Begin Again escrita por Fe Damin


Capítulo 2
Capítulo 2


Notas iniciais do capítulo

Olá, pessoas lindas!
Primeiro eu quero começar agradecendo todos os comentários maravilhosos que o capítulo anterior recebeu. De verdade mesmo, vocês trouxaram felicidade com cada uma das suas palavras. Eu não estava muito confiante que salguem gostaria dessa fic... de certa forma eu estav achando ela "sem sal", então foi uma supresa mto positiva encontrar tanto carinho!
Aqui está o capítulo final, espero que gostem tanto quanto o outro!



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“But on a Wednesday in a cafe

I watched it begin again.”

 

Quase na hora combinada para o jantar, eu saí da estação do metrô e andei as duas quadras que faltavam para um restaurante que eu não conhecia. A fachada era aconchegante e elegante sem ser pomposa, um local relaxado do jeito que eu gostava e aparentemente ele também, já que deixei a escolha por sua conta.

Dei meu nome na entrada e a atendente me guiou por entre as mesas até aquela que indicou ser meu destino. Para minha surpresa, um ruivo sorridente já me esperava sentado, os olhos acompanhando seu sorriso ao me ver.

—Eu achei que ia chegar primeiro - comentei ao me aproximar, eu nunca me atrasava para nada e geralmente era a pessoa que aguardava os outros.

—Sou ansioso, desculpe… - explicou sem graça.

—Não tem problema - sem que eu esperasse por isso, ele se levantou para me cumprimetar com um beijo e deu a volta para puxar minha cadeira. 

A mulher independente dentro de mim revirou os olhos com a atitude piegas, mas ali eu via que ele não estava fazendo aquilo por achar que eu não conseguiria arrastar minha própria cadeira ou que ele tinha que ser o “homem cavalheiro”, ele apenas foi gentil, portanto agradeci com um sorriso.

—Conseguiu achar fácil? - ele perguntou ao voltar para seu lugar de frente para mim.

—Sim, suas indicações foram bem claras - respondi e logo o garçom chegou com os cardápios.

Ficamos algum tempo discutindo opções, eu perguntei o que ele indicava por não conhecer o restaurante e ele disse que tudo era gostoso, o que não me ajudou em nada. Acabei decidindo por um risoto de frutos do mar e ele pediu uma lasanha de salmão.

—Já vai começar a tentar sua sorte para saber o fim do livro? - provoquei, bebericando um pouco do meu drink de morango.

—Na verdade não, eu desisti de tentar te convencer, decidi tomar um caminho alternativo - ele deu de ombros, mas eu notei o sorriso atrevido.

—Não me diga que você procurou um resumo na internet! - aquilo seria indignante - não pode dar esse exemplo para os seus alunos!

—Claro que não, a hipocrisia seria tanta que eu nunca mais poderia mandar minhas turmas lerem nada - ele riu - eu comprei o livro.

—E já leu? - não deve ter dado nem dois dias para que ele chegasse ao fim da história e não era um livro curto.

—Sim! É muito intrigante.

—Como você conseguiu? - eu estava admirada.

—Eu leio rápido, ossos do ofício, eu tinha tantos livros pra ler na graduação que me acostumei. Quando é algo tão interessante então, eu nem percebo o tempo passando. Pode ser que eu tenha me atrasado para uma reunião na sexta feira, mas isso a gente não fala em voz alta, né?

—Não acredito - eu dei risada do seu tom arteiro, parecia uma criança contando uma estripulia.

—Claro que esse não foi o motivo oficial que eu dei para a minha chefe - ele passou a mão pelos cabelos - mas vamos ao que interessa: não foi o cozinheiro!

—De fato não foi!

—Eu sabia que estava certo, mas não esperava que fosse o irmão, foi uma sacada de mestre.

Quando nossos pratos chegaram ainda estávamos discutindo todas as pistas que não percebemos ao longo da narrativa. O cheiro da comida estava maravilhoso, o que só foi superado pela primeira garfada que dei.

—Nossa, isso está uma delícia - suspirei saboreando sem pressa.

—A comida daqui é muito boa mesmo. Quer provar o meu?

Achei a oferta engraçada e fofa ao mesmo tempo e acabei aceitando, o que só me fez constatar que lasanhas também eram um forte daquele lugar.

—Acho que agora eu mereço um camarão - ele disse assim que eu terminei de comer o pedaço que tinha me dado.

—Ah, então foi tudo um plano para conseguir a minha comida!

—Touchè! Fui descoberto, ler um livro policial não ajudou a melhorar meus planos.

Ele era realmente divertido, fez uma cara de cãozinho pidão até que eu passasse um camarão para o seu prato. Assim que terminamos, o garçom veio perguntar se estava tudo bom e satisfatório.

—Tudo uma delícia - eu concordei.

—Olha, diz pra chef que já comi lasanhas melhores na rua de baixo - ele piscou para o garçom que pareceu entender alguma coisa que eu não entendi.

—Você não gostou? A lasanha estava tão boa!

—Gostei sim, muito, você já vai entender - ele riu, seus olhos se desviando para o fundo do salão onde pude ver, ao me virar, que ficava a entrada da cozinha - lá vem ela.

Uma ruiva estonteante vestida toda de branco vinha em nossa direção com cara de poucos amigos. Pelas suas vestimentas, se tratava da chef do restaurante.

—Posso saber quem foi o atrevido que disse que minha comida era pior do que aquele restaurante mequetrefe da outra rua? - ela parou com os braços na cintura, olhando feio para meu acompanhante.

—Sempre tão fácil conseguir sua atenção - ele mostrou a língua para ela, me deixando cada vez mais confusa.

—Muito engraçado, Roniquinho, da próxima vez que precisar de uma reserva em cima da hora, vou mandar você esperar na fila - ela resmungou.

—Você sabe que eu te amo e que sua comida é a melhor  - ele sorriu todo inocente.

—Melhor assim!

—Essa pessoa emburrada é a minha irmãzinha, Ginny - ele me explicou.

—Ah! Você me contou que ela trabalhava com gastronomia - fiquei um pouco sem graça de estar sendo apresentada para a irmã dele, mas nem era nada demais - ele é um completo mentiroso, o risoto e a lasanha estavam perfeitos, me chamo Hermione, aliás.

—Prazer em conhecê-la, Hermione - seu sorriso tranquilo para mim transformou todo seu semblante que antes queria matar o irmão - o pateta do meu irmão adora me provocar.

—Só porque é tão fácil - ele resmungou ao levar um soquinho da irmã no braço.

Conversamos mais um pouco, mas logo vieram chamar a chef com alguma emergência na cozinha e ficamos sozinhos na mesa novamente.

—Desculpe pela apresentação sem avisar, mas eu nunca resisto a provocar aquela esquentadinha. Já não moramos juntos tem uns anos, tenho saudade de vê-la mais, com o dia a dia corrido fica difícil, ainda mais que ela tem horários complicados de final de semana.

—Vira um desencontro.

—Exatamente! Vai querer sobremesa?

Eu não resisti a provar um doce o que nos rendeu mais um bom tempo de conversa, ele me contava dos alunos, dos livros que mais gostava e ria de tudo que eu ensinava na universidade porque dizia que parecia grego.

—Tem que ter qi demais pra entender dessas coisas, por isso que eu fugi.

—Nada a ver, só é uma área diferente, também tem que ter um bom qi pra entender o que o Shakespeare queria dizer naquele inglês arcaico.

—Você até tem razão aí, ainda fazemos os alunos sofrerem com isso e devo dizer que eu adoro.

Percebendo que o restaurante já estava praticamente vazio, resolvemos pedir a conta e ir embora. Parados na calçada, parecia que não sabíamos chegar ao fim daquela noite. Eu não queria ser a pessoa a admitir isso, mas também não gostaria simplesmente ir embora. Aquele jantar me lembrou de como as coisas podiam ser leves e descontraídas, era errado eu querer mais um pouco?

—Eu estou sendo inapropriado ao dizer que eu não queria que essa noite terminasse ainda? - como se tivesse lido meus pensamentos, ele me olhava de canto de olho.

—Não - confessei - eu também não queria.

—Que ótimo! - seu rosto se iluminou com a minha resposta - não sei o que tem por aqui uma hora dessas….

—Eu menos ainda, não moro aqui perto.

—Ah, já sei! Vai estar fechado, mas acho que você vai gostar mesmo assim - o tom enigmático já aguçou minha curiosidade - vamos?

—Não vai me dizer onde?

—É um lugar mágico que você tem que vir em um horário apropriado depois, vem - notando minha reticência, ele passou seus dedos pelos meus e foi me guiando por entre as ruas quase vazias de uma Londres noturna. Ainda tinha gente na rua, mas a maioria estava em bares e restaurantes que pelo jeito não era onde ele queria me levar. 

—Não acredito que estou deixando um desconhecido me levar para algum lugar mais desconhecido ainda - resmunguei.

—Desconhecido? Essa doeu, senhorita Hermione.

—Levando em consideração que te conheço há menos de uma semana, não tem outro nome para dar - ponderei, mesmo que realmente parecesse inapropriado.

—Poxa, mas olha a cara de pessoa legal que eu tenho! - ele esboçou um sorriso forçado mostrando todos os dentes, o que me fez rir.

—Se rostos dissessem tudo eu… - eu ia completar a frase com uma reminiscência nada boa, mas me interrompi abruptamente, eu não queria falar dele - mas não dizem, né!

—Quando são ruivos, dizem sim - ele apertou minha mão que ainda estava presa na dele e eu me senti uma adolescente ao prestar atenção naqueles detalhes tolos.

—Só por favor, não roube meus rins, preciso deles.

—Não tenho interesse em seus rins, pode ficar tranquila! Talvez em outras partes… - ele pareceu sem graça ao notar o que tinha falado então deixei ele mudar de assunto, mas deixei aquilo anotado no fundo da mente - eu já passei mais de uma hora reclamando dos trabalhos malfeitos dos meus alunos para você, ou seja, a tentativa de te matar já foi e você suportou o tédio.

—Esse foi um bom argumento - notei que ele foi diminuindo o passo, devíamos estar perto - mas, se te serve de consolo, todo professor gosta de reclamar do alunos, ainda mais para outros professores que entendem o sofrimento.

—É verdade, a gente não resiste - ele parou na minha frente - chegamos.

—Onde?

—Atrás de você - ele apontou - um dos meu lugares favoritos de Londres, lembra que eu comentei?

Me virei para ver uma enorme vitrine adornada com flores e bichinhos cortados em papéis de todas as cores, mas o mais impressionante eram os livros. Grandes edições em capa dura com letras douradas estavam dispostas atrás do vidro. Fiquei boquiaberta ao ver que eram títulos famosos, tudo ali naquele pequeno local, um recanto de tesouros para aqueles que sabiam apreciar.

—Que lugar lindo!

—Já que você adora livros, pensei que fosse gostar. Eu amo vasculhar os cantinhos aí dentro, sempre aparece coisas novas, ou melhor antigas - ele riu - já encontrei uma edição super rara do Dom Quixote, paguei com um rim, talvez eu vá mesmo precisar de um seu.

—Se vire com um rim só! - voltei a encarar os exemplares - como eu não conhecia esse lugar? Queria tanto entrar!

—Agora só na segunda feira.

—É uma pena, mas não vou me esquecer de voltar… Floreios e Borrões, até o nome é legal.

Meus olhos não queriam desgrudar daqueles exemplares tão bonitos, na semana seguinte, sem falta, eu estaria ali para ver o lado de dentro. Ele me contou mais algumas histórias sobre seus melhores achados naquela livraria, porém, num horário daqueles, era bem claro que não poderíamos ficar em pé no meio de uma calçada vazia por muito tempo.

—Mione… quer dizer, posso chamar assim?

—Pode, só os desconhecidos me chamam de Hermione - brinquei, sem prestar atenção no pulinho gostoso que meu coração deu ao ouví-lo me chamar daquela forma mais íntima.

—Ótimo! - eu gostava mesmo do sorriso dele - o que eu queria dizer é… eu fiquei sem mais ideias do que podemos fazer por aqui, mas não queria chegar na parte de nos despedirmos ainda… não sei o quanto eu estou sendo inconveniente, mas eu prefiro sempre ser honesto, acho que é o melhor caminho em qualquer situação.

Fiquei olhando para ele por alguns instantes, tentando assimilar o fato de que realmente existiam caras legais no mundo, aparentemente, o que não era a coisa mais fácil para mim de acreditar. Vivi por tanto tempo com alguém que só sabia mascarar controle como afeição que era quase um sopro de ar fresco estar de frente com uma pessoa que preferia o caminho da sinceridade.

Decidi então ser sincera também.

—Eu igualmente preferia deixar as despedidas para depois…. faz muito tempo que não me divirto assim.

Era difícil para mim compreender se eu estava sendo precipitada ou coerente, ainda mais quando tanta coisa ainda me dava medo. Medo de cair nos mesmos erros, medo de me ver novamente em uma prisão, medo de ter a minha personalidade tolhida de novo. Porém, se eu não deixasse nada acontecer na minha vida, então realmente nada aconteceria. Eu teria que dar um primeiro passo em algum momento e confiar em mim mesma para saber até onde era seguro ir.

—Você tem alguma sugestão então? - ele perguntou e, não pela primeira vez, eu me peguei pensando que queria sentir aquele sorriso dele mais de perto, muito mais de perto.

—Como você fez o convite da noite, acho que a sugestão deveria ser sua…

—Olha… eu moro aqui perto, não são muitas quadras - ele passou a mão pelos cabelos, desviando o olhar para longe de mim.

Era coisa de adolescente demais dizer que ele ficava uma graça encabulado?

—Não prometo que vai estar tudo arrumado, porque eu não estava esperando visitar, mas tenho uma cachorra fofa e uma garrafa de vinho…

—Você me convenceu com a cachorra fofa! Mas pode ser que eu dê mais atenção a ele do que a você - brinquei, tentando conter as borboletas no meu estômago.

Éramos grandinhos o suficiente para ter em mente o que aquele tipo de convite sugeria. Porém, fiquei surpresa comigo mesma ao notar que eu não estava nervosa de uma maneira ruim, sem sombras de receio. Eu nunca tive problemas de conexão física com ninguém, só não sairia correndo para o próximo relacionamento duradouro como já havia feito antes. Não sem ter muita, mas muita certeza de tudo.

—Sem problemas, ela merece atenção mesmo.

Para mim era uma surpresa muito interessante o fato de que ele gostava de falar de qualquer coisa e não se importava se eu começasse a tagarelar. Estávamos discutindo como o fato das pessoas acreditarem tanto em signos era engraçado, quando ele anunciou que havíamos chegado em seu prédio. Como seu apartamento era no primeiro andar, ignoramos o elevador e subimos o lance de escada.

—Sério não repara na bagunça mesmo tá?

—Tudo bem - o assegurei, mas quase caí na gargalhada quando ele abriu a porta e eu pude ver a quantidade de livros e papéis que ele tinha pelo imóvel - alguém precisa de uma estante.

—Outra, você quer dizer? A minha não cabe mais nada - ele deixou as chaves em cima do sofá e rapidamente escutei barulho de patinhas arranhando no chão - oi, menina, vem cumprimentar a visita!

Uma bolinha de pelo branca veio rebolando pela sala, o rabo balançando freneticamente ao ver o dono que abaixou para pegá-la no colo.

—Meu Deus que mocinha mais linda! - me aproximei e ela virou sua atenção para mim depois de ter lambido o rosto do ruivo - qual é o nome dela?

—Esta é a senhorita Jane!

—Jane Austen?

—Na verdade não, Jane Eyre, mas considero uma  homenagem dupla! Eu sei, sou um clichê...

—Achei bem apropriado para um professor de literatura, posso pegar? Ela não estranha?

—Pode, só corre o risco dela não querer mais sair do seu colo - isso não era nada negativo para mim, então roubei-a dos braços do dono e fui recebida com muito entusiasmo.

Eu adorava animais então não me importava com lambidas nem nada.

—Quem é a menina mais linda? - eu falava com ela, quando me sentei no sofá, esperando o dono da cãzinha aparecer com o tal vinho.

Pelo que ele tinha falado da bagunça, eu esperava um apartamento de pernas pro ar como se supõe do imaginário coletivo em se tratando de homens solteiros. Mas a verdade é que tudo estava até que bem organizado, apenas sem espaço para tudo que ele tinha, por mais que a sala não fosse exatamente pequena.

—Aqui está o vinho prometido! - ele me entregou uma taça e encheu com o conteúdo da garrafa que tinha na outra mão  antes de sentar no sofá junto comigo - Jane, agora deixa a tia Mione em paz, vai! Já sabemos que você é a estrela dessa casa - ele a chamou para si, porém Jane pareceu bem pouco interessada e partir.

—Deixa ela - Jane tinha se acomodado ao meu lado e estava muito satisfeita com a cabeça apoiada na minha coxa - esse vinho é uma delícia!

—Que bom que gostou, eu não sou de beber muito então não ia abrir uma garrafa só para mim.

—Está me usando de desculpa então?

—Exatamente, para que mais eu te traria aqui? - o sorriso malicioso me deixou com uma ideia ou duas na cabeça.

—Para me fazer inveja da coleção imensa de livros?

—Você é esperta demais para o meu bem! - bebeu mais um gole de vinho, sem tirar os olhos de mim, confesso que não sabia se o calor que eu estava sentindo era do álcool ou da companhia - quer ver o resto?

—Estão espalhados pelos cômodos da casa?

—Praticamente todos, mas tem um mais pivilegiado - ele explicou.

—Tudo bem, já que é para fazer inveja, que seja com direito a tour completo - levantei com o maior cuidado possível para não acordar aquele bolinha de algodão que já dormir tranquila no sofá.

Deixei minha taça na mesa de centro e o segui pelo corredor estreito. Passamos pela porta. do que eu vi ser o quarto dele, e entramos na seguinte que continha um escritório que era uma biblioteca ou vice versa.

—Você não estava brincando na quantidade, que legal! - eram estantes e mais estantes abarrotadas de títulos, tanto acadêmicos quanto de entretenimento - você faz empréstimos?

—Só para pessoas especiais.

—E o que precisa para entrar nessa categoria? - era divertido sentir que eu ainda sabia entrar naquela brincadeira de flerte.

—Primeiro não pode ser uma pessoa desconhecida…

—Acho que tenho que trabalhar nesse ponto primeiro então, até chegar no nível de “especial”. Tem algum roteiro? Quesitos para ser conhecida ao invés de desconhecida?

—Não sei… conhecer alguém leva tempo, não é? - ele veio para mais perto de mim, se eu esticasse o braço, conseguiria tocá-lo - mas acho que existem uns atalhos interessantes.

—Tipo? - eu senti a mão dele deslizando pelo meu braço, acompanhado de um arrepio no meu corpo todo.

Há quanto tempo eu não deixava ninguém me tocar? Ou melhor, há quanto tempo eu nem estava interessada nisso? Mas só pela forma que eu senti o meu coração acelerar, eu sabia que ali eu estava interessada e muito.

—Acho que assim com os dedos é uma forma - ele traçou um caminho pelo meu ombro, pescoço e veio terminar numa carícia no meu rosto.

—O que mais? - encorajei, tentando manter a respiração normal, eu sabia para onde aquilo estava indo e a antecipação era uma delícia.

—Acho que se for um pouco mais de perto….  - eu já conseguia sentir a respiração dele em meu rosto.

De repente, senti um surto de coragem e desejo, escolhi não racionalizar muito aquilo, apenas agir.

—Assim? - me inclinei devagar, eliminei o espaço entre nós e colei meus lábios nos dele, num selinho rápido.

—Exatamente assim - senti o sorriso dele quando suas mãos escorregaram para minha cintura aprofundando o beijo que eu comecei.

Gostei de sentir que o coração dele batia tão acelerado quanto o meu, nossas bocas participando de uma dança afoita. Quando dei por mim, eu tinha as costas pressionadas contra a estante de livros e o corpo dele colado ao meu, num encaixe perfeito.

—Já conheceu bem a minha boca? - sussurrei em seu ouvido, antes de deixar um rastro de beijos em seu pescoço.

—Acho que vou precisar de mais amostras - respondeu com a voz rouca que me deixou mais excitada ainda - de preferência não só da boca.

Notei que seus olhos buscavam o meu por consentimento, o que eu fiz colando nossas bocas novamente. Sem nos separar, ele foi me direcionando para fora do cômodo, diretamente para o tal quarto que tínhamos passado antes.

—Deixa só eu fechar aqui - ele se desvencilhou rapidamente para encostar a porta - a Jane é curiosa.

Eu ri ao imaginar aquele floquinho aparecendo no meio daquela situação, mas em segundos, meu riso se transformou em mais um suspiro. As peças de roupa foram sumindo a cada passo que estávamos mais perto da grande cama que ocupava o centro do quarto. Naquela noite eu conheci cada pedacinho daquele ruivo e deixei que ele me conhecesse também.

A leveza de seu toque, o respeito a tudo que eu queria e não queria, a forma como conseguia incendiar meu corpo. Tudo se juntou para transformar aquela noite em uma das melhores em bastante tempo. Lembrei como era possível ser muito gostoso estar com alguém assim, que entendia que era bom, se fosse bom para os dois, uma simples troca de prazeres.

Ele não deu espaço para que eu me sentisse encabulada ou insegura de nada, seus olhos refletiam exatamente todo o desejo que ele sentia e a vontade de estar ali.

Aquele encontro não poderia ter sido melhor.

Em contra-mão a tudo que eu já havia feito na vida, acordei no dia seguinte numa cama que eu não reconheci como minha. Meus braços e pernas ainda estava pesados, tanto quanto minhas pálpebras que pareciam travar uma guerra para continuarem fechadas. Aos poucos as memórias da noite anterior foram clareando e o cheiro do perfume naqueles lençois dizia exatamente onde eu estava.

Pisquei para enxergar alguma coisa na claridade que já entrava pela janela, mas o espaço ao meu lado estava vazio. Estranho… olhei em volta e não vi o dono da casa, talvez fosse melhor eu me preparar para ir embora. Me espreguicei e consegui me erguer devagar, sentando na cama. Toda a minha roupa estava jogada pelo chão do quarto então puxei o lençol numa tentativa bem boba de me cobrir.

Eu estava prestes a levantar quando escutei passos.

—Ah, você acordou! - Ron entrou no quarto, vestindo apenas uma cueca boxer e, para minha surpresa trazendo uma bandeja cheia de comida.

—O que é tudo isso?

—Achei que pudesse estar com fome, já é quase hora do almoço - ele explicou.

Como ele podia ser tão atencioso? 

Mas aquilo me deixou ligeiramente alarmada… sexo era uma coisa, mas café na cama? Isso estava num patamar completamente diferente em relação a apego e eu não estava pronta para me apegar a ninguém nem ter compromisso nenhum com ninguém.

—Não precisa, Ron, eu como em casa.

—Vai esnobar minhas panquecas só porque não estão em círculos perfeitos? - ele provocou daquele jeito bobo dele.

—Claro que não, estão lindas.

—Pois então, come comigo - ele deu a volta e se sentou ao meu lado, pusando a bandeja entre nós.

—Ron, eu… - não era certo eu deixar ele tendo ideias erradas, certo? Se ele foi sincero comigo, eu tinha que ser sincero com ele - a noite passada foi maravilhosa, mas… 

Era difícil falar aquilo quando tinha um par de olhos brilhantes te olhando com tanta atenção.

—O que foi, Mione? Pode falar, não tem problema - ele entrelaçou os dedos na minha mão, apertando-os de leve.

—Eu não estou pronta para nada que seja mais do que isso já foi… um jantar, uma noite gostosa… cafés na cama e toda essa atenção, eu não consigo… não agora.

—Rápido demais?

—Sim.

—Tudo bem, prometo que não repito isso, mas hoje não preciso jogar tudo fora, certo?

Eu já estava ali mesmo… e ele parecia ter compreendido a minha situação, não vi um pingo de mágoa em seus olhos.

—Tá bom, eu te ajudo com isso, mas só hoje.

—Só hoje, prometo - ele levantou os dedos em juramento, me fazendo rir - tudo pode ser no tempo que você quiser, Mione, eu posso até esperar mais um mês para mandar mensagem se você quiser… eu só gostaria de ainda poder mandar essa mensagem e que essa não fosse a última vez que nós nos vimos. Eu adorei todos os momentos desde que te conheci.

—Obrigada, Ron, de verdade, por entender… é que… - eu engoli em seco, não querendo trazer aquele assunto à tona, mas ao mesmo tempo sentindo que precisava de algum tipo de explicação - fiquei muito tempo com alguém que não foi legal comigo.

—Eu entendo - ele passou os dedos por uma mexa do meu cabelo, colocando-a atrás da orelha - não sei quem tipo de louco é esse que trataria uma mulher maravilhosa como você com menos do que tudo de melhor, mas eu garanto que não sou assim, o que talvez seja o que todos os homens dizem, então estou dependendo de um voto de confiança, mas prometo que não vou disperdiçá-lo se você me der um.

—Você não tem nada a ver com ele, Ron, nada mesmo - respirei fundo, sedimentando em mim aquela realização - eu também gostaria de te ver de novo e o voto de confiança é seu.

—De pouquinho em pouquinho então, até você morrer de saudade desse meu sorriso lindo! - ele fez um bico adorável que eu capturei em um beijo.

Aquilo podia dar em algum lugar, como podia não dar em nada, mas eu estava disposta a ficar para ver. Um relacionamento ruim não dita o resto da sua vida, eu fiquei por muito tempo amarrada no medo de ir em frente, presa no que havia sido. Porém ali, muito mais madura e segura do que antes e com aquela nova pessoa em minha vida eu sentia que pela primeira vez, o passado era o passado.

Eu tinha todo o futuro pela frente.


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Notas finais do capítulo

Então é isso!
Terminamos com uma Mione que passou a sentir que pode existir relacionamentos fora daquilo que ela conheceu e que foi tão negativo.
Adorei muito participar desse projeto de fic Romione, é um casal que eu sou completamente apaixoanda como podem ver pela maioria das minahas fics (e uma que vem em breve!). Eu quis fazer uma fic rapidinha e simples, incluindo um tópico que é tão delicado: os efeitos que ficam depois de um relacionamento abusivo.
Não posso dizer que sei de verdade o que é estar na pele de alguém que passou por isso, como infelizmente é o caso de tantas mulheres, porém eu quis colcar em evidência que isso acontece (jamais é culpa da vítima), mas que existe vida após. O caminho não é simples, não é fácil e não é indolor... mas uma hora o passado se torna mais distante do que o futuro.

Espero que tenham gostado, me contem lá nos comentários.

Bjus da Fe



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