa, tão diferente da base onde tinha estado. Pacífica, vazia, ao lado de uma das praias da cidade. Não queria estar no meio de crises de pessoas armadas, ataques e bombas de terrígeno. Só queria poder estar em paz. Esperava que Niko pudesse entender isso.

— Não… Eu quero ficar mais quietinho na minha, entende?

— Claro… Entendemos sim.

— Mas vou ficar em Nova York, então se estiverem passando pela cidade, nós podemos nos ver.

Ele os considerava, afinal, bons amigos. Não os via há algum tempo e, além de dever muito a eles, sentia saudades. Talvez pudessem comer um cachorro-quente e tomar um sorvete algum dia.

— É… Vai demorar um pouco preu poder te avisar — Niko respondeu, e a voz dela teve um tom complicado e pesaroso.

Eras sentiu a garganta apertar. Algo tinha acontecido.

— O que aconteceu?

— Muita coisa… Eu não posso te dizer, é informação confidencial da equipe, mas… Bom, vamos ter que mudar pra outra base, a localização dessa está comprometida. Então se quiser fazer uma visita surpresa um dia, não vai ter como. Ainda não sei pra onde vamos, e mesmo se soubesse, não poderia dizer. Mas… aviso, sim, se estiver visitando a cidade. Ok?

Se Eras dissesse que a resposta não o tinha magoado em algum nível seria mentira. Tinha feito parte daquela equipe, mas por se tratar de uma equipe de agentes secretos, era óbvio, se não fosse parte da equipe, não poderia saber os segredos. De alguma forma, foi como perder a segunda família no mesmo dia.

— Ok… — Respondeu enfim, aceitando que seria tudo o que teria e tudo o que deveria ter por ora. — Eu tenho que ir agora, mas a gente conversa depois, ok?

— Tudo bem. Mande notícias, Eras. Sentimos sua falta.

— Eu também.

Ele sorriu, embora Niko não pudesse ver, e desligou a ligação. Mais uma vez, a sensação de solidão esmagou seu peito, do tipo o qual Alexis não poderia preencher. A perda de ter de se afastar de pessoas que amava, em parte para sempre.

Eras se levantou, caminhando até a piscina. Ele tirou a camisa, deixando-a sobre uma das cadeiras ao lado, e se jogou na água, afundando e se sentando no fundo da piscina. Tinha descoberto que ficar submerso, respirando debaixo d’água, era tranquilizante. Esperava que também pudesse acalmar seu coração.


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Notas finais do capítulo

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Além dessa, tenho vagas também para uma interativa original sobre revoltas civis. Acesse aqui:
https://www.spiritfanfiction.com/historia/a-rosa-do-tempo--interativa-19350882/

Considere também dar uma olhada nas minhas outras histórias? :D Eu tenho coisas para vários gostos ^^

Leia a duologia Hunters! Comece aqui: https://fanfiction.com.br/historia/771022/Hunters_Hunters_1/

Leia minha original de fantasia urbana, Carmim! https://fanfiction.com.br/historia/787245/Carmim/

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