S.H.I.E.L.D.: Guerreiros Secretos (Marvel 717 2) escrita por scararmst


Capítulo 12
Defumado




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Sirius tinha ficado bastante impressionado ao ver o Zephyr Two pela primeira vez. Dizer que o avião era grande e majestoso ainda soava como uma sub descrição quase ofensiva do veículo, e isso só olhando a nave por fora. Ela devia valer por uns cinco quinjets de comprimento e mais uns cinco de largura, uma conta solta feita de cabeça por Sirius ao ver o único quinjet docado no topo da nave, parecendo muito pequeno em comparação com a nave mãe que o transportaria.

Por dentro, o avião não era menos impressionante. Com cabines, laboratório, sala de controle, enfermaria, ele era basicamente uma base móvel por si só, e Sirius tinha lido no manual que podia ficar dias inteiros no ar sem precisar pousar para absolutamente nada. O pensamento era tanto incrível quanto assustador, e algo que Sirius tentou não deixar ocupando em sua cabeça quando se acomodou em seu assento na sala de controle. O avião decolou, levando todo o time a bordo, e Yo-Yo e Bobbi terminaram de acertar o curso para São Paulo. Com aquele super-avião, a viagem não devia levar mais de cinco horas, talvez até menos. Sirius desejou que fosse um pouco mais lenta. Não achava cinco horas tempo suficiente para prepará-lo psicologicamente para o que estava por vir.

— Muito bem, todo mundo prestando atenção aqui — Mack chamou, acenando para a equipe e virando alguns monitores para eles.

Aos poucos, os agentes foram se sentando e se ajeitando nas cadeiras para ouvir o diretor falar. Sirius foi se sentindo cada vez menor, vendo inumanos e agentes treinados tomando seus lugares ao seu redor. Loucura. Isso era loucura. Devia estar em sua casa, escrevendo seus artigos, não em um avião de agentes secretos. Por que mesmo tinha aceitado isso? Ah é, porque achou que dava conta.

Porra, Sirius do passado. Que ideia!

Não tinha dormido nada de noite, passando a madrugada acordado à base de cafeína, um vício irônico considerando todos os problemas de insônia que já tinha. Sequer sabia qual dos dois tinha vindo primeiro, se a insônia de ansiedade ou o vício em cafeína, mas agora os dois estavam ali, para ficar. E ao menos a ansiedade se fazia muito presente naquele momento, fazendo-o balançar a perna vigorosamente enquanto encarava a tela projetada de Mack e resistia ao impulso de morder os dedos de nervoso. Precisava manter a calma. Bem dizia sua tia que não se ia conseguir resolver nada nervoso daquele jeito.

Sua tia… Sirius tirou o celular do bolso, abrindo a conversa com ela. O gif de bom dia daquele dia cuspia coraçõezinhos e ela tinha completado com “Te amo meu sobrinho !!!” embaixo, desse jeito mesmo, com um espaço e três exclamações. A visão era reconfortante, mas ao menos daquela vez não fez muito para diminuir os receios que o jornalista sentia.

Ele respirou fundo uma vez, duas, e colocou o celular no bolso. Tudo bem, era isso. Era hora. Tinha um trabalho a cumprir ali, e se Mack não achasse que poderia fazê-lo, não estaria ali. Só precisava manter a calma e confiar que daria tudo tão certo quanto Mack parecia acreditar.

O diretor projetou uma planta da mansão para onde se direcionavam na tela. A extravagância da mansão, um monstro de cinco quartos, piscina, hotel-cinema, elevador e sabe-se mais o que lá, pertencia a um conhecido do contato de Sirius, poderia muito bem ser político, traficante, miliciano ou tudo isso junto. No Brasil, nunca dava pra saber.

— A negociação vai acontecer nessa casa — Mack começou, ao ver que tinha atenção de todos sobre si. — Para garantirmos que tudo dê certo, vamos nos dividir em equipes, começando com Sirius e Agnes. As responsabilidades de vocês dois são de entrar na casa e fechar o acordo.

Sirius acenou com a cabeça, concordando, devagar. Sim, sabia que Agnes iria com ele. Ela tinha conhecimento tecnológico suficiente para atestar a integridade da bomba. Em tese, o disfarce dela era de cientista especializada, e estava ali apenas para esse tipo de conferência, mas a negociação mesmo era trabalho de Sirius.

— Vocês vão entrar disfarçados, as credenciais de vocês já foram impressas — Mack continuou, pegando duas carteiras em uma caixa na mesa e jogando para eles.

Sirius abriu a sua para encontrar uma identidade falsa escrita “João Paulo Menezes”, e a de Agnes para alinhar com o papel de cientista italiana, diria “Isabella Mongano”. Sirius tinha se surpreendido ao saber que a mulher falava a língua, mas até que viria a calhar. A chance de alguém falar italiano naquele local seria pequena, e poderiam acabar criando um canal de comunicação sigiloso entre eles, através de uma tradução no ponto em seu ouvido.

— O trabalho é simples. Entrem, se misturem, fechem negócio e saiam. Geralmente essas operações não dão errado — Mack continuou. — Mas, caso dêem, vocês vão ter reforços. Hunter, Clint e Bobbi também estarão disfarçados na festa, prontos para fazerem uma extração emergencial se for necessário. Porque Clint é famoso e Bobbi e Hunter são procurados, eles vão estar com máscaras de alteração facial. Prestem atenção nas roupas e rostos que eles vão estar usando para poderem se identificar na multidão.

Não que fosse muito fácil não reconhecer uma mulher da estatura de Bobbi em algum lugar, mas Sirius fez a nota mental assim mesmo de prestar muita atenção em quem eles eram e como estariam vestidos. Se precisasse ser removido do lugar às pressas, não queria ser incapaz de achar sua carona pra fora por não ter prestado atenção neles antes.

— Yo-Yo e Theo são a última linha de emergência — Mack concluiu. — Yo-Yo vai estar nos fundos para receber o pacote caso algo dê errado, e Theo vai ficar de tocaia em uma colina próxima com uma sniper para eliminar alguma ameaça se for necessário. Por fim, Niko, Erasmus e Adrian vão ficar em suporte aéreo junto comigo. Alguma dúvida?

Ah, sim. Várias dúvidas. Dezenas de dúvidas, mas não achava que “o que acontece se eu tomar um tiro na cabeça” fosse o tipo de pergunta a qual Mack pudesse responder agora. E nem achava que queria a resposta para isso. Não, era melhor deixar tudo isso de lado e se focar no melhor cenário, no lindo cenário no qual iam entrar, fazer a compra, sair, e ninguém nunca ia nem saber da estadia deles ali. Não custava sonhar, não é?

— Ótimo — Mack concluiu, ao ver que ninguém tinha perguntado nada. — Temos algumas horas até chegar no destino. Usem para conversar com seus grupos e acertar detalhes. Adquirir essa bomba hoje é muito importante, vamos cuidar para a operação correr do melhor jeito possível.

Certo. Conversar com seus grupos. Acertar detalhes. Conversar não estava ali no topo da lista de coisas às quais Sirius gostava muito de fazer, principalmente com estranhos, mas se estava prestes a entrar em um churrasco de miliciano pra comprar um tráfico e teria apenas a alemã do seu lado pra servir de apoio, seria bom ao menos saber como ela se comportaria lá.

Ele girou na cadeira, encarando Agnes por um instante. Ela estava sentada em sua cadeira, com as pernas pra cima do painel à sua frente, comendo biscoitos e assistindo um vídeo de algo que ele reconheceu vagamente como um episódio de Star Trek graças às roupinhas coloridas, porque nunca tinha assistido o conteúdo em si. Sirius pigarreou, se aproximando um pouco bem devagar e buscando atrair a atenção dela de forma delicada.

Funcionou. Agnes abaixou o celular, se virando para trás e vendo Sirius ali. A forma como a mulher franziu a testa e esvaziou a expressão deixou muito claro que a interrupção não a tinha agradado muito. Sirius tentou não se irritar. Ela já tinha ido presa, entrar num churrasco de traficante devia ser um passeio no parque pra ela. Mas que a falta de empatia dela naquele momento era irritante, isso era.

— Qual vai ser seu disfarce, exatamente? Se me perguntarem, o que você está lá pra fazer?

— E faz diferença? Eu não vou estar lá falando outra língua?

De repente, Sirius se preocupou com o tipo de besteira que ela cuspiria em italiano por achar que ninguém ia entender. E se alguém entendesse? E se alguma coisa desse errado? E se… E se…

— Olha, isso pode ser outra segunda-feira pra você, mas eu só fazia espionagem pequena, tá? Eu me envolvi em uma mutreta grande uma vez e puff, to aqui. Então, por favor, não complica.

— Tá certo — ela respondeu, suspirando. — O que você quer saber?

O que queria saber? Por onde começar?

— Hm… Algum código de conduta de ladrão que eu deva conhecer para não fazer cagada lá dentro?

— Um. Não rouba os caras.

Sirius levantou uma sobrancelha, bem devagar, esperando algum complemento. Não veio. Então ele olhou atordoado para a maleta de dinheiro falso em cima da mesa da sala de comando, esperando para ser trocada pela bomba, e quis surtar e berrar na mesma hora.

— Não é isso que estamos indo fazer?

— Ah, é. Mas idealmente eles só descobrem depois que você já foi embora.

Certo. Não estava ajudando. Não estava ajudando nada. Sirius se levantou da cadeira sem dizer nada, Agnes voltou pro episódio de Star Trek dela e o jornalista decidiu ficar andando em círculos. Parecia mais produtivo.

E foi por alguns minutos, embora não tivesse o ajudado a se acalmar. Enfim, Sirius decidiu não ter o que fazer a não ser rezar, e se sentou de volta em sua cadeira, esperando o avião camuflado pousar em seu destino.

As horas passaram rápido demais para ele. Quando se deu conta, faltavam apenas poucos minutos para pousarem, e Mack passou na sala de comando dizendo a todos para se prepararem. Se preparar, no caso de Sirius, foi vestir uma polo com bermuda no maior estilo burguesinho brasileiro, com direito a tênis branco e óculos escuro pendurado no pescoço. Agnes tinha ficado muito menos ridícula com o vestido longo florido dela, embora Sirius fosse o primeiro a dizer que não combinava nada com a mulher.

Pouco tempo depois, o avião pousou em um sítio abandonado alguns metros de distância da mansão. Clint, Bobbi e Hunter apareceram no hangar, usando rostos falsos, roupas igualmente brasileiras e, no caso de Bobbi, uma bolsa máxi que com certeza carregava uma boa quantidade de armas, talvez camufladas embaixo de um monte de maquiagens e afins. Sirius os encarou por talvez tempo demais, tentando ter certeza de não ser capaz de esquecer como eles se pareciam agora.

— O plano é simples, tem tudo para funcionar — Mack comentou, aproximando-se deles e entregando um ponto para cada um. Sirius colocou o seu no ouvido, surpreso pelo objeto caber tão bem julgando como fones de ouvido sempre caíam da sua orelha. — Sigam como combinado e estaremos indo embora tão rápido quanto chegamos.

Ou assim Sirius esperava.

— Boa sorte — Mack desejou, por fim, e Hunter, Bobbi e Clint saíram do avião juntos. Os três iriam entrar e se posicionar primeiro, cobrindo um bom território antes dos outros dois os seguirem.

Sirius ficou parado ali na rampa ao lado dos outros dois, sem saber o que falar ou como agir enquanto esperavam notícias. Não demorou para ouvir um breve som de estática no ouvido, e logo se deu conta de ser o canal de Bobbi, aberto para eles ouvirem.

Vestido bonito, madame.

Obrigada! A festa está muito bonita, senhor…

Ribeiro.

Ribeiro. Prazer em conhecer. Ana Clara Monteiro.

Sirius tentou disfarçar, mas acabou deixando o queixo cair do mesmo jeito. Tinha ouvido falarem sobre Bobbi saber português, e tinha esperado que ela soubesse se comunicar, apenas, mas minha nossa ela era boa. Fluente, facilmente. O jornalista piscou os olhos algumas vezes, chocado, ouvindo a conversa fiada da mulher com os outros até a comunicação com eles encerrar

— Ok, eles estão lá. É a vez de vocês — Mack anunciou, olhando para Sirius e Agnes.

Tudo bem. Sem pressão. Entrar, comprar, sair. Não era para ser difícil e não deveria ser, já tinha se infiltrado em muitos lugares antes. Ia ficar tudo bem.

Sirius pigarreou, ajeitando a gola da camisa e descendo da rampa. Agnes o seguiu, xingando as sandálias plataformas em seus pés, e logo os dois estavam em seu caminho.

Estavam desarmados, no sentido tradicional da palavra. Agnes tinha conseguido espremer um taser disfarçado de desodorante e um spray de pimenta disfarçado de batom na bolsinha dela, e Sirius mal tinha conseguido fazer o seu spray disfarçado de spray de menta caber na pochete de péssimo gosto pendurada nos quadris. Ainda assim, era melhor que nada, certo? Além disso, ele carregava a maleta de dinheiro falso a qual usariam para pagar a transação, e mais nada.

Ele seguiu em silêncio, apertando e fechando as mãos enquanto caminhava e resistindo ao impulso de murmurar pelo caminho que tudo ia ficar bem. A última coisa em sua lista de necessidades imediatas era pagar um mico desses na frente de Agnes, mas já desconfiava dela ter percebido muito bem o nível de nervosismo dele. Era tarde para isso. Ainda assim…

Os dois caminharam por poucos metros de um passeio de pedras até chegarem na portaria da mansão. Lá, um segurança estava esperando com uma lista na mão, e foi o primeiro momento no qual Sirius sentiu o coração acelerar.

— Documento? — O homem pediu, em português, e Sirius sentiu as mãos começarem a tremer.

Ele enfiou a mão na pochete, tirando o documento de identidade falso feito para ele, torcendo para passar, mesmo sabendo que seria um tanto impossível uma falsificação da S.H.I.E.L.D. não ser aprovada ali naquele fim de mundo.

Como era de se esperar, o segurança não viu nada demais no documento de Sirius, embora tivesse se prendido um pouco demais na carteira italiana de Agnes. A mulher cruzou os braços, parecendo enfezada, e Sirius temeu de repente ela cogitar fazer algo que colocasse tudo a perder. Não a conhecia o bastante para saber como ela agiria sob pressão.

— Itália? — O segurança perguntou, devolvendo o documento, desconfiado.

— Engenheira. Veio me auxiliar com questões técnicas em uma aquisição.

Sirius sequer soube como conseguiu falar tudo isso com a expressão séria. O segurança os olhou por mais um instante de cima a baixo, com a mão sobre a pistola presa ao coldre. Por fim, pareceu decidir que a intenção dos dois era legítima. Ele pediu as bolsas para revistar, parecendo não achar nada de estranho em algumas maquiagens e um spray pra bafo de cebola, e por fim, relaxou, abrindo o portão da cerca do sítio.

— Divirtam-se.

Sirius ficou tão aliviado com isso que por muito pouco não entrou correndo propriedade adentro, e isso sim seria muito suspeito. Ele ouviu a grade se fechar atrás de si e correu os olhos pelo que via em sua frente. Um enorme e luxuoso jardim se estendia pela frente da propriedade, enfeitado com mesas e mais mesas, e um cheiro forte de churrasco subia pelo ar. Churrasco dos bons, mas Sirius estava tão nervoso que não conseguia nem pensar em comida agora. Chegou até a ficar nauseado.

— Precisamos nos misturar — Agnes comentou, caminhando para a frente sem esperar por ele. Sirius correu para conseguir a acompanhar. — Ali, Harpia está debaixo da varanda, vê?

O brasileiro desviou o olhar para a varanda dos fundos, vendo Bobbi casualmente escorada contra a cerca, conversando com dois homens aleatórios. Não viu Clint ou Hunter em lugar algum.

— Quem estamos procurando mesmo? — Ela perguntou, ainda andando e chegando perto de um garçom que passava com algumas carnes na bandeja. Agnes espetou um bom pedaço de maminha sem cerimônia, e Sirius se perguntou como ela conseguia comer agora. Ele sentia que ia vomitar.

— Esse cara — ele respondeu, abrindo uma foto no celular e mostrando pra ela. — Júlio Fonseca. Deve estar em algum lugar…

— Aham. Achei — ela comentou, do nada, apontando sem muita discrição para um sujeito conversando com duas mulheres atrás da piscina. E, sim, era ele.

Sirius sentiu o estômago afundar. Sem mais enrolação. Sem mais medo. Quanto antes acabassem com isso, melhor.

Ele respirou fundo e caminhou em direção ao vendedor com o máximo de firmeza e autoconfiança possível no momento, e se fosse ser bem sincero, não era um nível muito bom para nenhuma das duas coisas.

 

[...]

 

Seguir Sirius era um saco. Não que ele fosse um saco, Agnes não o conhecia bastante para isso, mas nossa, conseguia sentir de longe o cheiro de pavor emanado por ele. Embora isso pudesse passar como um comprador inexperiente fazendo o primeiro negócio ilegal dele, poderia também resultar nos vendedores tentando os passar para trás, e Agnes não tinha nem meio saco de paciência para isso. Ela tentou ignorar os passos mais ou menos trêmulos e a tensão nos braços de Sirius enquanto se aproximavam do homem para falar com ele, mas até ela estava começando a ficar nervosa de tabela.

— Júlio — Sirius chamou, e Agnes apertou seu comunicador, esperando para contar com o apoio do avião para traduzir aquela falta de noção em português para ela.

O tal Júlio abriu um sorriso enorme ao ver Sirius, abriu os braços e o chamou para um abraço apertado que Agnes esperou poder escapar, e apesar de realmente escapar do aperto, o abraço social ainda existiu, com dois beijinhos no rosto ainda.

Eca.

Os dois começaram a conversar e ela fez o seu máximo para não parecer muito impaciente. Como sabia falar espanhol, conseguia entender ao menos o contexto da conversa, mas se queria detalhes precisava esperar alguém abrir o bico no seu comunicador. Para sua não tão surpresa, quem fez isso foi Bobbi.

Tudo bem, Júlio parece bem empolgado com a venda. Eu diria que ele quer se livrar dessa bomba o mais rápido possível. Podem usar isso em sua vantagem.

— “Cosa ha detto, esattamente?” — Agnes perguntou, abrindo um sorriso simpático para Júlio.

O homem a encarou muito confuso, deixando bem visível que não entendia quase nada de italiano. Quase. Ele pareceu entender uma palavra.

— Exatamente, exatamente — ele respondeu, rindo. Então passou um braço pelas costas de Sirius e chamou os dois com um gesto de cabeça.

Que pé no saco — Bobbi comentou, no comunicador de Agnes. — Ele falou um monte de bosta. Te chamou de gostosa. Fez piada sobre tráfico, dinheiro ilegal. Me perdi no meio, tava um tédio. Mas agora ele tá levando vocês pra onde a bomba está. Hunter está por perto, vou mandar ele seguir.

Dessa vez, Agnes não poderia responder sem parecer que estava falando sozinha, então apenas deixou a comunicação cair. O homem guiou os dois para dentro da mansão, passando pela sala onde algumas pessoas bebiam e conversavam e depois para um escritório adjacente, que tinha um segurança na entrada. O tal Júlio abriu a porta, indicando para Agnes passar na frente em uma crise de cavalheirismo qualquer, e ela entrou, logo seguida pelos outros dois.

A porta se fechou atrás de si. Júlio se sentou na cadeira atrás da mesa presente no escritório, indicando as duas outras cadeiras para Agnes e Sirius se sentarem. Havia uma maleta em cima da mesa, e Sirius colocou a sua ali também, contendo o dinheiro.

Ele disse alguma coisa, Agnes pegou em sua analogia espanhola como “podem olhar a mercadoria”, entendimento confirmado quando o homem abriu a maleta da bomba e a virou para eles.

Os olhos de Agnes brilharam no mesmo instante como uma criança ao entrar em uma loja de brinquedos. Ali estava. Perfeita. Inteira, não utilizada, prontinha para ser desmontada, exatamente como estavam precisando. Ela estendeu a mão para a mala, pegando a esfera prateada com muito cuidado em mãos, girando-a e procurando o mecanismo de gatilho. O botão estava ali, ainda não pressionado.

— Diz pra ele que eu preciso abrir para conferir os componentes — ela comentou, em italiano, para Sirius, abrindo a bolsa e tirando uma chave de fenda.

Alguém devia ter traduzido para ele no comunicador, pois Sirius logo avisou Julio e o homem a deu permissão para mexer a vontade na bomba. Se a bomba tivesse sido adulterada, se estivessem sem terrígeno dentro ou se qualquer outra coisa tivesse sido feita com ela, não iria servir para eles.

O traficante abriu a maleta de dinheiro e começou a contar os reais falsos presentes ali. Ia demorar bastante para contar aquilo tudo, e Agnes só esperava que ele não olhasse as notas demais. Falsificar dinheiro era difícil. Clint se orgulhava de conseguir fazer um trabalho quase perfeito mas, bem, quase. Principalmente com um papel moeda o qual nunca tinha trabalhado antes em sua vida. E, por falar em Clint, a voz dele soou em seu ouvido naquele instante.

— O dinheiro tá passando?

— Até agora — ela respondeu, em um tom de voz que indicava poder estar resmungando consigo mesma enquanto analisava a bomba.

Agnes conseguiu, enfim, abrir a tampa superior. Ela colocou os parafusos de lado, tirando agora um monóculo do bolso e o usando para começar uma análise mais minuciosa do interior dela. Os cristais de terrígeno estavam lá, conseguiu ver muito claramente. O dispenser de água estava vazio, mas isso não era problema, água qualquer um podia colocar na bomba. Era colocar água, apertar um botão e bum. Terrígeno para todo lado.

Agnes abriu um sorriso talvez até um pouco largo demais. Perfeito. Não havia meio parafuso fora do lugar naquela bomba, era tudo o que precisavam.

È perfetto, João — ela informou, começando a parafusar a bomba de volta para guardar. — Ottima acquisizione.

Mais uma vez, alguém devia ter traduzido aquilo para ele no comunicador, ou o cognato para português era fácil de entender, porque Sirius reagiu na mesma hora começando a balançar a perna embaixo da mesa. Tudo bem, a bomba era ótima, só faltava Júlio terminar de contar o dinheiro agora. E aceitar, é claro. E então poderiam dar o fora dali.

Agnes fechou a maleta, com calma, guardando o monóculo e a chave de fenda na bolsinha. O desespero de Sirius estava começando a ficar mais e mais aparente, e Agnes decidiu passar a mão para a coxa de Sirius, apertando-a debaixo da mesa em um pedido silencioso e desesperado para ele parar de balançar aquela perna maldita como se fosse um pinscher de tanta tremedeira.

Adiantou, mas ela não ousou soltar a perna dele enquanto Júlio não terminasse de contar aquele dinheiro. O homem passou tranquilamente pelos últimos dois maços de reais, contando uma nota de cada vez, e enfim, pareceu decidir que tudo estava sob controle. Ainda bem. Se precisasse sair dali correndo com a maleta da bomba sem terminar a compra de forma oficial, faria isso, mas era melhor lidar com tudo com a menor dose de dor de cabeça possível. O homem fechou a maleta, sorridente, levantou e estendeu a mão para apertar a de Sirius. Seu colega se levantou, quase às pressas, estendendo a mão para apertar a de Júlio, e foi nesse momento, nesse fatídico momento que tudo deu terrivelmente errado.

É claro que daria errado. Agnes não sabia porque tinha imaginado aquela situação correndo de forma tranquila quando Murphy já tinha dito que se algo tinha chance de dar errado, ia dar errado, e ponto final. Se isso servisse para ensinar algo às pessoas, sendo impossível ensinar que não tinha como prevenir de todas as coisas do mundo dessem terrivelmente errado em algum ponto, que ao menos servisse para ensinar as pessoas a se precaverem.

Precavida ela estava, ou assim queria pensar, até entender a parte de ter subestimado exatamente o quanto poderia dar errado. A porta do escritório se abriu de repente, e um dos seguranças da festa olhou para ela por um instante. Para ela. Diretamente. E Agnes conhecia vários tipos de olhares diferentes: os de flerte, os de raiva, os de indiferença, e aquele, de superioridade. De peguei você. E aquele olhar queria dizer muito mais do que simplesmente “eu sei que vocês estão tentando passar a gente para trás aqui”. Não, era para ela, em específico. Muito em específico.

Fodeu. O cara a conhecia de seus não tão gloriosos dias de crime.

O segurança chamou Júlio para fora e começou a conversar com ele do lado de fora, deixando uma Agnes desesperada e o um Sirius atordoado para trás. Não havia tempo para lidar com a lerdeza de Sirius agora. Precisavam agir, e rápido. Muito rápido.

Agnes pegou a maleta da bomba, a entregando para Sirius.

— Segura. Deu ruim. Você sabe brigar?

O quê?? — O homem perguntou, de repente, abraçando a maleta contra o corpo em uma reação involuntária. — Brigar carregando um explosivo? Não! Nem sem o explosivo!

— Não se preocupe, não ativa sem água. Fica quietinho ali no canto da sala, fica — ela recomendou, tirando o taser—desodorante da bolsa e arrancando a tampa, ficando parada de frente para a porta.

Quando aquela porta abrisse, não podia pensar demais. Se dessem sorte, seria um cara só. E Hunter estava por perto, ou ao menos Bobbi disse que estaria. Precisavam contar com isso.

Agnes ativou o comunicador, apoiando-se contra a mesa em posição de defesa.

— Deu ruim meu povo — ela comentou. — Hunter está por perto?

Mais ou menos. O que aconteceu?

— Acelera essa bunda inglesa sua, antes que decidam colocar eu e Sirius na vala. Rápido, de preferência.

Ela cortou a comunicação antes de ouvir resposta, porque não queria ninguém falando em sua cabeça para desconcentrá-la agora. Precisava prestar muita atenção no que ia acontecer. Muita.

Agnes se manteve firme no local, até a porta ser escancarada por um segurança.

Ela não pensou duas vezes. Não podia pensar, não sabia lutar igual esses especialistas doidos sabiam, só sabia defesa pessoal porque acabava sendo útil e necessário em sua linha de trabalho para situações como essas. O segurança levou a mão ao coldre e antes dele conseguir sacar a arma, Agnes apertou um botão do taser, ligando-o e se jogando contra o cara.

Ela acertou o taser no rosto dele, um dos únicos lugares que achou com pele exposta e provavelmente ia deixar uma bela marca na cara do sujeito, mas não estava nem aí, talvez ficaria triste em não poder ver o quão feio ele aparentaria depois. O homem tombou pra trás com o impacto, começando a tremer e caindo no chão do lado de fora do escritório. De repente, ela estava sentada em cima do segurança, uma senhorita de vestido atacando um homem com um desodorante enquanto o grupo de convidados da sala a encarava como se ela fosse completamente insana.

Ok. Passo dois.

Agnes arrancou a arma do segurança do coldre, empurrou o corpo para longe com toda a força reunida no momento, voltou para dentro da sala e fechou a porta. Sirius estava com o queixo caído, talvez até um pouco assustado, mas Agnes não ligava muito realmente. Tinha acabado de salvar a pele dos dois e conseguido uma arma no processo, ele podia agradecer depois. Ou até mesmo podia agradecer ali, contanto que ajudasse no pequeno plano dela e não a deixasse fazendo tudo sozinha.

— Me ajude com essa mesa. Rápido!

Ela deu a volta na mesa, começando a empurrá-la em direção à porta. Levou alguns segundos para Sirius sair do estado de estupor dele, mas logo o homem se inclinou, ajudando Agnes e fazendo força com as costas. O bendito móvel era de madeira maciça, ridiculamente pesado para um móvel de escritório e muito ideal para barricar a porta.

Terminaram de empurrar no instante exato. Outro segurança tinha acabado de tentar abrir a porta quando finalmente a mesa bloqueou a entrada de vez, e os dois se afastaram para trás.

— Ok, ótimo — ela comentou, ativando o comunicador mais uma vez.

— Ótimo???? — Sirius questionou, indignado. Ele parecia muito branco, tinha voltado a apertar a maleta contra o corpo e Agnes não achava ser uma medida de segurança para não perdê-la, era para não ficar com os braços tremendo mesmo. — Estamos presos dentro de um cubículo com três seguranças assassinos do lado de fora! Como foi que descobriram a gente?

— Acidente, fazer o que, acho que eu tenho o rosto famoso no mundo do crime.

Impressionante o quão azarados tinham sido de acabarem esbarrando com um ex-associado de Agnes naquele lugar. Do outro lado do mundo. Mas que merda de histórico pra se ter agora...

— Gente, ideias? — Ela perguntou, com o comunicador ativado.

A ideia óbvia era a janela. Agnes a escancarou, olhando para baixo e percebendo muito frustrada que, apesar de estarem no primeiro andar, o terreno abaixo do térreo tinha sido rebaixado naquele lado da casa. Uma queda daquela altura não ia quebrar as pernas, mas podia torcer um pé, e isso não ajudaria em nada principalmente quando precisassem correr, e sim, ela tive certeza de futuramente eles precisarem.

O que cacetes vocês fizeram? — Hunter perguntou, no comunicador, e pelos sons ele estava em combate ativo com alguém. — Harpia, Gavião e eu estamos tentando chegar aí no escritório. Continuem aí dentro, entenderam? E esperem. Estamos chegando.

Um barulho de soco soou, e a comunicação caiu.

Não podendo sair pela janela, não era como se pudessem ir para qualquer outro lugar de alguma forma, então Agnes respirou fundo, exausta e frustrada, e se sentou em cima da mesa como se estivesse em casa. Sirius ainda parecia um fantasma do outro lado da sala, atônito e anestesiado com aquela situação que ele torceu muito para não precisar presenciar.

Infernos. Mack tinha pedido a ela para ser babá do cara, e ela não estava fazendo um trabalho muito bom, estava?

— Cara, fica tranquilo. As coisas darem errado em missão de tráfico assim é normal. É pra isso que tem backup. Você acha mesmo que esses seguranças de bosta vão dar conta de um militar mercenário, uma agente secreta e um vingador? Relaxa.

Ele não parecia muito relaxado. Agnes respirou fundo, contendo-se com bastante força de vontade para não revirar os olhos. Por pior que fosse lidar com gente inexperiente, pior ainda seria a parte de sair dali servindo de babá para Sirius porque ele estava aterrorizado demais para correr sozinho. Só faltava carregar ele no colo, isso seria humilhante.

— Sirius, olha pra mim — ela ordenou, levantou-se da mesa, parou na frente dele e segurou o rosto do homem com as mãos de frente para o seu, forçando-o a encará-la. — Se controla. A gente vai ficar bem, vamos sair daqui de boa. Mas você precisa conseguir correr sozinho pra isso, não dá pra te carregar, tá legal? Pelo amor do universo, não congela agora!

Ele concordou, muito devagar, com a cabeça. Por agora, ia ter que servir. Era melhor ele conseguir correr quando aquela porta fosse aberta, ou Agnes sairia correndo ela mesma e ele com certeza ficaria para trás.


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Notas finais do capítulo

Link pro grupo de whatsapp: https://chat.whatsapp.com/DrHNqXKPp8cBfLb7UGgbAL

Considere favoritar essa fic e Homem de Gelo também. Vai deixar meu coração bem quentinho ♥

Além dessa, tenho vagas também para uma interativa original sobre revoltas civis. Acesse aqui:
https://www.spiritfanfiction.com/historia/a-rosa-do-tempo--interativa-19350882/

Considere também dar uma olhada nas minhas outras histórias? :D Eu tenho coisas para vários gostos ^^

Leia a duologia Hunters! Comece aqui: https://fanfiction.com.br/historia/771022/Hunters_Hunters_1/

Leia minha original de fantasia urbana, Carmim! https://fanfiction.com.br/historia/787245/Carmim/

Leia minha fanfic de Harry Potter! https://fanfiction.com.br/historia/781763/Marcas_de_Guerra_Historias_de_Bruxos_1/
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