Until next Sunday... escrita por Aayumii


Capítulo 1
Until next Sunday...


Notas iniciais do capítulo

*AVISO IMPORTANTE DE GATILHO(mas não é nada pesado, talvez algumas pessoas apenas não gostem de ler): nos dias 12 de abril e carta da Bella*

Espero que gostem, e nos vemos nas notas finais.



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Era possível escutar In the feelings ao fundo enquanto Carlie arrastava Jane pela mão cada vez mais para os fundos da casa, indo para o pequeno galpão, onde ela sabia que ninguém iria incomodá-las. Tudo o que Carlie desejava para aquela noite era um pouco de sossego, ninguém nunca a avisou que ser uma caloura na universidade de Pittsburgh seria tão estressante, ainda mais sendo um legado.

—  Carlie, qual é. Estamos em uma festa. Podemos muito bem sentar ali no jardim. - Jane tentou mais uma vez parar a loira, que a ignorou pela terceira vez desde que deixaram a sala.

— Nem pensar, eu preciso, NÃO, eu necessito de uns minutos de paz, e se eu escutar Seth se gabar de outra boca que acabou de beijar ou alguém tocar Drake pela centésima vez não respondo por mim.

Jane já conhecendo o gênio teimoso da garota - ainda se perguntava de qual dos pais ela havia herdado - apenas suspirou se deixando ser arrastada até chegarem ao velho galpão.

Usando um pouco mais de força que o necessário, abriu a porta de madeira e já foi logo puxando a morena consigo. Não era a primeira vez do casal ali, mas não importava quantas vezes Jane já tivesse posto os pés naquele lugar, ainda não gostava de ficar lá. O cheiro de coisa velha incomodava seu nariz, a falta de espaço por todas as tralhas que as antigas e novas moradoras da república guardavam lá era absurdo e, acima de tudo, odiava como Carlie simplesmente parecia ir para outro mundo quando entrava no pequeno espaço.

— Paz, finalmente paz - disse jogando-se no único puff que havia no recinto - Sério Jane, mamãe estava certa quando disse que festas seriam a última coisa em que eu iria pensar quando entrasse para a faculdade. Eu até curtia no começo, mas agora, meu deus - levantou seus braços em descrença - se eu pudesse já teria alugado um dormitório só para mim e saído da república.

— Não, você não teria - Jane arqueou uma sobrancelha em direção a garota.

— Tá, talvez não, mas quem aguenta festa todo final de semana? Além de Tanya é claro!

— Todos que estão aqui? -  Sorriu ladino - Sua semana só foi cheia demais e você sabe disso, sabe que só precisa se trancar no seu quarto e ficar sozinha quando isso acontece, mas é medrosa demais para dizer às outras meninas.

— Elas não iriam entender, ninguém além de você e meus pais entendem - suspirou frustrada se encolhendo mais no puff.

— Eu sei querida, me desculpa - disse já se sentando ao lado da namorada e abraçando-a - Mas não vamos pensar nisso, ok? O que quer fazer? Só ficar agarradinha com a melhor pessoa desse mundo? - a apertou mais - Ou vai revirar esse lugar de cabeça pra baixo? Juro que não irei reclamar, considere isso uma exceção.

— Mas aí não é justo, eu só terei mais 3 exceções, e eu nem concordei com isso em primeiro lugar. - olhou-a desejosa.

— É pegar ou largar Carl, nós sabemos que de uma forma ou de outra é assim que nossa noite irá terminar. E minhas exceções com você já acabaram, nada mais justo que as suas acabem uma hora também.

Carlie ainda revirou os olhos e fingiu pensar, sabia que sua semana a desgastara demais e precisava de um tempo para limpar a mente, um tempo no seu próprio mundo, e nada a deixava mais feliz do que revirar as memórias que aquele galpão guardava.

— Ótimo, mas se você reclamar uma vez sequer, eu terei minha exceção de volta.

— Feito!

Jane esticou a mão para selar o acordo, mas foi pega de surpresa quando a garota se jogou em cima dela beijando-a.

— Prefiro selar nossos acordos assim - disse rindo ainda com os lábios perto da morena.

Sorrindo, Jane a empurrou para se levantar.

— Certo, feche os olhos e aponte para uma caixa.

Já em frente às várias caixas que o lugar guardava, Carlie perguntou à namorada. Era assim que decidia que caixa iria olhar, acreditava em destino, e sempre arrastava Jane consigo nessas loucuras, que mesmo que sem entender o porquê daquilo, amava a namorada o suficiente para não questionar.

Então apenas fechou os olhos, apontou para a esquerda e ficou rodando seu dedo como se estivesse pensando por um tempo, até o parar completamente em direção ao sul.

— Aquela, escolho aquela.  - Disse ainda sem abrir os olhos.

— Uau, 1998, ótima escolha! - Disse animada já puxando-a para perto da caixa. - Vamos lá, me ajude a pegá-la.

Carlie sempre amou história, desde pequena, não importava se fossem apenas histórias contadas por seus tios ou de grandes figuras do mundo. Por isso que decidiu seguir esse caminho quando entrou para a faculdade.

E foi assim que descobriu um dos seus maiores hobbies - passar horas revivendo o passado das antigas moradoras da república que vivia. A maioria das coisas eram livros da faculdade, panfletos de festa antigas e até mesmo objetos que, muitas vezes, ela nem sabia para que serviam. Mas, se alguém lá de cima resolvesse sorrir pra ela, encontrava diários antigos, muitos contendo histórias de amor, perdas e intrigas; e fotos, muitas e muitas fotos.

Ela amava todas elas, sempre criava uma vida por trás de cada uma e para ela não existia nada no mundo melhor do que aquilo.

— O que você acha que vai encontrar dessa vez? - Jane perguntou enquanto puxava a tampa da caixa - Espero de verdade que não seja mais nada sobre aquela Kate, sério, você ficou obcecada e eu tive que aguentar você falar sobre isso por semanas.

— Mas porque era incrível!! Você não se pergunta como ela está hoje em dia? Eu daria qualquer coisa pra ver se ela realmente largou tudo e mudou de país apenas para começar seu próprio negócio.

— Talvez, mas eu me sinto como se estivesse em um programa de fofoca, em que fico sabendo da vida de estranhos, enquanto eles não sabem nada sobre mim.

— Não é assim… - se encolheu, sabendo muito bem o que Jane pensava sobre seu passatempo.

— Me desculpa, eu prometi não te julgar mais e vou cumprir. Vamos lá, olha, esse tem uma agenda - disse já tirando o objeto esverdeado da caixa - Porque essas pessoas deixam essas coisas pra trás, afinal de contas?

— Talvez para esquecer o que tem dentro?

— Talvez.

Com isso, passou o objeto para o colo da outra, chegando mais perto dela. Jane podia ver o brilho nos olhos de Carlie ao tocar na agenda e ela estava certa, jamais tiraria isso da namorada.

Ao abrir a capa, se depararam com flores azuis enfeitando os cantos e no meio da página amarelada podia ler-se:

 

Esta agenda pertence à:

Isabella Swan

 

Carlie sentia o coração disparar e seus batimentos aumentarem a cada segundo, ela conhecia esse nome. O conhecia muito bem, para ser exata desde o dia em que nascera, já o escutara tantas vezes e de tantas formas que era impossível não o reconhecer, não importava onde estivesse.

— Carlie… - ouviu Jane chamá-la, mas não podia tirar os olhos da página à sua frente.

— Carlie… - tentou mais uma vez - esse não é o nome da sua m…

— Minha mãe - completou sem perceber.

A garota sabia que sua mãe havia estudado ali, claro que sabia, escolheu a Universidade de Pittsburgh justamente por isso, por sempre ouvir dos seus pais o quanto eles amavam aquele lugar.

Entretanto, nunca pensou que encontraria algo de sua mãe ali, sua adorável mãe, que fazia questão de guardar cada carta que seus familiares e amigos mandavam; sua fiel mãe, que nunca havia jogado nenhum dos seus trabalhos importantes de escola fora; sua acumuladora mãe, que se pudesse ter um quarto só para guardar todas as suas memórias, teria.

Então por que ela teria deixado algo assim para trás? Será que fazia parte de algo que ela gostaria de esquecer, como metade das coisas que estavam naquele galpão?

Será que ela o perdeu e nunca o encontrou, e um dia ele acabou vindo parar aqui?

Ou

Será que….

Sentiu seus ombros serem sacudidos, enquanto tentava a todo custo encontrar um motivo para o objeto em sua mão estar onde se encontrava.

— Carl, você está bem?

— O que isso está fazendo aqui?

— E eu deveria saber?

— Jane!? - A morena podia ouvir a frustração em sua voz.

— Foi mal, mas eu realmente não sei amor, ela é SUA mãe.

— Aí é que tá. - desviou os olhos da agenda - Mamãe não deixaria algo assim para trás.

— Por que você não pergunta para ela? Sabe que ninguém vai se importar se você levar a agenda com você, né? E convenhamos, essa não seria a primeira coisa que você pegou para si.

— Eu não posso - sussurrou.

— E por que não?

— Se está aqui é porque ela não queria que soubessem.

— Carlie, você não está fazendo sentido nenhum e eu não estou entendendo mais nada. É apenas uma agenda.

— Eu sei, mas é uma agenda da minha mãe. Minha mãe, sabe? Aquela que te mostrou todos os registros que tinha sobre mim no momento que te conheceu.

— Ok, ok - disse apenas para concordar com a garota, certos traços de Carlie nunca iriam fazer sentido. - E o que você vai fazer agora? Olhar? Guardar de volta? Levar até sua mãe?

— Eu ainda estou pensando - olhou fixamente as palavras.

— Carlie, nós duas sabemos que você está morrendo para olhar, apenas olhe, se não gostar do que achar apenas guarde de volta e vida que segue. É da sua mãe que estamos falando.

— Você está certa. - Se deu por vencida virando a página.

Domingo, 29 de março de 1998

Masen ainda está estranho, ele não me abraça mais e não consegue me olhar nos olhos quando estamos conversando, ele diz que é coisa da minha cabeça quando eu lhe peço explicações.

Isso está fazendo com que eu me sinta cada dia mais culpada pelo o “ocorrido”, mesmo sabendo que a culpa não é de ninguém, Rose trabalhou isso comigo por muito tempo para que eu não sucumba de novo, eu não posso.

MAS O QUE ELE ESPERA DE MIM?

O QUE EU DEVO FAZER?

Eu sinto que estamos nos afastando cada vez mais, apenas parece inevitável que não iremos sobreviver a isso... não a isso.

 

— Quem é Masen? - Jane perguntou assim que terminou de ler - seu pai não se chama…

— Quieta - disse já virando para a próxima página.

 

Domingo, 05 de abril de 1998

Depois de quase dois meses sem ir à terapia eu acabei voltando lá na terça passada. Rose ficou surpresa quando me viu, na verdade até eu fiquei surpresa por ter tido coragem de ir. Eu estava me controlando bem, estava conseguindo seguir com a minha vida, mas Masen tem estado cada vez mais distante e por mais que eu tente me convencer de que isso não tem nada a ver com o “ocorrido”, minha mente não me deixa em paz. Mas eu decidi ser forte, decidi que não iria me afundar de novo, por isso apareci no consultório de Rose sem avisar.

Conversar com ela depois de tanto tempo foi estranho, foi desconfortável a maior parte do tempo, mas estamos falando de Rose, e bem, no final eu acabei me abrindo sobre tudo o que vem me assombrando nas últimas semanas.

Contei que a culpa do meu relacionamento estar acabando era toda minha (Rose discordou, é claro).

Contei que o sonho voltou e que a frequência com que ele ocorre está aumentando de novo.

Contei que apesar de tudo, eu não quero mais passar pelo que passei nos últimos meses, não quero que isso me vença mais uma vez.

Talvez eu tenha chorado muito também, mas no final eu me senti mais leve, não como se tudo tivesse sumido em um passe de mágica, mas como se eu conseguisse respirar através de aparelhos outra vez.

E claro, voltarei a ver Rose toda semana.

 

— Meu deus, mamãe vê Rose desde 1998? 19 anos vendo a mesma pessoa?

— Deve ser por isso que ela sempre está nas festas de final de ano - Jane deu de ombros - e o que diacho é esse “ocorrido”? - fez aspas com as mãos - Bella nunca te disse nada sobre isso?

— Não - sussurrou com a atenção voltada para a agenda mais uma vez.

 

Domingo, 12 de abril de 1998

Eu me sinto sem forças até mesmo para escrever, sinto como se nada fizesse sentido.

Faz uma semana que não vejo Masen.

Ele não atende minhas ligações e nunca o vejo pelo campus. Preciso aceitar que nem isso me sobrou para ser feliz, eu não mereço o seu amor.

E a prova disso é que o sonho voltou, eu tive o mesmo sonho todos os dias desde que visitei Rose. Se eu fechar os olhos agora, consigo ver todo o sangue, consigo sentir a dor e depois a escuridão.

Infelizmente não sou forte o suficiente.

 

Domingo, 19 de abril de 1998

Masen terminou comigo, eu já esperava, mesmo assim ainda dói, acho que eu preciso aceitar que a dor agora faz parte da minha vida.

 

Domingo, 03 de maio de 1998

Bem, faz um tempo que eu não venho aqui, mas eu não queria pensar, não queria colocar a dor no papel, ela se tornaria mais real, já dói o suficiente, eu não preciso de provas do quanto eu não mereço ser feliz.

 

— Isso não é da minha mãe, isso não se parece nada com ela. - Carlie negava com a cabeça, enquanto sentia a garganta apertar. Nunca lhe passou pela cabeça que sua mãe pensaria isso de si mesma, nunca poderia imaginar que sua mãe um dia não se amou.

— Amor, se isso for muito pra você, apenas guarde a agenda, não se torture por favor. - Jane a abraçou.

— Não, eu quero continuar.

— Carlie, por favor…

— Eu tô bem Jane - ignorou o olhar reprovador da garota.

 

Domingo, 24 de maio de 1998

Eu sinto como se estivesse vindo aqui cada vez menos, e esse não é o objetivo. Rose me deu você para que eu pudesse exorcizar meus sentimentos, me livrar do que me sufoca, e bem acho que ela percebeu que eu não tenho feito isso ultimamente, e por um acaso ela achou que seria uma boa ideia eu me comunicar com pessoas que também sofrem por conta do luto. Ela disse que gostaria que eu pelo menos tentasse, que me faria bem conversar com pessoas que iriam me entender.

Eu quero tentar, eu vou me dar essa chance.

 

— Então mamãe perdeu alguém. Eu só me pergunto quem, meus avós estão vivos.

— Um irmão ou irmã?  - Jane sugeriu insegura.

— Não. Mamãe ou mesmo meus avós já teriam falado sobre isso em todos esses anos. Não tem como a vó Renée ter escondido isso por todos esses anos.

— Talvez fosse alguém ligado a esse Masen? Sua mãe mesma disse que ele estava estranho com ela desde o ocorrido, faz sentido, não faz?

— Pior que faz - a encarou - vem, vamos ver se mamãe comenta mais sobre.

 

Domingo, 07 de junho de 1998

Segui o conselho de Rose.

Fui me encontrar com um tal de Antoine essa quarta, na cafeteria perto do campus. No começo fiquei me perguntando o que eu tinha na cabeça para estar ali, se valeria a pena e como aquilo iria me ajudar a seguir em frente… mas confio em Rose.

Se eu falasse que não foi desconfortável eu estaria mentindo, não é como se ele fosse alguém ruim ou mal educado, muito pelo contrário, ele foi super simpático o tempo todo, tentava puxar assunto e até pagou a conta no final.

Mas como agimos com alguém que sabemos que só está ali para compartilhar algo que não quer ser compartilhado?

Como começar uma conversa com medo que a pessoa faça alguma pergunta que você não vai querer responder?

Por sorte nada disso aconteceu, ainda.

P.S: Ele tinha um sotaque engraçado.

 

— Meu Deus Carlie, isso está ficando cada vez melhor, agora eu entendo por que você gosta tanto de ficar mexendo nessas coisas, parece que estou lendo algo que provavelmente estaria na Netflix - riu sem perceber a cara de desagrado da garota ao seu lado.

— Isso é tão estranho... Eu sei que essa agenda é da minha mãe, mas nada aqui se parece com a vida da minha mãe - disse ignorando o comentário alheio.

— Mas amor, as pessoas mudam, você não pode esperar que a Bella que escreveu essas coisas seja a mesma que conhecemos hoje. Sem contar que nunca conheceremos alguém cem por cento, não é?

— Eu sei, é só.... - cortou o que ia dizer por não saber exatamente o que falar...

— Ei, que tal fazermos algo diferente?

— O que?

— Vamos fingir que não sabemos sobre quem estamos lendo. Vamos imaginar que isso é apenas um livro que pegamos na biblioteca, vamos deixar os sentimentos de lado, o que acha?

Carlie não queria fingir que aquilo tudo não se tratava da sua mãe, mas uma parte dentro de si pedia para aceitar a sugestão de Jane.

— Só vamos tentar ok? Se não der certo, não deu.

— Tudo bem Jane, tudo bem.

 

Domingo, 14 de junho de 1998

Encontrei o Masen hoje. Vi o Masen hoje com uma garota e ele parecia feliz.

No final o problema era eu mesmo.

 

— Por que ela pensaria isso de si mesma? - disse, nem um minuto depois que voltou a ler.

— Pelo amor de Deus, só continua lendo.

 

Domingo, 21 de junho de 1998

Talvez Rose esteja insistindo que eu encontre Antoine de novo, mas que dessa vez tente me abrir e fazer com que ele se abra também, ela continua acreditando que isso me fará bem. Ela disse que preciso tentar olhar para o futuro, não posso mais me prender ao passado, e conhecer gente nova é um dos caminhos.

Não tenho sonhado com tanta frequência e penso cada vez menos em Masen, talvez o fato de ter me afundando nos estudos tenha algo a ver com isso, se for, ótimo.

 

Domingo, 28 de junho de 1998

Okay, Antoine é uma boa pessoa.

Nos encontramos no mesmo café, ele parecia estar mais solto, me falou mais sobre si.

Fiquei surpresa quando descobri que ele na verdade nasceu na França (isso explica o nome), sem falar que é 2 anos mais novo que eu e ainda é calouro, pois entrou para a universidade 3 anos depois que se formou no ensino médio por problemas familiares. Ele ficou desconfortável depois disso, mas logo mudou de assunto.

Ele estuda Arquitetura e trabalha meio período em um bar perto da avenida Oakland, até me convidou para ir lá um dia, eu só concordei, não quis que ficasse chateado caso negasse.

Conversamos bastante, é fácil conversar banalidades com ele, o tempo passa rápido, no final trocamos nossos números e ele até pediu meu ID do ICQ, avisei que quase nunca entro lá, mas ele quis do mesmo jeito.

 

— É O PAPAI! - gritou entusiasmada pela primeira vez desde que começou a ler.

— Seu pai? Mas seu pai não se chama Edward?

— Sim, mas Antoine é seu nome do meio e ele é mais novo que mamãe, meu Deus Jane, tudo está batendo. Eu não acredito nisso. - voltou sua atenção para a agenda.

— Você acha que sua mãe vai contar das noites quentes que eles tiveram? - perguntou sacana.

— Eu vou apenas te ignorar. - resmungou, escutando-a rir alto.

 

Domingo, 05 de julho 1998

Tenho conversado com Antoine quase todos os dias dessa semana. Normalmente ele costuma me enviar um sms perguntando se estou ocupada e, se eu responder falando que não, ele me liga. A primeira vez que conversamos não passou de 10 minutos, ele apenas quis saber como eu estava e me desejou uma boa semana, entretanto, nossa última conversa durou mais de uma hora. Ele gosta de conversar sobre tudo, e às vezes solta umas informações aleatórias (graças a ele que fiquei sabendo que a Microsoft lançou um novo sistema operacional, e que agora posso trocar o meu) e posso dizer que sinto falta quando ele não liga, é estranho.

E bem… eu o visitei hoje, sentei lá por horas e contei sobre meus dias (Rose disse que seria bom pra mim) contei que Masen já não faz parte de minha vida, que ainda dói, dói muito, especialmente nos dias que eu sonho, mas que as poucos eu estou melhorando, até contei sobre Antoine e como ele é uma pessoa boa. Eu não queria ter ido embora, queria poder ficar lá com ele, onde deveria ser meu lugar.

 

— Pera, que? Ela visitou quem? - Jane a olhou confusa. - Eu achei que ela estava falando do Edward, como se fala de uma pessoa para ela mesma?

— Se você ficar quieta e continuar lendo, podemos descobrir.

— Mas nossa….

— Shiu.

 

Domingo, 12 de julho de 1998

Graças às férias, Antoine e eu temos nos encontramos mais vezes, na maioria delas apenas tomamos um café antes dele precisar ir trabalhar, mas no seu dia de folga ele decidiu que deveríamos ir para o gramado dos soldados e marinheiros. Estava um dia bonito demais para passarmos dentro de um café.  Eu não recusei.

Foi um dos melhores dias que tive desde de muito tempo, sentamos perto das árvores para evitar o sol quente, ficamos por um bom tempo apenas observando o lugar e absorvendo a vitamina D em nossas peles, e pela primeira vez eu o olhei de verdade e meu Deus, como ele é bonito. Como eu não tinha reparado nisso antes? Ele tem as maçãs do rosto tão marcadas, e acho que me apaixonei por um nariz, isso é tão ridículo.

Por um momento eu o comparei com Masen, comparei a cor dos cabelos, os dele um loiro quase vermelho, comparei o jeito de rir, ele ri pra dentro, como se não quisesse que ninguém escutasse e, por fim, comparei como ele me trata. Nos conhecemos a tão pouco tempo, mas ele sempre me deixa tão a vontade, não me pressiona quando apenas desvio de uma de suas perguntas e quando olha para mim parece que consegue ver minha alma (isso me assusta um pouco pra falar a verdade). Acho que fiquei o encarando demais, mas quando ele percebeu apenas balançou a cabeça e voltou a olhar as árvores. Ele me respeita.

 

— Você tem o nariz do seu pai, mas eu não me apaixonei por ele não - disse depositando um selinho no nariz da namorada.

— Puta que pariu, eu desisto de você.

— Não, você não desiste, você me ama, assim como sua mãe já estava caidinha pelo seu pai.

— Eu te odeio.

 

Domingo, 19 de julho de 1998

As coisas estão melhorando, o sonho não faz sua aparição já tem umas boas semanas.

Continuo indo ver Rose e sinto que nossas conversas estão ficando mais leves com o passar do tempo, ela mesma comentou isso, talvez isso se dê ao fato de não pensar mais tanto em Masen e toda a bagagem que vem junto com ele.

E Antoine… ele tem sido como uma brisa leve, calma, mas ao mesmo tempo balançando minha vida o suficiente para que eu continue seguindo em frente.

 

Domingo, 26 de julho de 1998

Sabe quando alguém te pega desprevenido e você não sabe o que fazer ou como agir?

Foi assim que me senti quando Antoine finalmente decidiu dividir seu luto comigo. Estávamos no gramado mais um vez (gostamos bastante de lá) quando um carro de polícia passou por lá com as sirenes ligadas (eu odeio o barulho de sirenes e percebi que ele também), e quando o barulho começou a sumir com o vento eu o escutei dizer baixo “eu perdi meu irmão mais novo”. Na hora eu achei que tinha entendido errado, então pedi para ele repetir o que tinha dito e ele disse de novo mais claro “eu perdi meu irmão mais novo”.

Depois disso não conversamos mais e decidimos ir embora poucos minutos depois. Fiquei sem notícias dele por dois dias, até chegar em casa hoje e me entregarem uma carta dele. Eu estou com medo de abrir.

 

— Tio Jake… - era possível ouvir a voz embargada - Como eu não liguei os pontos antes? É óbvio que tio Jake é o luto de papai.

— Você estava chocada e animada demais para pensar sobre isso amor, acontece.

— Você acha que mamãe deixou a carta aqui? A carta que papai mandou pra ela?

— Podemos tentar achar, talvez esteja na mesma caixa da agenda.

Jane se levantou indo em direção a caixa e ao se abaixar começou a retirar as outras coisas que estavam dentro. Encontrou livros de romance, materiais de papelaria, alguns envelopes, cds antigos e até mesmo um álbum de fotos.

— Vê se não está dentro de algum desses envelopes. - disse passando-os para Carlie, enquanto sua curiosidade falava mais alto e pegava o álbum para olhar.

Enquanto Carlie passava pelos envelopes, pôde ver Jane olhando as fotos, por um momento parou o que estava fazendo para chegar mais perto e espiar o conteúdo, mas logo desistiu quando viu que eram apenas fotos das antigas moradoras da república.

— Aqui, está aqui. Anda Jane.

 

Isabella,

Eu queria lhe pedir desculpas por quinta, eu não sei o que deu em mim.

Eu já estava pensando em te contar, até porque nós dois sabemos que esse foi o motivo de nos conhecermos em primeiro lugar, dividirmos nosso luto, mas eu não deveria ter simplesmente jogado aquilo em cima de você e depois ter ido embora.

me perdoe!

Sim, eu perdi meu irmão mais novo, Jacob infelizmente nem chegou a completar 18 anos!

Lembro claramente, como se fosse ontem, meus pais descobrindo por outros pais que a escola de meu irmão estava sendo alvo de um tiroteio. Lembro do desespero, da dor, da incapacidade, do barulho e principalmente dos gritos.

Já faz 1 ano isso, e por mais que eu já tenha aceitado o que aconteceu, eu ainda não consigo perdoar o responsável por tirar a vida de Jake.

Ele era um garoto tão cheio de vida Isabella, sonhava em ser jogador de futebol americano, tinha uma namorada, amigos e uma família que o amava. 

É engraçado como podemos perder tudo em questão de segundos, não é? Uma hora nossa vida está como sempre deveria ser, e um segundo depois tudo vira de cabeça pra baixo e nunca mais volta a ser como era antes.

Eu daria tudo para ter esse segundo de volta Isabella.

P.s: estou te enviando uma foto de Jake e Leah (namorada de Jake) no seu último jogo. mesmo que ele não esteja mais aqui, gostaria que você o conhecesse, ele iria gostar de você.

Antoine.

— Você sabia que papai até hoje não perdoou o cara responsável pelo tiroteio? E eu acho que nunca irá perdoar.

Jane não a respondeu, sabia que era apenas uma pergunta retórica, já conhecia a história do tio de Carlie e sabia como a família lidava com isso.

Após alguns segundos apenas abraçou a namorada, que ainda encarava a carta e, ao olhar para o envelope em seu colo, notou a foto que Edward havia mandando para Bella.

— Seu tio era muito bonito - disse alcançado a foto - entretanto ele se parece tão pouco com seu pai.

— Eu sei, o cabelo de papai é único, nem vó Esme sabe explicar de onde surgiu - riu encarando o casal da foto.

Jake com uniforme do time da escola e Leah ao seu lado vestindo seu capacete.

— Eu nunca tinha visto essa foto, ele parece tão feliz - suspirou enquanto a guardava junto com a carta.

— Você quer continuar? Podemos voltar outro dia, eu venho com você, eu juro.

— Eu quero terminar Jane.

— Vamos terminar então.

 

Continuando...

Eu li a carta, e nesse momento eu só queria abraçá-lo, será que ele iria se importar?

 

Domingo, 02 de agosto de 1998

As coisas entre Antoine e eu estão estranhas se posso colocar assim.

Eu o vi depois que li a carta, algo dentro de mim falou mais alto e eu liguei para ele perguntando se poderíamos nos encontrar, ele aceitou. Conversamos muito pouco, ele se desculpou outra vez pelo jeito que agiu e eu apenas o abracei por um tempo, eu precisava, e acho que ele também.

As coisas entre Antoine e eu estão mudando, eu posso sentir.

Isso, é isso. Mudanças.

 

Domingo, 09 de agosto de 1998

Antoine e eu fomos ao nosso primeiro encontro (?).

Será que eu poderia chamar assim?  Ele me convidou, então acho que sim.

Diferente de Masen, que me levou para um restaurante chique, onde os pratos quase não vinham comida e eu saí de  lá com fome, Antoine me levou em um rodízio.  Eu sei que muitas garotas teriam odiado, mas eu amei. Depois de todo esse tempo que tenho passado com ele, sei que tudo o que ele faz é por um motivo e eu estava certa.

A comida estava muito boa, comemos até não aguentarmos mais. Ele ainda brincou falando que eu deveria colocar um pouco na bolsa para mais tarde.

Acho que algumas pessoas no restaurante não ficaram tão felizes com a gente, conversamos alto demais, rimos mais ainda, por horas e horas sobre tudo o que temos passado desde a última vez que nos vimos.

Mas o que me pegou desprevenida foi saber que seus pais estão conseguindo se desfazer das coisas de Jacob, e que sua mãe já consegue olhar suas fotos sem chorar (espero um dia conseguir fazer o mesmo, e fico feliz que ele já confie em mim o bastante para me contar mais sobre sua família).

Ele quis pagar como sempre, eu nunca conheci alguém tão teimoso como ele em toda minha vida.

Mas se quer saber, o ponto alto da noite foi quando estávamos no táxi voltando para o campus e My All da Mariah Carey estava tocando no rádio, quando ele sussurrou meu nome e me beijou quando o olhei. Sim, definitivamente foi um encontro!!!!

AH, sobre a parte de estar certa sobre ele sempre ter um motivo, bem…. uma hora eu fiquei confusa sobre o que comer e ele simplesmente disse: “Apenas experimente algo que nunca comeu antes, se não gostar, olhe só, você ainda terá muitas outras opções para tentar, assim como tudo na vida. Você só precisa estar disposta a correr o risco.”

 

— Não acredito que papai já era brega naquela época, comparar um rodízio com a vida? Como mamãe pôde se apaixonar por ele, meu Deus?! - sorri, lembrando que seu pai amava usar metáforas sobre qualquer coisa e a qualquer momento, tão brega.

— Ah para, foi fofo vai. Eu ainda tenho o bilhete que ele me deu sobre os limões quando reprovei naquela matéria, até hoje não entendi o que ele quis dizer com aquilo, mas foi fofo, me fez relaxar um pouco.

— Continua sendo brega…

 

Domingo, 16 de agosto de 1998

Rose está eufórica, acho que ela não deveria demonstrar tanto suas emoções em relação a minha vida, mas hoje em dia ela é mais uma amiga do que minha terapeuta.

Ela está muito feliz por mim e muito feliz por Antoine também.

Não esperava que fossemos nos envolver tanto a esse ponto, e em certo momento eu precisei cortá-la, ainda estamos nos conhecendo.

Eu ainda tenho coisas a resolver comigo mesma.

 

— Ei, ela não tem uma filha? Uma que sempre fala como você se veste mal toda vez que eles passam os feriados na sua casa?

— Já te falaram o quanto você é aleatória? Sério.

— Ué, estávamos lendo sobre a Rose, e isso me fez lembrar da garota, qual era o nome dela mesmo?

— Alice - fez uma careta ao lembrar da garota - Lembra do Natal passado? Só porque estava noiva ficou mostrando a porcaria do vestido o tempo todo, argh.

— Sua mãe a ama.

— É, vai entender. - deu de ombros - Agora, a gente poderia, por favor, voltar ao que interessa?

— Não está mais aqui quem atrapalhou.

 

Domingo, 23 de agosto de 1998

Somente Elas passou na TV terça passada, eu já havia assistido esse filme anos atrás, mas resolvi ver outra vez. No meio do filme eu percebi que tinha sido uma péssima ideia, pois não conseguia parar de chorar, entretanto, quando o filme acabou eu já estava pegando minhas coisas e saindo pela porta.

Digamos que, em um momento de loucura, eu tenha ido parar em Philly. Sim, peguei um ônibus de 7 horas, sem um destino em mente.

Quando cheguei lá já tinha anoitecido e eu apenas procurei um lugar para dormir. Quer dizer, tentar dormir, pois passei boa parte da noite pensando no que eu estava fazendo ali, mas só conseguia pensar em Jane, Robin e Holly e em como elas largaram tudo para trás para tentarem se encontrar ou apenas fugir. Será que era isso que eu estava fazendo, estava tentando fugir do que ainda me assombra?

Quando acordei decidi dar uma volta pela cidade, apesar de tudo, eu amo Philly, amo a atmosfera calma mesmo no verão, amo como a cidade guarda tanta história em todos os lugares que olhamos e pode parecer ridículo, mas quando estava subindo os degraus do museu de arte me deixei levar e cantarolei “Gonna Fly Now” enquanto mentalizava o futuro que desejo, mas que não estou conseguindo alcançar rápido o suficiente.

Quando cheguei ao topo e olhei a cidade banhada pela luz do final da tarde eu só consegui pensar em Antoine, em como ele tem me ajudado a esquecer um pouco o passado, mesmo não tendo ideia sobre isso, e a felicidade que sinto toda vez que estou com ele.

Fui para a rodoviária quando já tinha anoitecido e por um momento não sabia para onde ir, não sabia se queria voltar. Fiquei sentada lá por um tempo, até que a fala que Jane diz para Robin quando ela está no hospital me veio à mente. Voltei para Pittsburgh.

“Às vezes, quando você não tem para onde ir, é melhor ficar onde está”.

 

— Eu amo tanto esse filme, mamãe sempre assiste quando está triste.

— Você não acha engraçado que a gente já parou de imaginá-los apenas como pessoas aleatórias há muito tempo?

— Para ser sincera eu não os imaginei assim em nenhum momento, eu só concordei para você não tentar me impedir.

— Você é terrível, já te falaram isso?

— Você. Em toda oportunidade que aparece - riu vendo o olhar descrente de Jane - Mas falando sério agora - a encarou - O que acha de um dia a gente ir até Phlly, sem roteiro nem nada, e passar o dia por lá?

Jane podia ver a empolgação no olhar de Carlie, e quem ela era para negar algo para a namorada?

— Acho que seria o máximo.

 

Domingo, 30 de agosto de 1998

As sessões com Rose estão cada vez melhores, eu sinto que estou progredindo e pela primeira vez depois de muito tempo sinto orgulho de mim.

Finalmente eu fui ao bar onde Antoine trabalha. No começo foi estranho, fazia tanto tempo desde que pisara em um, mas acabei encontrando uns conhecidos da faculdade que me chamaram para sentar com eles e acabei aceitando. Conversamos e até mesmo me arrisquei tomando uns shots, eu estava me divertindo.

Antoine apareceu um tempo depois, se sentou com a gente apesar de só conversar comigo, eu estava me divertindo.

Quando uma música do Van Morrison começou a tocar, ele me tirou para dançar, eu infelizmente não lembro que música era, mas lembro claramente das suas mãos na minha cintura, do seu hálito quente no meu pescoço, e do beijo que ele me deu logo em seguida.

Naquele momento eu não podia cometer erros, e seria um erro monumental dar espaço às ânsias estranhas que tomavam conta de mim quando pensava em sua boca... sua pele... seu corpo.

Eu cometi muitos erros naquela noite, cometi quando o deixei me beijar o quanto quisesse, quando aceitei ir para sua casa e quando parei em sua cama.

Mas às vezes devemos cometer erros, eles nos levam para os acertos.

E nada foi tão certo como seu corpo sobre o meu, a respiração pesada enquanto dizia o quanto ansiava e amava meu corpo, as mãos como brasas encontrando os pontos mais sensíveis e o encai....

 

— CARLIE!! NÃO!

— Não? Não!? Eu não vou ler a transa dos meus pais, você tá louca?

— Mas não tem nada demais, me dá isso aqui. - disse tentando puxar a agenda.

— Sai fora Jane, é nojento, ainda mais nojento porque minha namorada quer ler sobre os meus pais transando. - sentiu o estômago embrulhar - Porra, a gente nem deveria estar tendo essa conversa, eu quero morrer, alguém me mata agora mesmo.

Afundou-se mais no puff, corando apenas com a ideia de ler algo de cunho sexual envolvendo seus pais.

— Para de ser dramática! Se você não quer saber eu quero, esperei muito esse momento chegar.

— Que? Meu Deus, Jane!

— Qual é, passa para cá, deixa eu terminar.  - tentou mais uma vez alcançar a agenda.

— Definitivamente não. - se afastou ainda mais.

— Carlie!

— Jane!?

— Carlie, por favor - fez bico.

— Eu nem sei mais se quero continuar a ler, estou traumatizada.

— Você tem certeza? - a encarou já sabendo a resposta.

— Não - foi quase impossível ouvir sua voz.

As duas ficaram em silêncio por um tempo, os olhares das duas pousados na agenda.

— Vamos fazer o seguinte.  -  Jane foi a primeira a quebrar o silêncio. - Você me passa a agenda e eu leio por cima até achar uma parte segura para gente continuar lendo, pode ser? Assim as duas saem ganhando.

Carlie fechou os olhos e suspirou, sabia que não tinha muitas opções no momento e mesmo que ainda não tivesse se recuperado da última passagem, precisava terminar de ler.

— Okay, mas se você demorar demais em alguma parte eu vou arrancar da sua mão, esteja avisada - entregou a agenda para a morena.

— Sim senhora!

 

Domingo, 06 de setembro de 1998

Eu contei a ele, eu não sei de onde tirei coragem… Quer dizer, eu mandei uma carta para ele contando e eu espero que ele entenda, ainda não sou corajosa o suficiente para falar disso com outra pessoa além de Rose, mas ele merece saber depois de tudo que aconteceu entre nós.

 

— Me ajuda a procurar, Jane. - já estava a meio caminho de onde os outros envelopes foram deixados.

— Você vai estar pronta para isso? - era nítida a preocupação em sua voz. - Pode ser algo que não te faça bem.

— Já chegamos até aqui, eu preciso saber.

— Mas você vai estar pronta para o que quer que esteja lá?

— Só acha isso logo.

— Você é teimosa demais, eu só não quero te ver mal.

— Eu vou ficar bem, Jane, e você está aqui comigo. - assegurou procurando a mão da outra para segurar.

— Certo. - concordou, entregando-lhe o envelope que continha a letra de Bella - Eu estou aqui.

 

Antoine,

Sei que não tenho costume de mandar cartas, nem mesmo para responder as que você me manda, e você deve estar achando isso tudo estranho.

Antes de tudo, tenha em mente que a Bella que te escreve é uma pessoa que está lutando para seguir em frente, e bem, eu preciso te contar para continuar o meu caminho.

Bom, tudo começou quando eu ainda namorava Masen, éramos diferentes, mas nos dávamos bem e nos amávamos, é claro, tínhamos uma vida calma, fácil.

Bem, até a gravidez.

Já estávamos juntos há mais de um ano quando descobri que estava grávida, e no momento eu me assustei, entrei até em negação se quer saber, não podia ser possível, eu era nova demais, minha vida acadêmica exigia muito de mim, sem falar que eu não tinha dinheiro para sustentar uma criança.

Após uma semana negando a mim mesma, eu contei a Masen. Tive medo de sua reação, achei que assim como eu, ele não queria uma criança naquele momento, mas foi o contrário, nunca o vira tão feliz quanto naquele momento, e depois de conversamos muito decidimos que iríamos morar juntos, pois eu iria precisar de ajuda e tudo mais que uma gravidez envolve.

A coisa é: eu que não queria um bebê, me vi apaixonada pelo o meu no momento que fiz meu primeiro ultrassom. Não tenho como te explicar o sentimento que te atinge no momento em que você escuta o coração de um serzinho, um serzinho que está dentro de você. Eu já amava esse bebê com toda a força do meu ser.

Viver com Masen estava sendo melhor do que eu pensava, contar aos nossos pais foi tranquilo, tudo estava correndo muito bem, como deveria ser.

Isso é, até eu entrar no 7º mês de gestação. Eu ainda me lembro claramente o que estava fazendo no dia, como estava vestida e como o tempo estava, como podemos lembrar de tudo isso de um dia tão cruel de nossas vidas?

Acho que a essa altura você já sabe o que aconteceu comigo, eu não tenho um filho, não é?

O “ocorrido” , sim eu não uso a palavra e acho que jamais usarei, foi um dos piores momentos da minha vida, eu nunca vou conseguir explicar a dor que senti naquele dia, tanto física, quanto emocional, e agora você sabe que eu entendo o que seus pais passaram.

Eu não vou entrar em detalhes, mas eu não fui eu mesma por meses, meus pais tiveram que vir cuidar de mim por um tempo. Eu me afastei de meus amigos e não queria ver Masen, o que, vendo agora, foi egoísmo de minha parte, ele também estava sofrendo, também era filho dele.

Mamãe me fez começar a ver Rose e foi aí que as coisas começaram a melhorar um pouco. Masen e eu ainda morávamos juntos, mas não era mais o mesmo, os dois sabiam disso. Comecei a sair e ver meus amigos, mas eu já não era mais a mesma.  E bem, um mês antes de te conhecer, Masen terminou comigo, afinal, a pessoa por quem um dia ele foi apaixonado já não estava mais aqui.

Mas como eu poderia estar depois de me tirarem o meu bem mais precioso? Como eu poderia me amar sabendo que meu filho nunca foi amado? Como ser feliz assim?

E aí está, esse é meu luto.

 

Era possível ouvir a música que vinha da casa principal, apenas um som fraco, quase oco. Dentro daquele lugar, no entanto, apenas os soluços de Carlie preenchiam o ambiente.

— Amor - Jane a chamou quando percebeu os soluços diminuindo, abraçando-a ainda mais apertado. - Está tudo bem, eu estou aqui.

— Jane-eee - soluçou.

— Eu sinto muito por isso Carlie.

Permaneceram em silêncio até os soluços começarem a diminuir e Carlie levantar o rosto para encarar a morena que tinha um olhar preocupado.

— Eu vou ficar bem.

— Você tem certeza? Eu odeio te ver assim, eu nunca sei o que fazer.

— De verdade Jane, eu só preciso me acalmar e tudo vai ficar bem.

— Por que você não liga para os seus pais? Vai te ajudar a se acalmar.

— E falar o que? Que eu descobri sobre o passado que eles nunca quiseram compartilhar? Não faz sentido.

— Apenas converse com eles, fale o que está sentindo, você não precisa dizer o motivo, você sabe que vai te fazer bem, amor.

— Se eu começar a chorar vou colocar a culpa em você, e você que lute com a ira de papai.

— Acho que posso lidar com isso - sorriu.

Com as mãos um pouco trêmulas pegou o celular já discando o número tão conhecido. Após 3 toques pôde escutar a voz que amava, que sempre a acalmava.

Querida? Está tudo bem, por que está ligando tão tarde?

— Desculpe mamãe, a senhora já estava dormindo? - tentou disfarçar o nó na garganta.

Carlie, o que houve?— Claro que não adiantou, sua mãe a conhecia tão bem.

— Eu não sei - suspirou tentando não chorar de novo. - Acho que apenas queria ouvir a sua voz, tem sido uma semana tão difícil. - De certo modo ela não estava mentindo, se encontrava nessa situação apenas porque queria relaxar da semana que tivera.

Ah— pode ouvir a mãe suspirar do outro lado da linha— Você me assustou— riu baixo.

— Foi mal!

Está tudo bem, mas me fale, o que está te afligindo tanto?

— Eu não sei - repetiu - eu apenas sinto que tem muita coisa acontecendo dentro de mim e eu não sei o que fazer sobre isso. Eu apenas não sei.

Isso é estar na faculdade, um dia você sente como se estivesse no topo do mundo, no outro como se nada fizesse sentido, vai passar. — Era óbvio que sua mãe iria achar que seu estresse era por conta da faculdade, afinal de contas, estavam falando dela.

— A senhora tem certeza?

Claro, eu já passei por isso bobinha, e olha só, eu sobrevivi, não foi?

Ela sabia que era verdade, e por mais que as duas estivessem falando sobre coisas diferentes, ela sabia que a mãe havia superado todos os problemas.

— Foi difícil? - Ela só queria ter certeza, certeza de que tudo ficaria bem para ela também.

O que querida?

— Sobreviver?

Bem, não foi a época mais fácil da minha vida, mas eu tinha com quem contar, e no final nós precisamos passar por essas situações para crescer. Mas Carlie, eu quero que entenda que não importa pelo o que você passe ou o que você sinta, eu sempre vou estar aqui para te segurar e seu pai também, você sabe disso, não sabe?

— Eu sei, claro que eu sei.

Então não se preocupe tanto, você é tão nova meu amor.

— Eu vou tentar, obrigada mamãe. - fechou os olhos. - Eu sinto sua falta.

Nós também sentimos sua falta, vá dormir, está tarde.

— Tudo bem, boa noite.

Boa noite, eu te amo Carlie, sempre.

— Eu também.

Suspirando, desligou a chamada.

— Está melhor?  - Jane perguntou assim que a viu bloquear a tela do celular.

— Um pouco.

— Viu só!

— Jane…

— Não precisamos falar sobre isso se não quiser.

— Obrigada! Você me irrita na maior parte do tempo, mas me conhece tão bem - riu fraco enquanto se jogava no colo da outra.

— Vem, vamos juntar tudo e te levar para dentro.

— Que? - Perguntou surpresa.

— Vamos guardar as coisas, ué.

— Por quê? Eu quero continuar lendo.

— Você ainda quer ler a agenda?? Carlie!

— Eu preciso saber o resto.

— Mas…

— Por favor?

Jane apenas suspirou alto, sabendo que não havia como ir contra Carlie quando ela colocava algo em sua cabeça.

 

Domingo, 13 de setembro de 1998

As coisas foram tão confusas essa semana.

Contei a Antoine sobre meu filho, e mesmo que tenha doído relembrar o “ocorrido”, ao mesmo tempo senti como se tivesse tirado um peso dos meus ombros.

Ele veio me procurar no dia seguinte, me abraçou e não fez perguntas, apenas agradeceu por eu ter confiado nele para compartilhar uma parte tão grande de mim. Antes de ir embora ele sussurrou no meu ouvido que se eu o quisesse por perto, ele sempre estaria lá.

Rose nunca esteve tão orgulhosa de mim, falou que dei um grande passo contando para outra pessoa, e me lembrou que por mais que seja uma parte do meu passado que eu queira esquecer, eu também preciso lembrar que, antes das lembranças ruins, eu tinha as boas e essas eu deveria guardar, pois existia amor e sempre existirá.

Pela primeira vez eu a escutei verdadeiramente sobre isso. Eu o amo e sempre vou amar.

Estou começando a aceitar os sentimentos bons.

Hoje é o meu aniversário de 23 anos e, depois de 2 anos, eu acho que será um ano bom.

 

— A cada minuto que passa eu tenho mais certeza de que você é o seu pai.

— E isso é ruim?

— Não - riu - Apesar que em certos momentos eu te acho tão parecida com a sua mãe, forte assim como ela.

— Ela é, não é?

 

Domingo, 20 de setembro de 1998

 Hoje me peguei pensando em tudo que vivi nesses últimos meses e é até cômico, mas quando eu o visitei essa semana não doeu como antes. Pela primeira vez eu consegui sorrir ao lembrar do tempo em que passamos juntos, talvez isso seja um sinal de que tudo ficará bem.

Falando em sinal, posso dizer que Antoine também é um, ou melhor, Edward.

Depois de meses, ele decidiu me contar que seu primeiro nome é Edward, mas que não o usa porque apenas seu irmão o chamava assim, acho que sou uma pessoa confiável, pelo menos para ele.

Temos passado tanto tempo juntos, as coisas entre nós só melhoraram, e ele faz questão de confirmar isso a cada momento, quer dizer, ele disse que me amava, que fomos feitos um para o outro (bem no fundo eu acredito nisso) e que sempre estaria comigo.

Eu mereço ser feliz, eu mereço essa segunda chance.

Sim, Edward Antoine, eu vou estar com você.

“Mesmo que esta estrada seja longa e irregular

Você vai estar comigo?

Mesmo se cairmos e nos machucarmos às vezes

Você vai estar comigo?”

Antoine.*

— Será que sua mãe ainda o visita? Digo, seu irmão?

— Provavelmente, ela não iria esquecê-lo só porque formou uma família.

— Você está certa, foi uma pergunta besta. - abaixou a cabeça.

— Claro que não Jane, eu também estava pensando a mesma coisa. Eu nunca imaginei que meus pais tivessem vivido tudo isso, você acha que eles escondem mais coisas de mim?

— Sinceramente? Acho. Não é porque eles são seus pais que você vai saber tudo sobre eles Carlie, do mesmo jeito que eles também nunca irão saber tudo sobre você, e está tudo bem.

— Você tem razão. - riu se lembrando de algo. - Até hoje eles não sabem que fumamos maconha.

— E nunca vão saber. - se apressou em dizer, os olhos arregalados. - Eles nunca mais iriam querer me ver.

— Deixa de ser exagerada. - Carlie riu - Às vezes eu até acho que meu pai te ama mais do que mim.

— É porque ele ama. - gargalhou.

— Você é um saco.

 

Domingo, 18 de outubro de 1998 

Eu tinha decidido que não precisava mais de você, pra ser sincera eu até tinha esquecido disso daqui, mas as meninas estão fazendo a limpeza anual e te encontrei no meio da desordem

Então decidi que precisava de uma despedida, é o que dizem, precisamos fechar os ciclos.

Rose me deu você como uma forma de escape, um lugar para que eu pudesse me libertar sem medo, e pudesse me encontrar. E foi isso que eu fiz por todo esse tempo, até conseguir me libertar.

E me libertei!

Me perdoei!

Entendi que a bagunça dentro de mim não irá sumir, ela vai permanecer, e que de tempos em tempos eu terei que lidar com ela, de cabeça erguida e não simplesmente empurrar tudo para debaixo do tapete e fingir que ela não existe.

Porque eu sei que por mais que tudo esteja bem de novo, por mais que eu consiga amar novamente e me permitir ser feliz de verdade, eu não posso apagar o passado.

E é por isso que eu estou dizendo adeus a você, você não será apagado, e quem sabe um dia não nos encontremos de novo.

Está na hora de seguir em frente!

 Isabella Swan.

 

Ao ler as últimas palavras da agenda da mãe, Carlie se sentiu aliviada.

Ler que ela finalmente havia encontrado a felicidade que merecia, que parou de se torturar e de se culpar por algo que não era sua culpa e, acima de tudo, que estava aos poucos aprendendo a se amar, um dia de cada vez, fazia com que o orgulho que já sentia pela mãe triplicasse de tamanho. Sabia que sua mãe era uma pessoa forte, mas não imaginava o quanto.

E, por mais que doesse, sabia que nunca iria comentar aquilo com os pais, nunca poderia lhes fazer perguntas para sanar suas dúvidas. Aquilo era passado e, assim como sua mãe, Carlie teria que deixá-lo no lugar a que ele pertencia.

— Jane? - chamou a namorada.

Quando a morena olhou para ela, ainda arrumando as coisas em uma pilha para que Carlie decidisse o que fazer, estranhou o olhar da outra, mas antes que pudesse perguntar o que estava havendo ela continuou.

— Me prometa que nunca iremos comentar isso com ninguém. Me prometa que quando sairmos por aquela porta vamos esquecer tudo o que lemos hoje.

— Você tem certeza? Não quer levar as coisas para sua mãe?

— Não. Se ela deixou aqui foi por um motivo e eu sabia, ela não quer reviver essas memórias, ela é feliz agora Jane, verdadeiramente, ela se encontrou. Que tipo de filha eu seria fazendo ela reviver tudo isso? Você estava certa, certas coisas não devem ser lembradas várias e várias vezes, a vida continua.

— Tudo bem amor, eu sempre apago as lembranças desse lugar mesmo. - disse rindo, tentando fazer a namorada sorrir.

— Anda, me ajuda a guardar as coisas para podermos voltar.

Em silêncio, as duas guardaram tudo de volta, e quando estavam prestes a sair do galpão Jane segurou a namorada pelo pulso interrompendo-a.

— O que foi?

— Antes da gente sair, eu posso fazer um último comentário? - a olhou pidona.

— Claro.

— Por um momento eu jurava que sua mãe seria como a Donna em Mamma Mia. Masen, Antoine...eu conheço seu pai como Edward, eu já estava esperando ele chegar.

— Jane!? - disse rindo, quando voltou a puxar a namorada para fora do lugar e fechou a porta atrás de si. Deixando para trás não só as memórias daquele dia, como também segredos que, agora, ela e Jane partilhariam por longos anos.

Saíram para o jardim de mãos dadas, mais unidas do que nunca, e, quando se aproximaram do barulho alto da festa, Carlie ofegou indignada, sem poder acreditar naquilo, enquanto Jane apenas ria.

— MEU DEUS, ESTÃO TOCANDO DRAKE DE NOVO!?




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Notas finais do capítulo

*Trecho da música "A Supplementary Story: You Never Walk Alone" do BTS.

E cá estou eu mais uma vez quando disse que a do ano passado séria a única.

Primeiramente: Isabella espero eu tenha atingido pelo menos vinte por cento do que você queria quando fez seu combo, juro que pensei muito no que fazer e quando vi que você gostava um drama, simplesmente surgiu isso na minha mente e não saia de jeito nenhum. Se não gostou, finge, sou sensível hahahaha

Agora, queria agradecer a Madu por me ajudar com as montagens dos meus teasers e fazer essa capa maravilhosa, você é uma linda.

Depois as pessoas que aguentaram meus surtos quase todos os dias, Pedro e Brienne, vocês são uns anjos, o que seria de mim sem a ajuda de vocês, eu digo, eu não seria nada, obrigada por lerem, betaram e amarem minhas ideias loucas.

Deem amor a esse Beward, ou como diria Brienne: Betonie.

Beijos de luz!



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