Por Que Os Dinossauros Morreram escrita por Napalm


Capítulo 1
A Verdadeira Razão Pela Qual Os Dinossauros Foram Extintos




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Como de costume, fui acordado de madrugada pela fome. Fui até a cozinha e me deparei com uma criatura enorme e horrenda – que, pelo título deste conto, era de se esperar que fosse um dinossauro. Mas não, a criatura era uma barata. Sabe? Uma barata? Pois é.

Por toda minha vida fui ensinado, principalmente pela minha mãe, que baratas são seres que induzem o pânico. A imediata reação histérica ao se deparar com uma barata nada mais é do que o único tipo de reação plausível para o momento. E meus vizinhos sabem que aprendi tais ensinamentos muito bem. Mas mesmo tendo minhas dúvidas quanto a legitimidade de minhas reações, ter que lidar com uma barata é indiscutivelmente sempre um fardo. E eu vou, sem qualquer viés, explicar o porquê.

A partir do momento que o seu caminho se cruza com o de uma barata, nada mais te resta a não ser se munir e fazer algo sobre a situação. Você não pode simplesmente dizer “ah, depois eu lido com isso” e voltar para sua cama. É um problema que não pode ser deixado pra depois. E o problema que não pode ser deixado pra depois é o mais detestável dos tipos de problema. Você viu a barata? Acabou a paz. Todo ato a partir daí precisa ser um ato de guerra, visando o fim da vida da barata. Virar-se para o lado pode significar perdê-la de vista. E se você perdê-la de vista é arriscado que a próxima vez que você a encontre seja durante o sono, enquanto ela entra na sua boca aberta e roncante. E você, pessoa sensata, não vai querer correr esse risco.

Há então todo o sofrimento de ter que perseguir a barata por vários cantos da casa. Alguns cantos você já nem lembrava que existiam. Você descobre, com imensa tristeza, que é possível uma criatura enorme se esgueirar por caminhos onde nem o vento você imaginava ser capaz de perpassar. E quando você finalmente vence o embate, você pensa “pronto, problema resolvido. Espero, com fé divina, nunca mais ter que passar por algo parecido na vida”. Mas logo em seguida – logo no milésimo seguinte, você descobre que tudo que aconteceu até ali foi só a metade do problema. Porque a outra metade haveria ainda de vir, destrutiva como um meteoro. Um meteoro daqueles que supostamente teriam varrido os dinossauros da face do planeta há, sei lá, zilhões de anos atrás. E essa outra metade nada mais é que a pesada carga filosófica de se perguntar: por que as baratas fazem tanta questão em ficar vivas?

Por quê? Por quê? A curiosidade é irrefreável.

Já me deparei com pessoas cuja vontade de sobreviver não chegavam aos pés da vontade de sobreviver de qualquer barata que exista. E nenhuma dessas pessoas tinham um cotidiano tão ruim a ponto de se igualar a qualidade de vida de um itinerário que consiste em se esgueirar eternamente pelas sombras e comer lixo. E certamente este não é um estilo de vida que te faz querer continuar vivo.

Inconsolavelmente você despeja o cadáver da criatura em algum lugar longe da sua visão. Senta-se então na cadeira da cozinha e não faz nada além de ponderar o quão estúpido é uma barata querer tanto viver.

O dia a dia de uma barata não passa de um constante terror por perder a vida e o objetivo de tal vida é não ser morta. E o mais impressionante é que elas cumprem esse objetivo excepcionalmente bem. Elas estão aí desde que o mundo é mundo e provavelmente a humanidade vai deixar de existir bem antes da última barata bater as botas. E então a Terra apocalíptica haverá de estar lá, sendo puro lixo e destroço, com uma imensa camada de radiação verde pairando sob a atmosfera, enquanto as baratas reinam sobre um planeta onde só elas mesmas existem, sem sequer terem consciência de tal fato.

Mas não para por aí.

Logo chega aquele questionamento que te faz coçar ainda mais o queixo: “Será que a barata possui a consciência do verdadeiro sentido que a vida foi feita para ter? E, por conseguinte, o sentido da vida na Terra é simplesmente este: o de sobreviver?”. O não-saber é doloroso.

Porém, depois de meia hora encarando os utensílios da cozinha, que foram mais cedo pisoteados pela barata agora morta, é possível chegar a conclusão de que tal objetivo não pode ser o sentido universal da vida.

Existiram, sim, criaturas nesta terra que simplesmente tinham outro sentido para suas vidas. Sobreviver estava em segundo plano. Tais criaturas não só morreram, como também se extinguiram, vide tão longe estava, para elas, sobreviver de uma meta de vida. E essas criaturas foram ninguém mais, ninguém menos, que os dinossauros.


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