Dinastia 2: A Coroa de Espinhos escrita por Isabelle Soares


Capítulo 11
Capítulo 11




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A princesa olhava por trás das cortinas e via a plateia se ajeitar em seus lugares. A gravação do programa iria começar em instantes. Ela estava nervosa. Pegou na testa e começou a sentir que a maquiagem iria se esvair toda antes mesmo que ela entrasse no palco.

Não sei por que eu aceitei esse convite! Talvez eu ainda possa desistir.”. Mas antes que ela dessa qualquer passo, o apresentador tocou-lhe o ombro e lhe deu um sorriso.

— Vamos começar em breve, ein?

— Ok. – Renesme falou meio receosa.

Ela respirou fundo mais uma vez e lembrou o quão importante era essa entrevista. Emily, a secretária particular de Bella e de alguma forma de Renesme também, olhou para a princesa como se adivinhasse que ela estava pensando em andar para trás.

— Não vá desistir!

Renesme olhou pra baixo e começou a caminhar de um lado para o outro.

— Não vou. Foi eu que aceitei dar a entrevista.

Depois do episódio do discurso, ela tinha resolvido jogar tudo para o alto e enfrentar tudo de uma vez. Certo que sua imagem ficou acabada naquele instante e era preciso que alguma coisa fosse feita. Ela passou dias remoendo esse assunto. Noites sem dormir pensando o quão sério a sua declaração tinha atingido a imagem de sua família. Isso era tão inadmissível! Ela não queria ser responsável por qualquer coisa que acontecesse de ruim. Nem mesmo ela seria capaz de entender o que estava acontecendo com si mesma. Esse não era o futuro que ela queria encontrar depois de passar anos se preparando para assumir suas responsabilidades como princesa real.

  O pessoal do escritório se reuniu com Renesme para decidir o que fazer para reverter à situação. Ela estava disposta a se abrir mais e fazer tudo que fosse preciso. Em algum momento ela tinha que deixar essa sensação de insegurança que estava a encurralando de lado. Se eles queriam conhecê-la, pois agora chegou a hora. E o seu primeiro grande ato seria uma entrevista num talk show.

Há muito tempo, um amigo seu e de sua mãe, Josh, que é apresentador, vinha a convidando para uma entrevista e ela sempre negava. Até que ele estreou num programa novo e veio falar com Bella para ver se havia alguma possibilidade para convencer a sua filha a dessa vez aceitar. Devido ao acontecido, nem precisou muito para que Renesme dissesse sim. É claro que ainda tinha toda a burocracia da liberação do palácio. Josh ainda teve que se reunir com ela e a sua secretária para decidir como a entrevista seria e quando iria acontecer. E agora tinha chegado o grande dia.

Além da sua aparição no programa, Bella também tinha conseguido um patrocínio com a Channel para apoiar as famílias com necessidade em Clarence e outras causas assistenciais. A Duquesa há anos tinha uma boa relação com a empresa. O falecido Karl Lagerfeld tinha pessoalmente a convidado para ser o rosto da nova campanha em 2014. Ela relutou bastante, mas acabou aceitando em troca de dinheiro para os seus projetos no Talk. Agora mãe e filha iriam lançar a nova marca de roupas e acessórios da Channel juntas.

Para a princesa foi um prazer ter esse momento ao lado da mãe. Apesar da timidez, tudo que ela fazia ao lado dela era divertido. As duas passaram o dia inteiro no estúdio tirando fotos com as roupas e acessórios da marca, mas nem parecia que tinha demorado tanto. Renesme se sentia tão feliz e tão solta que o tempo parecia não passar.

Porém, agora na gravação do programa era exatamente o contrário. Ela via por de trás das cortinas as pessoas vibrando a cada aparição de um convidado famoso ou com alguma piada que Josh contava e nunca parecia chegar a sua vez. Sua mão suava e tremia. Queria que tudo terminasse logo.

— Não vá dizer nada além do combinado, alteza. – alertou Emily. – Essa entrevista é importante demais. Qualquer coisa que diga vai ser levado muito a sério.

— Eu sei. Sempre não foi assim?

— Mas agora todos estão aguardando para ouvir a sua retratação. Você tem que ser simplesmente perfeita.

Renesme observava Emily desesperada demais em dizê-la como ela deveria se sentar, que imagem ela deveria passar para o público, que palavras deveria dizer. Não poderia haver um erro se quer. Nunca podia. Ela tentou lembrar de algum momento em que não teve suas roupas escolhidas por alguém ou algum funcionário do palácio a dizendo sempre como ela devia se comportar. A princesa sabia que essa busca desenfreada pela perfeição fazia parte do jogo. Ela era um membro sênior de uma família que deveria ditar para todo o país um padrão de vida. Sempre era tudo ou nada na perpetuação do poder.

De repente, veio à lembrança de quando morava nos Estados Unidos. Pela primeira vez em sua vida ela pôde andar nas ruas sem ser reconhecida, ou sem ter mil e um paparazzi a vigiando. Era uma sensação tão boa de liberdade que nem mesmo ela sabia como iria viver dali pra frente. Sua vida inteira ela esteve rodeada pelos muros do palácio com vários funcionários cuidado da vida dela. Mesmo que sua mãe por anos a tenha introduzido um pouco de realidade, não era suficiente. Nada era comparado a experiência que ela teve no exterior.

Mas quando voltou a pisar em Belgonia tudo tinha voltado à tona. Todo o peso da sua responsabilidade, toda essa busca por agradar sempre sem retorno algum. Ela tinha, no fundo, a ciência que todo esse medo do mundo exterior vinha dessa pressão que consumia a sua mente. Estar trabalhando com o seu avô no escritório era uma maneira de servir a realeza, mas também uma maneira de se esconder.

— Estamos no finalzinho do programa e eu quero chamar uma convidada especial. Ela que é um dos rostos mais conhecidos de todo o país, mas duvido que muitos saibam algo sobre ela. Porém, hoje nós vamos mudar isso por que ela gentilmente aceitou nos conceder uma entrevista. Quero que recebam com muita alegria, a sua alteza real, a princesa Renesme.

Palmas e mais palmas soavam por todo o estúdio. Renesme acenou timidamente e seguiu até a poltrona. Josh a recebeu com uma reverencia formal e ela sorriu, ele nunca tinha feito isso antes. Eles se conheciam há anos e nada disso era necessário. Renesme segurou a mão de seu amigo e olhou levemente para o público.

— Tem tanta gente aqui! – disse baixinho e nem pôde perceber se todos a tinham escutado. Bateu lhe uma preocupação. Já tinha dado o seu primeiro erro.

Josh segurou a mão dela com força e sentiu o quanto ela estava gelada.

— Primeiro, eu gostaria de agradecer você por estar aqui.

— Eu é que agradeço o convite. Para mim é um prazer! – Renesme falou tentando entrar no roteiro.

— Você tem noção de quantas pessoas estavam aguardando ansiosos por essa entrevista? Por que você é muito famosa! Seu nascimento foi aguardado e televisionado, aquela coisa toda. Toda sua vida você esteve diante do público, mas ninguém conhece você de verdade. Por quê?

— Bom... Eu sou muito tímida. Eu estou até tremendo no momento e acho que é por isso que eu não dou entrevistas.

— Esse assédio todo em cima de você te incomoda?

— É claro que sim! Eu entendo que as pessoas querem saber sempre algo sobre mim devido ao que eu sou e muitos dizem que a gente tem a obrigação de aceitar isso. Mas realmente não é fácil ser vigiada o tempo inteiro, seguir um padrão de regras, não fazer o que pessoas normalmente fariam...

— Mas eu acho que você soube se blindar, até certo ponto...

— Com relação a outras pessoas da minha família, sim. A principio, eu tive muita exposição e esse fato de me manter um pouco distante foi uma iniciativa que veio dos meus pais. Até para me proteger um pouco e quando eu fui crescendo, eu mesma fui procurando me afastar da mídia.

— E isso te permitiu ter um pouco mais de liberdade? Para viver uma vida pessoal ou isso é meio que impossível para uma princesa?

— Na verdade, eu tinha uma vida muito próxima do normal. Meus pais sempre me deram muita liberdade para que eu fizesse o que eu gostava. Tipo, eu pratiquei karatê por dois anos, fiz curso de artes, morei fora por um tempo, trabalhei. Então, tudo isso foi me ajudando a ter um pouco dos dois mundos, mas ser princesa é algo que é para sempre. Não sai de dentro de você.

Renesme sentiu um zumbido e depois a voz de Emily falando no ponto para ela. “Ei! Olhe para o público como ensaiamos.” A princesa arriscou um pouco a se virar e olhar para as pessoas na plateia. O seu estomago revirou e ela achou que vomitaria em algum momento. Mas seguiu respondendo como tinha pensado antes em dizer.

— Eu sempre me preocupei muito com o que as pessoas pensam sobre mim e isso me limita muito. Por que tudo que eu falo vira uma coisa muito grande e às vezes é mal interpretado. E realmente eu peço desculpas por algo que eu tenha dito e que não soou muito bem. Não foi com má intenção, acreditem.

— Deve ser realmente duro ter que ser perfeita o tempo inteiro, não é? Ainda mais com tantas expectativas em cima de você.

— É verdade e isso me machuca bastante, confesso. Por que eu fui treinada a minha vida inteira a não fazer e nem dizer nada errado e isso me deixa muito travada. – falou com sinceridade, sabendo que Emily gritaria em seu ouvido depois. - Eu estou tentando muito me desvincular disso. Estar aqui já me ajuda muito a tentar me aproximar mais das pessoas.

— Aproveitando essa oportunidade, que você está disposta a responder algumas perguntas, vou te fazer algumas bem pessoais, bem jogo rápido, só para a gente te conhecer um pouco mais. Pode ser?

— Claro!

A princesa mordeu os lábios e ficou ainda mais ansiosa. Isso não estava nos planos. Emily falava com ela no ponto o tempo inteiro para ela ter cuidado com o que ela iria responder.

— O que você queria ter mais não tem?

— Liberdade. – falou virando a cabeça. Emily já estava desesperada em seu ouvido.

— Uma coisa que você faz e que poucos sabem?

— Eu danço.

— Você dança?

— Sim, e é algo que eu realmente gosto muito de fazer.

De repente, o dia do blecaute com Tom surgiu e sua mente e a fez sorrir, como sempre a acalmando muito.

— Isso eu não sabia!

— Eu fiz balé quando eu era bem criança, mas quando eu estive na Itália, eu me apaixonei pela dança de verdade. Fiz até aulas de danças modernas.

— Bacana! Um sonho a ser realizado?

— Poder acordar de manhã ao lado de uma pessoa que eu ame muito e poder me sentir aliviada por tudo ter dado certo no final.

— Você está namorando?

Renesme deu um riso nervoso e abaixou a cabeça um pouco. Era uma pergunta sempre faziam, mas dessa vez foi impossível não lembrar do seu beijo com Tom. Há dias, ela vinha se sentindo culpada pelo que fez. Era óbvio que ele só estava querendo ser amigo e um bom profissional, porém, como sempre, ela tinha interpretado mal as coisas.

Ele até andava um pouco estranho com ela. Nesses dias, ele tinha pedido uma licença e ela estava com outro segurança. A princesa achava que ele estava a evitando. Ela não o julgava, mas tinha que confessar que sentia a falta dele.

— Não.

— O que um homem precisa ter para conquistar você?

— Não precisa muito. Apenas que ele me ame e que seja honesto comigo sempre.

Tom assistia a entrevista pelo celular. Ele tremeu ao ouvir a resposta dela e se sentia embaraçado com isso. No início achou que seria muito fácil trabalhar para ela, mas à medida que eles iam se conhecendo as coisas foram mudando. Por mais que ele não quisesse e se esforçasse, sentia um carinho por ela. Isso estava ficando inevitável!

Ele abaixou a visão do celular e viu que o homem que ele estava aguardando chegou. Tom o esperava em seu apartamento. Respirou fundo e abriu a porta. Achava que isso tinha que acabar, ambos tinham que se encontrar um local mais desconhecido. Uma hora esses encontros iriam chamar muita atenção.

— Ela me beijou. – Tom revelou de supetão.

— Isso é ótimo!

— Eu não sei bem se isso foi bom. Está fora do planejado.

— Não, isso é exatamente o tipo de coisa que devia acontecer.

— O que devo fazer?

— Se deixe levar. Corresponda os sentimentos dela e verá que será muito bom para você. Mas mantenha sempre o controle.

Tom pensou que não seria difícil fazer isso, mas tinha medo de onde ele chegaria com esse envolvimento. Não era difícil se apaixonar pelo jeito doce, responsável e simpático da princesa. Por um lado, ele achava que seria melhor não se envolver.

— Mas lembre-se. Continue de olhos abertos.

— Sim, é claro.

O homem se levantou e deixou em cima da mesa um envelope para Tom. Ele pegou e o guardou enquanto observava o distanciamento daquele que ele imaginou que era o seu salvador. Aquele que ele admirou por um bom tempo. Mas nesse minuto, o segurança imaginava que as coisas tinham chegando longe demais. Lá no fundo se arrependeu de certas atitudes, porém era algo completamente sem volta. Tinha que aguentar as consequências até o fim.


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