Contraste escrita por isa


Capítulo 1
(Des)semelhanças


Notas iniciais do capítulo

Olá! :)
Pra mim é uma alegria estar escrevendo essa nota porque significa que eu tenho de fato uma oneshot pra postar, haha. Quando eu animei Winnie e Anny em relação ao projeto, ainda era meio do ano e eu nem sabia que dezembro ia ser o mês mais turbulento de todos. Apesar dos pesares, cá estamos. O projeto já tá quase chegando ao fim e é uma honra contribuir com essa besteirinha :) espero que a leitura valha a pena e que vocês tenham um excelente fim de mês.
Deixo, por fim, meus votos sinceros de um ano novo possível para tds nós ♥



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O tempo havia permitido que fosse quase estranho pensar naquele início em que, a princípio, eles não poderiam concordar um com o outro nem se fosse para salvar a própria vida. Não nos enganemos: Hermione Granger continuava sendo, em muitos sentidos, a pessoa metódica, um tanto crítica e bastante incisiva que havia subido no expresso para Hogwarts aos onze anos. Do mesmo modo, Ronald Weasley ainda tinha uma porção da personalidade insegura e distraída de sua versão infante. Isto é dizer, em outras palavras, que o material de que Hermione era feita e o material de que Ron era feito ainda contrastava como dia e noite, mas isso não havia impedido os múltiplos desdobramentos da personalidade de ambos – individualmente e como casal.

E a verdade é que eles haviam florescido em áreas diversas, como é comum na passagem da adolescência para a vida adulta. E também haviam crescido muito juntos – o que também acontece quando se está junto há muito tempo. Assim, contra todas as expectativas iniciais, eles se tornaram, em parte, uma unidade curiosa. Eles sabiam identificar o humor um do outro há um raio realmente longo de distância só de se olharem. Ron tivera tempo de sobra para compreender a extensa lista de coisas que deixavam Hermione azeda e Granger, por sua vez, havia adquirido um tato até então insuspeito para alguns gatilhos afetivos do namorado.

Eles completavam as frases um do outro quando estavam juntos. Ron havia roubado sua expressão taciturna quando estava concentrado e Hermione havia tomando emprestado o sorriso enviesado quando precisava sair pela tangente ou parecer um pouquinho menos séria do que de fato era. Dividiam o gosto em comum por algumas séries trouxas e Weasley era capaz de falar com propriedade sobre um monte de livro que nunca tinha lido apenas por ter escutado com atenção as análises minuciosas de Hermione a ponto de poder opinar sobre também.

E havia os detalhes: ninguém no mundo sabia colocar a quantidade adequada de açúcar no café ao gosto de Ron como Hermione. Nem ele próprio. E ela podia jurar a qualquer um que se interessasse que ele cozinhava a melhor pizza de marguerita que ela já experimentara na vida. Quando ela estava muito estressada com o estágio no ministério e o acumulo de trabalhos na faculdade trouxa que insistira em cursar, a única coisa capaz de lhe regular o espírito era uma volta de carona na vassoura de Ronald pelo quarteirão. Era espantoso o quanto Hermione não tinha gosto nenhum pelo ato de voar em si, mas adorava cada um desses passeios, geralmente noturnos, onde apenas observava o céu e os telhados enquanto segurava firme a cintura do amigo e namorado.

E nessa ordem mesmo, respeitando o primeiro substantivo, porque eles eram, antes e depois de tudo, amigos. Se o interesse romântico ou a tensão sexual da adolescência tinha posto em xeque a verdadeira natureza do relacionamento em algum momento, não havia espaço para dúvidas agora. Sim, eles tinham discussões infindáveis as vezes. Sim, o conhecimento que tinham sobre o outro nem sempre era usado apenas para o bem – Ronald sabia provocá-la e Hermione nunca fora tão afiada em rebater a altura.

Mas a parte das brigas de estimação, não havia ninguém tão disposto a proteger a retaguarda um do outro com tanto afinco ou motivação. Quando Ron começou a ter duvidas sobre o que estava fazendo da própria vida no treinamento dos aurores e quando foi ficando mais e mais miserável a medida que o tempo passava, Hermione foi a primeira a verbalizar o que ele vinha ruminando no fundo da mente sem nunca ter coragem de contar a si mesmo:

Estava tudo bem mudar de ideia.

Foi só quando ela disse isso – com tanta naturalidade e tanta preocupação-amorosa nos olhos que Ronald notou o quanto os ombros estavam moídos pelo peso da tensão que vinha carregando. Ele vinha guardando tanto medo de decepcionar ela e os pais e todo mundo que conhecia que mal conseguiu expressão em palavras o tamanho da gratidão que sentia.

Hermione ficou do lado dele durante todo o processo de tomada de decisão e anúncio e rebateu a todas as deliberações ansiosas de Molly sobre o que ele faria com respostas gentis, mas firmes. Ela lhe deu o espaço necessário e guardou a própria ansiedade em uma caixinha discreta do fundo da mente para não acumular com a dele. Quando Ron decidiu que assumiria a loja junto com George, Hermione sorriu – um sorriso muito parecido com o que ele mesmo havia lhe aberto quando ela anunciara que faria sua aplicação para uma universidade trouxa.

E eles continuaram sorrindo um para o outro em pequenas e grandes decisões, como quando, duas estações depois de entrar nos negócios com o irmão, Ron precisou passar alguns meses fora supervisionando a nova filial que eles abriram na América do Norte. Não foi a primeira vez que ficaram longe um do outro, nem a mais longa, mas pareceu o suficiente para dar a ambos uma nova perspectiva a respeito do que eles já sabiam: no fim de um dia – ruim ou bom – era o rosto um do outro que eles esperavam ver.

Era a diferença entre as tonalidades de pele, o modo como a respiração ruidosa de Ron fazia par com a lenta de Hermione e o jeito como os pensamentos de um podia se emaranhar nos do outro e gerar conversas infindáveis sobre todo tipo de assunto corriqueiro ou importante. Era o jeito como ela descansava as pernas em cima das dele ou modo como as mãos se procuravam automaticamente. Todas essas coisas juntas produzia a calmaria necessária para uma boa noite de sono.

Todas essas coisas juntas faziam com que os dois ponderassem que podiam até divergir em uma centena de coisas, mas na principal, a que mais importava, estavam na mesma página: eles se queriam para a vida. Justamente pelo contraste: o modo como as personalidades se realçavam e se afirmavam até mesmo quando cediam espaço. O jeito como se incandesciam as melhores coisas nele e nela em razão do outro.

Era o suficiente para uma vida inteira.

— Você sabe, acho que nós deveríamos nos casar. – ela murmurou numa tarde qualquer, logo depois da volta dele, enquanto lia um exemplar de uma biografia alternativa de Morgana Le Fey.

— Você sabe, eu odeio quando sou obrigado a concordar com você. – Ron brincou, tirando os olhos da TV da sala (um hábito que havia adquirido com o sogro) para encarar os olhos castanhos bonitos que amava.

— Está decidido então? – quis confirmar, meio incerta. Havia uma parte sua, a parte acadêmica e racional que achava preocupante ceder para um padrão social heteronormativo compulsório com raízes tão pouco plausíveis baseadas em mulheres como moeda de troca e propriedade.

— Se você estiver me propondo, sim. – sorriu de maneira simples, como quem não se importava de assinar um papel ou de ouvir a ladainha da mãe e dos sogros pelo resto da vida pela falta de um documento oficial, contato que estivesse com ela. E era a visão dele em circunstâncias assim que acendiam em Hermione uma outra parte, muito mais abstrata e intuitiva que apenas tomava decisões baseada no que parecia certo para além de uma lógica cartesiana:

— Eu estou.

— Então eu aceito. – ele respondeu sem nem titubear.

E porque (se) aceitavam, tudo deu certo, mesmo nos momentos em que não deu. E porque se lembravam que, apesar das inúmeras coisas cotidianas que os misturavam as vezes fazendo deles dois uma única entidade como casal, eles eram diferentes, que foram capazes de, pelos muitos anos a frente, refazerem a mesma escolha vezes sem fim.


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